Autora : Claudia Alaíde Silva(*)
A busca por relacionamentos perfeitos é algo recorrente em nossa sociedade. Talvez não "perfeito", mas o mais próximo do ideal. O fato é que, vivemos em tempos líquidos e, tanto quanto os eletroeletrônicos, também os relacionamentos passam a ser construídos para acabar.
Algumas dezenas de anos atrás, vivia-se exatamente a outra ponta desse novelo, os relacionamentos uma vez iniciados não podiam ser encerrados, senão pela imponente evidência da morte. Vivia-se ao pé da letra o famigerado "até que a morte nos separe", hoje adotamos como possibilidade, desde o início, o fim das relações.
Aparentemente o extremismo impera, quando a questão são os relacionamentos românticos.
O que o sociólogo polonês Zygmunt Bauman propõe em sua teoria é que os relacionamentos líquidos têm por pano de fundo uma insegurança dos indivíduos, pois sendo solida a relação seus desafios se apresentam em igual dimensão. No entanto, nos encontramos em um oceano de desafios; pois embora se evite o peso das relações sólidas, as frustrações líquidas se apresentam bem concretas, apontando inúmeras vezes para um vazio.
Não estou, porém, entrando em defesa das relações tradicionalmente sólidas, pois é evidente que, também essas, se configuram a partir de uma busca por segurança e oferecem o risco da frustração e exploração dos mesmos vazios.
Quando olhamos os dois exemplos, liquidas e sólidas, as relações apresentam elementos muito similares: a busca por segurança que, pode ou não, desembocar num vazio a partir da frustração de uma expectativa. Quando falamos em emoções, nos adaptamos a uma espécie de compensação que, temporariamente, parece funcionar. Comemos para não chorar, compramos para esquecer... é uma fórmula bem difundida em nossa sociedade, mas, como dito, é temporária. Os relacionamentos têm também servido a esse propósito?
É normal nos depararmos com a sensação de completude na relação com um outro que, parece carregar nele o que nos falta, mas talvez seja o momento de considerar que não é no outro que nos completamos, pois, assim como nós o outro também possui suas faltas.
Um dos princípios da comunicação não violenta é o autoconhecimento; o reconhecimento de emoções e necessidades, não para transferi-las ao outro, mas justamente para a autorresponsabilidade.
Uma ferida recorrente em casamentos, namoros, amizades, relações familiares e profissionais, é ocasionada porque não sabemos como nos sentimos, o que precisamos, nem mesmo o que buscamos, mas colocamos no outro a responsabilidades de satisfação dessas necessidades.
Quando conhecemos nossas faltas, assumimos a responsabilidade e a liberdade para compreender que o outro pode fazer parte, não apenas do que completa, mas também do que falta. Afinal nem todas as faltas são preenchíveis. Isso nos diz que os relacionamentos, sólidos, líquidos e gasosos, podem ser completude se suportarem as incompletudes.
Mais sobre...
Alguns livros podem te auxiliar nesse percurso rumo ao autoconhecimento e construção de relações. Vou deixar 3 indicações:
Amor líquido: a fragilidade dos laços humanos – Zygmunt Bauman (2003);
A parte que falta – Shel Silverstein (2018); e
Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais – Marshall B. Rosemberg (2006)
*CLAUDIA ALAÍDE SILVA
-Graduada em Psicologia pela FMU (2020);
-Especialista em psicologia fenomenológico hermenêutica pelo Instituto Daisen (2022) com foco nos fenômenos relacionais;
-Atua como biblioterapeuta e mediadora de grupos, além de ser intervisora de práticas clínicas.
-É também psicóloga clínica, oferecendo atendimento a adultos em sessões individuais, de casal e em grupos.
Nota do Editor:
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