Fiz 59 anos em agosto de 2016. Não é uma idade a se comemorar, principalmente sendo mulher e brasileira. O que significa envelhecer no Brasil? Atualmente: deixar de ser atraente, adquirir o dom da invisibilidade, e estar mais próxima da estatística do IBGE que, segundo o último levantamento divulgado em 2016, afirma que apenas 1 em cada 20 entrevistado que já passou dos 60 anos está empregado, contra 1 em cada 5, na faixa dos 50 anos.
Não foi, portanto, no melhor estado de espírito que recebi o novo boleto de meu plano de saúde, no mês imediatamente posterior ao meu aniversário. O mau humor estava plenamente justificado, a mensalidade, que até então era de pouco mais de oitocentos reais, havia sido majorada em mais de 73% sem que houvesse decorrido um ano do reajuste anterior.
Nem bem havia recuperado o fôlego e veio o telefonema do corretor que havia me vendido o plano, nove longos anos antes, que eu já nem sabia mais por onde andava. Pelo visto a alienação era unilateral, já que ele não só tinha todos os meus contatos como estava a par do reajuste absurdo da minha parcela e se prontificou a conseguir novo plano, mais adequado à minha realidade.
Recusei, indignada. Escolher um plano de saúde individual foi um longo processo. Selecionei com cuidado a empresa e a cobertura que achei mais adequados para que, ao me aposentar, não precisasse entrar no SUS, sistema que respeito mas que qualquer pessoa minimamente informada sabe que está quebrado, depois de anos de desmando e corrupção. Basta abrir o jornal para ler casos escabrosos de gente morrendo como gado, nas filas de emergência, na frente de hospitais, em corredores superlotados.
Aquele telefonema me irritou de tal maneira que decidi lutar por mim. Não iria me render a um sistema ganancioso, acobertado pela agência reguladora que, paradoxalmente, protege a quem deveria fiscalizar em detrimento daqueles que deveria proteger.
Entrei no Juizado de Pequenas Causas contra a mensalidade abusiva alegando que, em um país que vive a pior recessão de sua História, com perto de 14 milhões de desempregados, mais de 1,3 milhão de pessoas obrigadas a desistir de seus panos de saúde apenas em 2016, e com um sistema de saúde pública reconhecidamente quebrado, ser excluída de meu plano por um reajuste escorchante equivalia a uma sentença de morte.
Minha ação foi acatada em parte em primeira instância, embora tenha sido uma “Vitória de Pirro” - meu plano procedeu ao reajuste anual em dezembro de 2016, o que fez com que eu fechasse o ano com uma mensalidade mais de 100% superior à de janeiro. Além disso, houve recurso da sentença.
Não tem nada não. Em primeira instância o aumento foi reduzido para menos de 22% e o reajuste original, considerado excludente e abusivo. Nós, que estamos na virada dos 60 anos, somos diariamente desrespeitados, não raro abaixamos a cabeça para todos os abusos, até dentro de casa.
Estamos acostumados a ver idosos condenados a morrer em filas de hospitais ou em depósitos para velhos, sem que ninguém se apresente para defendê-los, então é uma conquista e estou feliz.
Quem sabe você, que está lendo agora, pronto para desistir do plano que pagou durante a vida inteira para não ter que depender do SUS exatamente na velhice, não se inspira na minha história e faz o mesmo?
Basta de esperar que o país reconheça que estamos aqui. Se a ANS não nos protege, paciência, esta é apenas mais uma distorção de um país em crise, sigamos em frente.
Nem um direito a menos, não saia do seu plano de saúde, entre na Justiça.
Por BEATRIZ RAMOS
-Cronista; e
- Publicitária
- Trabalha com mídias sociais
NOTA DO EDITOR :
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Parabéns Beatriz pelo texto e pela atitude! 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻👍🏻🙏🏻
ResponderExcluirObrigada, Stela, seu elogio me incentiva muito.
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