Autora: Larissa Gonçalves Rodrigues (*)
Não é de hoje que as mudanças climáticas oriundas do aquecimento global vêm causando desastres ambientais e deixando um rastro de destruição em diversos centros urbanos do planeta.
O mais recente deles ocorreu no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, em maio de 2024, devido a chuvas torrenciais que culminaram na maior enchente da história do povo gaúcho. Inúmeros foram os estragos causados pela cheia dos rios e consequente tomada das águas nos centros urbanos, resultando no alagamento de casas, veículos, prédios públicos e edifícios residenciais.
Apesar da verticalização das residências, inúmeros foram os condomínios atingidos pela catástrofe. Diante desse quadro, a gestão condominial se depara com a necessidade de reparação do edifício, o que faz surgir a indagação do que pode ser ressarcido pela construtora, diante do comprometimento da edificação.
Inicialmente, há de ser levado em conta o fato de que, em desastres naturais, é típica a exclusão de responsabilidade geral, por se tratar de um caso de força maior.
Todavia, cada caso tem de ser avaliado individualmente. Para tanto, é importante a realização de uma inspeção predial pelo síndico, após a baixa das águas da enchente, para fins de levantamento da condição e dos danos causados à parte estrutural, elétrica e hidráulica do condomínio. Com isso, será possível ter um vislumbre da razão do alagamento e, consequentemente, se os estragos foram causados, ou contribuídos, por conta de erro humano, ou se ocorreram exclusivamente por força da natureza.
Se a obra entregue pela construtora foi comprometida devido à falta de estrutura para suportar a água da chuva, ela pode ser responsabilizada civilmente pelos vícios construtivos do empreendimento, observados os prazos necessários para tanto.
No entanto, é de suma importância a verificação da origem do dano, ou seja, se ele ocorreu exclusivamente por força da natureza, ou se ele poderia ter sido evitado no caso de conduta humana diversa.
Exemplificando: no caso de condomínios inundados pela enchente oriunda da cheia dos rios, cuja água se alastrou por meio do solo, tomando ruas e cidades inteiras, a exemplo da citada catástrofe climática ocorrida no Rio Grande do Sul, via de regra, não há que se falar em responsabilidade da construtora por vícios construtivos, afinal, trata-se indiscutivelmente da força da natureza e, portanto, é um caso de força maior.
De outra banda, sendo o caso de condomínios afetados pela água das chuvas torrenciais, por meio de infiltrações no telhado, por exemplo, a construtora pode, sim, ser responsabilizada civilmente por vícios construtivos existentes na edificação. Afinal, neste exemplo, os danos são oriundos de falha humana na ação da construtora, por entregar obra incapaz de conter a entrada de água das chuvas em seu interior.
Para a possível cobrança da construtora, se faz imprescindível a elaboração de laudo técnico, a ser providenciado pela gestão condominial, relatando a origem e também os impactos dos danos causados pelas chuvas.
Outra saída para os edifícios afetados pelas enchentes é a análise da apólice do seguro obrigatório do condomínio[1], para fins de verificação de eventual cobertura de alagamento e inundação. Se houver cobertura do seguro para esse tipo de sinistro, orienta-se que a gestão comunique o sinistro o mais rapidamente possível, mesmo que a água da enchente ainda não tenha baixado completamente, de modo a agilizar o processo, tendo em vista o prazo legal de 30(trinta) dias concedido às seguradoras para finalizar a análise do sinistro reclamado.
Apesar da imprevisibilidade dos eventos climáticos, realizar uma assertiva avaliação de riscos ao condomínio é uma tarefa muito importante da gestão, seja para demandar antecipadamente a construtora por vícios construtivos, de modo a evitar danos significativos à segurança do empreendimento, seja para contratar seguro adequado aos novos riscos ao condomínio.
REFERÊNCIA
(1) Artigo 1.346 do Código Civil: "É obrigatório o seguro de toda a edificação contra o risco de incêndio ou destruição, total ou parcial."
*LARISSA GONÇALVES RODRIGUES
- Advogada inscrita na OAB/RS n° 107.592;
- Graduada pela Universidade de Caxias do Sul, em 2017;
-Especialista em Direito Imobiliário e Condominial pela Universidade Cruzeiro do Sul, em 2021; e
-Vice-Coordenadora da Comissão de Direito Imobiliário - OAB/RS Subseção Caxias do Sul.
Nota do Editor:
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