Autor: Alceu Albregard Junior(*)
Já faz alguns meses venho recebendo telefonemas reiterados da minha operadora de sinal de internet e telefonia fixa, oferecendo a locação de um aparelho note book novo, mediante o pagamento de um preço mensal, pelo período de 36 (trinta e seis) meses. Fazem parte do pacote oferecido pela operadora, garantia e assistência técnica para manutenção de hardware e software do aparelho.
Iniciadas as ligações em meados do ano anterior, as ofertas realizadas praticamente a cada mês superavam em muito o preço do mesmo aparelho em lojas de varejo.
Recentemente, porém, recebi nova oferta. Segundo a atenciosa atendente do outro lado da linha, essa oferta seria de locação do mesmo aparelho notebook novo, pelo mesmo período de 36 (trinta e seis) meses, com os mesmos serviços anteriormente oferecidos, sem qualquer acréscimo do preço da fatura dos serviços de telefonia fixa e sinal de banda larga de internet que já possuo.
Após me esforçar para que a gentil atendente repetisse em pelo menos seis oportunidades diferentes a proposta de produto gratuito, o que ela fez em todas as oportunidades, resolvi aceitar a tão singular proposta.
Como dizem, se por um lado sabemos que não existe almoço grátis, por outro lado, alguns aceitam, grátis, até injeção na testa. Resolvi arriscar e aceitar, desta vez, a tão inusitada oferta, mas não sem antes observar que:
- O número do protocolo, que indica o contrato verbal firmado entre a operadora e o cliente, bem como a data e hora da contratação bem como o nome da atendente, estão devidamente anotados;
- Recordar que por diversas vezes e de diversas formas, a operadora contratada, através de sua atendente, afirmou não haver qualquer nova fatura ou acréscimo nas faturas do serviço já em curso, em virtude da referida locação.
Ocorre que o artigo 104 do Código Civil Brasileiro estabelece que para um negócio jurídico ser reputado válido, é imprescindível que seja realizado entre agentes capazes; tenha objeto lícito, possível, determinado ou determinável e seja realizado pela forma prescrita ou não proibida pela lei.
Da mesma forma, o artigo 107, também do código civil brasileiro, determina que a declaração de vontade não depende de forma especial, exceto quando a lei assim o exigir. No caso, a operadora tem, como prova válida da contratação da locação, a conversa telefônica travada entre o cliente e sua preposta, a atendente. Porém, as condições da contratação, exigidas pelo cliente, ou seja, a inexigência de qualquer contraprestação em dinheiro, seja em parcela única, seja em parcelas mensais, também consta da mesma conversa telefônica.
Em outras palavras, caso a operadora tenha a intenção de, por engano ou má-fé, exigir pagamentos mensais pela locação, deverá comprovar que o cliente contratou a locação, apresentando em juízo essa conversação, da qual contarão também, as exigências do cliente.
Outro fundamento a ser alegado em eventual "desentendimento" com a prestadora do serviço nessa modalidade de contratação verbal, é questão da boa-fé na contratação e na execução do contrato, que é exigida pelo artigo 422 do mesmo código. Afinal, cobrar um valor em dinheiro, por algo que foi oferecido ao cliente sem qualquer espécie de ônus, viola o princípio da boa-fé, assim como, ter aceito um objeto oferecido gratuitamente, pelo qual se descobre, posteriormente, haver um preço que lhe foi ocultado, é manifesto vício (ou erro) de consentimento.
Além do mais, o artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor atribui um prazo de 30 (trinta) dias para que o consumidor reclame por vícios do produto, aparentes ou de fácil constatação, prazo suficiente para que uma nova eventual fatura chegue às mãos deste novo cliente e lhe permita discutir. O vício da negociação, por indução a erro do consumidor, se enquadra nessa definição.
Os artigos 30 e 31 do CDC da mesma forma impõem que a forma, assim como a publicidade do produto, devem atender a correção, clareza, precisão, bem como outras especificações necessárias para evitar seja o consumidor induzido a erro.
Enfim, considerando todos os cuidados e fundamentos legais mencionados, estamos imbuídos da esperança de que a proposta oferecida seja verdadeira, e que seja direcionada, como intenção única da prestadora de serviços, preservar um cliente em vias de rescindir seu contrato, em lugar de aumento de seus lucros com base em má-fé explícita.
*ALCEU ALBREGARD JUNIOR
-Graduação em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie(1985);
- Atua principalmente nas áreas dos Direitos Tributário,Imobiliário e Consumidor.
Contato: alceu.adv@albregard.com.br
Nota do Editor:
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