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sábado, 31 de agosto de 2024

Uma Educação da Razão


 Antonio Carlos Jesus Zanni de Arruda(*)

Para o Racionalismo de Descartes[1], só temos conhecimento a partir de "idéias claras e distintas", conforme o mesmo afirma, através de um trabalho da razão, já que quando nos pautamos pela experiência incorremos em erro, pois no mínimo esta já nos enganou pelo menos uma vez, de acordo com o argumento da dúvida nas "Meditações Metafísicas".

Esse percurso, que objetiva em primeiro lugar duvidar de tudo aquilo que foi fornecido pela experiência, estabelece uma certeza inabalável em Descartes que é a certeza do pensar, a capacidade que a razão possui em interpretar o mundo de um modo certo e seguro e isso é um trabalho da razão humana, o que para Descartes se configura como um fator emancipatório do existir, elevando a razão humana ao seu mais alto grau de perfeição, conforme assinalado no "Discurso do Método". Portanto, a razão deve ser educada de modo que não cometa erros.

O ato de perceber as coisas é fornecido pelos sentidos; mas, o ato de compreender como as coisas são é fruto de uma organização da razão, Diz ele que percebemos as modificações nele ocorridas, porém o ato de compreender é um trabalho da razão (do sujeito).

Neste artigo, pretendemos abordar o que denominamos por uma Educação da Razão, quando a mesma se torna "errante", quando conferimos à experiência o poder explicativo das coisas e "razão emancipatória" (educada pela razão), àquela que determina o poder organizador e de compreender as coisas como são, razão esta quando bem conduzida (o método, que garante o educar da razão).

Para Descartes, o Conhecimento verdadeiro, que nos dá a certeza e evidência sobre as coisas ("Clareza e Distinção"[2]), é produto de um trabalho da razão. A experiência não nos dá a conhecer verdadeiramente as coisas em si mesmas, portanto, todo conhecimento centrado na experiência nos remete diretamente ao erro.

Para reconstruirmos seu raciocínio sobre esta questão, nos dedicaremos à análise do texto clássico, que oferece as bases do pensamento moderno, as "Meditações Metafísicas".

Sabemos da forte influência do Ceticismo sobre o pensamento de Descartes e a maneira cética como inicia as suas meditações, colocando em dúvida tudo aquilo que apresentar a menor possibilidade de erro ou falsidade.

O primeiro argumento construído no 3º. parágrafo é o de duvidar (suspender os juízos) sobre os sentidos, pois são fontes constantes de erros e ilusões e que nunca podemos tomá-lo como base para conhecimento das coisas (já que por ausência de racionalidade, conduz a razão a um caminho enganoso). Citemos alguns exemplos que corroboram este argumento:
1- Se estamos no porto e vemos um navio distante, ele parece pequeno e parado; quando se aproxima vemos que, relativo a nós, ele é grande e está em movimento;
2- Um remo, metade na água e metade fora, parece quebrado; e
3- Existe uma limitação natural nos nossos sentidos, que nos levam a considerar de forma errada as coisas. O Sol parece girar em torno da terra.
Portanto, os sentidos não nos dão a conhecer as coisas e constituem-se em uma fonte inesgotável de erros e ilusões, implicando num conhecimento falso ou numa "razão errante". Encontramos, neste primeiro grau da dúvida, uma desqualificação do elemento sensível (da experiência) para a formação do conhecimento verdadeiro. Posição que será mantida, durante o texto ("Meditações Metafísicas"). Neste primeiro argumento Descartes já afirma que todo o conhecimento que se pauta na experiência como fundamento, incorre em erro, numa razão sem sentido, sem atingir a verdade.

No segundo argumento, que estende e radicaliza a dúvida, Descartes pondera sobre a limitação do argumento anterior (erro dos sentidos), pois me enganar com relação às coisas distantes e pouco sensíveis não me dá possibilidade de duvidar de todas as questões sensíveis, como, por exemplo, que eu esteja aqui sentado junto ao fogo e vestido com este chambre.

Descartes, então, constrói o segundo argumento, que é o do sonho. Há uma possibilidade, ainda que pequena, que eu esteja, neste momento em que escrevo, dormindo e tudo não passa de ilusões produzidas em meus sonhos. A idéia deste argumento é a de que tudo poderia ser uma ilusão produzida por mim mesmo em meu sonho e que devo suspender os meus juízos sobre a verdade acerca de todas as coisas que percebo. O que valida este argumento é o fato de nós já termos nos enganado no sonho algumas vezes, o que pode levar a crer que neste momento estejamos sonhando e, portanto, sendo enganado.

O argumento do sonho tem a função de estender e radicalizar a dúvida e de levar, portanto, a uma impossibilidade nas afirmações que realizamos sobre os dados sensíveis. A experiência sensível pode ser uma ilusão produzida em meus sonhos.

No entanto, quer esteja sonhando, quer esteja acordado, algumas verdades parecem que não são afetadas por estes argumentos, por exemplo: as quantidades, as formas etc. E, sobretudo, as verdades matemáticas (que o quadrado tenha quatro lados e que dois mais três seja cinco etc.). Portanto, neste percurso a razão está sendo guiada ou educada por procedimentos que não erram, atingindo a verdade.

Dentro dessa argumentação, será elaborado o terceiro argumento que estende e radicaliza a dúvida, o argumento do Deus Enganador3. A idéia fundamental deste argumento é a de atribuir minha origem a um Deus (como dirá Descartes mais à frente na meditação: quanto mais imperfeito for aquele que me produziu mais imperfeito serei) e argumentar que eu posso ter sido produzido de uma tal forma que me engane sobre tudo o que penso.

Ao final da 1ª Meditação, o que temos é a dúvida tornando-se generalizada e radical. Como diz Descartes no começo da 2ª Meditação:
A Meditação que fiz ontem encheu-me o espírito de tantas dúvidas, que doravante não está mais em meu alcance esquecê-las. E, no entanto, não vejo de que maneira poderia resolvê-las; e, como se de súbito tivesse caído em águas muito profundas, estou de tal modo surpreso que não posso nem firmar meus pés no fundo, nem nadar para me manter à tona4

Este comentário de Descartes dá a medida da dúvida empreendida pelo autor e o propósito seguinte é continuar nesse caminho até que tenha encontrado um ponto que fosse fixo e seguro.

A partir daí temos o argumento que conduz à conquista da primeira verdade, que inaugurará a cadeia de razões, levando ao conhecimento verdadeiro. Neste ato de duvidar, será que duvidei da própria existência?

Não, a minha existência estava assegurada no ato do pensar. Eu sou, eu existo como coisa que pensa (res cogitans).

Diz Descartes:

De sorte que, após ter pensado bastante nisto e de ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito5.

Eu tenho a certeza de que sou uma coisa que pensa. O que é uma coisa que pensa?"É uma coisa que duvida, que concebe, que afirma, que nega, que quer, que não quer, que imagina também e que sente" (DESCARTES, René. 1987, 27).

É sobre este ponto fixo (que é o pensamento6), que Descartes solidificará a questão do conhecimento.7

O conhecimento das coisas é elaborado pelo pensamento e a experiência não fornece senão dados mutáveis e aparentes.

Para discutir a questão do conhecimento do mundo físico, Descartes fala não: 

"...dos corpos em geral, pois essas noções gerais são ordinariamente mais confusas, porém de qualquer corpo em particular. Tomemos, por exemplo, este pedaço de cera que acaba de tirado da colméia: ele não perdeu ainda a doçura do mel que continha, retém ainda algo do odor das flores de que foi recolhido; sua cor, sua figura, sua grandeza, são patentes; é duro, é frio, tocamo-lo e, se nele batermos, produzirá algum som. Enfim, todas as coisas que podem distintamente fazer conhecer um corpo encontram-se neste7.

O que temos, nesta argumentação de Descartes, é a descrição daquilo que os sentidos nos dão a conhecer dos objetos, isto é, o que a experiência fornece das coisas. O que temos é a doçura, o odor das flores, a cor, a figura etc.

No entanto, a argumentação de Descartes prossegue para a questão da modificação ou transformação do pedaço de cera e a conseqüente conclusão que somente a razão ou o pensamento é capaz de conhecer o que são as coisas materiais.

Diz Descartes (1987, p. 28):

Mas eis que, enquanto falo, é aproximado do fogo: o que nele restava de sabor exala-se, o odor se esvai, sua cor se modifica, sua figura se altera, sua grandeza aumenta, ele torna-se líquido, esquenta-se, mal o podemos tocar e, embora nele batamos, nenhum som produzirá. A mesma cera permanece após a modificação? Cumpre confessar que permanece: e ninguém o pode negar. O que é, pois, que se conhecia deste pedaço de cera com tanta distinção? Certamente não pode ser nada de tudo o que notei nela por intermédio dos sentidos, posto que todas as coisas que se apresentavam ao paladar, ao olfato, ou à visão, ou ao tato, ou à audição, encontram-se mudadas e, no entanto, a mesma cera permanece8.

O pedaço de cera, assim como todo o mundo material, é suscetível de transformações ou modificações. O que permanece é algo de extenso, flexível e mutável, que é apreendido pela razão.

O que temos como tese fundamental do pensamento cartesiano é que o conhecimento das coisas materiais é uma elaboração do sujeito (pensamento, entendimento ou razão).

Diz Descartes:

Ora, qual é esta cera que não pode ser concebida senão pelo entendimento ou pelo espírito? Certamente é a mesma que vejo, que toco, que imagino e a mesma que conhecia desde o começo. Mas o que é de notar é que sua percepção, ou a ação pela qual é percebida, não é uma visão, nem um tatear, nem uma imaginação, e jamais o foi, embora assim o parecesse anteriormente, mas somente uma inspeção do espírito, que pode ser imperfeita e confusa, como era antes, ou clara e distinta, como é presentemente, conforme minha atenção se dirija mais ou menos às coisas que existem nela e das quais é composta9.

Portanto, a transformação ou modificação espacial dos corpos significa uma passagem de um estado A para um estado B e a permanência daquilo que podemos caracterizar como substancial. Percebemos pelos sentidos esta transformação, no entanto, esse ato de perceber é coordenado e organizado pelo sujeito (razão). Somente a razão apreende o elemento substancial das coisas.

Segundo Descartes, os sentidos só nos informam a mudança de estado, a forma etc., cabendo, se e somente se, à razão perceber a transformação.7

É o entendimento ou razão que concebe as transformações espaciais dos objetos, aprendendo a verdade.

Estabelece-se a partir daí um desprezo da experiência na formação do conhecimento sobre o mundo físico. Cabe tão somente à razão conhecer as coisas ou os objetos. A experiência nada organiza, nada representa, nada conhece.

Portanto, a experiência em si mesma, nada representa como fonte de conhecimento, visto que é a razão através de suas elaborações e representações que formata e organiza o mundo dos objetos10.

Mas para atingir tal sucesso, é necessário que a razão esteja educada para realizar tal tarefa afim de dar conta de tudo aquilo que cerca a vida, incluindo o conhecimento sobre o mundo físico:

"O primeiro era o de nunca aceitar algo como verdadeiro que eu não conhecesse claramente como tal; ou seja, de evitar cuidadosamente a pressa e a prevenção, e de nada fazer constar de meus juízos que não se apresentasse tão clara e distintamente a meu espírito que eu não tivesse motivo algum de duvidar dele. O segundo, o de repartir cada uma das dificuldades que eu analisasse em tantas parcelas quantas fossem possíveis e necessárias a fim de melhor solucioná-las. O terceiro, o de conduzir por ordem meus pensamentos, iniciando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para elevar-me, pouco a pouco, como galgando degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e presumindo até mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros. E o último, o de efetuar em toda parte relações metódicas tão completas e revisões tão gerais nas quais eu tivesse a certeza de nada omitir". In: Discurso do Método.São Paulo: Abril Cultural/Nova Cultural. Coleção Os Pensadores, 1987.

Portanto, a garantia do conhecimento verdadeiro e o atingir de todas as verdades, teria como garantia única a razão sendo guiada (ou educada) por um método infalível, garantindo também o sentido da existência.

É uma Educação da razão!

                                

Referências:

ARRUDA,ACJZA. A importância da experiência na construção da noção espacial segundo a Epistemologia Genética de Piaget. Capítulo I. Dissertação de Mestrado.UNESP. Bauru, 2004;

BRÉHIER, É. História da Filosofia. São Paulo: Mestre Jou, 1977;

CHAUÍ, M. Convite à Filosofia.  São Paulo: Ática, 1997,p.231-235;

DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural/Nova Cultural. Coleção Os Pensadores, 1987;

REALE, G. História da Filosofia. São Paulo: Paulus. 199;

1 René Descartes (1596-1650) é considerado o fundador do pensamento moderno;

2 Clareza e distinção para Descartes são os critérios para se atingir a verdade, não restando a menor dúvida;

3 Deus Enganador e Gênio Maligno possuem a mesma função, porém, o gênio maligno possui uma função psicológica, isto é, o engano acontece por que ele produz as ilusões no exato momento em que penso e a falsa impressão de que são verdadeiras.;

4 DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural/Nova Cultural. Coleção Os Pensadores, 1987, 23;

5 Idem, 24;

6 Pensamento, entendimento, espírito e razão são utilizados como sinônimos;

7 DESCARTES, René. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural/Nova Cultural. Coleção Os Pensadores, 1987, 28;

8 Idem;

9 Idem, 29; e

10 Descartes buscou construir uma física geométrica, isto é, elaborar  uma  físico-matemática capaz de conhecer as propriedades do mundo físico.

 *ANTONIO CARLOS JESUS ZANNI DE ARRUDA

























-Graduação em Pedagogia pela Universidade do Sagrado Coração (2017);

- Graduação em Filosofia pela Universidade do Sagrado Coração (1996);

- Mestrado em Educação para a Ciência pela UNESP (2004);

-Doutorado em Educação para a Ciência pela UNESP (2009); e

- Pós doutorado em Educação pela UNESP (2020);


-Trabalha no Ensino Superior nas mais variadas disciplinas, como filosofia, ética e responsabilidade social, antropologia, metodologia científica e filosofia da educação) ;

Contatos:

e-mail: arrudafilosofia@hotmail.com

linkedin: Carlos Arruda

Tel: (14) 991152195

 Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0764418599887611


Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

Infância e Afeto na Era da Complexidade


 Autora: Ana Lúcia Machado (*)


"O homem deseja ser confirmado em seu ser pelo homem,
e anseia por ter presença no ser do outro...
– secreta e timidamente, ele espera por um Sim que lhe permita ser,
e que só pode vir de uma pessoa humana a outra. "
Martin Buber

Vivemos um momento de grande complexidade e a infância se encontra no centro das incertezas desta época. As mudanças sociais ocorridas nas últimas décadas alteraram de forma considerável a estrutura da vida familiar e seus reflexos podem ser observados nitidamente na vida da criança.

Os hábitos cotidianos transformaram-se significativamente, modificando o ritmo e a rotina dos pequenos, com estilos de vida mais individuais, sedentários, que desfavorecem o convívio social, atividades físicas, a imaginação, e a autonomia infantil.

A dinâmica imposta por essas mudanças, gerou isolamento, aceleração, e adultização das crianças, expondo-as assim às mesmas angústias e estresses que os adultos estão sujeitos, causando males físicos e psicológicos.

A crescente urbanização, associada ao medo pelo aumento da violência, ergueu muros e contribuiu para uma cultura de confinamento. Além disso, valores da sociedade de consumo tomaram conta do universo da criança, que exposta intensamente a conteúdos de natureza mercadológica e seduzida por apelos do mundo moderno com suas inovações tecnológicas, vê seu tempo e espaço lúdico invadido e reduzido.

Esse é o panorama da infância da atualidade, um cenário que não favorece essa etapa tão importante da vida. A infância é o período no qual edificamos as bases que sustentarão tudo o que virá depois – chão firme que apoiará os passos futuros na juventude, na maturidade e até mesmo no envelhecimento. É a fase em que a qualidade das interações sociais é fundamental para a construção de memórias afetivas cheias de significado que contribuirão para a formação de sujeitos éticos, resilientes, empáticos, cooperativos e próativos na sociedade.

Engana-se quem pensa que a infância é uma etapa que fica para trás depois que nos tornamos adultos - é um ciclo vivo, que volta, e se renova. Ecos da criança que fomos continuam a ressoar dentro de nós no decorrer da vida.

Nas palavras do pediatra Dr. Márcio Lisboa "tudo se forma nos primeiros anos de vida. Como adultos, somos do ponto de vista da personalidade, o que éramos aos 6 anos de idade. Nossa estrutura se forma nesses primeiros anos.Tudo o que acontece neste período reflete na vida adulta sob o ponto de vista físico, emocional e social."

O nascimento é a primeira grande experiência vivida pelo ser humano e o primeiro obstáculo a ser vencido no processo de desenvolvimento. Ao deixar a segurança e proteção do útero materno, o bebê tem que enfrentar os desafios de um mundo desconhecido, o que exige adaptações físicas e psicológicas.

O bebê tem uma relação íntima e praticamente simbiótica com a mãe, e desde os primeiros instantes de vida, é ela quem exerce forte influência no desenvolvimento da criança e na formação da sua personalidade.

Hoje, sabemos que a qualidade dos cuidados parentais que as crianças recebem é de fundamental importância para a estruturação do cérebro infantil e sua saúde mental futura. As experiências vividas pela criança tem impacto duradouro na arquitetura cerebral. Nos anos iniciais de vida formam-se de 700 à 1.000 conexões cerebrais por segundo, construindo assim a base para o desenvolvimento cognitivo, emocional e relacional.

Os gestos do adulto na hora de alimentar, trocar fralda, dar banho, ninar a criança, e seus sentimentos em relação à ela, irão provocar reações agradáveis ou não. É necessário que a criança tenha a vivência de uma relação afetuosa, prazerosa e estável com sua mãe ou cuidador que a substitua, para o desenvolvimento do apego e do vínculo. O apego, o vínculo, e o convívio com pais, irmãos, avós, cuidadores, encontram-se na base do desenvolvimento da personalidade, do caráter e da saúde mental do indivíduo.

Todo o ambiente que envolve a criança e os estímulos sensoriais, devem ser amigáveis à ela - texturas, aromas, imagens, e sons que proporcionem vivências genuinamente humanas por meio da expressão facial, olhar e sorriso, do toque, do tom da voz, e gesto lúdico.

Durante muito tempo a criança é totalmente dependente de outros seres humanos para sua alimentação, cuidados com higiene, proteção, apoio emocional, e estímulos - essenciais para o seu desenvolvimento biopsicossocial.

Sob o ponto de vista das relações humanas, a Dra. Julieta Jerusalinsky, psicanalista infantil, avalia a importância dos primeiros anos de vida da criança como um "tempo primordial da constituição psíquica, fase que está em jogo a constituição de si, a apropriação do próprio corpo e a relação consigo mesmo, além do estabelecimento das relações com o outro". O que nos dá a dimensão da grandiosidade e do valor do começo da vida.

A CONSTRUÇÃO DO AFETO NA INFÂNCIA

Ao nascer a criança é entregue às mãos humanas, num verdadeiro útero social formado primeiramente pela família, depois pela escola e também por toda a comunidade. Trata-se da segunda gestação, que agora irá preservar e proteger a criança emocionalmente durante os primeiros anos até que ela possa caminhar com confiança e autonomia, por meio de relações de afeto com os pais, irmãos, avós, tios, professores, amigos, com outras crianças, e no contato com a natureza. O enfrentamento, pela criança, de obstáculos, conflitos, críticas, num ambiente permeado pela afetividade, auxiliará no fortalecimento da sua estrutura psíquica e cognitiva.

É durante a infância que se constrói a autoestima da criança tendo como alicerce a afetividade. Uma criança que recebe afeto se desenvolve com muito mais segurança e confiança. A afetividade interferirá na maneira como as pessoas vêem as situações e como reagem a seu respeito.

Por afetividade entende-se a qualidade ou caráter de quem é afetivo; o conjunto de fenômenos psíquicos que são experimentados e vivenciados na forma de emoções e sentimentos; tendência ou capacidade individual de reagir facilmente aos sentimentos e emoções; emocionalidade (Dicionário Houaiss,2009).

A afetividade é como uma raíz, sustenta a vida emocional da criança, promove sua autoestima e autoconfiança, gera bem estar e influencia o comportamento humano.

Afeto diz respeito aquilo que afeta, ao que mobiliza, por isso reporta à sensibilidade, às sensações. Podemos, ainda, referir afeto como ser tomado por, atravessado, perspassado, quer dizer: afetado. (Gomes, C. A. V.& Mello, S. A. Educação escolar e constituição do afetivo: algumas considerações a partir da Psicologia HistóricoCultural. Perspectiva, 2010).

O afeto se manifesta por meio de sentimentos, atitudes, ações positivas e afirmativas na interação de pais, cuidadores e professores com a criança, favorecendo seu amadurecimento. É a expressão respeitosa que se escolhe em resposta às dificuldades, contrariedades e desafios diante das etapas de desenvolvimento da criança. É a maneira amorosa de reagir e enfrentar as dores naturais cotidianas, as frustrações decorrentes das vontades que nem sempre podem ser satisfeitas, e a ansiedade pelo tempo de espera das coisas.

O RESPEITO ÀS ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Apesar da nossa cultura ter a tendência de querer eliminar as sensações desagradáveis e a dor, é importante compreender que vivências negativas, contribuem para o desenvolvimento da percepção, controle e domínio das emoções pela criança. Quem não tem a oportunidade de fortalecer-se com as vivências dolorosas normais do dia a dia, mais tarde tenderá escapar dos sofrimentos inevitáveis da vida de modo inadequado para o viver em sociedade.

A educação da criança tanto no âmbito familiar quanto escolar, precisa de bases sólidas que a sustente. Compreender a natureza da criança, suas características e necessidades biopsicossociais e espirituais frente às etapas do seu desenvolvimento, é o ponto de partida para trilhar de maneira segura o caminho da desafiadora tarefa da educação nos dias de hoje.

É importante respeitar todas as etapas do desenvolvimento infantil para a formação de indivíduos saudáveis e autônomos, compreendendo que cada fase é base para a próxima, e todas elas exigem um trabalho interno da criança, além de estímulos saudáveis do mundo externo.

É necessário entender que a criança apreende o mundo e aprende de forma gradual, ao nível de sua compreensão, segundo uma grandeza interna de prioridades, ordenadas pelos conhecimentos já assimilados por ela. Portanto é fundamental respeitar o seu ritmo, sem antecipação e sem pressa, uma vez que trata-se de um trabalho intenso realizado pela criança para a construção do seu vir a ser diante do mundo, envolvendo amadurecimento físico, emocional, cognitivo e social.

Espera-se que pais e educadores atuem como facilitadores desse processo, pois o ser humano depende do ambiente em que vive, do incentivo que recebe e da interação com outros seres humanos para se desenvolver. Na concepção de Vygotsky, psicólogo russo, "a ausência do outro, o homem não se constrói homem". O humano existe na interação com seus pares. O papel do outro é atribuir significado as experiências e vivências da criança e ser exemplo do modo de ser e estar no mundo de maneira ética.

Além disso, a criança precisa sentir que é capaz de atrair a atenção daqueles que a rodeiam e perceber que seus gestos, expressões, e necessidades, podem provocar reações no outro, alterando o seu estado, produzindo um efeito. O efeito produzido no adulto também afeta a criança, retroalimentando assim o importante jogo de ação e reação, a influência mútua a que chamamos interação – convívio e comunicação que geram intimidade.

E não é somente na primeira infância que um ambiente de afeto é fundamental. A partir dos sete anos e à medida que as crianças avançam para a pré-adolescência e puberdade, a presença, a atenção, a conversa, a mediação e principalmente o modo de viver dos pais, são de extrema importância para atravessar essa fase em que os adolescentes buscam externamente referências e identificações.

Nesse momento, a rede social formada por familiares e amigos, criada e cultivada durante os anos anteriores, poderá funcionar como uma ponte segura na transição dessa fase.

Esse é o ideal de educação que queremos alcançar, pautado pela disponibilidade ao outro, interesse genuíno, pela escuta atenta, encontros autênticos e relacionamento profundo.

Ocorre que não vivemos num mundo ideal e cada época impõe seus desafios. Desta forma, convém questionarmos quais são os desafios da contemporaneidade.

É certo que avançamos de maneira positiva em relação ao fortalecimento dos vínculos parentais a partir de valiosas mudanças. Hoje ao nascer o bebê é imediatamente colocado no peito materno; é feito o alojamento conjunto nas maternidades; estimula-se a amamentação, a livre demanda do leite materno, e a colocação do bebê no quarto dos pais nos primeiros meses. Além disso, a ampliação da licença maternidade e a criação da licença paternidade, ainda que não totalmente satisfatórias, por trata-se de um período curto, são consideradas conquistas importantes para a promoção da proximidade do bebê à mãe e ao pai. Entretanto percebe-se que as políticas públicas são insuficientes para que essas medidas sejam efetivadas com sucesso. Sabemos que muitas mães são pressionadas a retornar ao trabalho antes do cumprimento total da licença e que algumas optam expontaneamente por encurtar esse período. O que as levam a escolher retornar ao trabalho antecipadamente?

Em 2012 a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal solicitou ao IBOPE uma pesquisa intitulada "A visão da sociedade sobre o desenvolvimento da Primeira Infância", com o objetivo de identificar percepções e práticas da sociedade no tocante ao desenvolvimento integral da criança. Em resposta a pergunta ‘o que é importante para o desenvolvimento da criança de 0 a 3 anos?’, a pesquisa apontou baixos percentuais atribuídos à tópicos relativos à afetividade, tais como: conversar com a criança (19%) , receber atenção dos adultos (18%), receber carinho e afeto (12%), conforme pode ser visto abaixo. Esse resultado insatisfatório, demonstra o tamanho do desafio que a sociedade tem que enfrentar.












Fonte:https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/pi-a-visao-da-sociedade/?s=desenvolvimento,primeira,inf%C3%A2ncia,vis%C3%A3o,sociedade,sobre


Um estudo feito com 14.000 crianças dos Estados Unidos, concluiu que 40% delas não têm vínculos emocionais fortes com seus pais. Os pesquisadores descobriram que essas crianças são mais propensas a enfrentar problemas de aprendizagem e de comportamento.

Outra questão desafiadora que se impõe atualmente é que as crianças vão para a escola cada vez mais cedo, devido ao fato de pai e mãe trabalharem fora. Esse afastamento precoce do ambiente familiar e consequente antecipação da vida escolar, acaba complicando os limites de atuação entre a família e a escola. Como fica a educação de base até então de responsabilidade da família? O psiquiatra Içami Tiba (Quem ama educa, 2002) avalia que "a escola sozinha não é responsável pela formação da personalidade, mas tem papel complementar ao da família".

Ademais é preciso levar em conta que muitas famílias estão desestruturadas. Muitos pais esquecem sua responsabilidade em dar amor, apoio emocional, educar os filhos e participar de suas vidas ativamente. Quais as consequências da carência afetiva na vida da criança?

No livro "A criança terceirizada", o pediatra Dr. José Martins Filho, usa o termo "terceirização" para referir-se à transferência das funções paternas e maternas para outras pessoas, e relata casos de pais que passam a semana sem ver os filhos, pois ao sairem de casa muito cedo, eles ainda estão dormindo e ao retornarem à noite, já estão na cama. No atendimento em seu consultório,frequentemente ele se vê diante de pacientes que chegam acompanhados pelas avós, e muitas vezes pelas babás apenas. Que efeito essa ausência parental produzirá na formação da personalidade dessas crianças?

Na visão do Dr. Márcio Lisboa, a tendência à agressividade e ocorrências de comportamentos anti-sociais cada vez mais frequentes, podem ser explicadas pela falta do aprendizado de valores, limites, disciplina, baixa autoestima, e privação materna durante a primeira infância. Ele apresenta estudos que analisam a biografia de indivíduos portadores de distúrbios comportamentais e que apontam evidências de transtornos afetivos graves com origem na primeira infância, permitindo a conclusão que a semente da violência é implantada na criança em seus primeiros anos de vida pela carência de relações de afeto.

Em 2017 a mídia noticiou uma escola de educação infantil na cidade de São Paulo que oferece uma variedade de serviços que vão além da esfera educacional, o que causou grande polêmica por suscitar uma importante discussão a cerca dos limites de atuação da escola e a responsabilidade das famílias na participação da vida dos filhos. Com o objetivo de aliviar as obrigações dos pais com as atividades domésticas do dia a dia e com isso proporcionar tempo de qualidade com seus filhos, essa escola oferece um amplo cardápio de facilidades às famílias: lavagem dos uniformes usados pelas crianças, todas as refeições, inclusive o jantar com opção de compra de comida congelada para os fins de semana, a possibilidade de contratação de professoras como babás, e ainda o serviço de corte de cabelo das crianças na escola. Tais facilidades sugerem uma desconexão com a própria vida, a medida que entrega nas mãos das crianças tudo pronto, sem que elas possam perceber as etapas de feitura das coisas e vivenciar processos.

A constante transferência de responsabilidades em relação aos cuidados e atenção que uma criança exige, além de estar sendo repassada para as escolas, também tem sido entregues aos meios digitais. Crianças têm recebido cada vez mais a atenção de TVs, jogos, smartphones, tablets, etc.

A Dra. Jerusalinsky alerta quanto ao acesso precoce e uso excessivo desses dispositivos digitais pelas crianças, ressaltando os perigos que ameaçam a infância pelo uso de forma inadvertida e a importância da riqueza da experiência interativa presencial nos anos iniciais de vida.

Entre os perigos apontados encontram-se a ausência psíquica dos pais, que muitas vezes estão de corpo presente mas ausentes psiquicamente em relação àqueles que estão ao lado; a linguagem fragmentada, fria e de isolamento produzida por esses aparelhos, que emitem sequências sonoras mas não estabelecem um diálogo, uma conversa com a criança, e a falta de mediação dos adultos em relação as informações acessadas pelas crianças via internet – informações descontextualizadas, desprovidas das experiências vivenciadas dos adultos, sem a transmissão de valores culturais.

Não se trata de negar os diversos benefícios das inovações tecnológicas ou classificá-las como maléficas, mas de refletir sobre as influências e consequências desta revolução digital na vida das crianças em fase de formação. Que modelo do que é ser humano é oferecido à elas hoje? Uma vez que elas veem adultos conectados 24 horas, o que elas estão assimilando a cerca de como acontecem as relações humanas? O que é estar com o outro numa relação de afetividade? Existe relação sem celular?

Adultos e crianças estão sendo sugados para seus próprios mundos digitais. Isso não é sem consequência para a infância, pois interfere no convívio social, na interação e na qualidade dos relacionamentos, restringe a comunicação, o olhar, o toque, suprime a separação de tempo de trabalho e tempo de lazer e família, e também interrompe o momento presente a cada novo toque e mensagem que chega pelo celular.

É essencial estabelecer limites seguros e coerentes de tempo de uso das telas pelas crianças e sobretudo examinar nossas próprias condutas em relação ao uso que fazemos desses aparelhos. É preciso rever o mundo que apresentamos às crianças na atualidade e instituir princípios e valores éticos capazes de nortear a educação das crianças.

Nós somos criaturas de vínculo. Sem afeto uma família não pode existir, e uma criança não pode se desenvolver sadiamente. O afeto é uma força que atrai, que busca proximidade, ligação e intimidade. Trata-se de um óleo lubrificante, facilitador das relações humanas e dinâmicas sociais.

No mundo material, o afeto é invisível, impalpável. De natureza etérea, ele pode ser percebido em sutilezas. Está presente no brilho do olhar e luminosidade do sorriso, na temperatura da pele e calor do toque. Está no ar – na entonação da voz, no ritmo da canção de ninar e no tom da conversa. Está no aroma e sopro quente do hálito de quem bem de perto conta uma história. O afeto vive nos lábios do beijo de boa noite. Vive em cada micro segundo das tarefas cotidianas que fazemos junto com os filhos. Se manifesta na capacidade de estar disponível para eles, para compartilhar acontecimentos corriqueiros do dia, descobertas, decepções, frustrações, etc. Se expressa na convicção e transmissão de princípios e valores éticos, na clareza dos limites estabelecidos, na firmeza ao dizer não quando necessário, e na sensação de acolhimento do riso, da alegria, do choro e da dor normais do viver.

Pais, educadores e todos os profissionais que atendem à criança, são os maiores responsáveis por desenvolver uma consciência que entenda a cultura da infância como uma etapa particular do processo de iniciação do humano, de forma a garantir a sobrevivência da espécie. Nossa capacidade de viver neste planeta de maneira digna, depende de soluções inovadoras e do olhar atento ao começo da vida, à garantia da saúde da infância. À esse cuidado e olhar atento dá-se o nome de afeto.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Martins Filho , J. A criança terceirizada: Os descaminhos ds relações familiares. Campinas,SP: Papirus, 2012;

Jerusalinsky, J. e Baptista, A. Intoxicações eletrônicas: o sujeito na era das relações virtuais.Bahia: Álgama,2017;e

Lisboa. A.M.J. – A Primeira Infância e as Raízes da Violência, Editora LEG, Brasília, 2006

*ANA LÚCIA MACHADO



















-Bacharel  em Relações Públicas  com especialização  em Pedagogia Waldorf, transdisciplinaridade em educação,  saúde,  liderança e cultura de paz pela UNIPAZ (1991);

-Pós-graduada em deficiência intelectual pelo Instituto APAE de São Paulo(2019); 

-Educadora e pesquisadora da cultura da infância ;

 -Escritora autora dos livros: 
    A Turma da floresta uma brincadeira puxa outra e
  Livro do Educador brincando com a natureza (plataforma Educando Tudo Muda)

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Reformas Urgentes que o Brasil Necessita


 Autor Eli dos Reis(*)

No momento em que o Brasil literalmente é consumido pelo fogo, os brasileiros que não morremos de amores pelo atual governo, desgoverno para muitos, ficamos extremamente incomodados com tudo que anda acontecendo sem que se consiga ver a mínima esperança de mudanças.

Mas, não é só isso, a cada dia o que se vê é um Congresso Nacional atuando de forma totalmente cooptada pelo Executivo, que tira proveito da corrupção, que em ambas as casas é um problema crônico, e praticamente age sempre aprovando "tudo o que o mestre mandar", gerando extrema insatisfação da população que apenas vê, já que não participa nem tem seus interesses atendidos, todos esses conchavos e fica responsável pelos pagamentos dos impostos, gerados na maioria das vezes por essas aprovações condenáveis.

Ao lado de tudo isso, tem-se um Judiciário totalmente alheio ao bom senso e ao cumprimento dos ditames da Constituição. Parece que não se tem mais leis, cada Juiz atua levando em consideração apenas seu entendimento e suas convicções.

Assim, quero traçar considerações acerca do relacionamento estranho entre os poderes no Brasil, na atualidade.

Um Senado que não aceita discutir impeachment de integrantes do STF, um Congresso Nacional corrompido que só aprova à custa de liberações de dinheiro pelo Executivo, e, um Executivo que só aumenta despesas e impostos sobre uma população, sem esperanças de melhora, que não suporta mais pagar impostos que não param de aumentar. Ao lado de tudo isso, como já dissemos acima, um Judiciário alheio aos anseios da população, e avesso ao bom senso e à normalidade do direito.

As considerações introdutórias até aqui apresentadas, nos fazem pensar e nos leva a fazermos mais considerações sobre esse estado de coisas, senão vejamos:

  •  STF e Senado Federal: Embora o grande anseio dos políticos de oposição ao governo e da população, o Senado não quer discutir impeachment de Ministros do STF, que nem juízes são, e escancara uma interdependência entre esses dois poderes que há muito deixou de ser interessante ao Brasil e aos brasileiros. Todos sabemos que o impeachment é um artifício constitucional para a manutenção do Estado de Direito e para que se tenha garantida a responsabilidade dos agentes políticos;
  • Congresso Nacional: Em ambas as casas, Senado e Câmara, a corrupção é um grande problema sem solução, permanente, que acabou com a confiança dos brasileiros nos políticos de modo geral. Só fazem liberar recursos do Executivo em troca de aprovações de projetos de lei, o que configura sobrepor interesses próprios acima dos da população;
  • Poder Executivo: Virou prática o mantenimento de uma máquina administrativa enorme, para acolher integrantes dos partidos que lhe dão sustentação, extremamente onerosa e ineficiente. Estes fatos e a falta de perspectivas de melhora na economia, acabou por criar uma grande aversão e insatisfação na população e
  • Judiciário: O conhecimento pela população da forma espúria de atuar, e sem cumprir os conceitos constitucionais, acabou gerando um enorme problema, total aversão e falta total de credibilidade na instituição.
Todo esse estado de coisas nos leva a considerar causas e consequências interessantes:

  • Fragilidade das instituições: A falta de mecanismos eficazes de controle e fiscalização dos poderes levou ao mantenimento perene da corrupção e perda de legitimidade das instituições;
  • Descrédito da população: O crescente descrédito nas instituições políticas, leva o povo à apatia, incentivo ao envolvimento em movimentos radicais e/ou busca de alternativas fora do sistema político tradicional;
  • Polarização na política: Esta polarização ideológica e o aumento dos conflitos no meio dos poderes atrapalham a constituição de consensos e a busca de resoluções para os diversos problemas do país; e
  • Instabilidade econômica: A indefinição política, a incerteza e a falta de confiança nas instituições levam a comportamentos negativos na economia, o que dificulta a criação de empregos e o desenvolvimento e crescimento econômico.

Por tudo que vimos até aqui, urge pensarmos na busca de possíveis caminhos para a superação e correção de políticas de atuação:
  • Reforma do Judiciário: Necessidade imediata da reforma do judiciário, estabelecendo novo ordenamento jurídico, retorno do STF apenas à apreciação da constitucionalidade da justiça brasileira, redução dos prazos dos mandatos dos Ministros, são urgentes. Sem isso o nosso judiciário continuará em seu estado de ocaso;
  • Reformas institucionais: Também urgente a grande necessidade de reformas fortalecedoras das instituições, que garantam a transparência e a responsabilidade dos agentes políticos, para tornar a dar à população confiança na política e nos políticos brasileiros;
  • Postura do Executivo: Além de, no primeiro momento reduzir-se a criação de cargos desnecessários e o aumento descabido de Ministérios e de servidores, é fundamental que o Executivo adote medidas para conter os gastos públicos, estimular a economia e promover a justiça social;
  • Combate à corrupção: Primordial em todos os poderes o combate à corrupção. Imperiosa a necessidade de investir em sistemas de prevenção e punição severa da corrupção, e promoção da transparência e a participação social;
  • Educação política: Imperiosa a necessidade de educação política, que é fundamental para formar cidadãos conscientes e participativos, com capacidade de cobrar seus representantes e exigir um governo mais justo e mais eficiente; e
  • Diálogo e consenso: Estimular de imediato o diálogo e a construção de consensos entre os poderes, em busca de soluções que beneficiem o interesse da população.
Discorridos esses comentários, interessante ressaltar como nossas considerações finais:

O ambiente político brasileiro e seu cenário é extremamente complexo e desafiador, mas não é impossível de mudar;

É preciso que todos os atores sociais estejam envolvidos nesse processo, exigindo dos seus representantes um compromisso com a ética, a transparência e o bem comum; e

Necessária a eliminação dessa política de governo que prega e insiste em implantar uma ideologia socialista que a população brasileira não quer e rechaça.

*ELI DOS REIS























-Graduado em Economia pela Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da UMC-SP (1974); 

-Especialista em Gestão Empresarial pela Universidade Paulista UNIP (2012); 

-Especialista em Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância pela Universidade Federal Fluminense (2017);

-Consultor Empresarial e de Vendas, além de Corretor de Imóveis credenciado pelo CRECI-SP;

- Presidente do Lar dos Velhos da Igreja Presbiteriana  e 

 -Primeiro Secretário do GACC Grupo de Apoio à Criança com Câncer .


Nota do Editor:

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Propaganda Eleitoral, o que os candidatos devem saber


 Autor: Marcelo Duarte Palagano (*)

A Constituição Federal no artigo 1º, inciso V consagra como fundamento do Estado Democrático de Direito o pluralismo político.

O pluralismo político é um princípio fundamental em uma democracia, que consiste na aceitação e promoção da diversidade de opiniões, ideologias e grupos políticos dentro de uma sociedade. Esse conceito reconhece que uma sociedade saudável é composta por uma multiplicidade de pontos de vista, que devem ter a oportunidade de se expressar, competir e coexistir pacificamente.

Já no artigo 14 a Lei maior estabelece os direitos políticos e prevê, no parágrafo 3º, as condições de elegibilidade entre as quais se destaca a filiação partidária (inciso V).

Denota-se que na democracia brasileira vigora o sistema partidário, sistema este que influencia diretamente a dinâmica da política e a representação dos cidadãos e a formação dos governos.

Um partido político é uma organização que reúne pessoas com ideologias, interesses e objetivos comuns, com o propósito de participar do processo político e eleitoral de um país. Os partidos políticos têm como principal função representar segmentos da sociedade, influenciar políticas públicas e buscar o poder político através das eleições para implementar suas ideias e programas de governo.

São os partidos políticos que selecionam e indicam candidatos para disputar as eleições.

Os partidos políticos são essenciais para o funcionamento da democracia, pois facilitam a organização e expressão das diversas opiniões e interesses existentes na sociedade. Eles também são o principal canal através do qual os cidadãos participam do processo eleitoral e político, influenciando a condução do governo e das políticas públicas.

Pois bem, a propaganda de candidatos a cargos eletivos somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição.

Com o início da propaganda eleitoral deverá ser observado uma série de regras para que a propaganda esteja em conformidade com a legislação eleitoral e as resoluções do TSE, sob pena de incidência de diversos tipos de penalidades, tais como multa, retirada imediata de propaganda irregular etc.

E considerando que estamos falando de propaganda eleitoral, recentemente, observei que as propagandas eleitorais dos candidatos aos cargos de prefeito e vereadores, já que neste ano a eleição será Municipal, não estão observando a disposição legal.

Isto porque, não raro, observa-se por aí que os candidatos não têm colocado nos seus cartazes, banners, bandeiras e todo material de propaganda a legenda do partido a qual se filiou.

Foi observando essa "omissão" que a reflexão logo surgiu:

 "Ora, se na nossa democracia se fala tanto de partido político, e defende-se tanto a ideia de transparência, qual é o motivo de ocultar a legenda do partido que o candidato faz parte?"

E outra:

 "Levando em consideração que o debate político está tão polarizado entre ‘esquerda x direita’, qual é a razão dos candidatos de omitirem as legendas do partido?".

Ao que parece, os aspirantes a mandato eletivo se esquecem que a campanha eleitoral deve ser transparente e justa, já que o eleitor não pode ser enganado, nem condicionado a estados mentais, emocionais ou passionais.

O eleitor é o maior interessado nas informações que são apresentadas a eles pelos pretensos candidatos, pois serão eles convencidos ou não das propostas, ideias que cada candidato expõe e que está diretamente ligado a ideologia do partido político a que está filiado.

Mas alguém poderia perguntar "na propaganda eleitoral é obrigatória a indicação expressa da legenda partidária?".

 A resposta é: Sim.

 Nos termos do artigo 242 do Código Eleitoral:

 

 Art. 242. A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais.            (Redação dada pela Lei nº 7.476, de 15.5.1986) (G.N.) 

Note que o artigo 242 do CE não diz "poderá", mas, sim, "mencionará". Embora o verbo esteja conjugado no futuro do presente do indicativo, remetendo a ideia de que a ação ocorrerá no futuro, fato é que o verbo "mencionar" significa que algo deve fazer alusão, referência, citação, assinalar, consignar, relatar algo. E neste caso em específico a ideia é a de que a propaganda eleitoral deve mencionar SEMPRE a legenda partidária, isto é, a todo instante, sem exceção, constantemente.

Não é algo facultativo ou eventual e que pode se ignorar, como se tem notado por aí.

E neste mesmo sentido, a Resolução do TSE nº 23.610/2019, que dispõe sobre a propaganda eleitoral, no capítulo II, da propaganda em geral, no seu artigo 10 estabelece:

Art. 10. A propaganda, qualquer que seja sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais (Código Eleitoral, art. 242 , e Lei nº 10.436/2002, arts. 1º e 2º).

Salienta-se a obrigatoriedade de consignar a legenda partidária na propaganda eleitoral inclusive na eleição majoritária, aquela que é voltada para presidente, governador, prefeito e senador, na forma do artigo 11 da já referida resolução do TSE:

Art. 11. Na propaganda para eleição majoritária, a federação e a coligação usarão, obrigatoriamente, sob a sua denominação, as legendas de todos os partidos políticos que as integram, nos termos do art. 6º, § 2º, da Lei nº 9.504/1997. (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

Parágrafo único. No caso de coligação integrada por federação partidária, deve constar da propaganda o nome da federação e de todos os partidos políticos, inclusive daqueles reunidos em federação. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021) (G.N)

No Brasil existe cerca de 37 partidos políticos e ninguém, a não ser aqueles que trabalham com política, é capaz de saber o número de cada legenda partidária em atividade.

Assim, a mera indicação do número partidário, tão somente, não é suficiente para levar ao eleitor o conhecimento de qual legenda faz parte o pretenso postulante ao mandato eletivo. Daí porque a propaganda eleitoral deve ser completa e entregar todas as informações e indicações, signos, símbolos, nomes, imagem do que está a se depositar a confiança, a final, o poder é exercido de forma indireta por meio de representantes eleitos.

Veja, tal omissão pode confundir o eleitor que muitas vezes é convencido por algum amigo a votar em determinado candidato do bairro que é conhecido e que está se lançando a candidato a vereador (p. ex.), porém, é filiado a um partido político com ideologia totalmente contrária à do eleitor.

A omissão da legenda partidária já foi a causa de diversos recursos na Justiça Eleitoral e é um fenômeno atual, sobretudo com o advento das propagandas eleitorais pelas redes sociais. 

Como podemos ver no caso a seguir, a propaganda eleitoral não atendeu aos requisitos previstos em lei e foi considerada irregular, com a consequente remoção do conteúdo da internet:

 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO CEARÁ ELEIÇÕES 2022 – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA ELEITORAL NA INTERNET – LEGENDA PARTIDÁRIA – OMISSÃO – INFRINGÊNCIA AO ART. 242 DO CÓDIGO ELEITORAL E ART. 10 DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.610/2019 1. A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária. 2. Constatada a não indicação da coligação em propaganda postada nas redes sociais, impõe–se a imediata retirada. 3. Tutela de urgência deferida. (TRE-CE - Rp: 06013762920226060000 FORTALEZA - CE 060137629, Relator: Des. FRANCISCO GLADYSON PONTES, Data de Julgamento: 16/09/2022, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 16/09/2022) (G.N.)

 

Portanto, é de extrema importância que seja observado os dispositivos legais, mais as resoluções do TSE próprias para a propaganda eleitoral e, ainda, os mais diversos julgados existentes na Justiça sobre o tema para se colocar uma propaganda eleitoral regular e que não leve o eleitor – o principal interessado – a erro.

*MARCELO DUARTE PALAGANO







-Advogado, graduado em Direito pela Universidade de São Caetano do Sul (2015);

 -Pós Graduado em Processo Civil pela Academia Jurídica (2020); e 

Atua nas áreas do direito Civil, de Família, Sucessões, Consumidor e do Trabalho.

Nota do Editor:


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