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sábado, 30 de novembro de 2024

Semeando o Autoconhecimento


 Autora: Maria Cristina Tofoli (*)






Queridos(as) professores(as),

Como o tempo passa! E, às vezes, eu me pego pensando em toda a minha trajetória nos quase 30 anos na área educacional e me perco nas emoções boas que vivi, e em ­outras, nem tanto, mas faz parte. Iniciando em escolas multisseriadas na área rural, sendo professora em escolas públicas e privadas, logo assumi direção e coordenação. Isso abriu um grande horizonte profissional que me permitiu, mais tarde, conhecer e atuar no mundo editorial.

Hoje, olhando para o passado, mas com os pés sempre no presente, recorrendo ao aprendizado que todas essas vivências me trouxeram, encarando situações desafiadoras do dia a dia, chego à conclusão de que, em alguns desafios que enfrentei, os problemas poderiam ter sido resolvidos de outra forma. Não faltou amor, mas faltou mais diálogo. E quem não passou por isso?

E digo a vocês: foi muito importante entender os acertos e os desacertos que vivi e que sempre contribuíram para o meu autoconhecimento. E foi a partir disso, que aprendi, de fato, que o autocuidado – a minha saúde mental, física e emocional no contexto profissional e pessoal – era fundamental para a minha vida.

Chorei, sorri; respondi, não respondi; reagi, não reagi; entendi, não entendi; indaguei, não indaguei; adoeci, sacudi a poeira e sobrevivi!

Quantos aqui lendo passaram por situações diversas e, por não conhecerem a si próprios, fecharam-se, emocionalmente, por não saberem lidar com sentimentos e emoções?

"Vivendo e aprendendo" é o ditado popular que representa, fielmente, a importância da aprendizagem durante o processo. E creio que, ao longo dos anos e do caminho percorrido, é que compreendi um pouco mais de mim e do outro, ora resolvendo com a razão e, em outras situações, com o coração (ou seria emoção?) e cheguei até aqui. Minhas decisões foram assertivas? – Acho que nem todas!

Barreiras foram quebradas, outras extintas e algumas ainda permanecem, afinal de contas, acredito que somos seres em construção – eu, ao menos, tento ser.

E, assim, todos nós temos uma boa história para contar, não é mesmo? Ainda mais quando o assunto é emocional!!

Afinal, aonde desejo chegar com esta reflexão do meu "eu" com a temática "autoconhecimento"?

Sendo eu da área educacional, e sempre muito envolvida com minhas responsabilidades, trago aqui uma comparação entre aquele tempo que não volta mais, daqueles ambientes escolares nos quais trabalhei, daquela educação que promovíamos versus a nossa atualidade educacional. No passado, não tínhamos tantas informações nem muitas referências sobre o que deveria ser trabalhado e, muito menos, a tecnologia que atualmente nos ajuda a aprofundar nesses estudos. Hoje, felizmente, a educação nos apresenta uma série de subsídios para trabalharmos o tema com alunos e profissionais nas escolas.

Antes, passávamos por dificuldades de reconhecer emoções e os impactos disso no comportamento dos alunos e de outros. Na época, também não se falava muito sobre isso.

Hoje, porém, temos muito do que precisamos para trabalhar as emoções e o autoconhecimento. Até mesmo, para nós, educadores. As ferramentas estão aí, e o que se deve trabalhar está explicitamente descrito, bastando que isso seja aplicado em sala de aula como uma aprendizagem essencial que os alunos devem ter na Educação Básica.

Como sabem, esse desenvolvimento é amparado pela Base, que, de forma clara, reforça que os alunos precisam desenvolver o conhecimento socioemocional, por meio de uma ou mais das inúmeras abordagens para a formação integral. E que bom! Trazer à tona sentimentos, emoções, vivências, atitudes e suas consequências, sem dúvida, irá ajudá-los a ter mais consciência e equilíbrio emocional e melhor qualidade de vida.

Vale lembrar que a BNCC coloca como "necessidade de o estudante aprender a cuidar da saúde física e emocional através da competência que desenvolve o Autoconhecimento e Autocuidado".

Diz, também: "Conhecer-se e apreciar-se, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas. A competência trata do aprendizado que crianças e jovens devem adquirir a respeito de si mesmos, sendo capazes de identificar seus pontos fortes e fragilidades, lidar com suas emoções e manter a saúde física e o equilíbrio emocional".

Sabemos, hoje, e assistindo a tantas barbáries no mundo, envolvendo alunos em situações críticas emocionais, o quão importante é a escolha da abordagem que cada escola adota para aplicar e desenvolver as competências emocionais nos alunos, com o objetivo, também, de reforçar suas aptidões quando se trata de habilidades e competências.

Podemos citar Gardner (1995), que afirma:
"É necessário uma Educação centrada nos alunos, uma educação que pode levá-los a uma situação feliz, em que todos se sentem bem consigo mesmos, encontram seus propósitos e se tornam membros positivos da comunidade".
A escola ter a consciência de seu papel como agente transformador é fundamental para desenvolver a responsabilidade social, e além das questões emocionais, aplicar também conceitos que façam entender o que são práticas morais e éticas, onde a primeira orientará a maneira de agir das pessoas dentro de uma situação. Já a segunda, funciona como uma organização da moral, ou seja, reconhecer valores que definem moralmente o que é certo ou errado, enquanto pessoas e sociedade.

Aprender isso é aprender a se autoconhecer e se cuidar emocionalmente, é saber como lido comigo e com o outro.

Esse tema nunca foi tão importante, e é por isso, que estamos vendo uma “enxurrada” de livros e coleções sobre o socioemocional dos alunos nas escolas.

Atualmente, estou trabalhando na criação de um livro, já em fase de finalização, com o tema Autoconhecimento. Nele, a autora descreve carinhosamente a história de uma linda flor que se acostumou com os elogios e cuidados de uma menina que passava as férias naquela fazenda. E, claro, chegando o tempo das aulas, ela retorna para a cidade. Com sua ausência, a rosa ficou tão triste que não mais sorria, não mais falava com suas amigas flores e acabava se maltratando, por não saber lidar com aquele sentimento de abandono, deixando, assim, de se cuidar e de se valorizar. Ela passa por várias situações de desconforto. Sofre!

O livro chamado "Semear, regar, colher" e que logo estará disponível para aquisição, indaga sobre a importância do autoconhecimento e da habilidade de se autoavaliar, por meio da reflexão contínua sobre suas atitudes. A Rosa Amarela aprendeu que o autoconhecimento é um processo fundamental para a construção de uma vida feliz e realizadora. Aprendeu a cada dia, a tomar decisões mais assertivas, fortaleceu-se emocionalmente, pois entendeu que as pessoas têm diferentes sentimentos, necessidades e maneiras de pensar e agir, inclusive ela mesma. E esse processo a ajudou a se conhecer e, dessa forma, a cuidar de suas emoções, bem como a respeitar as dos outros.

Sempre que dirijo a criação de um livro, elaboro materiais complementares para serem exercitados nas aulas dos professores. No caso do Semear, regar, colher, o exercício irá facilitar uma conversa cheia de trocas com os alunos e permitirá que eles e professores percebam o quão necessário esse tema é. Também, acompanha um material complementar com dois questionários, um para os alunos responderem e refletirem sobre o seu autoconhecimento e o outro questionário traz uma dinâmica para entender e conhecer o outro, ou melhor, nesse caso, seus colegas de classe. Muito legal!

Acredito que essa reflexão não servirá apenas para aprendizagem dos alunos, mas também a muitos adultos que necessitam dessa reflexão (como eu, que me vejo hoje e como era no passado) e, assim, viver uma vida mais saudável, física e emocionalmente. Fico feliz em contribuir com esse material, e espero, de fato, que independentemente do que aqui escrevo, todos os professores possam se realizar, cuidar melhor de si e aproveitar a vida, sem tristezas ou desafios que os impeçam de continuar (a vida não é um mar de rosas para ninguém) em sua missão, mas que sejam fortes, posicionando seus limites e que não adoeçam na caminhada.

E, assim, todos nós temos um pouco da Rosa Amarela, resistentes em aprender a se ver, a se conhecer, mas inteligentes para entender que viver bem e feliz, mas com limites, facilitará demais nossos relacionamentos, nossa saúde, nossas vidas.

Termino aqui este delicioso encontro com a frase de Daniel Goleman (2012, p. 278), que diz:
"O aprendizado não pode ocorrer de forma distante dos sentimentos das crianças. Ser emocionalmente alfabetizado é tão importante na aprendizagem quanto a matemática e a leitura."
Segue o exercício de reflexão que faz parte do referido livro:

"Semear, Regar, Colher – A importância do autoconhecimento

E o que de fato esse título nos traz para reflexão?

Todos nós, em algum momento, passamos situações parecidas como a vivida pela Rosa Amarela. E como podemos nos fortalecer, aprendendo a desenvolver habilidades e competências em prol da nossa saúde emocional e de nosso crescimento? Vamos refletir sobre os três termos abaixo e, descobrir como ampliar nossas maneiras de promover o nosso autoconhecimento e o autocuidado.

SEMEAR: É plantar em você o desejo de adquirir habilidades específicas, é focar no campo emocional. Devemos ampliar sempre nossos conhecimentos sobre nós mesmos para tomarmos decisões coerentes e emocionalmente equilibradas. Ser capaz de lidar com a inteligência interpessoal, que é a habilidade de se relacionar com as outras pessoas, e com a inteligência intrapessoal, que é a capacidade de conhecer a si mesmo, é imprescindível nos dias de hoje. Desenvolver essas duas competências já é um bom começo para uma semeadura que deverá ser regada para colher bons frutos. Vivemos em um mundo onde saber se relacionar com o outro é fundamental, mas para isso, aprender a autoconhecer-se é essencial! Vamos pensar, então, no mínimo, em três formas de ampliar/semear o seu autoconhecimento para melhorar suas ações, suas palavras e sentimentos?

REGAR: É fazer crescer em você o desejo de nutrir a relação humana. Pois é, isso é surpreendente e desafiador! Quando o bem-estar emocional e psicológico estão prejudicados, precisamos ter a compreensão de nossos limites. É nessa hora que devemos parar, refletir e regar o conhecimento por meio de suas percepções e cuidando para que frustrações não atrapalhem as relações no seu dia a dia. Se você não desejar isso, outro não fará por você. Essa dinâmica o ajudará a ser mais seguro em suas atitudes. Um bom começo para adquirir esse conhecimento é aprender a se cuidar, e se indagando sobre como poderia melhorar, enfim, uma infinidade de perguntas e respostas poderão ajudar nesse crescimento. O autocuidado é um aspecto essencial do autoconhecimento. Vamos exemplificar e colocar em ação pelo menos três maneiras positivas de nos cuidarmos ao longo das nossas semanas?

COLHER: É quando você vive de forma equilibrada! Havendo equilíbrio emocional, sendo você conhecedor de seus limites e de suas emoções, tudo começa a fluir melhor e, lembre-se, estamos falando de relações humanas. Tomando decisões certas e eticamente corretas, você, sem dúvida, colherá benefícios em seus relacionamentos. O autoconhecimento pode ajudar a enfrentar medos e desafios, mas você terá que sair da zona de conforto, semear, regar e encarar suas vivências de forma mais tranquila, sabendo que o diálogo sempre será necessário, como a Rosa Amarela, que ouviu suas amigas flores e entendeu os limites de Alícia e se cuidou emocionalmente para seguir a vida. O autoconhecimento melhora sua autoestima, é quando você consegue distinguir mais facilmente o que é melhor e o que não é para determinadas situações de sua vida, você consegue resolver os problemas que antes não eram enfrentados. Fica mais confiante! Como podemos trabalhar as nossas emoções e conhecimentos em cada situação do nosso dia a dia para tomarmos as melhores decisões?

Uma ótima reflexão a todos!"

* MARIA CRISTINA TOFOLI






















Graduada em Magistério com especialização em Educação Infantil/Pedagogia;
- Atuou como professora, diretora e coordenadora em escolas públicas e privadas; e 
Atualmente é Diretora Pedagógica e de Criação na Editora Sigma Educação.
São suas palavras :
"Estou há quase 30 anos na área educacional e essa atividade traz conforto e satisfação ao meu coração"

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

A influência da Inteligência Artificial na Educação


 Autor: Emilton da Silva Amaral(*)

Imagine um dia típico em uma sala de aula do futuro, onde tecnologia e empatia andam de mãos dadas. Os alunos entram e são recebidos por uma voz calorosa de um assistente virtual que conhece o nome de cada um, suas preferências de aprendizado e até as músicas que os deixam mais motivados. Esse assistente não é uma máquina fria e distante, mas um aliado no desenvolvimento deles, projetado para compreender e respeitar a singularidade de cada mente.

Naquela manhã, Rita, uma jovem curiosa, coloca seus óculos de realidade aumentada e é transportada para uma simulação da Revolução Industrial. Enquanto explora uma fábrica do século XIX, ela interage com personagens históricos, aprende sobre as condições de trabalho da época e reflete sobre como esses eventos moldaram o mundo moderno. Ao seu lado, um tutor virtual, com um tom amigável, faz perguntas instigantes: "O que você acha que mudou desde então? Como podemos evitar repetir esses erros?"

Na mesa ao lado, João, um aluno com dificuldades em matemática, está imerso em um jogo adaptativo. Cada problema que resolve lhe dá uma dica visual ou sonora para o próximo desafio. O sistema, impulsionado por inteligência artificial, monitora seu progresso em tempo real, ajustando a dificuldade e reforçando os conceitos que ele ainda precisa dominar. Para João, a matemática deixou de ser um obstáculo e se transformou em um jogo empolgante.

Os professores, longe de serem substituídos pela tecnologia, estão mais presentes do que nunca. Ana, a professora da turma, usa a IA para planejar suas aulas com precisão. Ela analisa os dados gerados pelo sistema para entender onde seus alunos estão brilhando e onde precisam de mais apoio. Naquele dia, ela organiza um debate sobre ética na inteligência artificial, incentivando os alunos a pensarem criticamente sobre as ferramentas que estão utilizando.

Ao final do dia, Rita e João compartilham suas experiências em uma reunião online com estudantes de outro país. A IA traduz automaticamente as falas, permitindo uma conversa fluida e enriquecedora. Juntos, eles descobrem que, embora venham de culturas diferentes, compartilham os mesmos desafios e sonhos.

Essa é a educação do futuro: um espaço onde tecnologia e humanidade se encontram para criar oportunidades únicas. Não se trata apenas de aprender fatos ou fórmulas, mas de desenvolver empatia, criatividade e pensamento crítico. Com a IA, as barreiras desaparecem, e o aprendizado se torna uma jornada profundamente pessoal e colaborativa.

E aí, você consegue imaginar como seria fazer parte desse mundo? Parece ficção, mas é um futuro que estamos construindo agora, com a promessa de que ninguém será deixado para trás. 

*EMILTON DA SILVA AMARAL




sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Como as democracias morrem com voto e apoio popular


Autora :Marilsa Prescinoti (*)

A democracia não morre apenas com solavancos, tanques de guerra e continências.

Ela também pode morrer por descuido, radicalização, discurso de ódio, intolerância, medo do comunismo, do fascismo; morre pelas mentiras contadas como forma de governar, pela desinformação e manipulação dos fatos.

Ela morre com a negação da ciência e com o desrespeito à propriedade privada.

Ela morre em votações obscuras no Congresso Nacional.7

Morre pela aceitação e impunidade de seus detratores.

Anistia? Não mesmo!

As democracias ao redor do mundo têm enfrentado desafios significativos nos últimos anos, com muitas delas entrando em colapso, apesar do voto popular. Esse fenômeno é conhecido como "recessão democrática".

A expressão sugere um estado de cansaço, desânimo ou até mesmo frustração com o processo político, com a falta de mudanças significativas, a decepção em relação a promessas não cumpridas e a corrupção. Estado perigoso, é neste momento que líderes populistas e autoritários ganham espaço.

Basta um único homem com discurso populista, más intenções e votos suficientes para alcançar a Presidência da República e, então, desencadear um processo lento, sorrateiro e perigoso.

De acordo com os especialistas Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, autores do livro Como as democracias morrem, a ascensão de líderes autoritários eleitos democraticamente é um dos principais fatores que contribuem para a erosão das democracias. Eles argumentam que, em muitos casos, o declínio da democracia ocorre não por golpes militares ou por imposições autoritárias externas, mas por um processo interno gradual, em que líderes políticos e movimentos ganham apoio popular para subverter ou enfraquecer as instituições democráticas.

Esses líderes frequentemente usam táticas populistas, sem compromisso com a verdade, com a ética, sem compromisso com o país e a nação, apelando para a família e a religiosidade. Colocam-se como garantidores da lei e da ordem, que, segundo eles, estaria ameaçada. Sem pudor, o discurso é fácil e atraente para uma população ansiosa por um salvador. Sob esse discurso, o apoio popular é consequência.

Eleitos, implementam medidas que concentram poder em nome da liberdade.

Fatores que contribuem para a morte das democracias:

Populismo: Líderes que usam discursos simplistas e emocionais para ganhar apoio popular, muitas vezes à custa da institucionalidade democrática;

Extremismo: Ideologias que rejeitam o pluralismo e a tolerância, promovendo a violência e a intolerância;

Autoritarismo: Concentração de poder em torno de um líder ou partido. As instituições são subservientes ao poder central, muitas vezes usando a força e a repressão para manter o controle;

Erosão das Normas Democráticas: A democracia não se sustenta apenas por regras formais (como constituições e leis), mas também por normas informais que garantem o funcionamento estável do sistema. A deterioração dessas normas pode ser um fator crucial. Líderes que ganham popularidade podem começar a atacar as instituições democráticas e desafiar limites constitucionais, sob o pretexto de atender à "vontade do povo" e às "4 linhas da Constituição";

Isso pode ser apoiado por setores da população que, em sua maioria, se sentem insatisfeitos com a política tradicional e acreditam que mudanças radicais são necessárias;

Apelo à "Vontade do Povo": Em muitos casos, se aproveitam de um contexto de insatisfação popular para ganhar apoio em nome de um suposto "interesse geral" da população. Prometem resolver problemas complexos e se apresentam como figuras fora do sistema, distantes das elites políticas tradicionais. Eles podem minar instituições democráticas, como o judiciário, realizar ataques sistemáticos contra a mídia independente e o sistema eleitoral, frequentemente com o apoio de uma parte significativa da população, que vê essas instituições como parte do problema;

Uso da Maioria para Legitimação: Em uma democracia, a maioria tem o poder de eleger seus representantes, mas a verdadeira democracia depende da proteção dos direitos das minorias e do respeito à pluralidade de opiniões. Quando um líder ou movimento se apoia na "maioria" para justificar ações autoritárias (por exemplo, modificando a constituição ou enfraquecendo os mecanismos de controle e equilíbrio), isso pode ser uma forma de usar o apoio popular para enfraquecer o próprio sistema democrático;

Deslegitimação das Instituições Democráticas: Atacam instituições que limitam seu poder, como o judiciário, os meios de comunicação independentes e os organismos de controle eleitoral. Esse ataque pode ser disfarçado como um "respeito à vontade do povo" ou como um "desafio à elite corrupta". Quando as instituições democráticas são deslegitimadas, fica mais fácil para líderes autoritários centralizarem o poder, muitas vezes com o apoio da maioria;

Polarização e Radicalização: Outro fator que pode contribuir para a morte de uma democracia com apoio popular é a crescente polarização da sociedade. Quando a sociedade se divide em facções extremas, as soluções democráticas para o conflito político podem ser vistas como ineficazes. Populistas podem explorar essas divisões, prometendo o "reconhecimento da vontade do povo", mas também incentivando a intolerância, a repressão de opositores e a perseguição política; e

Caminho Gradual para o Autoritarismo: As democracias podem começar a "morrer" de forma gradual. Isso não significa uma queda repentina, mas sim a transformação lenta das instituições democráticas em algo mais autoritário. O enfraquecimento dos controles sobre o poder executivo, a eliminação de contrapesos institucionais e a centralização do poder são exemplos de processos que podem ocorrer com o apoio popular, caso a população acredite que isso é necessário para melhorar a governança ou resolver crises.

Exemplos históricos de países que vivenciaram movimentos políticos que ganharam apoio popular e, gradualmente, minaram o sistema democrático, enfraquecendo o judiciário, atacando a mídia livre e controlando eleições.

Vou apenas pontuar as principais medidas adotadas que transformaram ou consolidaram o autoritarismo em alguns países.

Alemanha na década de 1930: O partido nazista, liderado por Adolf Hitler, chegou ao poder legalmente através de eleições. Depois de ganhar apoio popular, Hitler e seus aliados usaram a crise econômica e o medo do comunismo para enfraquecer o sistema democrático e estabelecer um regime autoritário;

Venezuela de Hugo Chávez: Chávez foi eleito presidente em 1998, apresentando-se como um defensor dos pobres e um crítico da elite corrupta;

Chávez começou a consolidar seu poder através de estratégias políticas e manipulações institucionais:
  • Reformou a Constituição: Em 1999, convocou uma Assembleia Constituinte para redigir uma nova Constituição, que foi aprovada com mais de 70% dos votos;
  • Controlou o Judiciário: Reformou a Suprema Corte, aumentando o número de juízes de 20 para 32, com suas indicações políticas;
  • Dominou os Meios de Comunicação: Fechou a principal emissora e controlou a imprensa;
  • Culto à Personalidade: Típico de regimes autoritários. Ele se retratava como o salvador da pátria. Seu governo foi marcado por grandes demonstrações de apoio popular;
  • Militarização do Estado: Promoveu a "militarização" do governo, colocando militares em posições-chave no governo e em empresas estatais. Incentivou a formação de "milícias bolivarianas", uma força paralela composta por civis armados, leais ao regime. Esse estreito vínculo com os militares deu a Chávez uma base de apoio crucial, que continuou a ser usada por seu sucessor, Nicolás Maduro, para se manter no poder; e
  • Reformas Eleitorais e Manipulação Eleitoral: Foram instituídas mudanças que deram maior controle do processo eleitoral ao governo, incluindo restrições à atuação de partidos de oposição;
Hungria: Em 2010, sob uma jovem democracia, o populista Viktor Orbán retornou ao cargo de primeiro-ministro e iniciou uma série de medidas para consolidar seu poder:
  • Mudanças Constitucionais e Reformas Jurídicas;
  • Reformas no Judiciário;
  • Reforma Eleitoral; e
  • Erosão da Liberdade de Imprensa
  • Ataques à Sociedade Civil e ONGs:
  • Lei contra Organizações Não-Governamentais (ONGs)
  • Ataques ao Sistema Eleitoral e Manipulação das Regras
  • Limitação das Liberdades Civis e Direitos Humanos e
  • Promoção do Culto à Personalidade.
Em 2022, o Parlamento Europeu emitiu um relatório afirmando que a Hungria "não pode mais ser considerada uma democracia plena", lamentando que um de seus Estados tenha se transformado no que chamou de "regime híbrido de autocracia eleitoral".

Polônia: Em 1989, a Polônia inaugurava o primeiro governo democrático do antigo bloco soviético, o que, por fim, levou à queda do comunismo.

Em 2015, com a chegada do partido de ultradireita Lei e Justiça (PiS) ao governo, de orientação conservadora e nacionalista, o partido tem promovido uma série de reformas que têm sido amplamente vistas como uma ameaça ao sistema judicial independente, à separação dos poderes e à democracia.

Embora continue a realizar eleições regulares e tenha um sistema multipartidário, as medidas implementadas provocaram:
  • Enfraquecimento da Independência Judicial;
  • Erosão da Separação dos Poderes, um dos pilares da democracia;
  • Repressão e deslegitimação da oposição;
  • Alterações nas leis eleitorais;
  • Ataques à liberdade de imprensa;
  • Exploração do nacionalismo;
  • Polarização política; e
  • Enfraquecimento do Estado de Direito.
A Polônia, que transitou de um regime comunista para uma democracia parlamentar em 1989, está enfrentando um momento crítico em sua trajetória democrática com a ultradireita no poder. O Parlamento Europeu tem expressado preocupações crescentes;

EUA e a Invasão do Capitólio: A invasão do Capitólio, ocorrida em 6 de janeiro de 2021, foi um dos momentos mais dramáticos e alarmantes da história recente dos Estados Unidos e representou uma ameaça direta à democracia americana. A ação de milhares de apoiadores do então presidente Donald Trump, incitados por ele e seus aliados políticos, visava interromper o processo formal de certificação dos resultados da eleição presidencial de 2020, que havia sido vencida por Joe Biden.

Embora Trump tenha sido eleito de forma legítima em 2016, o ataque ao Capitólio em 2021 foi um episódio de extrema gravidade, marcado por tentativas de minar a confiança nas instituições democráticas, especialmente por parte de um setor de sua base eleitoral. Apesar das alegações de fraude eleitoral, as eleições de 2020 foram amplamente auditadas e verificadas, com todos os tribunais e autoridades eleitorais rejeitando as acusações. O ataque, portanto, representou uma afronta ao processo democrático, embora o resultado da eleição tenha sido finalmente respeitado pela oposição democrática e pelo sistema eleitoral dos EUA.

O ocorrido levanta questões sobre os limites da democracia e os perigos de um líder populista e autocrático eleito em uma das democracias mais influentes do mundo. Resta acompanhar as consequências políticas e sociais desse evento e como a democracia americana reagirá;

Brasil e o 8 de Janeiro: O ataque à democracia que culminou com a invasão dos Três Poderes em 8 de janeiro foi um teste crítico. O evento mostrou que, quando uma parte significativa da população adota a ideia de lideranças autoritárias que não aceitam os resultados eleitorais e recorre à violência e conspiração para alcançar seus objetivos, as bases democráticas são colocadas em xeque.

Embora o governo atual e as instituições democráticas tenham respondido de forma firme, o episódio deixou claro que a democracia brasileira continua a enfrentar ameaças reais.

Independentemente da ideologia, é fundamental separar os fatos dos anseios. Hoje, podemos afirmar que quem atentou contra a democracia foi Jair Bolsonaro e seus apoiadores; eram eles políticos, integrantes das Forças Armadas, do poder econômico e da sociedade em geral que se identificaram com o discurso do líder autocrata. São pessoas que não têm apreço pela democracia, pelas minorias, pelas liberdades individuais e não respeitam o Estado Democrático de Direito. Os radicais lideraram o movimento, mas muitos foram influenciados por discursos fáceis, maléficos, mentirosos e conspiracionistas. Pessoas comuns foram sendo gradualmente radicalizadas pelo bombardeio de mensagens nas redes sociais.

Um parêntese: vamos falar claramente, sem rodeios ou ilações. A ameaça à democracia foi um ato de apenas um espectro político: o da extrema direita. Independentemente de qualquer crítica que se faça ao outro lado, a esquerda nunca ameaçou nossa democracia. Os contos que aterrorizavam a população mais distraída sobre o Foro de São Paulo, George Soros, urnas eletrônicas fraudadas e a ameaça do comunismo já eram o ovo da serpente sendo chocado. Foi um método que eu vi nascer e crescer nas ruas da cidade de São Paulo, tomar forma e amedrontar o Brasil afora.

O leitor que chegou até aqui já deve ter percebido que o risco de o Brasil virar Venezuela só foi real sob o governo anterior, que seguia os caminhos percorridos por Hugo Chávez, a quem confessou admiração. Mas as mentes já estavam tomadas pelo contrário, acreditando que o risco partira da esquerda.

Do começo ao fim, quem tinha olhos para ver já identificava o governo Bolsonaro com viés autoritário e golpista. O método de governar, os discursos, a negação da pandemia, o flerte com a necropolítica e com a política higienista, o desrespeito ao meio ambiente e às minorias, a militarização do Estado. As medidas implementadas, o controle das polícias, da ABIN, os projetos para o controle do Judiciário, a repressão ostensiva ao contraditório, o desmantelamento de órgãos de controle, já davam sinais de alerta. Com a possível reeleição em 2022 e a eleição expressiva de aliados para o Congresso Nacional e nos Estados, ficou claro que tudo estava sendo direcionado para o enfraquecimento das instituições democráticas e para uma maior concentração de poder nas mãos do Executivo. Mais quatro anos de extrema direita no poder e não reconheceríamos a democracia como ela é. Por essa e todas as razões: obrigada, Nordeste!

Não acabou. Hoje, a extrema direita e tudo o que ela representa ainda ameaça nossa jovem democracia, seja por projetos obscuros e outros muito claros de controle do judiciário que tramitam no Congresso Nacional, seja pela falta de observância por parte da sociedade, seja pela desinformação e mentiras espalhadas de forma sistemática, pelo ódio político, pela polarização ou pela tentativa de anistiar os golpistas.

A invasão marcou um ponto em que a violência política se tornou aceitável, o que é um fato extremamente perigoso, podendo abrir caminho para outras tentativas de golpe de Estado ou para o uso da força para alterar o poder de forma antidemocrática. Por isso, é fundamental a punição exemplar. Quando a democracia é um valor fundamental de um país, não existe anistia para os detratores. A radicalização precisa ser inibida.

Os ataques sistêmicos ao STF que vêm acontecendo no Brasil e o estímulo ao ódio direcionado contra ministros não são simples manifestações de vontade popular, são métodos! É fundamental que a sociedade perceba a diferença entre críticas a decisões pontuais da Suprema Corte e ataques. São fatos distintos: um faz parte da democracia, é saudável e aceitável; o outro atua para enfraquecer o sistema judiciário.

Espero que o eleitor tenha se dado conta de que, em todas as democracias que morreram ou que correm sério risco, o enfraquecimento, a reformulação e os ataques ao Poder Judiciário são pontos comuns e determinantes.

O Judiciário forte e independente é decisivo contra os autoritários.

A independência do STF e do TSE foi determinante para garantir a manutenção da democracia brasileira contra os ataques sofrido após a derrota de Bolsonaro nas eleições de 2022. Alexandre de Moraes, brilhante constitucionalista, foi o homem certo no lugar certo, no momento certo.

A democracia brasileira sobreviveu, mas ainda corre riscos. É preciso vigilância e comprometimento de toda a sociedade democrática. Lembrem-se: basta um homem, autocrata, personalista, que não tem respeito pelo Estado Democrático de Direito, para desencadear o processo.

Não é razoável que o ódio político se sobreponha aos interesses democráticos, ao caráter pessoal dos candidatos ao Poder Legislativo e Executivo, nem que a ideologia se sobreponha a boas ou más políticas públicas.

Em resumo, as democracias podem morrer com o apoio popular quando líderes políticos usam sua popularidade para enfraquecer ou destruir as instituições democráticas, muitas vezes sob a justificativa de que estão atendendo à vontade da maioria. Isso é uma ameaça real em muitos contextos políticos contemporâneos, onde o descontentamento popular é explorado para justificar medidas autoritárias que, embora inicialmente populares, acabam corroendo os pilares da democracia.

A responsabilidade de preservar a democracia é toda nossa, enquanto sociedade.
Não é prudente estar distraído.
Não é atitude cidadã lavar as mãos; a vida não é generosa com os omissos.

Conhecimento é poder de decisão! Conheça.
Informação é antídoto contra a manipulação! Se informe!
Razão além da paixão. Pense.
Senso crítico acima da ideologia. Apure o seu.
Brasil em construção: 2026 está logo ali.
Democracia sempre!

*MARILSA PRESCINOTI com revisão de MARESSA FERNANDES
















De acordo com suas próprias palavras:

-Empresária;

-Paulista;

- Gosto de filosofia; política; do Estado de SP e de gente bem resolvida.

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

Achegas da Vida

Autor: Luiz Antonio Sampaio Gouveia (*)
 

Aprendi com o Professor Manoel Justino Bezerra, exímio jurista, cujas letras fluem como águas límpidas que correm de mananciais preciosos, que não se deve usar ao redigir palavras inusuais, que fundam a cuca do leitor. Se você for aos Sermões do Padre Vieira, o Imperador da Língua Portuguesa, segundo Fernando Pessoa, você verá que a simplicidade das palavras é a chave da inteligência, que não quer bem dizer a mente privilegiada de qualquer ser humano, mas a necessária compreensão de que os textos são continentes.

Mas achegas, na minha pouca Inteligência, esta, sim, de uma mente limitada, vi-a pela primeira vez em um texto de meu saudoso amigo Hernani Donato, que, com outro, Pedro Brasil Bandecchi, ambos da Academia Paulista de Letras e do Instituto Geográfico de São Paulo, com eles eu bicava um vinho às quintas-feiras, no antigo Restaurante Itamaraty e em que, entre outros, não me faltava a personagem agradável de Licurgo de Castro Santos, que derramávamos o sublime líquido na garganta, enquanto, por atenção a mim, talvez, falávamos de um matador de minha Santa Cruz do Rio Pardo, o Coronel Tonico Lista e de tradições misteriosas da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.

Pois bem! Achegas se podem traduzir como complementos, por exemplo, na hipótese, que é como se pode denominar este artigo, uma breve dissertação sobre complementos da vida e a ser como tais, prazerosos complementos de nossa existência, sobretudo, agradáveis. Como agradável é o prazer dever de escrever este tema, para as variadas achegas literárias de Werneck, este cara, que também é Sampaio, como eu, família cuja achega de vida, dizem é fazer um buraco na tampa do ataúde (caixão de defunto, para seguir, Manoel Justino), porque senão, ela não fecha e a ver a grande prole que fica atrás de nós.

Por falar em prazer poucos deles são tão gostosos como uma biblioteca, como dizia o descendente de cristãos novos portugueses, como eu sou também e que, não obstante, era argentino, o Jorge Luís Borges, que o Paraíso, se existir deveria ser uma grande biblioteca.

Outro dia, curtindo minha estante, parei para ver "Crime e Castigo", do grande Dostoievski e pensando em Trump, vi que o caricato de grandeza não pode passar, de um grande palhaço, mas o que mais me fez pensar foi que tendo sido perguntado a Rodion Raskolnikov, o sociopata aassassino, que não perdia o rebolado, para se dizer, matador com dignidade, porque não trabalhava, ele respondeu, penso!

De fato, pensar é mesmo trabalhoso porque para muitos, nada pensar seja nada fazer, ao contrário e o pensamento na teologia católica, é mesmo a morada do pecado. Logo, se penso trabalho e como Descartes, penso logo existo.

Contudo a questão não é o "Crime e Castigo" de minha estante, porém, um livrinho que naquela poeira, falava das estripulias de antigos alunos da Academia do Largo, alunos dos anos 1945/1950, que deram origem à Peruada.

Então: os perus foram furtados de uma exposição agrícola no Parque da Água Branca e eram do Professor Mário Mazagão, lente de Direito Administrativo da Escola. A história foi contada pelo meu saudoso amigo Manoel Elpídio Pereira de Queiroz, da Turma, creio de 1948, que saudade!

Contei uma história! Entrei por uma porta e sai pela outra. Quem quiser que conte outra!

A pedido do Werneck fiquei pasmo. Pensei! Vou escrever sobre o nada; que deve ser o vácuo do Universo, onde, em breve vamos nos encontrar, Mas, não, sai melhor, com Achegas da Vida.      


* LUIZ ANTONIO SAMPAIO GOUVEIA










-Advogado graduado em Direito pela Faculdade de Direito da USP (Arcadas) (1973);

-Mestre em Direito Público (Constitucional) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo;

- Especialista pela FGV, em Finanças (EAESP) e Crimes Econômicos (GVlaw);

-Orador Oficial e Conselheiro do Instituto dos Advogados da São Paulo e

 -CEO de Sampaio Gouveia Advogados.

Nota do Editor:

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quinta-feira, 28 de novembro de 2024

A maioridade civil e a continuidade da obrigação alimentar


Autora: Sara Brigida Farias Ferreira (*)
 

A obrigação alimentar não cessa automaticamente com a maioridade civil do filho. Mesmo que o alimentando seja capaz de prover o seu próprio sustento, é necessária decisão judicial para exonerar o alimentante, comprovando a desnecessidade dos alimentos.

A jurisprudência do STJ reforça que o cancelamento da pensão depende de prova concreta da independência financeira do alimentando, respeitando o contraditório. Pode ser que a renda do alimentando não seja suficiente para sua total autonomia. Além disso, mesmo com ação exoneratória, o pai não se torna isento do pagamento das parcelas em atraso.

Esse entendimento está consolidado na Súmula 358 do STJ, que estabelece que o cancelamento da pensão após a maioridade está sujeito à decisão judicial e ao contraditório. O caso foi julgado pela 4ª Turma do STJ, no Habeas Corpus nº 908.346-PR, relatado pelo Ministro Raul Araújo (Informativo 822).

Portanto, para desconstituir a obrigação alimentar, é essencial comprovar a desnecessidade dos alimentos judicialmente, garantindo o direito dos filhos à manutenção durante períodos de transição, como faculdade ou estágio.

*SARA BRIGIDA FARIAS FERREIRA













-Advogada, bacharela em Direito, com habilitação em Relações Sociais, pela Universidade Federal do Paraná - UFPR (2015);

-Especialista em Direito de Família pela Universidade Cândido Mendes (2016);

- Mestre em:
  -Planejamento e Desenvolvimento Regional e Urbano na Amazônia (PPGPAM) (2021)  e 
   -Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação, ambos pela Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará - UNIFESSPA (2024).
 
Atualmente é professora efetiva da Universidade Estadual do Tocantins - campus Paraíso, da área de Direito Constitucional.

Nota do Editor:

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quarta-feira, 27 de novembro de 2024

A Polêmica das Novas Diretrizes da Eleição do Foro na Relação de Consumo

Autor: Rogério Alves(*)
 
Em toda relação consumerista, principalmente na esfera contratual, muitos não se atentam as menções da parte final dos contratos, mesmo estando logo abaixo da parte que assinam, trata-se da "Eleição do Foro Judicial" para dirimir qualquer conflito gerado em virtude da relação ali estabelecida.

Claro que ao concretizar uma relação de consumo entre o fornecedor e consumidor, espera-se que não haja conflitos e nem descumprimentos das cláusulas contratuais, porém a grande demanda de ajuizamentos de processos judiciais desta natureza, demonstra que muitos problemas ocorrem nesse tipo de relação.

Justamente por esses motivos, a eleição de foro se torna algo importante no contrato que envolva relação de consumo, vez que no mundo globalizado que vivemos, bem como a notória comunicação potencializada pelas redes sociais, os entes da relação contratual, embora estejam bem distantes entre si separados até mesmo por bairros, cidades, estados e países, se aproximam pelas ferramentas eletrônicas disponíveis.

Vejamos essas questões atuais na prática, por exemplo, tempos atrás se permitia assinar fisicamente o contrato em determinado local e, logo após, esse era enviado via correio para assinatura da outra parte, que no caso reside em outra cidade, podendo levar dias para se concluir um negócio, hoje em dia se permite assinar eletronicamente com validação digital por entes autorizadores (gov.br) e até com reconhecimento de firma pelo "e-notariado", ou seja, por mais que as partes estejam distantes, não se exige a presença física das mesmas para o estabelecimento de um contrato expresso válido. Estas transações podem se concluir em minutos.

É nesse momento que se torna importante a eleição do foro competente, afinal de contas, se der algum problema, onde ajuizar a ação, perto do fornecedor ou do consumidor?

O Código de Processo Civil (CPC) estabelece a competência das ações judiciais em geral (artigos 42 e seguintes do CPC) e dependendo do tipo da causa, ela se modifica. O "Foro de Eleição" existe em razão do permissivo previsto em Lei (art. 63 do CPC), atribuindo a modificação entre o combinado pelas partes envolvidas em razão do valor e do território onde ocorre o negócio. Exige forma escrita com alusão ao negócio jurídico (§1º do art. 63 do CPC), obriga herdeiros e sucessores (§2º do art. 63 do CPC), pode ser refutado de ofício pelo juiz se considerado abusivo (§3º do art. 63 do CPC) ou pela parte (§4º do art. 63 do CPC), a abusividade da eleição deve ser justificada (§5º do art. 63 do CPC).

Recentemente a Lei nº 14.879/2024, estabelecida no dia 04 (quatro) de junho, alterou algumas regras do art. 63 do CPC no que diz respeito as relações de consumo, não permitindo que a eleição do foro seja mencionada de qualquer jeito. A primeira alteração ocorreu no §1º, acrescentando o texto "e guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das partes ou com o local da obrigação, ressalvada a pactuação consumerista, quando favorável ao consumidor", ou seja, além de ter forma escrita expressando o negócio jurídico, o foro escolhido deve guardar pertinência com o endereço das partes e o local da obrigação, porém, sendo relação de consumo, a eleição do foro pode favorecer o consumidor.

Dessa forma, diante da alteração, por exemplo, em sendo determinado negócio de natureza consumerista e o fornecedor reside em Diadema - SP e o consumidor em Poá - SP e o cumprimento do contrato for uma entrega em São Caetano do Sul – SP, o foro de eleição não pode ser em Guarulhos – SP, salvo se for vantajoso ao consumidor, em sendo Guarulhos – SP o local de trabalho dele e próximo ao advogado que ele costuma contratar.

A segunda alteração ocorreu com a inclusão do §5º no art. 63 do CPC, possuindo assim o seguinte texto "O ajuizamento de ação em juízo aleatório, entendido como aquele sem vinculação com o domicílio ou a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda, constitui prática abusiva que justifica a declinação de competência de ofício". O texto trouxe uma nova modalidade de prática abusiva, auxiliando o juiz no enquadramento da definição legal aos casos práticos no momento da análise e aplicação do disposto no §3º do mesmo artigo, lhe permitindo antes mesmo da citação, refutar ineficaz de ofício a eleição do foro abusivo, determinando assim a remessa dos autos ao foro de domicílio do réu.

Essas alterações visam a dar maior proteção ao consumidor, onde a Lei o trata como parte mais vulnerável da relação, vez que é de notório conhecimento que o foro de eleição muita das vezes está fora do escopo de negociações na esfera de consumo, na maioria dos casos os contratos seguem o modelo de adesão, onde a maioria das cláusulas são fixadas previamente e sem margem de negociação, inclusive a cláusula do foro de eleição enquadra-se nesse modelo.

Empresas com o maior poder econômico, possuem acesso a ótimas assessorias jurídicas que realizam pesquisas no intuito de saber quais Foros e Tribunais emitem decisões mais favoráveis aos seus tipos de negócio, sobrecarregando assim determinados Fóruns com muitos processos, por esta razão o foro de eleição de determinado contrato é bem diferente do domicílio das partes, com certeza a escolha não é aleatória e isso torna desigual a relação jurídica ali estabelecida, cabendo a Lei tornar a relação entre fornecedor e consumidor o mais equitativo possível.

Por outro lado, pode-se construir argumentos que tornam essas alterações legislativas uma verdadeira afronta a liberdade contratual e a autonomia da vontade, portanto inconstitucional (art. 5º, II da Constituição Federal), impondo limites às partes quanto a escolha do foro de eleição. No mais, a aplicação dessas regras em contratos internacionais podem trazer algumas complicações, bem como nos contratos em que o objeto envolver múltiplas jurisdições.

Conforme visto, as alterações legislativas quanto ao foro de eleição coloca na balança de um lado a proteção do consumidor e do outro lado a liberdade das partes no contrato. Por ser recente, como todo texto polêmico que o Poder Legislativo produz, caberá a jurisprudência de nossos Tribunais definir qual a melhor e a mais saudável aplicação do texto no dia a dia das relações consumerista, só o tempo trará as respostas quanto a melhor aplicação.

Fontes:








* ROGÉRIO ALVES
















-Advogado Graduado no Centro Universitário Nove de Julho - 2004;

- Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito - 2007;

- Advogado parceiro da Buratto Sociedade de Advogados e da Shilinkert Sociedade de Advogados e

- Palestrante do Departamento de Cultura e Eventos da OAB Seção São Paulo

– Instagram: @rogerioalvesadv


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Nota do Editor:

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