A experiência da análise é uma maravilha, nela você (re)descobre e
(re)constrói. Mas como isso seria possível sem olhar para si? Faz-se necessário
ver, ouvir e falar, Aquilo que nem sempre conscientemente se quer. E então
descobrir Isso e Aquilo que parecia estar quentinho e confortável, coberto numa
manhã fria.
É possível transformação sem dor? (Re)construção sem desejo?
Há uma piada antiga que pergunta quantos psicólogos são necessários
para trocar uma lâmpada; tendo como resposta para a charada: só um, mas a
lâmpada precisa realmente querer mudar!
E é claro que a pessoa busca a análise querendo mudar. Ou melhor,
querendo mudar Aquilo que vem acontecendo com ela a partir do olhar para o
desejo do outro, para a mudança no outro.
E esse desejo é tão presente que não é difícil ouvir enunciações do
tipo: "quem deveria estar fazendo terapia
não sou eu, é ela/ele!" "quem precisa
mudar é ela/ele e não eu!"; deixando evidente que o desejo da mudança está
para o outro, quando a mudança precisa justamente partir da própria pessoa.
Sabe aquele ditado do ovo? Que se quebrar de dentro para fora nasce e
se quebrar de fora para dentro morre? É um baita clichê, eu sei. Mas esperar
que as coisas mudem focando no outro é como quebrar o ovo de fora para dentro;
e feito isso, o que nascerá?
E quando é que essas expressões começam a surgir? Quando a pessoa, inconsciente
ou até mesmo conscientemente se percebe olhando para si; quando começa a se dar
conta de que a resposta que busca não irá partir do outro, que ela é quem
precisa mudar - ou não - se quiser que algo seja diferente.
"Lacan introduz a oposição entre fala plena e fala vazia como
onipresente na análise. Na fala vazia, o sujeito fala em vão sobre si mesmo sem
reconhecer-se em seu desejo" [1], e penso que quando a fala deixa de ser vazia
(re)descobre-se Aquilo que estava coberto, e tentando evitar uma confrontação
com seu próprio desejo e realidade, tenta fugir de si fugindo da análise.
Somos seres desejantes em meio a um caos de complexos e sintomas, e é
claro que querer mudar parece fácil enquanto a visão da mudança mais tem a ver com
o que o outro deseja da gente do que com o que nós desejamos da gente ou para a
gente - por mais estranho que isso soe.
Tal como uma criança que ao se deparar com um novo bebê em casa,
roubando a atenção que antes sentia ser somente dela, adoece para ser cuidada; pessoas
adultas abraçam seus sintomas querendo retornar àquele lugar quente e
confortável onde tudo era possível de ser fantasiado sem dor. Eis uma relação
de amor que adoece.
Fonte da citação
[1]:JORGE, M. A. C. Fundamentos da Psicanálise de Freud a Lacan, vol. 3: a prática analítica. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.
*KARLA KRATSCHMER
Contato: +55 (11) 99613-5444 | www.karlakratschmer.com.br
Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário