Autor: Luís Lago(*)
Se não me falha a memória, neste exato instante, creio ter havido um filósofo chinês, em meados de 550 a.C , que tinha a mania de pensar agudamente sobre as relações interpessoais. Entre as suas máximas, existe uma pérola em que ele diz que "a experiência é uma lanterna dependurada nas costas que apenas ilumina o caminho já percorrido". Sem dúvida alguma, essa sua assertiva perpetuou-se por ter estado sempre entranhada, em cada um vivente, ao longo de dois mil quinhentos e sessenta e nove anos; ou um pouquinho mais, talvez.
E porque me fez fazer vir à tona o nosso tão conhecido Confúcio e, especificamente, sua observação sobre a rememoração compulsória do que vivenciamos, com a tal maldita, ou bendita, lanterna?
O motivo básico é que, tristemente, eu e você não temos conseguido deixar de revolver, ao longo desses quatro anos de ausência, um segundo sequer os nossos instantes a dois. Escarafuchamos, sem nos preocupar com a auto pecha de masoquistas, os cantos e recantos do que fora nossa moradia, o pó acumulado, o odor nauseabundo do mofo. a algazarra dos ácaros, dos cupins, das traças. Nos enveredamos pela outrora denominada "varanda", e assistimos o escuro amarronzado do apodrecimento das raízes das não mais existentes gardênias e camélias, E não ousamos sequer olhar para o pasto de cabras em que se transmudou nosso antes esmerado jardim.
Quando a tal lanterna do Confúcio era apenas um detalhe pitoresco em sua devoção pelo seu curso de Filosofia, você se ausentava da ética do Aristóteles, como se ausentava da razão pura do Kant, da dialética do Hegel, e até mesmo do discurso do método de Descarte, seu preferido; seu número um; sua escolha para sua tese de mestrado.
Nos quedávamos, então, em silêncio. Você se deitava apoiada sobre o lado esquerdo e eu pensava ouvir as batidas arrastadas de sua pulsação, como se fossem unidades rítmicas de um poema, em suas sílabas átonas e tônicas. Talvez fosse a malemolência do meu próprio ritmo, arrastado, e que eu concebia tornar-se cada vez mais vagaroso.
Não havia tensão naqueles silêncios de outrora. Após fazermos sexo, olhávamos diretamente nos olhos, e depois nossos olhares passeavam por recantos dos rostos: dos olhos para os lábios, de volta para os olhos, e de volta para os lábios. Como se fizéssemos uma longa e demorada peregrinação. A cada minuto que passava sem nos falarmos, nossa recuperação da transa sexual ganhava força sem sacrifício da poesia a ser gerada.
Hoje, passados esses infindáveis quatro anos do que fomos, resta-nos a triste sina de uma lanterna dependurada nas nossas costas na tentativa de iluminar as turvações do caminho já percorrido de nosso destroçamento.
* LUIS LAGO
* LUIS LAGO
-Psicólogo graduado pela Universidade Santo Amaro(1981);
- Especialização em Terapia Comportamental; e
- Atuação clínica por 15 anos.
-Atualmente é Jornalista e Fotógrafo (Não necessariamente nessa ordem); e
-Autor dos livros "O Beco" (poesias) Editora e Livraria Teixeira e "São tênues as névoas da vida" Âmbito Editores (ficção desenvolvida no estilo literário denominado "Realismo mágico")
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