|Autor: Vinicius Melo(*)
Embora a pensão alimentícia seja para garantir a própria sobrevivência de quem a recebe, notadamente crianças e adolescentes – vulneráveis -, a própria legislação vigente acaba, por muitas vezes, fazendo com que o recebimento se torne um verdadeiro martírio.
Em uma ação de cumprimento de sentença ou execução de alimentos, a lei define que o devedor será intimado para efetuar o pagamento em 3 dias ou justificar a sua impossibilidade de o fazer (art. 528 do Código de Processo Civil - CPC).
Quando intimado o devedor, o prazo começará a contar a partir da juntada do mandado cumprido pelo oficial de justiça aos autos (art. 231, II, CPC). Tal situação foi acelerada, durante a pandemia, pelo uso de ferramentas como o WhatsApp para citações/intimações, que acabou sendo até mesmo objeto de regulamentação pela Lei nº 14.195/2021 e pelo Conselho Nacional de Justiça para evitar nulidades.
Ocorre que, não raras vezes, tal juntada do mandado é demorada, sendo necessário que o advogado da parte interessada cobre agilidade para que o prazo comece logo a fluir. Ainda, tal prazo só será contado em dias úteis, o que significa que se o mandado for juntado na sexta-feira, o prazo só começará a contar na segunda-feira. Assim, ganha alguns dias a mais o devedor de alimentos, enquanto o credor, parte que mais necessita, fica à mercê.
Só que a situação começa a ficar ainda mais difícil a partir deste momento. Caso o devedor não pague e apresente algum tipo de justificativa, o juízo da causa dificilmente rejeitará tal alegação sem antes intimar o credor a se manifestar. Assim, nova contagem de prazo ocorrerá, entre os dias para que o despacho seja realizado, a intimação seja expedida e a parte exequente (credora) tenha que rebater todas as alegações de quem deve os alimentos, em uma tarefa muitas vezes hercúlea. Facilmente esse trâmite leva 20 dias.
A partir do momento em que o exequente refuta os argumentos, o julgador encaminha o processo para que o Ministério Público se manifeste. E aqui o grande problema: a lei prevê que o Ministério Público terá sempre 30 dias para se manifestar. Melhor dizendo, conforme a lei processual, serão 30 dias úteis. Que, na verdade, serão mais de 30 dias úteis, pois ainda há o prazo para leitura da intimação via sistema. O prazo pode chegar a quase 50 dias. Cabe à parte que necessita dos alimentos torcer pela agilidade da manifestação ministerial. Enquanto isso, no mínimo mais uma (e quase duas) parcelas se vencerão, somente no aguardo da posição do Ministério Público, que atua para salvaguardar os interesses de incapazes. Neste ponto, por própria previsão legislativa, a atuação do Ministério Público mais pode atrapalhar do que ajudar, considerando o prazo excessivo.
Após a manifestação Ministerial, com o processo voltando a ficar concluso ao juiz para decidir, é frequente que o devedor efetue o pagamento das prestações vencidas, sempre perto do prazo para que mais uma parcela se vença. Assim, o juiz, ao invés de aplicar uma das medidas coercitivas ou expropriatórias previstas na lei, como prisão civil ou penhora de bens, volta a intimar o credor para informar sobre a quitação do saldo.
Ocorre que, como dito, o pagamento foi efetuado próximo ao vencimento de uma nova prestação. Desta maneira, com novo vencimento, o credor informa ao juiz deste débito recente e todo o ciclo volta a se repetir, tornando o processo inacabável se o julgador não tiver a devida percepção da conduta procrastinatória do devedor e determinando, desde já, as medidas necessárias à efetivação de um direito que não pode aguardar prazos processuais tão alongados, muito menos os prazos de leitura dos sistemas judiciais, como o PJe.
Este quadro foi indicado apenas para reflexão. Será que as normas gerais do Código de Processo Civil, especificamente sobre a necessidade de sempre oportunizar às partes que falem sobre os temas abordados e os longos prazos do Ministério Público realmente defendem os interesses de um credor? Pior, de um credor de alimentos?
Ao que parece, não se mostram razoáveis tais prazos. Talvez seja necessário que uma lei específica sobre alimentos, renovada, seja pensada para evitar que essa situação continue causando tamanhos prejuízos ao credor e também para o(a) genitor(a) que o mantém mesmo sem apoio da outra parte e que sofre com os endividamentos constantes para sustento de alguém que não gerou sozinho.
VINICIUS MELO
-Advogado de Direito de Família;
-Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família; e
-Membro da Comissão de Direito de Família da OAB de Jaboatão dos Guararapes - PE.Nota do Editor:
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