Causa espécie a afirmação do Presidente do Banco Central, veiculada no sábado 26/08, de que a recuperação da atividade econômica será dada pelo aumento no consumo. Mesmo a tênue recuperação do consumo verificada nos dois trimestres últimos, tem a sua origem em fatores aleatórios e episódicos, tais como a queda da inflação e o volume extra de recursos injetados no mercado pela liberação dos recursos do FGTS que adormeciam em contas inativas sub remuneradas.
Na realidade, a recuperação da atividade com lastro no aumento do consumo somente será sustentável quando alicerçada em crescimento da renda nacional, o que não está ocorrendo no presente momento.
Além do mais, em o consumo aumentando (hipótese elencada pelo banqueiro central), o mesmo somente seria sustentável se viesse acompanhado de investimentos de médio e longo prazo, por parte dos ofertantes, que geraria aumento no produto e consequente recuperação na renda, mesmo sendo o país caracterizado como um grande concentrador na distribuição da renda. Os indicadores referentes a Formação Bruta de Capital Fixo, acompanhados pelo IPEADATA, indicam algo em torno de 15% do PIB para o ano em curso, sendo este resultado o menor verificado nos últimos 20 anos. Por óbvio, em não havendo aumento substancial do investimento, não haverá aumento do produto que geraria impacto positivo na renda tornando os índices do consumo insustentáveis no médio e longo prazo.
Na prática, quando existe uma recuperação no consumo opera-se, num primeiro momento, uma redução na ociosidade da economia. Ato contínuo, o "transbordamento" da capacidade instalada leva o ofertante a movimentar o setor de bens de produção para aumentar a oferta com encomendas ao setor de bens de capital. Em seguida movimenta-se o setor de serviços e inicia-se um ciclo virtuoso na economia com reflexos positivos na renda nacional.
Para que ocorra uma mudança desta natureza, o fator principal seria uma "virada" nas expectativas dos agentes econômicos que, na presente conjuntura, ostentam níveis assaz baixos. A razão principal das "baixas expectativas" está claramente situada no caos político/institucional em que está mergulhada a nação. Este estado de coisas impede que reformas estruturais sejam feitas de forma adequada e tecnicamente consistentes. O que se verifica é que, na ânsia de apresentar algum resultado no quesito "reformas", o governo de plantão procura "reformar" o mínimo que sua "base de sustentação" aceita, dada a sua fragilidade política. Estes mínimos atendem, apenas e tão somente, os ditames que o capital rentista determina para que não retire o seu "apoio" e mantenha a economia em níveis de "banho maria", para usar uma expressão dos tempos dos nossos avós.
No período do lulopetismo, o país apresentou um crescimento com base no consumo via aumento do crédito e não com base em aumento substancial na renda, em que pese a pirotecnia que a marketagem oficial veiculava, chegando-se a absurdos do tipo "nova classe média", esta com renda de R$ 1.000,00! Saliente-se que a conjuntura mundial apresentava-se como amplamente favorável e, mesmo assim, o crescimento da nossa economia ficava muito aquém dos resultados verificados em âmbito mundial.
Neste período, de triste memória (juízo de valor pessoal do autor), houve um crescimento substancial no chamado "consumo primário", causado pela disseminação de programas sociais distribuídos em espécie a populações à margem do mercado de consumo, elogiáveis sob qualquer parâmetro, mesmo que tenha sido utilizado com fins de aliciamento eleitoral e eivado de desvios criminosos que as circunstâncias estão a comprovar.
Para que fosse atendida esta nova demanda, verificou-se o crescimento da importação de produtos finais com estagnação do investimento, de vez que os agentes da oferta mantiveram uma posição clara de "oferta oportunista", ao invés de promoverem os investimentos necessários à sustentabilidade no processo de crescimento. O mercado reagia com as devidas cautelas, de vez que não existiam indicadores que apontassem para a sustentabilidade da política econômica adotada, que de resto resultou no desastre cujos custos estamos a amargar.
Em face disso, verifica-se a inocuidade das afirmações do Presidente do Banco Central, no que diz respeito a recuperação da economia, dado que sua base de sustentação é um verdadeiro "castelo de areia" se analisado, seriamente, à luz da teoria econômica. Assim sendo, estamos diante de uma afirmação tecnicamente irresponsável e destinada ao engodo dos agentes econômicos, posicionamento este que corrobora um ambiente de incertezas característico da corrupção sistêmica que prolifera no país.
Resta, sob esta apreciação, a confirmação de que a política econômica do governo resume-se ao "ajuste fiscal" como um fim em si mesmo e não como um dos pilares para a recuperação econômica do país. Com este desiderato, continuam-se a tomar medidas equivocadas tais como o congelamento das despesas da união por 20 anos, quando o correto seria um projeto de longo prazo de "deficit nominal zero". Por outro lado, nunca se ouviu , pelo menos uma menção, ao necessário "ajuste estrutural da máquina pública" com o objetivo de torná-la mais ágil e eficiente, diante do quadro atual de ineficiência, gigantismo e refém de um corporativismo deletério e que, não raras vezes, opera contra os interesses da nação.
Estamos, portanto, diante de um novo "voo de galinha" no que diz respeito ao crescimento econômico brasileiro, em que pese as manifestações ufanistas daquela autoridade monetária, comportamento este não condizente com a postura que se espera do titular da autoridade monetária de uma nação.
POR FLÁVIO JOSÉ CARPES SANTOS
- Economista e Professor Universitário;
- Graduação em Economia, Mestrado em Desenvolvimento Econômico e Doutorado em Economia Social;
- Economista da Carpes dos Santos Assessores Econômicos E Gestão de Crise.
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Foi uma medida ruim o congelamento dos gastos da união?
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