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sábado, 21 de março de 2020

Homeschooling obrigatório em tempos de coronavírus


Autora: Mariana Casoni(*)


Devido ao alastramento do COVID-19 no Brasil, vírus causador de infecção respiratória, o governo do Estado de São Paulo suspendeu as aulas como forma de conter sua transmissão. Desta maneira, crianças e jovens ficarão em casa por tempo indeterminado. Nestas horas muitos pais ficam sem saber o que fazer com os filhos e os deixam por horas na frente das telas da televisão e do celular, contribuindo para a agitação e o tédio deles.

Para muitos pais esta é uma rotina comum: a educação de seus filhos em casa, o chamado homeschooling. O termo de origem inglesa quer dizer educação domiciliar e vai além disso, representa um estilo de vida, no qual os filhos fazem atividades de aprendizado supervisionadas pelos pais. O aprendizado ocorre de maneira integral e não apenas nas horas fixadas pelos pais; todo passeio ou atividade tornam-se matéria de aprendizado.

Pode-se pensar que este modo de vida seja algo novo, no entanto esta prática era comum antes do século XIX, visto que não existia o sistema escolar como conhecemos hoje. Os pais educavam seus filhos em casa e aqueles que tinham condições contratavam um tutor para educar seus filhos.

No Brasil, este modo de vida tem ganhado notoriedade pelo aumento da adesão por parte das famílias que, compreendendo a importância de uma educação de qualidade, optam por educar os filhos em casa. Ainda não há, no país, uma lei que regulamente o homeschooling, mas também não há lei que o impeça. Segundo a Declaração dos Direitos Humanos no artigo 26, parágrafo 3: "Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos." Assim, os pais têm liberdade de escolher aquilo que é melhor para seus filhos.

Muitas pessoas podem criticar a prática do ensino domiciliar, no entanto ao longo dos anos percebe-se que os alunos que vivem esta realidade apresentam um nível muito mais elevado do que aqueles que estudam na escola regular. Segundo a ANED, Associação Nacional de Educação Domiciliar, o estudo em casa com duração de duas horas é muito mais eficaz do que as cinco horas em que o aluno fica na escola.

Sabe-se que os índices educacionais no Brasil não são nada favoráveis ao desenvolvimento dos alunos, o último exame do PISA (2018), Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, tradução de Programme for International Student Assessment, o qual avalia os alunos da faixa etária dos 15 anos, no mundo todo, mostrou que

68,1% dos estudantes brasileiros estão no pior nível de proficiência em matemática e não possuem nível básico. Assim, caiu da posição 65ª para a 70ª posição nesta disciplina. Em ciências, nenhum aluno conseguiu chegar ao topo da proficiência na área e 55% não atingiram o nível básico. Sobre leitura e compreensão de texto, o país também não avançou. Cerca de 50% dos brasileiros não atingiram o mínimo de proficiência que todos os jovens devem adquirir até o final do ensino médio.[1]
  
Conclui-se, a partir dos dados do PISA, que infelizmente o Brasil não tem avançado nos índices educacionais, pelo contrário, tem decaído ano após ano, resultado de um sistema educacional ineficaz. Diante desta realidade alarmante, muitos pais optam pelo ensino domiciliar como uma alternativa segura de que seus filhos serão alfabetizados e estimulados a atingir suas potencialidades não só no nível educacional e de letramento, mas também como pessoa.

O ensino domiciliar não é somente uma prática de ensino diferenciada, mas é, sobretudo, um estilo de vida, no qual os pais estão dispostos a investir seu tempo e conhecimento para ensinar seus filhos da melhor maneira. Ele também não é uma afronta ao sistema escolar ou um modo de dizimá-lo, pelo contrário, nota-se que ambas as práticas podem existir na sociedade "uma prova disso é que a maioria dos países que lideram os rankings mundiais de educação permitem a educação domiciliar, como Finlândia, Austrália, Nova Zelândia, França, Canadá, Irlanda, Holanda e Dinamarca."[2]

Outro receio que paira quando se fala em educação domiciliar é em relação ao ingresso na universidade. Mesmo o jovem que não frequentou a escola regular é possível prestar o exame gratuito do Encceja (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos). Ao prestar a prova, o jovem recebe um certificado de conclusão do ensino fundamental e do ensino médio, assim ele pode prestar o ENEM e os demais vestibulares sem problema algum.

Estima-se que no Brasil hoje haja 15 mil famílias que adotaram este modo de vida, claro que nem todas as famílias têm condições de adotar esta prática, seja por questões financeiras ou intelectual, mas é importante saber que ela é uma realidade presente em nossa sociedade e não devemos olhá-la com discriminação ou pavor sem antes conhecê-la melhor.

REFERÊNCIAS

[1]Guia do Estudante, disponível em: https://guiadoestudante.abril.com.br/atualidades/entenda-o-pisa-avaliacao-mundial-de-educacao-e-o-resultado-do-brasil/. Acesso em: 16/03/2020 e

[2]Associação Nacional de Educação Domiciliar, disponível em: https://www.aned.org.br/conheca/perguntas-e-respostas. Acesso em: 16/03/2020.

*MARIANA CASONI














-Graduada em Letras (2010) pela UNESP- Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho";
- Mestre em Literatura Comparada (2013) pela mesma Universidade;
- Professora de Língua Portuguesa e Literatura.
Currículo na Plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/4705890322409799

Nota do Editor:
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