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terça-feira, 11 de outubro de 2022

O Projeto de Lei nº 3.293/2021 e as vantagens da Arbitragem


Autor: Rodolfo Real Amadeo (*)

Desde sua promulgação em 1996, passando pelo reconhecimento de sua constitucionalidade em 2001 e por sua reforma em 2015, a Lei de Arbitragem (Lei n.º 9.307/1996) tem fornecido base sólida para o desenvolvimento da arbitragem como o principal meio de solução de conflitos em diversos segmentos do mercado brasileiro, além de reiteradamente colocar o país entre os maiores usuários das grandes câmaras arbitrais internacionais do mundo. Atualmente, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n.º 3.293/2021, que tem por objetivo reformar novamente a Lei de Arbitragem. O tema que nos propomos, portanto, é, ainda que brevemente, revisitar as vantagens da arbitragem frente aos possíveis impactos previstos neste Projeto de Lei.

Diferentemente da reforma de 2015, que apenas positivou o entendimento da jurisprudência que veio se formando ao longo dos primeiros quase 20 anos de vigência da Lei de Arbitragem no sentido de favorecer a ampliação desse meio de solução de conflitos, o Projeto de Lei n.º 3.293/2021 se apresenta como uma contrarreforma, impondo restrições à liberdade que permitiu o desenvolvimento do instituto no Brasil.

São três as principais vantagens que normalmente levam as partes a elegerem a arbitragem como método de solução de conflitos: sua celeridade, a qualidade técnica de suas decisões e a confidencialidade do processo arbitral.

A celeridade da arbitragem decorre tanto da liberdade que as partes têm na escolha dos árbitros que irão resolver o litígio, quanto da liberdade destes para, em conjunto com as partes, adaptarem os atos processuais à solução daquele litígio específico.

Já a qualidade técnica das decisões arbitrais decorre do conhecimento especializado na matéria objeto do litígio e na capacidade de o árbitro ou o tribunal arbitral apurar os fatos envolvidos no litígio para sobre eles aplicar a norma eleita pelas partes ou imposta pela ordem jurídica.

Diz-se, com razão, que uma arbitragem vale tanto quanto o árbitro ou o tribunal arbitral que a preside. Árbitros mais experientes e com conhecimento mais especializado do tipo de litígio objeto daquele processo arbitral têm mais facilidade na resolução da disputa, levando, em tese, menos tempo para proferir a sentença arbitral.

Nesse ponto, o Projeto de Lei n.º 3.293/2021 coloca em confronto essas duas vantagens, pois restringe a liberdade de escolha das partes, impedindo que elas elejam um profissional que já esteja atuando, como árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal arbitral em dez processos arbitrais (cf. § 8º que o Projeto de Lei pretende incluir no art. 13 da Lei de Arbitragem).

A alteração parte de uma premissa aparentemente lógica, qual seja, que um árbitro com menos processos arbitrais poderá dedicar mais tempo a eles, resolvendo-os com maior celeridade. Trata-se, no entanto, de premissa generalizante que não leva em consideração a realidade de cada árbitro ou cada litígio, sendo perfeitamente possível que um árbitro com número maior de arbitragens do que a dezena projetada resolva cada caso em tempo significativamente menor do que outro árbitro que só tenha um ou dois processos arbitrais em tramitação. Seria como se se quisesse limitar o número de pacientes para cada médico, sem considerar sua especialidade e as características de cada moléstia.

Da mesma forma, a alteração proposta não se leva em consideração que as próprias partes podem estar dispostas a enfrentar um tempo maior para ter seu litígio resolvido por um árbitro ou por um tribunal de árbitros especializados, mas com mais processos arbitrais em curso. Lembremos de que, em regra, não se prevê a possibilidade de interposição de recurso contra a sentença arbitral, o que leva as partes a, geralmente, prezarem mais pela qualidade técnica da decisão do que pela celeridade em obtê-la.

A confidencialidade é outra vantagem apontada como grande atrativo da arbitragem. Embora a confidencialidade não esteja prevista na Lei n.º 9.307/96, os regulamentos das câmaras arbitrais consagraram essa característica aos processos arbitrais.

Em relação a este aspecto, o Projeto de Lei n.º 3.293/2021 prevê a inclusão dos arts. 5º-A e 5º-B na Lei de Arbitragem, determinando, em síntese, que as câmaras de arbitragem divulguem: (I) a pendência do processo arbitral, com a composição do tribunal arbitral e o valor atribuído à controvérsia; e, após, (II) a íntegra da sentença arbitral proferida, com eventual supressão de informações confidenciais.

Não há dúvida quanto ao interesse na busca de um necessário equilíbrio entre a confidencialidade e a publicidade do processo arbitral, em especial quando consideramos alguns segmentos da economia como o mercado livre de energia elétrica e o mercado de capitais. No entanto, a solução prevista no Projeto de Lei n.º 3.293/2021 é, novamente, generalizante e dificilmente atenderá as necessidades específicas de cada segmento. Trata-se, portanto, de matéria que deve ser, com maior êxito, discutida e disciplinada setorialmente.

Assim, ao menos numa primeira visão e em sua configuração atual, o Projeto de Lei n.º 3.293/2021 coloca-se na contramão do desenvolvimento das vantagens da arbitragem.

* RODOLFO DA COSTA MANSO REAL AMADEO

















Graduado  em Direito  pela Universidade de São Paulo (1998);
Mestrado em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo( 2005);
Doutorado em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo (2010);
Professor dos Programas de Pós-Graduação da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo;e
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAR), da Dispute Resolution Board Foundation (DRBF), do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), do Centro de Estudos Avançados de Processo (CEAPRO) e do Instituto Brasileiro de Estudos do Direito da Energia (IBDE).

Nota do Editor:

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