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terça-feira, 27 de outubro de 2015

Direitos e deveres nos bares, boates e restaurantes



Muitos questionam, principalmente os mais jovens e os frequentadores de bares e boates, sobre os direitos e deveres dos estabelecimentos comerciais e de seus clientes, considerando a ausência de informação adequada que cerca o tema.

Neste sentido, o presente artigo busca tecer esclarecimentos breves e básicos acerca de alguns dos questionamentos supramencionados, a fim de que mais pessoas conheçam seus direitos e deveres, seja na posição de cliente ou de gestor de estabelecimentos comerciais.

Pagamento de 10% na conta

É praxe nos estabelecimentos comerciais, principalmente em bares e restaurantes, o acréscimo de 10% ao valor final da conta, popularmente conhecido com "10% do garçom".

De plano, destaca-se que o pagamento do referido acréscimo não é obrigatório. Este valor cobrado nada mais é que gorjeta, que pode ser paga ou não, de acordo com a qualidade do atendimento e a satisfação do cliente. É mera liberalidade do cliente, que deve pagar apenas se entender que o atendimento do estabelecimento comercial justifica o pagamento de tal título.

Outro ponto que merece destaque consiste no fato de que, pelo dever de informação, uma das bases do Código de Defesa do Consumidor, os estabelecimentos comerciais deveriam informar a todos os clientes, seja verbalmente, no cardápio ou de qualquer outro modo, a facultatividade do pagamento do adicional de 10%. Contudo, a maioria dos estabelecimentos não o faz, contando com a falta de conhecimento por parte da maior fração da população para que sejam pagos os valores em questão.

Neste sentido, o art. 5º, II, da Constituição Federal [1] prevê que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Assim sendo, por não haver lei que determine a cobrança deste percentual, seu pagamento torna-se facultativo.

Frise-se que as Convenções Coletivas de Trabalho que preveem este adicional são válidas apenas no âmbito do Direito do Trabalho, na relação entre Empregador e Empregado, não possuindo qualquer aplicação com relação a terceiros alheios à negociação, no caso representados pelos consumidores que frequentam tais estabelecimentos comerciais.

Consumação Mínima

Outro hábito dos estabelecimentos comerciais é a cobrança de consumação mínima para ingresso dos consumidores em suas dependências, principalmente em dias de eventos festivos.

Neste ponto, duas questões merecem maior enfoque. Primeiramente, caso seja cobrado um valor para entrada no estabelecimento e seja ainda estabelecido um valor mínimo de consumação, verifica-se ser caso de venda casada, em que o fornecedor de produtos ou serviços condiciona a permanência do consumidor no estabelecimento ao consumo do valor determinado, embora tenha sido cobrado valor a título de entrada. Tal prática é vedada pelo Código de Defesa do Consumidor [2].

Em segundo lugar, a cobrança de consumação mínima, por si só, ainda que não tenha sido cobrado qualquer valor a título de entrada, é ilegal, visto que o mesmo diploma legal veda a possibilidade de se condicionar o fornecimento de produto ou serviço a limites quantitativos

Assim sendo, a nosso ver, a cobrança de consumação mínima é ilegal, seja ela cumulada com o pagamento de entrada ou cobrada individualmente, razão pela qual o consumidor tem direito à devolução do valor remanescente caso não venha a consumir todo o valor estabelecido como consumação mínima.

De se ver que alguns Estados brasileiros, como o Estado de São Paulo, possuem legislação específica que veda tal prática, além da previsão legal supramencionada.

Couvert Artístico

A cobrança de valores a título de couvert artístico gera muita polêmica e discussão nos bares e casas noturnas. Sem adentrar na seara do direito, consumidores não se cansam de discutir acerca da obrigatoriedade ou não do pagamento de valores a este título.

De início, importante destacar que o couvert artístico só pode ser cobrado em caso de apresentações ao vivo. Show exibidos em telões e afins não são considerados apresentações que permitem a cobrança de couvert artístico. Dito isto, no que tange à obrigatoriedade do pagamento, esta existe, porém com uma condição. O valor do couvert deve ser informado aos clientes no momento da entrada no estabelecimento ou estar afixado em local visível, conforme prevê o Código de Defesa do Consumidor [3]. Caso contrário, seu pagamento se torna facultativo, por violação por parte do estabelecimento comercial ao direito de informação do consumidor.

Importante frisar que o valor do couvert artístico não deve integrar o valor total da conta para fins de cálculo do valor dos 10% a serem pagos aos garçons a título de gorjeta, que devem ser calculados apenas em cima do valor dos itens consumidos.

Multa por perda de comanda

Diversos estabelecimentos comerciais preveem multas para casos de perda de comanda, muitas vezes em valores absurdamente altos, se comparados aos valores dos itens consumíveis, o que acaba por intimidar/coagir o consumidor.

De se ver que a cobrança de multa por perda de comanda é abusiva. Isso porque o estabelecimento comercial não pode responsabilizar o consumidor por não ter outros meios de controle de suas vendas. O ônus de controlar as vendas e o consumo é exclusivo do estabelecimento comercial, não podendo ser transferido ao consumidor em nenhuma hipótese.

Caso eventualmente haja perda de comanda e ausência de outra forma de controle por parte do estabelecimento, deve prevalecer o princípio da boa-fé, das duas partes, com o consumidor pagando apenas o valor que consumiu.

Frise-se que a maioria dos estabelecimentos tem controle eletrônico do consumo de cada comanda, vinculada ao nome dos clientes ou ao número da mesa, de forma que mesmo com a perda da comanda há como identificar o que fora consumido por determinada pessoa ou grupo, sendo mais um fator que justifica a impossibilidade cobrança de eventual multa.

Importante mencionar que caso o cliente seja impedido de deixar o estabelecimento pelo não pagamento da multa, deve entrar em contato com a polícia, visto que a referida prática é criminosa.

"Entradas" ou couvert

Outra prática comum de estabelecimentos comerciais, principalmente bares e restaurantes, é disponibilizar nas mesas algumas "entradas" (couvert), sem que tenham sido solicitadas pelos clientes, como por exemplo pães e torradas.

Como mencionado anteriormente, é dever do estabelecimento comercial manter o consumidor sempre informado sobre valores e serviços a serem cobrados, razão pela qual, ainda que o cliente consuma a "entrada" fornecida, não pode ser obrigado a pagar por ela, caso não tenha solicitado ou sido previamente informado de que seria cobrada.

No entanto, caso o cliente tenha sido informado da cobrança da “entrada” e não queira efetuar o pagamento, deve dispensá-la assim que seja entregue à mesa ou simplesmente não a consumir.
Síntese

Em suma, o pagamento dos 10% na conta é facultativo; a cobrança de consumação mínima é ilegal; o pagamento de couvert artístico é obrigatório, desde que o cliente seja previamente informado de seu valor; a multa por perda de comanda é abusiva; e “entradas” fornecidas sem que tenham sido solicitadas e/ou não tenha sido informada previamente sua cobrança não podem ser cobradas ao final. Este é o nosso entendimento.

NOTAS

[1] Art. 5º, II, da Constituição Federal: Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

[2] Art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor: Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

[3] Art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor. Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

Postado no dia 22.10.2015 em http://jus.com.br/artigos/43894/direitos-e-deveres-nos-bares-boates-e-restaurantes
Por DIOGO BECACICI



-Graduado pela Faculdade de Direito de Vitória - FDV; 
-Pós-Graduando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC e
-Advogado Sócio do Escritório Dall'Orto, Becacici, Botelho & Miguel Advogados Associados.

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