Autora: Maria Antonia Sant´Ana(*)
Imagino que essa associação não seja tão usual no dia-a-dia da maioria das pessoas que não se exercitam, menos ainda daquelas que não praticam um esporte de luta, assim como não era para mim também, ou seja, estivemos no mesmo barco até bem pouco tempo atrás.
O meu objetivo hoje é surpreender, assim como eu fui surpreendida quando precisei conhecer um pouquinho mais sobre o judô.
Então, se ajeita onde estiver para embarcar nessa viagem comigo lá para o Japão.
Em 1882, com apenas 22 anos, Jigoro Kano decide criar um novo método que educa o físico e forma o caráter, baseado no Ju-Jutsu e seguindo um conjunto de preceitos do Budismo, Xintoísmo, Confucionismo e do Taoísmo.
Vemos a presença do Budismo quando Kano afirmava que o judô era uma forma de educação, que a sua prática leva ao desenvolvimento da vontade e da moral, bem como do autodomínio e autoconhecimento. O Xintoísmo está relacionado ao judô na questão hierárquica, fidelidade ao mestre, desenvolvimento do autocontrole, perseverança e solidariedade. A base do Taoísmo prega a generosidade, o equilíbrio, a humildade e a suavidade, presentes em diversos princípios do judô. O Confucionismo é citado por Jigoro Kano como a forma de educação e a formação de um cidadão, ou seja, de um Judoca.
Kano cria duas máximas e nove princípios, vou lista-los abaixo:
Máximas:
1. Seiryoku Zenyo, máxima eficácia com menor uso de energia; e
2. Jita Kyoei, prosperidade e benefícios mútuos.
Princípios:
1. Conhecer-se é dominar-se e dominar-se é triunfar;
2. Quem teme perder já está vencido;
3. Somente se aproxima da perfeição quem procura com constância, sabedoria e, sobretudo, humildade;
4. Quando verificares que nada sabes, terás feito teu primeiro progresso na aprendizagem;
5. O judoca não se aperfeiçoa para lutar, luta para se aperfeiçoar;
6. Nunca te orgulhes de haver vencido um adversário. Ao que venceste hoje, poderá derrotar-te amanhã. A única vitória que perdura é a que se conquista sobre a própria ignorância;
7. O judoca é quem possui inteligência para compreender aquilo que lhe ensinam e paciência para ensinar o que aprendeu aos seus semelhantes;
8. O caminho do verdadeiro judoca é saber cada dia um pouco mais, utilizando o saber para o bem; e
9. Praticar o judô é educar a mente a pensar com velocidade e exatidão, bem como educar o corpo a obedecer com justeza. O corpo é uma arma cuja eficiência depende da precisão com que se usa a inteligência.
Começamos a perceber que o judô vai além de um estilo de arte marcial, não é mesmo? Ele é um estilo de luta que tem uma filosofia a ser seguida e que não tem como único objetivo vencer o adversário ou uma simples prática mecânica e sistemática de movimentos.
O seu objetivo é contribuir para o desenvolvimento do praticante e fazer com que ele contribua com o próximo dentro da sociedade em que está inserido.
As últimas notícias nos mostram o quanto a ansiedade tem chegado aos lares brasileiros e como ela interfere diretamente no nosso bem-estar, na nossa autoimagem, no nosso autoconceito, na nossa autoestima, na nossa produtividade... Mas, hoje não é dia de darmos muitos holofotes para ela, tá bem? (Se você sente que a ansiedade tem atrapalhado seus dias, não deixe para amanhã, procure agora mesmo a ajuda de um profissional).
Hoje é dia de falarmos como o judô auxilia o nosso bem-estar físico e emocional.
Além dos neurotransmissores relacionados à sensação de bem-estar e que ajudam a reduzir o estresse e ansiedade, que são liberados quando praticamos atividade física, vamos nos aprofundar um pouquinho mais nas máximas e princípios do judô.
Antes de adentrarmos ao tatame, fazemos a reverência, mostrando respeito ao lugar de prática, aos colegas judocas, ao sensei (professor), desenvolvendo, então, a disciplina, o respeito, a obediência às regras, a humildade.
Preparados para iniciar uma luta, fazemos novamente a reverência ao nosso adversário porque acreditamos que só podemos nos aperfeiçoar com a ajuda dele, demonstrando também respeito.
A referência acontece novamente no final da luta, tendo-a perdido ou ganhado, recordando novamente o respeito ao adversário. O judoca que ganha não pode caçoar do perdedor, afinal, o objetivo é o desenvolvimento de ambos. O respeito no momento da derrota também nos relembra que quando perdermos seremos respeitados, trazendo-nos segurança para sermos derrotados e aprender com nossos erros.
O judô nos ensina também que o único caminho capaz de nos aproximar da perfeição é procura-la com constância, sabedoria e humildade. Indo na contramão do que vivemos nos dias de hoje, onde queremos tudo o mais rápido possível e, dentro das possibilidades, com o menor esforço das nossas capacidades mentais e físicas.
A espera pelo rendimento perfeito, pelo comportamento perfeito, pela escolha perfeita... que tanto nos angustia e causa medo, nos é ensinada nos tatames de prática do judô.
O aperfeiçoamento é constante, mas não apenas para golpes perfeitos, também para o autodomínio, para o autoconhecimento, para os nossos pensamentos, para a paciência em ensinar o que já sabemos e aguardar pelo desenvolvimento do outro, para o nosso autocontrole.
A prática do judô, alinhada aos seus ensinamentos, nos mostra que os níveis de raiva são diminuídos e que a conversão da raiva em agressão é menos provável.
Os desafios físicos e mentais propostos durante as aulas contribuem para o nosso desenvolvimento pessoal, com a nossa saúde, com o nosso crescimento pessoal.
Deparamo-nos com a vitória e com o fracasso e somos ensinados que isso pode acontecer de forma natural, com respeito, segurança e com menos sofrimento.
Bom, eu poderia passar mais alguns minutos escrevendo sobre como o judô pode nos ajudar a enfrentar os desafios do dia-a-dia, mas, antes de encerrar, quero trazer um ponto para refletirmos porque eu imagino que você tenha ficado interessado em fazer parte ou inscrever seus filhos numa aula de judô. Acertei?
Creio que a maioria de nós nos cobremos constantemente para sermos bons profissionais, bons pais, bons cônjuges, bons amigos, bons filhos, bons praticantes de atividade física... e muitas vezes nos esquecemos da humanidade que carregamos conosco e que não nos permite desempenharmos sempre todos esses papéis perfeitamente. Esse esquecimento pode nos prejudicar.
Por muitas vezes, focados no alto desempenho daqueles que temos sob nossa responsabilidade ou de nós mesmos, nos entregamos muita responsabilidade, muita cobrança, muita obrigação em ganharmos todas as nossas lutas (dentro do tatame ou fora dele) e isso pode trazer prejuízos como ansiedade, desmotivação, agressividade, distúrbios do sono, aumento da frequência de infecções, diminuição do círculo de amigos...
Deixo, então, a proposta de nos olharmos e olharmos para os nossos com mais compaixão, lembrando sempre de nos compararmos com o nosso eu de ontem ao invés de nos compararmos com uma outra pessoa. E, caso você sinta que precisa de ajuda para isso, conte com a ajuda de um psicólogo. Você não está sozinha (o).
Espero ter cumprido meu objetivo e desejo ter despertado em vocês uma vontadezinha de conhecer mais sobre esse esporte e usufruir de todos os benefícios que ele nos traz quando decidimos nos aplicar e replicar esses princípios na nossa vida.
Um grande abraço!
Referências bibliográficas:
MARCÍLIO, Arthur, (2018). Influência da prática do judô nos aspectos comportamentais e sociais em crianças de 8 a 13 anos .
Disponível: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/188794.
Acesso em 15 de junho 2023;
TRUSZ, Rodrigo Augusto; DELL’AGLIO, Débora Dalbosco. A prática do judô e o desenvolvimento moral de crianças. Rev. bras. psicol. esporte, São Paulo , v. 3, n. 2, p. 117-135, dez. 2010.
Disponível
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1981-91452010000200010&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 15 de junho 2023;
Hokino, M. H. & Casal, H. M. V. (2001). A aprendizagem do judô e os níveis de raiva e agressividade. Buenos Aires, 6(31). Recuperado em 25 de outubro de 2009, da Educación Física y Deportes.
Revista Digital
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TRUSZ, Renato Daniel; TRUSZ, Rodrigo Augusto. ABORDANDO O JUDÔ NA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELATO DE EXPERIÊNCIA. Capa > v. 10, n. 2 (2019) > Trusz. Disponível: http://www.oldarchive.rbceonline.org.br/index.php/cadernos/article/view/2375. Acesso em 15 de junho 2023.
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