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sábado, 6 de julho de 2019

Desafio da Formação Docente


Autora Maria Cristina Bento(*)

Refletindo sobre a ação docente temos que assumir, entre outros fatores, a marca de cada gesto ou ação docente deixada nos alunos. Freire, em sua obra Pedagogia da Autonomia, anotou um momento de entrega de redação onde o olhar do professor foi mais importante do que a nota 10 atribuída à redação. A apreciação do docente naquele momento fez do aluno um escritor. 

A formação docente para a atuação na educação básica é um exercício desafiador, os professores formadores têm a incumbência de alertar os futuros docentes sobre as marcas que deixarão em seus alunos. Entre as disciplinas lecionadas em cursos de formação docente ao longo de minha jornada, descobri alunos, por exemplo, com temor a matemática por conta de gritos ou expressões negativas por parte de professores. Um fato não tão distantes de diversos estudantes que muitas vezes carregam consigo dificuldades de aprendizagem advindos de experiências traumáticas. 

Considerando que a formação docente deve proporcionar conhecimentos ao profissional da educação básica para saber muito bem o ensinar, o saber cuidar da forma como ensina, para quem ensina e por que ensina, o desafio dos docentes formadores do profissional da educação básica é ampliado. Estes indicativos são primordiais para a construção da sociedade que queremos, uma vez que indica o perfil de profissional que atuará no mundo, consequentemente, o perfil dos seres humanos formados por eles. Isso torna a tarefa de educar imersa em valores éticos, morais e pautados nos movimentos sociais de cada época. 

O ato de formar o docente para saber bem o que vai ensinar, proporcionar momentos de reflexão sobre o para quem ensina e seus reflexos na sociedade não se altera nas diferentes modalidades em que este profissional busca se formar. Qualquer que seja a modalidade de ensino de formação docente - presencial, online/EAD ou no modo híbrido[1], requer o exercício da reflexão sobre o que, por que e para quem se ensina. As modalidades de ensino citadas existem como forma de auxiliar o aluno em suas possibilidades para a aprendizagem e formação em qualquer profissão. 

Considera-se que o candidato a docente, mesmo que ao iniciar o curso não compreenda o reflexo do seu exercício na vida dos alunos, possa compreendê-lo ao longo dos estudos e ao iniciar as atividades de estágio como previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais aos cursos de licenciatura, no Brasil. 

Recentemente, ouvi um colega recém-formado contando que fez a primeira graduação presencial em Filosofia. A segunda em História na modalidade EAD. Ele narrou também que na segunda formação teve muito material para estudar sozinho e passou a fazer apenas as atividades, mediante a falta de tempo para estudar. O espantoso em sua narrativa foi quando disse ter obtido nota 10 em todas as atividades. Ao término da escuta, indaguei ao colega quais objetivos ele tinha mediante ao apresentado. Se ele pretendeu verificar e contar que era muito bom, um ser humano de altas habilidades; se cursou a segunda licenciatura simplesmente para poder ampliar a jornada docente; e se as licenciaturas cursadas o ajudaram a entender o ofício da docência; a ser professor, ou seja, auxiliar na formação de formar seres humanos capazes de solucionarem problemas do quotidiano em busca de paz e transformação, ou simplesmente auxiliar seus alunos a compreenderem o quotidiano pelo viés conceitual da Filosofia e da História. 

A narrativa apresentada suscitam-nos muitas reflexões, entre elas destaco algumas: o que leva uma pessoa a buscar por um curso de licenciatura? Por que fazer uma segunda licenciatura? Por que as pessoas insistem em falar da formação em EAD/online ou híbrida como algo displicente? Para quem e como oferecemos o curso de licenciatura, seja em EAD ou presencial? Será a oferta de cursos em EAD a mercantilização da educação? Há muitas respostas a estas indagações, estas talvez ferem mais indagações. Isso é bom, precisamos rever constantemente o perfil do professor da educação básica e o perfil do aluno deste segmento de ensino, pois esta relação/interação professor aluno forma o cidadão. 

Creio ser mais um desafio do docente da formação inicial, criar uma visão consciente sobre o ser docente e o dedicar-se para tal. Assim como na formação presencial é um desafio lidar com alunos que muitas vezes não detêm “dom” e motivação para docência, mas sonham ou veem como oportunidade serem professores, na educação a distância é um desafio lidar pessoas que enveredam para a EAD por se adequar a rotina ou mesmo por ser mais barato. Não sei, mas talvez seja um desafio fazer o aluno deixar de se enxergar como aluno e se ver como professor, ainda durante a sua formação, tenho a impressão que a ideia de ser aluno, por si só, cria estereótipos que sem perceber seguimos quando somos nós que estamos estudando. ou seja, que determine o perfil do sujeito que poderá realizar o curso de licenciatura, nem sei se isto resolve. Mas, compreendo a necessidade de que cada aluno de curso de licenciatura possa inferir sobre o que é ser/estar professor. 

REFERÊNCIA

[1] No momento muito se discute se a EAD deverá ser nomeada educação online ou EAD ou presencial em modo híbrido. Neste texto não temos a intenção em abordar esta temática, cito todas como marco das reflexões da época.

*MARIA CRISTINA MARCELINO BENTO

- Graduada em Pedagogia; 
- Mestre em Educação pela UMESP-SBC; 
-Doutora em Tecnologias da Inteligência e Designer Digital;
- Atuou na Educação Básica por 22 anos;
Atualmente é Professora titular da FATEA nos cursos de graduação e pós-graduação e
-Professora Coordenadora do Curso de Pedagogia da Fatea

Nota do Editor:


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