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terça-feira, 5 de novembro de 2019

Direito Animal:Nova Perspectiva Social e Ramo Fundamental do Direito



Autora: Karina Medyk(*)


O mundo não se restringe ao uso e ao gozo do ser humano, existe em prol de todos os seres vivos que nele habitam, e todos estes organismos de uma comunidade biótica dependem uns dos outros para sobreviverem.

Inexistem fundamentos para a ilusão que criou-se na ideia da superioridade dos seres humanos, e os argumentos geralmente usados como desculpas morais, éticas e sociais para a violação dos direitos dos animais não são mais aceitos pela camada consciente e evoluída em termos intelectuais da sociedade.

O direito à vida não é inerente ao homem, e sim inerente ao ser, merecendo os animais o devido respeito e à proteção de suas vidas, independente das vantagens direcionadas aos seres humanos.

Assim, o Direito dos Animais está cada vez mais em pauta como novo e fundamental ramo do direito, surgindo cada vez mais doutrinas e jurisprudências que abarcam o tema. No Direito brasileiro vemos que a legislação adota a visão antropocêntrica, carecendo urgentemente de uma atualização a fim de se adequar às atuais necessidades sociais, e acompanhar a evolução do pensamento da sociedade moderna, visando legitimar e legalizar os não-humanos como sujeitos de direitos com personalidade jurídica sui generis.

Existem inúmeros projetos de lei apresentados em defesa do Direito dos animais.


Estes são alguns deles:

PL nºs. 3141 e 42/2012:

Agrava a pena (01 a 04 anos) pela prática de atos de abuso, consistentes em maus tratos ou mutilação de animais, e institui como causa de aumento de pena a prática de atos de zoofilia. Projeto aguardando o parecer da Senadora Soraya Thronicke;

PL 1441/2019:

Proíbe em todo território nacional a realização de corridas competitivas com cães ou atividades similares de mesma natureza que configurem ou não apostas, ofertas de brindes ou promoções. Projeto esperando apreciação do Plenário da Câmara dos deputados; 

PLC 17/2017:

Proíbe a eliminação de cães e gatos pelos órgãos de controle e zoonose, canis públicos e estabelecimentos oficiais congêneres. Tramita desde 2012 na Câmara dos deputados, será votado nesta semana (04/11/2019-08/11/2019);

PLC 70/2014:

Visa proibir a utilização de animais em testes cosméticos;



PL 466/2015:


Visa a adoção de medidas que assegurem a circulação segura de animais silvestres no território nacional, para reduzir acidentes e atropelamentos; 

PL 5215/2019:

RG animal- visa a criação do Registro dos animais domésticos (cães e gatos);


PL 101/2015:

Proíbe a cobrança de impostos de entidades de proteção animal;

PL 6881/2017:

Proíbe fogos de artifício com estampido; 

PL 6267/2013: 

Proíbe animais em filmes pornográficos;

PL 1798/2015: 

Proíbe animais em práticas didáticas;

PL 3765/2012:

 Atendimento veterinário gratuito para a população carente;e

PLC 27/2018:

 Mudança da natureza jurídica dos animais não humanos do Código Civil. 

Além destes, existem milhares de outros projetos de lei que visam proteger estes seres indefesos, porém, infelizmente a maioria não é aprovado. 

Desta forma, é imprescindível a mobilização social em torno deste tema, para que tais projetos recebam atenção e sejam votados. As redes sociais exercem papel importantíssimo neste quesito, inclusive, o PLC  70/2014 só recebeu atenção da Câmara pois o Deputado Federal Ricardo Izar solicitou ajuda da ativista Luisa Mell, que fez apelações à seus seguidores nas redes sociais para que chamassem atenção das autoridades responsáveis para agilizar a votação deste projeto de lei. 

Estes projetos revolucionariam a sociedade como um todo, mudando a perspectiva sobre a vida no mundo, proporcionando um bem estar geral. Algumas consequências seriam a melhoria na saúde, melhores condições ambientais, e também na questão econômica. 

No caso do PLC 70/2014, por exemplo, que proíbe a utilização de animais em testes para cosméticos, se fosse aprovado seria extremamente favorável para a economia brasileira, visto que atualmente o Brasil não exporta cosméticos para a Europa pois eles não comercializam produtos que utilizam testes em animais.



Sobre o PLC 27/2018, o qual vêm recebendo enorme repercussão social, tem como objetivo mudar a natureza jurídica dos animais, reconhecendo todas as espécies como sujeitos de direito despersonalizados, visto que estão classificados atualmente como bens móveis, no artigo 82 do Código Civil. 


O objetivo é mudar o status de "coisa" dos animais, visto que estes são seres sencientes, ou seja, são capazes de ter sentimentos, como dor, tristeza, angústia. A importância deste projeto vai muito além de apenas mudar a natureza jurídica dos animais, pois diz respeito à uma tutela jurisdicional dos mesmos, o que possibilitaria a criação de legislações específicas acerca do tema. Tal projeto foi aprovado, porém, sofreu algumas emendas, não abrangendo mais a todos os animais, e sim apenas os domésticos e os silvestres. Atualmente está aguardando assinatura do Presidente para retornar para a Câmara dos Deputados.


A ciência já reconhece o animal como ser senciente, portanto, faz-se mister o reconhecimento por todas as esferas do Direito também. Neste sentido, o artigo 34-A da Lei Estadual n°12854/2003:
Art.34-A. Para os fins desta Lei, cães e gatos ficam reconhecidos como seres sencientes, sujeitos de direito, que sentem dor e angústia, o que constitui o reconhecimento da sua especificidade e das suas características face a outros seres vivos. (Redação do artigo dada pela Lei n°17526 de 28/05/2018).
No ordenamento jurídico vigente existem algumas previsões que resguardam os direitos dos animais, como a Constituição Federal, em seu artigo 225, que garante a preservação do meio ambiente, e mais especificamente no inciso VII, o qual veda qualquer tipo de maus tratos e crueldade aos animais. O artigo 32 da Lei 9605/98, que fala sobre crimes ambientais, protege expressamente todos os animais, reforçando o teor do artigo 225 da CF/88. 


Além destes, também existem outros dispositivos importantes acercas do assunto, como:


Decreto n°24645/34 – estabelece medidas de proteção aos animais; 


Lei Estadual n°11140/2018 de Paraíba, artigo 5° – prevê alguns direitos de todos os animais;

Declaração de Cambridge sobre a Consciência em Animais Humanos e Não Humanos – manifesto de neurocientistas que afirma a consciência dos animais não-humanos ; 

Relatório do Comitê de Brambell (1965) – define as 5 liberdades dos animais, quais são: 1- estar livre de fome e sede; 2- estar livre de desconforto; 3- estar livre de dor, doença e injúria; 4- ter liberdade para expressar os comportamentos naturais da espécie; 5- estar livre do medo e do estresse.


Importante salientar que o meio ambiente é um direito fundamental de 3ª dimensão, sendo um direito-dever, pois tem o dever de proteção, imposto à todos os entes federativos, conforme o artigo 23, incisos VI e VII da CF/88.

Neste sentido temos a jurisprudência do STJ, utilizando o princípio in dubio pro natura, em casos de conflitos e dupla interpretação de leis em Direito Ambiental, devendo o juiz escolher sempre o mais benéfico para a natureza, garantindo os processos ecológicos essenciais e a biodiversidade. Visto que a fauna é elemento essencial da natureza, a proteção ao meio ambiente abrange a proteção à todas as espécies de animais não humanos.

Conforme o jurista Zaffaroni, o critério que separa o respeito ao meio ambiente da violação dos direitos da natureza está em proibir os abusos supérfluos e desnecessários. Fazendo uma analogia à defesa dos animais o excesso é a proibição da crueldade. Dar subjetividade aos animais é dar garantias constitucionais a eles, ou seja, eles terão capacidade jurídica para ser parte em ações judiciais, sempre representados, possibilitando desta maneira a defesa de seus direitos. Será possível, inclusive, se os animais forem considerados sujeitos de direitos, a utilização de remédios constitucionais, como o Habeas Corpus. 

O primeiro caso que temos a natureza como sujeito de direitos é o Caso Rio Vilacamba, no Equador. Em 2008 o Governo iniciou obras nas proximidades do Rio Vilacamba, sem o devido licenciamento, e os dejetos destas obras foram jogados nas margens do rio, provocando sérios danos à natureza e às propriedades ao redor. Em consequência das enchentes causadas em sua propriedade, dois moradores procuraram o Ministério Público, e ingressaram com ação judicial, como representantes do Rio, sendo este parte na ação como sujeito de direitos. Na Constituição do Equador há previsão de que qualquer pessoa possa entrar com ação representando a natureza.

Outros exemplos de ações neste sentido são os casos do chimpanzé Jimmy e da chimpanzé Cecília. 

O primeiro, ocorreu no Rio de Janeiro em 2011, no qual requereu-se o Habeas Corpus do chimpanzé, para que ele fosse libertado de um zoológico em Niterói, onde estava em condições precárias. Entretanto, o processo foi negado ao chegar no Tribunal de Justiça, pois considerou-se que o animal, por se tratar de "coisa", não possuía direitos, e sequer seria possível tratar sobre a questão valorativa da vida deste chimpanzé. 

Em contrapartida, no segundo caso, da chimpanzé Cecília, que aconteceu na Argentina em 2017, também foi requerido o Habeas Corpus para tirar o animal de um zoológico em Buenos Aires. Foi reconhecido o direito da chimpanzé Cecília, considerando-a como um ser senciente. 

Outros países como Alemanha, Espanha, Áustria, Portugal e França, também reconhecem os animais como sujeitos de direito. Portanto, nota-se que há uma visão biocêntrica mundial, reconhecendo que os animais têm direitos, estando o Brasil atrasado em comparação com a maioria dos países desenvolvidos. Um exemplo disso, é o fato de que o Brasil é um dos poucos países que ainda não possui nenhuma lei que tipifica a zoofilia como crime, por conta disso, muitos estrangeiros vêm produzir filmes pornôs de zoofilia no Brasil. 

Desta forma, é imprescindível um progresso nesse aspecto, tanto por questões ambientais, tanto pela questão social do respeito por todos os tipos de vida. O Brasil possui uma das biodiversidades mais ricas do mundo, as maiores reservas de água doce do planeta e um terço das florestas tropicais que ainda restam. Estima-se que a cada 10 espécies de plantas ou animais existentes, uma está no Brasil. À vista de tais fatos, e sabendo a extrema importância do papel exercido pelos animais no meio ambiente, não podemos deixar de pensar na proteção destes, sendo imprescindível um reforço na legislação para resguardar os direitos destes animais, que convivem juntamente com nós neste planeta, dependendo uns dos outros para sobreviver. 

*KARINA MEDYK

-Estudante de Direito na Faculdade CESCAGE, atualmente no 4° ano;
-Estagiária na Procuradoria Federal em Ponta Grossa.



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