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terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Mediação de Conflitos e a Real Pacificação Social



É sabido que, consoante consta na Constituição Federal de 1988, o Estado Brasileiro tem seus poderes divididos em Executivo, Legislativo e Judiciário, todos independentes e atuando de forma harmônica, cada qual com suas funções e competências próprias.

Isso posto, com o passar dos anos, restou calcificada no seio da sociedade brasileira a denominada “cultura da sentença”, segundo a qual, em síntese, os variados e inevitáveis conflitos emergentes das relações humanas somente poderiam ser solucionados mediante a apreciação e julgamento do Estado-Juiz, responsável pela aplicação das leis elaboradas pelo Poder Legislativo de forma justa, imparcial, e com vistas à pacificação do conflito.

No entanto, o Poder Judiciário não mais suportou a enorme demanda de processos propostos a cada dia, além daqueles que ainda aguardam por julgamento, enfrentando uma crise institucional e de credibilidade social, que gerou nos jurisdicionados sensação de insatisfação com os resultados obtidos em procedimentos judiciais. Assim, surgiram as seguintes indagações: Porque eu cidadão não posso resolver meus próprios conflitos da forma como melhor atenda meus interesses e da parte adversa? Por quais motivos o Estado é o único habilitado a oferecer a considerada melhor solução? 

Neste contexto, em meados do ano de 2010 com a Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, e, após, em 2015, com o Novo Código de Processo Civil e a Lei da Mediação, os métodos autocompositivos de resolução de conflitos, em especial o método da mediação passaram a ocupar lugar de destaque no ordenamento jurídico brasileiro, dando espaço à denominada “cultura de paz”.

Mencionado método privilegia o empoderamento das partes em conflito, até mesmo em fase pré-processual, para que, apenas com o auxílio de um terceiro neutro e especialmente treinado para o reestabelecimento do diálogo perdido, denominado de mediador, elas próprias possam alcançar a solução que melhor as satisfaça, gerando com isso, o sentido de justiça almejado. 

O método em questão é bem definido por Calmon (2007) como “[...] a intervenção de um terceiro imparcial e neutro, sem qualquer poder de decisão, para ajudar os envolvidos em um conflito a alcançar voluntariamente uma solução mutuamente aceitável [...]”.

Interessante anotar a preocupação da novel legislação processual civil com a real pacificação de conflitos familiares, em regra mais expostos à perpetuação no tempo após prolação de sentença judicial, ao dispor expressamente em seu artigo 694, caput, e parágrafo único do Código de Processo Civil/2015, que “nas ações de família todos os esforços devem ser empreendidos para que as partes cheguem à solução consensual da controvérsia [...]”, possibilitando, ainda a suspensão do procedimento judicial já instaurado para a realização de mediação extrajudicial ou atendimento multidisciplinar.

Trata-se de verdadeiro avanço no que concerne à resolução de conflitos familiares, nos quais os vínculos sociais pré-existentes ao conflito devem ser mantidos tendo em vista que, em regra, nestes conflitos há menores envolvidos (prole), filhos que não perdem esta condição pelo desfazimento de eventual vínculo conjugal e que necessitam do apoio e carinhos dos pais para que tenham um crescimento e desenvolvimento compatível com suas necessidades básicas.

Desta forma, infere-se, ainda que parcialmente, que a real pacificação dos conflitos sociais apenas é alcançada quando as partes envolvidas, devidamente emponderadas participam do caminho para a conquista da solução que eu melhor atenda a seus interesses, o que ocorre através do método da mediação, quando corretamente aplicado, o que não significa a eliminação da via judicial, e sim, apenas mais uma porta para a verdadeira aplicação da justiça.

Por derradeiro, resta a nós operadores do direito, mudarmos nossa mentalidade calcada no litígio, a fim de que a legislação então vigente não se perca em meio aos entraves culturais ainda existentes no que se refere à resolução de conflitos sociais.

Referências

BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. AZEVEDO, André Goma de (org.). Manual de Mediação Judicial. 5ª Edição. Brasília-DF, 2015;
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em: 02 jan 2016;
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 02 jun 2015;e
CALMON, Petrônio. Fundamentos da mediação e da conciliação. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2007.

POR RAÍSSA VARRASQUIM PAVON














-Graduada em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica Dom Bosco;
-Pós - Graduada em:
 - Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus  Unidade Campo Grande; e
 -Direito Civil e Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito;
Extensão em Métodos Alternativos de Solução de Conflitos - Mediação, Conciliação e Arbitragem pelo Tribunal Arbitral de São Paulo - TASP;
-Mestranda em Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB/MS);
- Membro do Grupo de Pesquisa "Patrimônio Cultural, Direitos e Diversidade", atuando como pesquisadora no Projeto de Pesquisa "A trajetória do mestrado em Desenvolvimento Local - UCDB";
- Colaboradora no Projeto de Pesquisa em Iniciação Científica "A divulgação científica do texto acadêmico: visibilidade e acessibilidade - continuidade";
-Advogada inscrita na OAB/MS sob o nº 16.760 e 
 - Sócia Fundadora do Escritório Jurídico Ovando & Varrasquim Advogados.

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

Um comentário:

  1. Bastante interessante seu texto,embora eu,infelizmente,não tenha nenhuma competência para comentá-lo;mas como pessoa,posso dizer sem titubear que,em qualquer desavença,ou qualquer conflito social,as partes litigantes só aceitarão a pacificação se,em resumo,elas mesmas chegarem a uma solução em que elas mesmas tenham sugerido e compreendido! Só assim acredito que haverá uma pacificação verdadeira e satisfatória! Tomara que surjam muitos e muitos mediadores que consigam ajudar às pessoas sem que ela tenham que percorrer o caminho da Senhora Justiça,tão cara e tão lenta que foge do alcance de milhares de pessoas! Gostei muito do seu artigo,amigo Werneck !

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