Autora: Maria Thereza Antunes(*)
Muito se tem comentado sobre a necessidade da educação continuada, como um imperativo na vida profissional, acadêmica e mesmo pessoal do indivíduo.
Por mais que esse tema possa parecer esgotado, não
entendo dessa forma. Digo isso, em função de minha experiência como educadora,
pois são 22 anos de atuação no ensino superior, período em que vivenciei as
mudanças ocorridas na educação em nosso país.
Assim, gostaria de compartilhar com vocês algumas
reflexões sobre a importância desse tema, mas tendo como balizador o próprio
indivíduo e, não, as instituições, sejam elas de qualquer natureza.
Para tanto, coloco-me, também, como personagem desse
contexto. Antes, porém, algumas definições se fazem necessárias, para se
equalizar os entendimentos das modalidades de educação continuada aqui mencionadas.
"Professora, estou
em dúvida se faço uma pós ou um mestrado, o que a senhora acha?"
Inúmeras vezes ouvi essa pergunta. Para a primeira
parte da pergunta, a resposta é bem
simples: as duas coisas são a mesma coisa, só que em níveis diferentes.
Após a conclusão do curso em nível superior (curso de
graduação) tudo o mais que se vier a cursar é entendido como pós-graduação, ou
seja, cursos realizados após a conclusão de um curso de graduação, sendo esse
um pré-requisito. Ocorre que esses cursos de pós-graduação foram criados em
dois níveis, os em nível lato sensu e
os em nível stricto sensu, que são
duas expressões em latim que significam em sentido amplo e em sentido estrito,
respectivamente.
Objetivamente, de acordo com o Ministério da Educação,
as pós-graduações lato sensu
compreendem programas de especialização e incluem os cursos designados como MBA
(Master Business Administration), com
duração mínima de 360 horas, e que ao final concedem ao aluno um certificado de
especialista no tema escolhido.
Já as pós-graduações stricto sensu compreendem os programas de mestrado e doutorado, que concedem ao aluno ao final do curso um diploma, respectivamente, de mestre e doutor, na área do conhecimento. Ainda no âmbito dos programas stricto sensu, vale mencionar que nos últimos 20 anos foi criada a modalidade de mestrado profissional e mais recentemente, bem recentemente, a modalidade de doutorado profissional.
Em síntese, os mestrados e doutorados acadêmicos visam formar pesquisadores e professores. Os cursos de especialização (lato sensu) visam, via de regra, o aperfeiçoamento da prática profissional por meio da apresentação de conceitos e de ferramentas operacionais na área do conhecimento escolhida. Os mestrados e doutorados profissionais, por sua vez, foram criados para atender a uma demanda do mercado, no desenvolvimento de soluções específicas para problemas oriundos da prática, do dia a dia das organizações, sejam elas com ou sem finalidade lucrativa, ou ainda governamentais, baseadas na aplicação do método científico. Esses cursos habilitam ainda aos concluintes ao exercício da docência em instituições de nível superior.
Outra modalidade de pós-graduação são os cursos de extensão que compreendem os minicursos, cursos de atualização, de especialização técnica, reciclagem, treinamento, com carga-horária variando de 8 (oito) a 180 horas.
Quanto à segunda parte da pergunta, ("... o que a
senhora acha?"), já não é uma resposta tão simples de se dá, pois isso implica
em se voltar o olhar ao indivíduo, ao seu momento escolar, profissional e
pessoal.
Diferentemente do que ocorria nos anos 1950, 1960, quando um diploma de curso de graduação era por si só um grande diferencial, hoje, a grande oferta de cursos de graduação, em todas as áreas do conhecimento, possibilitou, felizmente, o acesso de grande parte da população brasileira à obtenção de um diploma de curso superior e, com isso, o direito ao exercício legal da profissão escolhida.
Ainda não é o ideal, de fato, e também não entraremos
no mérito da discussão sobre a qualidade do ensino; estamos falando sobre o
aumento do acesso aos cursos de nível superior e, consequentemente, da entrada
de profissionais no mercado e da concorrência que aí se estabelece, que faz com
que os profissionais formados busquem um diferencial por meio da pós-graduação
(em nível lato ou stricto sensu e dos cursos de curta
duração), modalidades de educação continuada.
Grande parte dessa exigência vem das empresas que em seus processos seletivos especificam certos diferenciais, bem como para a progressão na carreira. Outra parte vem de alguns órgãos de classe, que estabelecem pontuações mínimas anuais para serem cumpridas, a título de educação continuada para o exercício legal da profissão (aqui cabendo os cursos de curta duração e de extensão); outra parte, a que melhor seria, vem da vontade e necessidade do próprio individuo, enquanto conhecedor das suas habilidades, necessidades e limitações.
Como deveria se
dar o processo dessa escolha?
Conceitualmente, para os profissionais que buscam um conhecimento especifico e de aplicação mais imediata, seria mais indicado os cursos de pós-graduação em nível de lato sensu. Já aqueles indivíduos graduados que gostariam de seguir a carreira acadêmica, deveriam cursar o mestrado e, posteriormente, o doutorado acadêmico, pois, dessa forma, gradualmente se aprofundaria no desenvolvimento do conhecimento, por meio da aplicação do método cientifico e na disseminação desse conhecimento por meio do ensino.
Já os profissionais graduados que façam a opção pelo exercício da profissão no mercado, ou seja, não em instituições de ensino como pesquisadores e professores, como primeira opção, podem optar pelos cursos de curta duração, pelos cursos de especialização e, mais recentemente, pelos mestrados e doutorados profissionais. Esses cursos possibilitam o aperfeiçoamento da prática profissional, também por meio da aplicação do método científico.
Como a experiência
tem mostrado que tem sido esse processo de escolha?
O que se pode observar nos últimos anos, foi o crescimento da oferta dos cursos de mestrados profissionais, fato que vejo com muito bons olhos, considerando-se o ganho de conhecimento prático que esses cursos propiciam para a sociedade brasileira, notadamente nas áreas da saúde e das tecnologias, cujos resultados são bem mais tangíveis de serem observados em termos de avaliação dos benefícios gerados.
Na área de negócios, em menor número, verifica-se,
positivamente, um aumento na parceria entre instituições de ensino e empresas,
por meio, principalmente, de incubadoras de ideias, propiciando o apoio ao
desenvolvimento do negócio no sentido amplo de sua gestão e continuidade;
verificam-se empresas financiando seus funcionários em busca de aprimoramento
técnico específico.
Esses cursos de mestrado profissional tem atraído indivíduos em busca de aprimoramento conceitual e teórico, progressão na carreira, recolocação no mercado, titulação, mas, também, por um algo a mais, que defino como a busca pela intelectualidade, algo que somente o stricto sensu acadêmico poderia lhes oferecer, formalmente, anos atrás. Isso é muito bom! O fato de esses cursos poderem ser oferecidos no período noturno (coerentemente com a realidade de seu público-alvo), e mesmo aos finais de semana, foi um facilitador para esses profissionais, pois conseguem conciliá-lo com a atividade profissional, mesmo porque a grande maioria dos cursos exige investimento financeiro.
Por que citei a
busca pela intelectualidade?
Curiosamente, em contato com os egressos desses cursos, verifiquei que muitos trocaram a atividade profissional pela acadêmica, como primeira opção, fato que não está em linha com o objetivo precípuo do stricto sensu profissional. Isso despertou em mim, a curiosidade de saber o que motivou esses indivíduos a fazerem o curso, saber o que eles encontraram no curso e, principalmente, quais foram os ganhos em termos profissionais e pessoais (vale mencionar que essa pesquisa está concluída, mas não publicada).
Objetivamente, em termos dos ganhos pessoais, que é o que nos importa neste texto, os egressos afirmaram que aprenderam a pensar, e que se sentem mais livres e mais seguros para o exercício da prática profissional. Além disso, destacaram que o tempo formalmente dedicado ao curso, lhes propiciou o acesso a novos conhecimentos de forma sistemática e, mais que isso, à aplicação desses conhecimentos ao livre e novo pensar, estimulando o pensamento crítico e despertando a vontade de continuar, não mais necessariamente focados na prática profissional.
Refletindo sobre essas falas, lembrei-me de um artigo publicado por Claudio de Moura Castro. Nesse artigo intitulado - Academia de ginástica (mental)
"Sem o desenvolvimento do método científico, não teríamos os avanços tecnológicos que tanto beneficiam a humanidade", o autor assim se refere ao método cientifico: “O método impõe a disciplina de formular as perguntas de maneira rigorosa e sem ambiguidades. (...)
O método tornou-se uma espécie de roteiro seguro para pensar bem sobre
todos os assuntos, não apenas para fazer pesquisas. Quem aprendeu a pensar como
cientista e a usar o método científico tem um raciocínio mais enxuto e
rigoroso. As perguntas são mais bem formuladas e já facilitam a busca
sistemática das respostas."
Para onde penso
que caminhamos?
Essa foi a possível explicação que encontrei para os achados da minha pesquisa. Obviamente, que se trata de um estudo exploratório de natureza qualitativa, não me autorizando, portanto, à generalizações. Mas sinto-me muito confortável com essa explicação, pois, além de minhas convicções, tenho o respaldo de um educador que muito admiro.
Sendo assim, me questiono para onde estamos caminhando
em termos do ensino formal do método cientifico, já que em nível dos cursos de
graduação e de especialização (lato sensu)
nem há mais a obrigatoriedade, por parte dos órgãos regulatórios, de se
desenvolver um trabalho de conclusão de curso na modalidade de pesquisa científica,
e as instituições de ensino estão, paulatinamente, substituindo-o por trabalhos
de aplicação prática imediata.
Finalizando.
Por vezes, nos sentimos impelidos pelas necessidades imediatas da nossa carreira profissional, o que é legítimo! Mas, todavia, não devemos ceder à essas necessidades sem, antes, uma profunda reflexão pessoal.
Aqueles que procuram não só pelo aperfeiçoamento do conhecimento para a prática imediata e, sim, ambicionam por desenvolver habilidades transformadoras, tais como testemunhado pelos meus alunos (mesmo sem terem imaginado, a priori!), devem considerar que, além dos cursos, existe algo a mais, por vezes não perceptível à primeira vista.
Assim, a mensagem que gostaria de deixar é a de que na
escolha por um curso de educação continuada, se deve levar em conta não só os
benefícios imediatos de que dele advirão, mas, e principalmente, desejos e
sonhos. E que estejamos abertos a benefícios imagináveis...
Referência:
CASTRO,
Claudio de Moura. Academia de ginástica (mental)
"Sem
o desenvolvimento do método científico, não teríamos os avanços tecnológicos
que tanto beneficiam a humanidade".
Disponível em: http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/academia-ginastica-mental-508217.shtml
MARIA THEREZA ANTUNES
Nota do Editor:
- Graduação em Administração pela PUC/RJ (1984);
- Especialização em Finanças pelo IAG/PUC/RJ (1985),
- Mestrado em
Ciências Contábeis pela FEA/USP (1999);
- Graduação em
Ciências Contábeis FEA/USP (2002);
- Doutorado em Ciências Contábeis pela FEA/USP (2004);
- 22 anos de
experiência na área acadêmica, atuando como docente, pesquisadora e gestora;
- Pesquisadora líder de projetos de pesquisa com fomento do CNPq
e da CAPES, tendo participado de diversos congressos científicos nacionais e
internacionais;
-Autora de livros e artigos científicos publicados em
periódicos indexados, nacionais e internacionais;
- Membro de Conselho Editorial de periódicos nacionais e
internacionais;
- Parecerista;
- Palestrante com experiência internacional;
- Membro da Comissão Científico e Acadêmico do Conselho
Regional de Contabilidade de São Paulo (CRC/SP), onde foi Conselheira de 2014 à
2017;
-Sócia gerente da Findings Consultoria Ltda, especializada
em gestão educacional e perícia contábil.
E-mail: teantunes@uol.com.br
WhatsApp: (11)-98338-4343
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6278852648499064
.cnpq.br/6278852648499064
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