Atualmente a Lei Complementar 150 de
1º de Junho de 2015 é a lei especial que regula o trabalho doméstico. De acordo
com o artigo 1º da Lei Complementar 150/2015 o conceito de empregado doméstico é
“aquele que presta serviços de forma contínua,
subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família,
no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana”.
Então
significa dizer que o empregado doméstico presta serviços, de natureza não econômica,
para pessoa física ou à família no âmbito residencial destas. Deve-se lembrar
que este empregado pode tanto exercer funções internas como de limpeza, de
cozinha ou cuidar das crianças, mas também ser o vigia da casa e o motorista,
por exemplo.
Percebe-se
aqui que o empregador, ou seja, aquele que contrata, não é uma empresa, não
exerce uma atividade econômica, mas é uma pessoa natural ou uma família.
Se voltarmos um pouco ao conceito de empregado doméstico veremos
que o serviço deve ser prestado de forma contínua. A lei exige então, que o
serviço seja feito com habitualidade, ou seja, com frequência, que virou um hábito,
em que há rotina, ao longo da semana.
Portanto, aquele que presta serviços esporádicos, ou mesmo
intermitentes, em um ou dois dias da semana, não é empregado doméstico
(diaristas, por exemplo). Isso porque a Lei Complementar 150/2015 exige a continuidade
na prestação do serviço por mais de dois dias por semana, para configurar o
emprego doméstico.
Na Constituição Federal, no título de Direitos Sociais, no artigo
7º, parágrafo único (redação dada pela Emenda Constitucional 72), são
assegurados os seguintes direitos a saber:
➢
relação de emprego
protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei
complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos (inciso I);
➢
seguro-desemprego, em
caso de desemprego involuntário: valor de um
salário mínimo, por período máximo de três meses (art. 26 da Lei 150/2015). O
prazo para requerer é de 7 (sete) a 90 (noventa) dias contatos da data da
dispensa e os documentos exigidos estão elencados no artigo 28 da LC. (inciso II);
➢
fundo de garantia do
tempo de serviço:
FGTS. Há uma inovação da LC, quando o empregador deve depositar a importância
de 3,2% sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada empregado, destinada
ao pagamento da indenização compensatória da perda do emprego; além dos 8%.
(inciso III)
➢
salário mínimo: fixado em lei, capaz de atender às necessidades básicas vitais do
indivíduo (inciso IV);
➢
irredutibilidade do salário: é a proibição de reduzir o salário do trabalhador. Salvo o
disposto em convenção ou acordo coletivo (inciso VI);
➢
garantia de salário,
nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável: aos trabalhadores que perceberem remuneração variável, fixada por
comissão, peça, tarefa e outras modalidades, será garantido um salário mensal
nunca inferior ao salário mínimo (inciso VII);
➢
décimo terceiro salário
com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria (inciso VIII);
➢
remuneração do trabalho
noturno superior à do diurno: é aquele
realizado entre as 22 horas de um dia as 05 horas do dia seguinte. A hora
noturna terá duração de 52 minutos e 30 segundos e a remuneração deve ter acréscimo
de, no mínimo, 20% (vinte por cento) sobre o valor da hora diurna (art. 14 da
LC). (inciso IX);
➢
proteção do salário na
forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa: para evitar que o empregador deixe de pagar ao empregado, dentro
do prazo legal, o salário previamente estipulado no contrato de trabalho
(inciso X);
➢
salário-família pago em
razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei (inciso XII);
➢
duração do trabalho
normal não superior a 8 (oito horas diárias) e 44 (quarenta e quatro) semanais,
facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou
convenção coletiva de trabalho: também
previsto no artigo 2º da Lei Complementar 150/2015. (inciso XIII);
➢
repouso semanal
remunerado, preferencialmente aos domingos:
descanso semanal remunerado é de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas (inciso
XV);
➢
remuneração do serviço
extraordinário superior, no mínimo, em 50 (cinquenta por cento) à do normal: horas extras. A forma de se calcular o valor da hora normal está
previsto no artigo 2º, §§1º a 3º, da Lei Complementar 150/2015.É possível haver
acordo escrito de compensação de horas (§§4º a 6º). (inciso XVI);
➢
gozo de férias anuais
remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal: período de 30 dias, salvo os casos de regime de tempo parcial, após
cada período de 12 meses de trabalho prestado à mesma família (art.17 da LC).
(inciso XVII);
➢
licença à gestante, sem
prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 (cento e vinte dias): nos termos do art. 391 e seguintes da CLT/43 e art. 25 da Lei
Complementar 150/2015. (inciso XVIII);
➢
licença-paternidade, nos
termos fixados em lei (inciso XIX);
➢
aviso prévio proporcional
ao tempo de serviço, sendo no mínimo de 30 (trinta dias), nos termos da lei: Concedido para os casos com até um ano de serviço para o mesmo
empregador. (art. 23 da LC). Devem ser acrescidos 3 (três dias) por ano ao
serviço prestado ao mesmo empregador. A falta de aviso prévio por parte do
empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao prazo do
aviso. A falta de aviso prévio por parte do empregado dá ao empregador o
direito de descontar os salários correspondentes ao prazo respectivo. (inciso XXI);
➢
redução dos riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII);
➢
aposentadoria (inciso XXIV);
➢
assistência gratuita aos
filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches
e pré-escolas (inciso XXV);
➢
reconhecimento das convenções
e acordos coletivos de trabalho (inciso
XXVI);
➢
seguro contra acidentes
de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está
obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa
(inciso XXVIII);
➢
proibição de diferença de
salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo,
idade, cor ou estado civil (inciso XXX);
➢
proibição de qualquer
discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador
portador de deficiência (inciso XXXI);
➢
proibição de trabalho
noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a
menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze
anos (inciso XXXIII);
➢
integração à previdência
social (parágrafo único).É segurado obrigatório,
sendo-lhe devidas as prestações nela arroladas.
Ainda é importante dizer que é proibida a contratação de menor
de 18 (dezoito) anos para a prestação de serviço doméstico (parágrafo único,
do artigo 1º da Lei Complementar 150/2015).
O trabalho prestado em domingos e feriados deve ser pago em
dobro, se não for compensado, sem prejuízo da remuneração relativa ao
repouso semanal (art.2º, §8º, da Lei Complementar 150/2015).
É possível também a contratação de empregado doméstico por
regime de tempo parcial (artigo 3º da LC), sendo o salário proporcional a
sua jornada. E ainda é possível a contratação por prazo determinado (artigo
4º da LC), por contrato de experiência (inciso I) ou para atender a uma
necessidade transitória familiar (inciso II). O contrato de experiência não
pode exceder 90 dias, podendo ser prorrogado uma única vez, desde que a soma
dos períodos não ultrapasse 90 dias. E no caso do inciso II, o contrato durará
até a necessidade transitória persistir, obedecendo um limite máximo de 2 (dois)
anos.
A carteira de trabalho deve ser apresentada pelo empregado
ao empregador, para que nela seja anotado a data de admissão, a remuneração e,
quando for o caso, os contratos previstos nos incisos I e II do art. 4o,
da LC 150/2015, no prazo de 48 horas.
A Lei ainda permitiu poder convencionar uma jornada de trabalho
de 12 horas seguidas por 36 horas ininterruptas de descanso (12x36),
mediante acordo escrito (art. 10 da LC); bem como por meio de acordo escrito
definir sobre o acompanhamento deste empregado a viagens e sobre o
pagamento do acrescimento de 25% (vinte e cinco por cento) da remuneração-hora,
ser será paga ou convertida em banco de horas (art.11 da LC).
A Lei nº.7.418/85, do vale-transporte, se aplica
subsidiariamente ao empregado doméstico, nos termos do art.19 e parágrafo único,
da LC 150/2015. E a obrigação do empregador na concessão dos vales-transporte,
poderá ser substituída, a seu critério, pela concessão, mediante recibo, dos
valores para a aquisição das passagens necessárias ao custeio das despesas
decorrentes do deslocamento residência-trabalho e vice-versa.
O intervalo interjornada, ou seja, aquele entre duas
jornadas de trabalho, deve haver um período mínimo de descanso de 11 (onze)
horas consecutivas (art. 15 da LC).
Já o intervalo intrajornada, ou seja, aquele dentro da
jornada, para descanso e alimentação, deverá ser concedido pelo período de, no
mínimo, 1 (uma hora), e no 2 (máximo duas). Por acordo escrito pode ser
reduzido para 30 (trinta) minutos ou ainda desmembrado em dois períodos (art.
13 da LC).
É obrigatório o registro do horário de trabalho do
empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que
idôneo (art. 12 da LC).
A Lei Complementar 150/2015 prevê ainda 12 hipóteses em que seria
possível a demissão por justa causa do empregado, previstas no artigo
27, caput, incisos I ao XII. Já os casos de rescisão indireta,
ou seja, hipóteses em que o contrato de trabalho pode ser rescindido por culpa
do empregador, estão elencadas no parágrafo único do artigo 27, incisos I ao
VII, da LC.
A prescrição para reclamar eventuais direitos oriundos
desta relação é de 5 (cinco) anos até o limite de dois anos após a extinção do
contrato de trabalho, ou seja, o ajuizamento da ação deve ser realizado em até
2 anos contados da extinção do contrato de trabalho para reclamar direitos dos últimos
5 anos.
O empregador doméstico contará com o Simples Doméstico, que
é o regime unificado de pagamento de tributos, de contribuições e dos demais
encargos do empregador doméstico. A inscrição do empregador e a entrada única
de dados cadastrais e de informações trabalhistas, previdenciárias e fiscais no
âmbito do Simples Doméstico dar-se-ão mediante registro em sistema eletrônico a
ser disponibilizado em portal na internet, conforme regulamento (artigos 31 a
35, da LC).
CONCLUSÃO
Este breve artigo não
analisou de forma pormenorizada todos os artigos da Lei Complementar 150/2015,
uma vez que sua intenção foi abordar os direitos e aspectos mais relevantes
sobre o trabalho doméstico.
Ao longo da história
essa classe de trabalhadores, enquanto não havia uma regulamentação específica
era excluída de diversos direitos que os mantinham à margem da proteção social
e trabalhista previstos legalmente. Por outro lado a regulamentação de uma
parte considerável de direitos fortalece a importância e dignidade da classe,
bem como diminui as diferenças entres os empregados urbanos e rurais.
A intenção da Lei
foi demonstrar a relação empregatícia que há no trabalho doméstico, apesar do
seu caráter diferencial, no âmbito familiar. Mesmo que o empregado doméstico
seja “quase da família” ele está ali para exercer as tarefas para o qual foi
contratado, e para tanto, merece receber todos os direitos advindos dessa
contratação.
Certo é que o serviço
doméstico, seja de limpeza da casa, de cozinhar, de cuidar dos filhos, é
importante. Então, se sua execução foi transferida para outra pessoa (empregado
doméstico) que esta receba os valores justos para tanto.
Contudo, não podemos
desconsiderar os impactos que a regulamentação trouxe ao longo desses anos,
pois alguns aspectos como a obrigatoriedade do intervalo intrajornada, do
registro dos horários, da dificuldade da prova testemunhal em alguns casos em
que há somente um empregado doméstico, dentre outras coisas, poderiam ter
engessado mais a relação, pois havia-se uma liberdade para negociação que agora
não é possível (pontos analisados pelos empregados e empregadores).
A própria fiscalização
do auditor-fiscal do trabalho fica prejudicada (artigo 44 da LC) uma vez que o
ambiente onde se exercem as atividades laborais é a residência do empregador, e
conforme a Constituição Federal a “casa é asilo inviolável do indivíduo” (art.
5º, inciso XI, da CF/88).
Outro ponto
enfrentado é que com o aumento da carga tributária os empregadores desistiram
da contratação desta modalidade e com isso houve um aumento do trabalho
informal, como exemplo das diaristas.
Apesar de todos os
aspectos jurídicos e sociais da Lei Complementar certo é que os seres humanos
precisam entender que toda e qualquer relação deve ser pautada na boa-fé e
respeito. E ainda há vários avanços que esta categoria precisa alcançar para de
fato se iguale aos demais empregados.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Constituição da República Federativa do
Brasil. Brasil: [s.n.], 1988. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em:
28 mai.2023:
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual dos Direitos do
Trabalho. 16. ed. rev.,ampl.e atual.- São Paulo: Editora JusPodivm, 2022;
LEI, Complementar 150. [s.n.], 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp150.htm. Acesso em 28
mai. 2023.
*JOSIANE RODRIGUES JALES BATISTA
-Advogada;
-Graduação pela Escola Superior de Negócios (2010);
-Especialista em Docência com Ênfase Jurídica pela Faculdade Arnaldo Jansen (2022);
-Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Dom Helder Câmara (2016);
-Membra das Comissões Direito na Escola(https://direitonaescola.com) e Comissão de Direitos Sociais e Trabalhistas da OAB/MG; e
-Cocriadora do Projeto Verbum Est Vita - @josianejrjb @verbumestvita.
Nota do Editor:
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