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terça-feira, 21 de março de 2023

Conceito de Família no Direito Civil


Autor: Sergio Leite(*)



O presente artigo embora trate de família, o enfoca com base no Direito Civil e não no Direito de Família . Ele trata da Família de forma genérica e não específica como verão a seguir:

A dinâmica das relações familiares e sociais é constante. Ao lermos a forma e o regramento das relações afetivas de 100 anos atrás, percebemos que nada têm com os tempos atuais. E se regredirmos ainda mais veremos na sociedade colonial algo bastante comum nas relações concubinárias entre os estrangeiros portugueses colonizadores e as índias que aqui habitavam. Durante o período imperial, também era corriqueiro o concubinato entre os senhores de engenho e as escravas negras, que muitas vezes recebiam a carta de alforria e eram sustentadas por seus antigos senhores.

Porém, apesar dessas relações sempre terem existido, desde os primórdios da formação de nosso País, elas sempre foram marginalizadas, escondidas e as partes integrantes dessas relações, sobretudo as mulheres, eram, e continuam sendo, vítimas de preconceito e estigmatização.

Naqueles tempos, o casamento seguia regras bem definidas e era a única forma de se constituir uma família socialmente aceita. Soa isso bem hipócrita, porque qualquer forma diversa daquela preconizada naqueles tempos geraria uma relação espúria e filhos bastardos ou adulterinos. Tempos difíceis para quem olha do futuro, mas normais para quem viveu naquela época. Talvez tão difícil de imaginar como se um viajante do tempo, saído daquela época, se deparasse com as formas da constituição familiar na atualidade.

Na sociedade familiar tradicional não havia alternativa senão o casamento de um homem com uma mulher, com o intuito de constituir uma prole, cerimônia essa realizada de forma solene, tanto quanto eram rígidos os costumes daqueles tempos. Vivíamos então uma era social patriarcal, em que ao homem era concedido privilégios e à mulher apenas os cuidados com a família, se a tivesse. O claustro era habitual à mulher naqueles tempos.

Pois bem, o dinamismo acima mencionado é palpável e vemos hoje uma sociedade mais justa nas relações afetivas, não encontrando qualquer óbice na consecução do casamento diverso daquele alhures mencionado.

A mais notável alteração ocorreu com a edição da Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, que passou a regular os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, aonde a expressão desquite era a única alternativa à extinção do casamento.

A palavra era vista, pela sociedade de então, como algo incomum e vulgar, não sendo rara a discriminação em relação aos desquitados, como também aos filhos que foram gerados daquele consórcio rompido. Filhos de pais desquitados, na aurora do século 20, não eram bem vistos no grupo social.

Os patriarcas das famílias de então não queriam associar o seu nome a um descendente de pais desquitados. Eram outros tempos, como se disse acima.

Com o advento da Constituição de 1988, o cenário se alterou profundamente. Nela a família é tratada no artigo 226, onde se traz um rol exemplificativo, onde não se exclui a possibilidade de outros modelos de entidade familiar. Vejamos:
"Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuito a sua celebração.
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 66, de 2010)
§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações."
Já houvera, desde os idos de 1977, com a promulgação da lei federal 6.515/77, a denominada Lei do Divórcio, uma radical modificação naquele conceito familiar anterior, que causou muito constrangimento na sociedade. De tal sorte a questão familiar deixou de ser uma forma conceitual estagnada e passou a abrigar as plurimas formas de convivência afetiva entre as pessoas.

Nossa Corte Suprema teve oportunidade de se manifestar nesse particular, em duas questões a ela levadas, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, houve por bem decidir por equiparar a união homo afetiva à união estável garantindo, assim, todos os direitos conferidos pela Constituição e demais leis pertinentes à união entre pessoas do mesmo sexo desde que, por óbvio, cumpram os requisitos estipulados por lei na União Estável.

Com a escolha de gênero pelo indivíduo, o ambiente social sofreu uma profunda reforma e não seria diferente no contexto da família. Hoje, o casal não se une apenas para criar uma prole, mas também para trazer à lume uma relação afetiva que deve e merece proteção, razão pela qual a união mencionada no preâmbulo deste breve comentário, sobrevive mas não mais como única possível, onde a própria adoção de filhos se faz por casais homo afetivos, pois o conceito que prepondera é o amor.

*SERGIO LUIZ PEREIRA LEITE
















-Advogado militante nas áreas cível e criminal na Comarca de Tietê, Estado de São Paulo;
Atualmente, é o vice-presidente da 134ª Subseção da OAB/SP para o triênio 2022/2024;
Articulista em diversas mídias sobre temas principalmente jurídicos, sua atuação profissional é caracterizada pela incursão nas áreas civil e criminal.

 

Nota do Editor:

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