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sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Faltam propostas e abundam violências nos debates políticos


 

Rodrigo Augusto Prando (*)

Temos, infelizmente, visto cenas lamentáveis nos debates entre os candidato a prefeito nos mais de 5 mil municípios do Brasil. Na cidade de São Paulo, por exemplo, faltam propostas e abundam distintas violências, daquelas retóricas até a física, com cadeirada e soco. A quadra histórica é de força da lógica dos algoritmos, que capturam os sentimentos – medo, ódio, angústia, euforia – e desprezam os atores políticos mais ponderados, racionais e com propostas.

Já há, em curso, uma discussão se vale a pena manter debates no período eleitoral ou, ao menos, se esse modelo não se encontra esgotado, superado mesmo. Obviamente, São Paulo – onde vivo e voto - tem candidatos comprometidos com o debate político civilizado, com a democracia, com ideias, propostas e com respeito às regras e aos adversários. No entanto, existe, também, Pablo Marçal que, desde o início, deixou claro se pouco apreço pela democracia, pelos partidos políticos, pelas instituições e pelas regras do jogo. Marçal, ressalte-se, é sintoma e não a causa de uma situação que, para muitos, avança na direção de uma anomia e de aprofundamento da crise das democracias liberais representativas.

Questionamentos atinentes ao modelo dos debates são válidos. Classicamente, temos perguntas de candidato para candidato, direito a réplica e a tréplica; perguntas dos jornalistas; perguntas do público (telespectadores e internautas) e direto à resposta em caso de ofensa à honra. O fato é que não há modelo que sirva quando surgem figuras carismáticas, populistas, extremistas e avessas às regras. Simplesmente, não se enquadram e isso é parte de seu DNA político. Não raro, o olhar do populismo extremista é de quem não entende o outro candidato como adversário e sim como inimigo; mais do que isso, o mundo se divide em dois grandes grupos: os que estão comigo e são amigos (eu e o povo) e os inimigos (todos os demais candidatos, partidos, mídia, intelectuais, instituições, etc.). A retórica do ódio, nos debates, as ofensas, fake news, pós-verdades, distintos negacionismo e teorias da conspiração não são invenções recentes e tampouco de Marçal, pois atores políticos como Donald Trump, Nicolas Maduro, Jair Bolsonaro, entre tantos outros servem-se desse expediente corrosivo à democracia. Um outro aspecto: esses candidatos se colocam, quase sempre, na condição de vítimas, perseguidos pelos sistema, mas consideram-se ungidos e assumem postura messiânica.

Some-se a esse quadro geral o fato, também, que vivemos numa sociedade hiperconectada em rede, cuja força das redes sociais e das big techs são evidentes. Temos, ademais, uma lógica inerente aos algoritmos que selecionam e impulsionam conteúdos que mobilizam os sentimentos: medo, raiva, ódio, angústia, frustação, alegria, excitação. Desta forma, na sociedade e nos debates políticos o conteúdo racional, ponderado, explanado com clareza, propostas concretas e não milagrosas perdem espaço.

Alguém, então, indaga: não se pode excluir figuras extremistas e corrosivas? A democracia não traz em seu bojo a diversidade? Mas, ao valorizar a diversidade e a pluralidade não estaria a democracia refém daqueles que usam a democracia, a liberdade de expressão e as instituições para justamente solapar essas conquistas civilizacionais? Aqui, o famoso paradoxo da tolerância. Não é simples resolver um problema assaz complexo.

Não bastassem a violência retórica e as fake news – que muitos entendem como mera liberdade de expressão – vivenciamos episódios de violência física. José Luiz Datena, no debate da TV Cultura atingiu Marçal com uma cadeirada; no debate promovido pelo Estúdio Flow e Flow News, Marçal foi expulso por descumprimento das regras acordadas e um de seus assessores agrediu o assessor do Prefeito Ricardo Nunes com um soco, deixando caído, desacordado e ensanguentado. Isso tudo é a pura e evidente negação da política, que busca equacionar e resolver os conflitos por meio do diálogo, dentro das instituições e respeitando as leis.

Por fim, é importante enfatizar que este artigo – panorâmico – não pretende esgotar o tema. Temos que, no âmbito social e político, que retomar a importância da política, do debate civilizado e valorizar a democracia. O tempo das redes sociais e sua lógica algorítmica não pode determinar o tempo das instituições e das leis. A democracia reclama por democratas e democratas atuam com educação cívica e firmeza.

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