Cláudia Alaide Silva(*)
O homem tem vivido tempos em que a produção é o prato principal. Essa é uma realidade no mundo profissional, mas não se limita a ele; a necessidade de "dar conta" do mundo tem se mostrado com forte influência também na vida social e familiar, resultando, assim, numa busca constante por sucesso.
Como toda tendência, essa também vem preenchida por padrões que desconsideram as individualidades e o próprio indivíduo. Padrões de sucesso são expostos e seguidos por milhares de pessoas todos os dias.
Com frequência, recebo em meu consultório pessoas manifestando sensações de insuficiência, incapacidade, impotência, indisposição, desmotivação e, quase sempre, essas pessoas reconhecem estar carregando peso demais. No entanto, não estão em busca de autocompreensão emocional para fazer escolhas ou estabelecer prioridades; em sua maioria, buscam ferramentas para superar a própria humanidade, que tem como condição natural limites físicos e mentais.
Tem se fortalecido, em larga escala, a ideia de que, se não conseguimos algo que outros conquistaram, então o "problema" é de ordem do esforço — não estamos nos dedicando o bastante.
A questão, que em grande parte se mostra meritocrática, atinge uma complexidade emocional onde o indivíduo não se vê individualmente, mas a partir de acusações sociais, não podendo nem mesmo sofrer as próprias dores. O fato é que as pessoas têm, sim, se dedicado, empregado demasiado esforço e energia; porém, nem sempre isso garante o tão famigerado sucesso. A largada não é a mesma para todos, e a ideologia do merecimento despreza a história de vida e as demandas particulares de cada um.
O acolhimento psicológico se mostra eficiente no abrigo dessa angústia até que esse indivíduo possa enfrentar uma necessidade existencial: escolhas precisam ser feitas!
Atualmente, não nos permitimos o direito de escolher e, com isso, não nos damos conta das escolhas que fazemos, muitas vezes de forma inconsciente. Não queremos perder nenhuma oportunidade e acabamos sobrecarregados pelo peso de todas elas.
Talvez a maior dificuldade que enfrentamos ao nos depararmos com a necessidade de escolha hoje seja a potência idealizada de que se "pode tudo" e, desse modo, não devemos aceitar menos que a concretização desse objetivo. O fato é que nada, salvo a morte, é garantia; sendo assim, ao escolhermos "tudo", na tentativa de fugir da frustração, nos deparamos com uma exaustão que aponta para todas as frustrações, desconsiderando todas as conquistas. A questão é que se pode qualquer coisa, a partir das escolhas que se faz. O que temos tentado é realizar tudo, sem abrir mão de nada.
Esse ciclo tem como consequência uma série de problemas, como ansiedade, depressão e mesmo síndromes mistas de depressão e ansiedade, ou Burnout.
O processo psicoterapêutico nos auxilia a encontrar o sentido das nossas escolhas a partir da compreensão do sentido da vida. Em grande maioria, as pessoas estão conquistando muito, porém seguem cegas pela construção social de uma produção contínua, ignorando-se nesse processo.
Na verdade, podemos muito, quando reconhecemos que não podemos tudo. Reconhecer, aceitar e lidar com os próprios limites, ao contrário do que possa parecer, nos ajuda a correr em direção a um projeto de vida mais autêntico, considerando o sentido da vida, onde podemos ser felizes com nossas próprias perspectivas e lidar com as frustrações inerentes à busca por um desejo próprio, destituído do peso da ordem coletiva.
O processo terapêutico existencial nos coloca em contato com nosso modo mais autêntico de ser, nos conectando com nossas próprias necessidades e possibilidades. Podemos não poder tudo, mas quase sempre poderemos o que importa se escutarmos nossas próprias necessidades.
*CLÁUDIA ALAIDE SILVA
-Graduada em Psicologia pela FMU(2020);
-Pós-graduada em:
- Psicologia fenomenologica, hermenêutica pelo Instiuto Daisen (2022);
- Psicopatologia, saúde mental e atenção psicossocial, pela Faculdade Anhanguera (08/2024);
- Atua como :
- Psicóloga Daseinalista Clínica;
- Biblioterapeuta e mediadora de grupos, além de ser intervisora de práticas clínicas;e
- Psicóloga clínica, oferecendo atendimento a adultos em sessões individuais, de casal e em grupos.
Nota do Editor:
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Boa tarde, achei muito interessante, me fez refletir. Parabéns e obrigada.
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