Autora: Karen Lima Vieira(*)
"Vivemos em tempos líquidos. Nada foi feito para durar."(Zygmunt Bauman)Um dos grandes desafios dos seres humanos é conviver com a incerteza do futuro e buscar formas de controlá-la, ou ao menos reduzir o impacto desta incerteza, que muitas vezes é angustiante. A Política é um dos instrumentos fundamentais para a solução destes desafios, não obstante todos os seus percalços e situações inusitadas que por vezes a desviam do interesse público.
Muitos pensadores dedicaram sua obra e alguns suas vidas para definir e compreender a Política, seus fundamentos, seus conceitos e suas extensões. Nestas conceituações, o que se observa em comum é que as profundas e profícuas análises feitas por estes pensadores sempre possuem marcas do reflexo de seu tempo, de seu espaço e da formação que cada um deles teve durante a vida. A Cultura Política vai sendo, assim, impactada pelas circunstâncias de espaço e tempo nas quais vai ganhando novos formatos e recebendo influências das mais diversas naturezas, sem, no entanto, uma definição para muitos pontos sempre presentes na pauta da Ciência Política.
Alguns autores destacaram-se na Ciência Política, desenhando a história de seu tempo, refletindo também o pensamento de parte das pessoas de suas épocas.
Assim é que na obra de Maquiavel, por exemplo, feita sob a gestão de um governo absolutista e autoritário, uma série de análises e estratégias delineadas causariam espanto se pensadas sob a luz de outras realidades de tempo e espaço. Muitas dessas estratégias ou afirmações, em circunstâncias diferentes, podem ou poderiam ser consideradas reprováveis. É atribuída a ele a conhecida regra de que "os fins justificam os meios", que mesmo escrita há muitos anos atrás, é até hoje celebrada ou odiada, dependendo-se das circunstâncias e dos atores políticos envolvidos.
Outro pensador, Thomas Hobbes, em sua conhecida obra Leviatã, revelada em 1651, também leva em consideração conceitos da época em que viveu, colocando Deus como um referencial nas suas conceituações. Apoiador também do Absolutismo, procura justificar o Estado como o grande Leviatã, ao defini-lo como um homem artificial, mais forte e mais poderoso, com a finalidade de preservar a segurança da própria sobrevivência humana.
Segundo ele, para a sobrevivência do todo, há a renúncia de parte de cada poder individual para o poder do coletivo, da somatória dos poderes de todos juntos, considerado este como um poder coletivo. Atesta que o Estado seria um homem superior desprovido das emoções humanas, que vive em constante competição envolvendo honra, competição e vaidade, onde o homem encontra sua felicidade na comparação com outros homens.
No entanto, quem parece que a compreensão da alma do mundo nos tempos atuais foi refletida na obra de Zygmunt Bauman, que trata da Modernidade e Ambivalência. "A desordem é um agudo desconforto que sentimos quando somos incapazes de ler adequadamente a situação e optar entre ações alternativas". (in Modernidade e Ambivalência, BAUMAM, Zygmunt, pg. 9, Jorge Zahar Editor)
A modernidade, por sua vez, contem um conceito carregado de ambiguidades.
Assim é que nesta desordem toda parece contextualizada a Pandemia, que sem nenhum sinal ou aviso veio como um furacão arrebatador. Mudando tudo e todos, impôs uma revolução na Política, na Economia, na vida das pessoas.
Na Política, em pouco tempo, projetos de lei que demoravam uma década ou pelo menos anos para serem votados, passaram a ser votados da noite para o dia. Também as sessões, que eram presencias e só aconteciam as terças e quintas no máximo, passaram a ser feitas em todos os dias e horários, até aos domingos. Também a Saúde Pública que raramente era objeto de interesse passou a ser a estrela da vez.
Na área da tecnologia também, as mudanças que estavam plasmadas há anos no Universo começaram a se concretizar... trabalho à distância, "home office", reuniões virtuais nos modelos do “face time” da Apple, compras online, da Amazon, filmes em casa da Netflix, todas por enorme coincidência dentro do Rol das gigantes do capitalismo americano. Difícil não pensar em algum momento que nem tudo foi "uma grande obra do destino".
Curioso lembrar também de Heráclito:
"Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou. Assim, tudo é regido pela dialética, a tensão e o revezamento dos opostos. Portanto, o real é sempre fruto da mudança, ou seja, do combate entre os contrários."
Fato é que mesmo que a Pandemia passe, que as vacinas cheguem, muitas mudanças serão para sempre, o passado passou, nossas memórias de outros tempos ficarão apenas lá como bons ou maus momentos.
E por mais que tenhamos sofrido com a Pandemia, que os homens compreendam finalmente que somos seres do Universo, todos no mesmo transatlântico, e que somente o amor, a compreensão mútua e a integração numa direção mais sublime pode levar a evolução.
*KAREN LIMA VIEIRA
-Procuradora Legislativa e Advogada;
-Doutoranda e Mestre em Ciência Política pela PUC de São Paulo, com MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV);
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Nota do Editor:
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Muito bom, Ela é muito competente e ser homano fatástico
ResponderExcluirAbordagem muito interessante, baseada em Bauman.
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