RESUMO
O cenário contemporâneo sobre os direitos humanos impõe a necessidade de descrever e/ou analisar algumas práticas culturais que podem ser objeto de severas críticas no sentido de violar direitos humanos, no entanto, segundo os especialistas em seus relatórios apresentados ao Conselho de Direitos Humanos da ONU "Retrocessos alarmantes estão ocorrendo em diversas regiões do mundo, formando uma "aliança de conservadorismo político e fundamentalismos religiosos".
Por 70 anos, a igualdade de gênero foi consagrada na Declaração Universal dos Direitos Humanos; há quase 40 anos, foi adotada a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher; e há 25 anos, a Declaração e o Programa de Ação de Viena estabeleceram que os direitos das mulheres são uma parte indivisível dos direitos humanos, No entanto, especialistas apontam que nenhum país do mundo eliminou com sucesso a discriminação contra as mulheres ou alcançou a igualdade de gênero total, havendo portanto, a urgente necessidade de proteger as conquistas passadas e avançar para garantir a igualdade para as mulheres em todos os lugares do planeta.
PALAVRAS-CHAVE: direitos humanos, cultura, mutilação, interculturalismo, diálogo intercultural
ABSTRACT
The contemporary human rights scenario imposes the need to describe and / or analyze cultural practices that may be severely criticized for violating human rights, however, according to experts in their reports to the UN Human Rights Council "Alarming setbacks are occurring in various regions of the world, forming an" alliance of political conservatism and religious fundamentalisms "
For 70 years, gender equality was enshrined in the Universal Declaration of Human Rights; almost 40 years ago, the Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against Women was adopted; and 25 years ago the Vienna Declaration and Program of Action established that women's rights are an indivisible part of human rights. However, experts point out that no country in the world has successfully eliminated discrimination against women or achieved equality of all gender, but there is an urgent need to protect past achievements and to advance to ensure equality for women everywhere on the planet.
KEY-WORDS: human rights, culture, mutilation, interculturalism, intercultural dialogue.
Os direitos humanos fazem parte dos chamados direitos de terceira geração. São direitos difusos, meta individuais e transcendentes. Não possuem como objeto de sua tutela um indivíduo em específico, mas dizem respeito a toda uma coletividade.
Dos "muitos obstáculos"que as mulheres enfrentam, o relatório da ONU afirmou questões envolvendo família, cultura e saúde sexual e reprodutiva continuam sendo os desafios mais difíceis de serem ultrapassados e são os que recebem a maior reação negativa. Segundo a Organização das Nações Unidas, em nenhuma sociedade práticas como poligamia, casamento infantil, mutilação genital feminina, crimes de honra e criminalização de mulheres por comportamento sexual e reprodutivo deveriam ainda existir.
Dada a descomunal violência, capaz de agredir a mulher em TODOS os sentidos (físico, moral, psicológico, sexual e reprodutivo) trataremos aqui da mutilação genital feminina, a qual pode ser conceituada como extirpação parcial ou total do órgão genital feminino, que ocorre sobretudo em 28 países africanos. Em tempos de intensa globalização, o debate sobre a universalidade dos direitos humanos ganha novos contornos.
A MGF constitui, pela sua
natureza e pelas suas consequências, um atentado à igualdade de género
traduzindo-se numa das formas mais aviltantes de violência e discriminação
contra as mulheres. Esta realidade perpetua situações de desigualdade
constituindo um obstáculo ao exercício pleno do direito inalienável de
cidadania. Com efeito, enraizados nestas práticas encontram-se estereótipos
alicerçados na subordinação da mulher no contexto familiar e social. Estas
práticas reforçam noções e realidades distorcidas quanto ao papel da mulher nas
diversas esferas da sociedade. Subjacente a fatores alegadamente relacionados e
legitimados com costumes, tradições e/ou religião, o que transparece desta
violação mais elementar dos Direitos Humanos é uma relação assimétrica de poder
em que se subalterniza e discrimina o papel da mulher, quer na esfera privada,
quer na esfera pública, incluindo a política.
A Mutilação Genital Feminina
(MGF) é indiscutivelmente reconhecida em vários convênios internacionais como
uma grave violação dos direitos humanos das mulheres, provocando danos
irreparáveis, a curto e a longo prazo, para a saúde psicológica, sexual e
física das mulheres e meninas que a ela foram submetidas. Este grave atentado à
pessoa e à integridade física, mental, sexual e reprodutiva das mulheres chega,
em alguns casos, a provocar a morte.
A MGF é uma discriminação de gênero, já que
se encontra profundamente enraizada em desigualdades e assimetrias de poder
entre homens e mulheres impedindo a mulher de usufruir plenamente os seus
direitos. Mesmo quando praticada por mulheres não deixa de ser uma violência de
gênero, já que a mulher é aqui utilizada como veículo de perpetuação de uma
cultura de desigualdade que a subjuga, anula e viola a sua integridade.
A MGF
coloca em causa direitos fundamentais como a igualdade, dignidade e
integridade, assim como o direito das meninas e mulheres terem controle sobre a
sua própria vida. Como se as mulheres não pudessem ter direito ao seu próprio
corpo e à sua sexualidade.
Esta violação tem um efeito prolongado no corpo e
condiciona, por conseguinte, toda a vida e autonomia das mulheres. Anula-as, mutilando-as
também como. Esta prática viola um conjunto de direitos humanos fundamentais,
normas e princípios de igualdade de gênero e não discriminação, bem como o
direito inalienável à vida e o direito a ser livre de tortura ou tratamento
cruel, desumano ou degradante.
Esses princípios encontram-se consignados na
Declaração Universal dos Direitos Humanos; na Convenção para a Eliminação de
todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres; na Convenção contra a
Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos e Degradantes; na Carta
Africana sobre Direitos e Bem Estar das Crianças; na Plataforma de Ação de
Pequim; na Carta dos Direitos Humanos e Reprodutivos; no Relatório da Comissão
dos Direitos da Mulher e da Igualdade de Gênero; na Estratégia Europeia para a
Igualdade entre Mulheres e Homens 2010-2015, entre outros.
O respeito e a
sensibilidade para com uma cultura não significam a aceitação de práticas
tradicionais nocivas ou a violação dos direitos humanos fundamentais. A
compreensão das diversas realidades culturais deve levar-nos, em parceria, a
promover o respeito pelos direitos humanos. As culturas não são estáticas mas
dinâmicas, e influenciam e são influenciadas pela mudança, sendo que é essa
mudança que é preciso implementar.
O Dia Internacional da
Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina é observado pela Organização das
Nações Unidas (ONU), anualmente, a 6 de fevereiro, para chamar à atenção para o
fato de mais de 140 milhões de meninas e mulheres, em todo mundo, terem sido
sujeitas a estas práticas violadoras dos direitos humanos.
A Mutilação Genital
Feminina (MGF) refere-se a todos os procedimentos que envolvem a alteração ou
ferimento dos órgãos genitais femininos por razões que não sejam médicas. É
reconhecida, internacionalmente, como uma violação dos direitos humanos das
meninas e mulheres e constitui uma ameaça para a sua saúde, bem-estar e
auto-estima das mesmas, pondo muitas vezes em risco a própria vida. Para
debater a situação e encontrar novas respostas, o Fundo das Nações Unidas para
a População, o Fundo das Nações Unidas para a Infância e outros parceiros
promoveram em Nova Iorque, um evento intitulado "Mobilização para alcançar os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável através da eliminação da MGF até
2030".
A eliminação da MGF tem sido solicitada por inúmeras organizações
inter-governamentais, incluindo a União Africana, a União Europeia e a
Organização para a Cooperação Islâmica, bem como em duas resoluções da
Assembleia-Geral das Nações Unidas. Os 17 Objetivos para o Desenvolvimento
Sustentável, que entraram em vigor para os 193 Estados-membros que adotaram a
Agenda 2030, são outro instrumento onde a comunidade internacional estabelece
propostas para eliminar a MGF. O Objetivo consiste em até 2030, "Eliminar todas as práticas nocivas,
como os casamentos prematuros, forçados e envolvendo crianças, bem como as
mutilações genitais femininas". Esta resposta global chega numa altura em que a
MGF é cada vez mais reconhecida como uma preocupação global: é praticada em
mais de 30 países e tornou-se, também,
uma realidade nas comunidades de diáspora desses países que vivem na Europa,
América do Norte, Austrália e Nova Zelândia.
Boaventura afirma a incontestabilidade dos direitos
humanos como "linguagem de dignidade humana", porém, de plano, questiona essa
validade, principalmente devido ao caráter hegemônico do instituto. Coloca
mesmo, em xeque, a validade dos direitos humanos na forma e sentidos aos quais
lhe emprestam os seus defensores. "A grande maioria da população não é sujeito
de direitos humanos. É objeto de direitos humanos."
Fica bastante claro na citação acima o seguinte problema:
embora grande parte da população mundial sobreviva em níveis, que, conforme
padrões internacionais, estão abaixo dos de pobreza, essas pessoas não são
alcançadas pelos direitos humanos. Do contrário, são massacradas diariamente
através dos meios de comunicação em massa principalmente, em uma época em que a
informação consegue chegar de forma quase que instantânea aos locais mais
remotos do planeta em tempo recorde por publicidade que anuncia um padrão de
vida calcado no consumismo e bem-estar aparente exacerbados. Ora, são pessoas
que vivem um mundo onde apenas uma exclusivo número de endinheirados possui
junto, mais riqueza do que os cerca de oitenta por cento de todo o planeta.
Como bem afirma Boaventura,
essas pessoas não são sujeitos de direitos humanos e sim objeto de direitos humanos. É clara a inquietação
do autor português no seguinte questionamento:
"Deve, pois, começar por perguntar-se se os direitos humanos
servem eficazmente à luta dos excluídos, dos explorados e dos discriminados ou
se, pelo contrário, a tornam mais difícil. Por outras palavras, será a
hegemonia de que goza hoje o discurso dos direitos humanos o resultado de uma
vitória histórica ou, pelo contrário, de uma derrota histórica?" (Santos,
p.15).
A mutilação genital feminina
consiste na remoção total ou parcial dos órgãos genitais femininos, uma prática
presente em meio a vários povos e Estados, muitas vezes sob a defesa de que é
parte da identidade cultural de um grupo de pessoas. Dessa forma, indissociável
dele. A Organização Mundial da Saúde, por sua vez, oferece material suficiente
para a análise dessa prática cultural: o que é, onde ocorre, os motivos, efeitos
e mais. E, para fundamentar esse desestímulo à prática, recorremos à ideia dos
Direitos Humanos (que vem se consagrando em nossos dias), além da consciência
de cultura.
Considerando que os direitos
humanos surgiram no Ocidente, em uma sociedade organizada sobre os princípios
do individualismo, é compreensível que se questione a sua validade universal.
No entanto, será que hoje, com o decurso da história, quando os direitos
humanos já correspondem a um conjunto que vai muito além dos direitos meramente
individuais, não teriam esses direitos realmente uma aplicabilidade em todo o
mundo? Se pensarmos na Organização das Nações Unidas, da qual fazem parte 192
países dos mais diversos matizes culturais, tendo todos se comprometido, entre
outros propósitos, com a proteção dos direitos humanos (Carta da ONU, art. 1),
é possível pensar em um compromisso dos vários povos do mundo em direção a algo
em comum. Sabe-se que no campo da efetivação, entretanto, colocar em prática os
princípios acordados não é tão fácil quanto possa parecer.
Enfim, não é difícil
notar que o conceito evolui e muda tal qual a própria humanidade. Importante
lembrar que no século XVIII apenas o mundo moderno ocidental poderia
compreender a noção de direitos humanos, hoje se busca pensar esta ideia da
forma mais abrangente possível para que as diferentes culturas sejam
contempladas. Para tanto, há a necessidade de um fundamento dos direitos
humanos que seja passível de ser encontrado em todas as culturas, uma base
geral e abstrata para que sua aplicação concreta seja possível e desejável em
todos os lugares do planeta.
Como veremos, parece que fundar os direitos
humanos na dignidade humana ainda é o que pode tornar os direitos humanos
legítimos e emancipatórios nas mais diversas concepções de sociedade, sendo
para isso relevante verificar-se qual a posição do ideal de universalidade dos
direitos humanos dentro de um período em que a globalização deixa mais visível
a diversidade cultural existente – entre Estados e dentro deles. Assim, é
imprescindível rediscutirmos os limites em que o interculturalismo e os
direitos universais podem coexistir.
Nesse contexto, então, surge a
problemática da Mutilação Genital Feminina. Esta prática cultural tem levado a
conflitos entre alguns pontos de vista, entre eles os que ensejam estar o igual
valor das culturas acima do que outros consideram valores universais. Essa
conduta, contudo, aponta para um relativismo moral e cultural capaz de
legitimar a extirpação da dignidade alheia em nome do multiculturalismo quando
laçamos um "olhar Humano" sobre o que é
essa prática cultural e suas consequências dentro da sociedade.
A Mutilação Genital Feminina,
de acordo com o site da Organização Mundial da Saúde (OMS), trata-se de “todas
as intervenções que envolvam a remoção parcial ou total dos órgãos genitais
femininos externos ou que provoquem lesões nos órgãos genitais femininos, por
razões não médicas”. Esses procedimentos não trazem nenhum benefício para a
saúde e, sobretudo, ainda prejudicam a mulheres e garotas de variadas formas.
São quatro tipos principais que
a OMS classificou:
I) clitoridectomia, ressecção parcial ou total do clitóris
e, em casos menos frequentes, apenas do prepúcio;
II) excisão, ressecção
parcial ou total do clitóris e lábios menores, com ou sem excisão dos lábios
maiores;
III) infibulação, estreitamento da abertura vaginal para criar uma
vedação por meio do corte e reposicionando os lábios menores ou maiores, com ou
sem ressecção do clitóris;
IV) outros, que podem ser todos os outros
procedimentos lesivos à genitália feminina para fins não médicos, tais como a
perfuração, a incisão, raspagem a cauterização da área genital.
Sobre a terminologia desse
procedimento, em geral, houve mudanças. A princípio, quando começaram as
discussões sobre o assunto, usou-se a expressão "circuncisão feminina". Porém,
isso provocava uma analogia precipitada com a circuncisão masculina e, como
resultado, acontecia uma confusão no entendimento desses diferentes
procedimentos. É nos anos 70, do século passado, que começam a denominar como
Mutilação Genital Feminina, com intento de realçar a violação causada às
mulheres e crianças.
Não se tem clareza quanto à
origem dessa prática, porém se estima que ela já seja praticada há 3000 anos no
Egito. Ao passar do tempo, com a imigração, isto começou a se passar em países
diferentes dos países em que é natural. Dessa forma, torna-se claro que não se
trata apenas de um problema local, isolado.
Não há consenso sobre sua
origem e manutenção prática, sendo o costume e a tradição as razões comumente
utilizadas para justificar a mutilação genital feminina, conforme Dulce de
Queiroz Piacentini frisou:
[...] sua origem remonta a
tempos anteriores ao do surgimento da religião muçulmana. Não está claro,
contudo, quando ou onde a prática iniciou. Alguns autores sugerem que foi no
Antigo Egito. Outros dizem que a MGF é um velho ritual africano que chegou ao
Egito por difusão. Há ainda quem levante a hipótese de a prática ter sido
aplicada nas mulheres negras à epoca do velho mercado árabe de escravos ou de
que ela tenha sido introduzida quando o Vale do Nilo foi invadido por tribos
nômades cerca de 3.100 a.C. [...] Existem diversas crenças a manter a prática
da MGF. Diz-se que os homens a quiseram pelas seguintes razões: assegurar seus
poderes; acreditar que suas mulheres não iriam procurar outros genitores ou que
homens de outras tribos não as violariam; crer que as mulheres perderiam o
desejo sexual. Em algumas tribos, acredita-se que o clitóris é diabólico e que
se tocar na cabeça da criança durante o parto, ela estará condenada a
inimagináveis desgraças. Outros pensam que essa falsa representação de um pênis
minúsculo faria sombra à virilidade masculina (PIACENTINI, 2007, p. 120).
Estima-se que são mais de 100
milhões de mulheres e crianças que já passaram pelos procedimentos I, II ou
III, em todo o mundo. Na África, o número das que correm o risco de se submeter
a um destes procedimentos é de 3 milhões por ano. Há relatado em 28 países da
África e em vários da Ásia e do Oriente Médio. Assim como também há relatado em
outros países, como em grupos étnicos da América Central e América do Sul. Para
maior horizonte, ainda que não possamos ter precisão pela falta de
documentação, dados demográficos e de serviço de saúde vêm a indicar que as mulheres
e crianças que vivem fora de seus países de origem podem vir a aumentar estes
números.
A idade média em que costumam
passar por esse procedimento é entre os 4 e 14 anos, período em que não há um
discernimento pleno sobre o que se trata, sendo introduzidas por um membro mais
velho da comunidade (geralmente mulher). Vale frisar, também, que esta prática
é feita, normalmente, em comunidades patriarcais e religiosas, em que as
famílias e seus respectivos chefes possuem forte poder sobre as decisões da mulher
ou criança, valendo-se de valores morais e religiosos perpassados
culturalmente.
A MGF, em algumas comunidades
em que é praticada, está associada a cerimônias em que se costuma ser dados
presentes, dinheiro e comida. Ou seja, são usados meios para afirmar que a
pessoa está adotando uma conduta desejada pelos outros.
As formas utilizadas para
incentivar as mulheres e crianças a passarem pelo procedimento de mutilação são
de ordem sociocultural, higiene/saúde, espiritualidade/religião ou
psico-sexuais.
Os incentivos socioculturais partem da ideia
compartilhada de que a moça não se tornará mulher enquanto não passar pelo
procedimento, o que a impede de conviver com as outras garotas do seio de sua
comunidade. Existem também os que acreditam que, na hora do parto, a mulher não
“circuncidada” pode cegar quem a estiver auxiliando. Entre outras, há também a
ideia de que ela pode provocar a morte do recém-nascido ou do marido.
Acredita-se, ainda, que a mutilação possa assegurar a virgindade da mulher, sem
qual não poderá se casar.
A MGF também possui um apelo à
higiene, pois os órgãos genitais externos (femininos) são considerados sujos.
Como toda sujeira, eles devem ser removidos. Acrescenta-se a isso a crença de
que, ao manter o clitóris intacto, este poderá crescer (assemelhando-se a um
pênis). A mulher que se submete a esse procedimento, contudo, poderá ter
benefícios como filhos mais bonitos – de acordo com o senso comum da
comunidade.
Por sua vez, existem os motivos
religiosos. Acredita-se que, ao passar pelos procedimentos de mutilação
genital, a mulher será espiritualmente limpa. Estará mais a par do que Deus
quis. Isto, porém, não está expresso em nenhum dos livros sagrados das
comunidades em que há essa prática cultural. Exemplos disso são Bíblia e Corão.
Nenhuma religião promove ou
condena a MGF. Ainda assim, mais de metade das meninas e mulheres de 4 dos 14
países em que há dados disponíveis, acreditam que a MGF é uma exigência
religiosa. Por esta razão, uma estratégia efetiva para acabar com a MGF passa
por trabalhar com os líderes religiosos
O outro incentivo diz respeito
ao campo psicossexual, em que o senso comum das comunidades afirma que a
mulher, ao não passar pelo processo de mutilação genital, alimenta desejos
sexuais incontroláveis. Dessa forma, ela se encaminha a perder sua virgindade
(pré-requisito para o casamento) prematuramente. Outro ponto a favor seria que,
com a infibulação, o prazer sexual masculino seria maior por causa do
estreitamento do orifício vaginal. Prevenir-se-ia a infidelidade e os
divórcios.
A OMS juntamente com outros
órgãos, como a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia,
posiciona-se firmemente contrária a esse tipo de prática, que causa os mais
variados danos às mulheres.
Como normalmente são os membros
da própria comunidade que introduzem a mulher aos procedimentos de mutilação,
não costuma estar presente a figura do profissional da saúde. A exceção, no
caso, seria o Egito, onde foi estimado que 61% dos casos foram assistidos por
profissionais da saúde no ano 2000. Dessa forma, parte das mulheres não tem
acesso a elementos básicos, como anestesia, sendo o procedimento feito com ela
em posição ginecológica. Ocorre isso na grande parte dos sítios rurais. Com
isso, não obstante há casos de traumas e fraturas ósseas. Como também não há
esterilização dos instrumentos utilizados, para cada caso, pode ocorrer
transmissão de HIV ou até morte. Normalmente é recomendado algum tempo de
repousa para a cicatrização ou, às vezes, fazer um ligamento do tornozelo às
ancas.
A partir dos estudos publicados
pela OMS, sabe-se que as consequências da MGF são várias, sendo elas de curto,
médio e longo-prazo, que muitas vezes se estendem a complicações de ordem
psicossocial.
De imediato, são notados que as
complicações são dores intensas, choque, hemorragia, tétano, septicemia,
retenção de urina, feridas abertas na região genital e lesões no tecido genial
nas proximidades. Posteriormente, a longo-prazo, pode acontecer ainda mais
consequências, tais como infecções urinárias recorrentes, cistos, esterilidade,
aumento do risco de complicação no parto e morte de recém-nascidos, necessidade
de novas intervenções cirúrgicas, quando, por exemplo, o processo de selagem ou
estreitamente (tipo 3, mencionado anteriormente) deve ser corrigido para permitir
relações sexuais ou parto. Contudo, em alguns casos volta a se fechar,
necessitando de sucessivas intervenções, aumentando os riscos.
As complicações psicossociais,
por sua vez, atuam de diversas formas. É um ato realizado, normalmente, em
crianças não informadas. São estas intimidadas por familiares e pessoas de seu
ciclo mais próximo, como os pais e amigos. Também, não muito raro, existe a
obrigação para assistir à Mutilação Genital Feminina de outras crianças, o que
acaba gerando fortes problemas psicológicos para ela. Algo que ficará marcado
no seu desenvolvimento. É uma situação, para alguns, marcada pela submissão,
inibição e supressão de sentimentos. As
menstruações, posteriormente, são relatadas como tão dolorosas quanto o
procedimento da MGF. Ainda há as mulheres que, pelo pesar que fora passar por
essa prática, muitas vezes nem conseguem relembrar. Mostram-se, estas, em
estado de tristeza profunda e dor emocional.
Tendo em vista o cuidadoso
estudo elaborado sobre o que é a MGF, como ocorre e suas consequências –
bastante nocivas –, faz-se possível começarmos a discutir qual a função dos
Direitos Humanos diante dessa prática cultural. Partindo das explicações no que
dizem respeito ao procedimento e às circunstâncias, fica evidente, desde a primeira
vista, que a MGF viola uma série de princípios, padrões e normas que estão
legalmente expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que tem como
fundamento supremo o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana – cujos
valores-base são liberdade, igualdade, segurança e solidariedade.
Sabe-se que os direitos
humanos, após sua consolidação no século XVIII, passaram por transformações no
sentido de que novas lutas foram agregando novos direitos ao conjunto.
Se, a
princípio, falar de direitos humanos significava tratar apenas de direitos
civis e políticos, hoje tal denominação abarca também direitos sociais,
direitos difusos – como o direito ao meio ambiente – e direitos coletivos – por
exemplo, os direitos da mulher. Todavia, não obstante já terem passado mais de
dois séculos do seu "nascimento"– cujo marco a história ocidental assenta na
Revolução Francesa, de 1789 – sequer os direitos humanos ditos de primeira
dimensão foram totalmente efetivados. Ainda que tais direitos sejam
caracterizados como universais, isto é, pertencentes a todos os seres humanos,
observa-se o desrespeito a direitos mais básicos – como o de não sofrer
tratamento cruel ou degradante, para citar um – em várias partes do planeta.
Algumas vezes esse desrespeito provém de afronta à própria lei que consagra os
direitos. Outras vezes, eles acabam sendo violados por uma questão cultural, ou
seja, por práticas culturais que, malgrado sejam exercidas há tempos e sejam
aceitas por boa parte de seus praticantes, coíbem o desenvolvimento integral da
pessoa, ferindo a dignidade humana e, por isso, constituindo uma ofensa aos
direitos humanos.
Questionar a universalidade dos
direitos humanos é perguntar sobre o seu fundamento. Embora Norberto Bobbio
tenha asseverado que "o problema fundamental em relação aos direitos do homem,
hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los".
Em relação à dignidade humana,
podemos dizer afirmar que qualquer indivíduo deve ser tratado como centro e fim
das ações. Em contrapartida, observa-se agressão a dois itens supramencionados
(liberdade e igualdade). As garotas, por exemplo, têm a sua liberdade
violentada na medida em que são intimidadas a passar pela MGF. Importante
aludir que elas, normalmente, são sujeitas a esse procedimento bastante jovens
e, em sua maior parte, não possuem informações sobre as consequências dela. Tal
desconhecimento as priva de autonomia e da possibilidade de possuir um projeto
de vida próprio. A igualdade, por sua vez, também é completamente ferida. São
sociedades patriarcais, em que os homens têm quase total poder sobre as
decisões das mulheres. Isto é visível quando observamos os motivos pelos quais
tais práticas foram mantidas até os atuais dias, ressaltando a desigualdade de
gênero existente.
Quando analisamos a MGF à luz
das gerações (ou dimensões) dos Direitos Humanos, podemos retirar as seguintes
conclusões:
Na primeira geração, que
compreende os direitos civis, políticos e as liberdades clássicas, há violento
ataque à integridade física e moral, fato impossível de ignorar. As mulheres e
crianças que passam pelo procedimento têm seu corpo danificado, sem nenhuma
razão médica, rasão pela qual passam a não usufruir dele de maneira plena. Tais
prejuízos, físicos e psicológicos, limitam ou impedem a vida sexual , e, em
muitas das vezes, enfrentam a impossibilidade para a maternidade. Nessa
geração, além de várias outras, inclui-se ainda a já mencionada violação à
liberdade.
Na segunda geração, em que se
compreende os direitos econômicos, sociais e culturais, verifica-se a ofensa ao
direito à saúde, uma vez que os procedimentos de MGF trazem inúmeras
consequências nocivas a curto e longo-prazo por não contar com as menores
observações acerca de higiene no procedimento.
As mulheres são sujeitas à infecções e dores lacinantes, somando-se ao
fato de não serem orientadas com informações básicas sobre o procedimento e
cuidado especializado após a mutilação.
A MGF, por atentar contra
direitos essenciais do ser humano, tais como a liberdade, não discriminação por
gênero, saúde, etc., é reconhecida como uma prática cultural nociva aos
Direitos Humanos. Vale lembrar que estes, na sua condição de inalienáveis, não
podem ser tirados por outros, nem podem ser cedidos voluntariamente por
ninguém, além de que eles não podem ser suprimidos com o objetivo de promover
outros, o que garante a característica da indivisibilidade dos Direitos
Humanos.
Dessa forma, mesmo que haja,
eventualmente, uma concordância da mulher para com a prática, é necessário
fazer com que a indivisibilidade dos Direitos Humanos se sobressaia, pois
razões de índole social e cultural não podem ser evocadas em defesa da MGF, já
que direitos fundamentais estariam sendo suprimidos. É por esta razão que o
Direito Internacional, mesmo protegendo os direitos à participação na vida
cultural e liberdade religiosa, estipula limitações a esses direitos e
liberdade justamente para garantir a dignidade e liberdade dos outros.
Há ainda, para apoiar a
fundamentação da universalidade dos direitos, a perspectiva de Perces-Barba.
Ele defende que a universalidade dos direitos tem a finalidade de combater as
relações de desigualdade existente, pois são estas que dificultam a vivência
daquela na prática. Podemos perceber isso, por exemplo, quando não são dadas as
mesmas condições para mulheres e crianças, que têm dificuldade em ter acesso
aos seus direitos.
Esses direitos estão elencados
e têm o apoio de vários tratados internacionais e regionais. São resguardados
por um Sistema Global de Proteção. Por meio de conferências e convenções
mundiais, são complementados por vários documentos oriundos de um consenso
político, a exemplo dos feitos pelas Nações Unidas.
O apoio também tem acontecido
de maneira explícita em favor da mulher e criança, objetos dessa prática
cultural indesejada, em tratados internacionais, como “Convenção sobre a
Eliminação da Discriminação contra as Mulheres” e “Convenção sobre os Direitos
da Criança”, em tratados regionais, como a “Carta Africana sobre Direitos
Humanos e dos Povos” e “Protocolo sobre o Direitos da Mulher em África”, e em
documentos de consenso, tais como “Declaração de Beijing” e “Declaração
Universal da UNESCO sobre Diversidade Cultural”.
Um dos grandes desafios
enfrentados pelos direitos humanos hoje, entretanto, é sustentar sua
universalidade frente ao desponte das mais diversas culturas. O mundo sempre
foi heterogêneo e a diversidade cultural sempre foi uma realidade. Contudo, a
intensificação da globalização econômica ocorrida na segunda metade do século
XX contribuiu para que a diversidade cultural despontasse como um dilema a ser
discutido nas arenas política, jurídica, social e econômica.
A ideia do Estado moderno,
homogêneo, com tônica na igualdade dos seus cidadãos, está em xeque. O
desenvolvimento das tecnologias de modo geral e das tecnologias de informação e
a mobilidade fruto desse processo contribuíram consideravelmente para gerar
Estados cada vez mais multiculturais.
Nesse contexto, a corrente
relativista vem a polemizar ainda mais a questão. Segundo os defensores dessa
corrente, cada cultura é fruto de uma história e um contexto distintos no qual
são levadas a adotar posturas diferentes para tratar seus assuntos. Dessa
forma, incorre-se na ideia de que não cabe a ninguém julgar uma cultura
diferente nem qualquer de suas práticas. Mas é preciso levantar o problema que
dessa corrente surge: mesmo que uma comunidade esteja dominada por práticas
desumanas, que tendem à degradação da dignidade da pessoa humana, as demais
sociedades serão obrigadas a se omitirem na assistência das pessoas violadas.
Do outro lado, há a corrente
universalista. Esta propõe que os valores fundamentais são essenciais a cada
pessoa e, portanto, deve ser defendido independente da cultura a qual esta
pertença. A crítica que se faz, porém, é que essa corrente iria provocar uma
“ocidentalização”, ou seja, iriam impor valores ocidentais para as demais
culturas. Os críticos da corrente universalista, portanto, acreditam que os
direitos humanos estariam fechados ao diferente. Contudo, é preciso frisar que
essa não é a postura adotada nesse trabalho. O que se pretende é a construção
do diálogo entre as diferentes culturas, com o aprendizado recíproco.
Como nos ensina Boaventura de
Sousa Santos, a primeira premissa para uma transformação é "a superação do
debate sobre universalismo cultural". Ambas as correntes possuem suas falhas
intrínsecas, não podendo nenhuma alçar por si só uma solução efetiva para os
problemas enfrentados pelos direitos humanos. Uma das propostas a solucionar
parte desse problema é "propor diálogos interculturais sobre preocupações
isomórficas".
Somente ao olhar para as
semelhanças existentes entre as culturas, pode-se chegar a um consenso. Não são
elas seres totalmente alheios, mas que compartilham preocupações da mesma
forma. Há, a exemplo, a preocupação com a família, com a segurança, nas mais
diversas culturas. A partir disso, é possível manter o diálogo na busca de uma
resposta mais adequada aos anseios de cada parte.
A globalização gera o temor da
homogeneização e as reações a esse processo trazem à tona as diferentes
identidades e culturas, que clamam ser respeitadas. Por outro lado, algumas
práticas culturais, embora pertencentes a culturas bastante preciosas e ricas,
acabam reprimindo o desenvolvimento integral da pessoa humana
Um dos grandes problemas
enfrentados é fechamento das culturas à crítica. Nenhuma é isenta de erros. O
processo que temos, em cada uma, é de dinamismo. Ocorrem mudanças por fatores
internos e externos, o que não as torna um objeto estático, impassível de
reforma.
Quando se condena a MGF, não se
está condenando a cultura. É importante salientar que essa prática nociva não
descaracterizaria a cultura das comunidades em que é praticada, estas que
provavelmente até possuem muitas coisas que poderíamos aprender. O que se
condena, portanto, é tão somente o ato que violenta de maneira nítida os
direitos humanos, sem que a cultura seja descaracterizada.
Somente com os ideais dos
direitos humanos, inclusive, é possível mantermos o multiculturalismo. Não
seria possível a coexistência dessas diferentes culturas caso não houvesse
valores compartilhados, de maneira que uma não visse na outra objeto de
preocupação. Essa coexistência seria, nesse caso, insustentável, levando ao
confronto delas entre si.
Registre-se que mesmo num
contexto tão plural, reivindicações em prol de direitos humanos universais
ocorrem em diferentes partes do mundo.
Por outro lado, a globalização econômica
com a conseqüente hegemonia do mercado capitalista mundial gera o temor de
homogeneização.
Diante disso, seria possível defender a existência de direitos
humanos universais? Apesar dos diversos modos de vida e das variadas maneiras
de ver o mundo, o fato de sermos todos humanos implica haver algo em comum
entre nós. Até a antropologia, que lida com questões relativas aos diferentes
costumes e sociedades, tem representantes que admitem a existência de valores
comuns.
Como vimos, no que concerne aos direitos humanos, vislumbra-se
inclusive um núcleo mínimo intangível, que corresponderia àqueles direitos que,
embora não de forma absoluta, são encontrados em todos os patrimônios culturais
e sistemas sociais: o direito à vida; o direito a não sofrer tortura nem pena
ou tratamento cruel, desumano ou degradante; o direito de não ser reduzido à
escravidão ou servidão; o direito à não-retroatividade da lei penal. Ao
sustentar que os direitos humanos devem servir como marco a partir do qual a
diversidade cultural pode se manifestar, é comum deparar-se com o
contraargumento de que os direitos humanos pertencem à cultura ocidental e,
portanto, defender sua prevalência acaba sendo qualificado como um ato de
imperialismo cultural.
Ora, já é tempo de libertar os direitos humanos de sua
origem. O episódio de terem ‘nascido’ em uma cultura específica não implica
ficarem presos aos limites dessa procedência.
Além disso, o individualismo
presente nos direitos humanos – pelo fato de que quem possui direitos
geralmente é o indivíduo –, tão criticado por culturas mais comunitaristas, vem
adquirindo uma dimensão social e hoje já há também direitos humanos
pertencentes a coletividades e à humanidade como um todo.
Outro fator que
corrobora a desvinculação dos direitos humanos do Ocidente é o evento de que
grupos oprimidos nas mais distintas sociedades "levantam a bandeira" dos
direitos humanos à hora de lutar contra a opressão. Igualmente há que se
superar a conexão ‘direitos humanos – liberalismo’, que é um forte elemento a
mantê-los associados à cultura ocidental. É imprescindível destacar o fato de
direitos humanos serem advogados por intelectuais de culturas diversas à do
Ocidente.
É imprescindível destacar o
fato de direitos humanos serem advogados por intelectuais de culturas diversas
à do Ocidente. Chamam a atenção, em especial, os estudiosos muçulmanos, alguns
dos quais afirmam que os direitos humanos são uma cultura de todas as culturas,
ou expõem claramente que os valores-base desses direitos – dignidade humana,
liberdade, igualdade – podem estar em diferentes sistemas culturais.
Ainda nos defrontamos com outra
indagação: como estabelecer um limite entre aquilo que é cultura e deve ser
respeitado e o que "se veste" de cultura para mascarar opressão, desigualdade,
dominação? Um primeiro critério que despontou nesta pesquisa foi o da dignidade
humana. Derivando esta das qualidades peculiares e intrínsecas ao seres humanos
– sua capacidade de pensar, raciocinar, usar a linguagem para se comunicar,
capacidade de escolha, de fazer julgamentos, de sonhar, de imaginar projetos de
vida e de estabelecer com os seus semelhantes relações pautadas por critérios
morais –, cheguei à conclusão de que práticas culturais que coíbam ou
enfraqueçam tais capacidades não são emancipadoras e, portanto, merecem ser
erradicadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A comunidade internacional
comprometeu-se com o fim de todas as formas de Mutilação Genital Feminina no
tempo de uma geração e com a prestação de cuidados de qualidade para todas as
meninas e mulheres que tenham sido submetidas a esta prática. A erradicação da
prática da MGF é um elemento fundamental na criação de um mundo em que os
direitos humanos de todas as mulheres e meninas são totalmente respeitados.
Eliminar a MGF vai contribuir
para a realização de muitos dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que
estão interligados, nomeadamente os relacionados com a saúde e bem-estar,
educação de qualidade, igualdade de gênero, trabalho decente e crescimento
econômico. Desencadear todo o potencial das meninas e mulheres é também crucial
para a realização de um "dividendo demográfico" em países onde um
impulso econômico é agora possível, devido à diminuição da fertilidade e uma
maior proporção de pessoas em idade ativa.
O Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA, no
acrônimo em Inglês) e o Fundo das Nações Unidas para as Crianças (UNICEF, no
acrônimo em Inglês) lideram o maior programa global de aceleração do abandono
da MGF.
O programa centra-se em 17 países de alta relevância (Burkina Faso,
Djibouti, Egito, Etiópia, Eritreia, Gâmbia, Guiné, Guiné-Bissau, Quénia, Mali,
Mauritânia, Nigéria, Senegal, Sudão, Somália, Uganda e Iémen), bem como em
iniciativas regionais e globais.
O Programa Conjunto funciona através de
políticas que institucionalizem a eliminação da MGF, através de serviços de
saúde de alta qualidade que atendam às necessidades das meninas e mulheres que
sofrem as consequências desta prática e através do aumento da aceitação do
abandono da MGF como uma norma social. Mudar as normas sociais e o
comportamento típico passa por educar as comunidades sobre os direitos humanos
e as consequências físicas, psicológicas e legais da prática da MGF. Um
entendimento partilhado de que as meninas não devem nunca ser submetidas à MGF
é a chave para uma mudança sustentável. A esse respeito, as decisões coletivas
e públicas para acabar com a prática marcam um momento importante no processo
de mudança social, indicando que a prática não é mais aceite nessa comunidade.
Ao término, cabe citar a Declaração conjunta da OMS/
UNICEF/ UNFPA, de 2008 sobre Mutilação genital feminina:
Apesar de certas práticas culturais poderem
aparecer sem sentido ou destrutivas de um determinado ponto de vista, têm
significado e um objectivo para quem as pratica. Contudo a cultura não é
estática. É um constante fluxo que se adapta e reforma. As pessoas mudarão os
seus comportamentos quando entenderem os malefícios e a indignidade dessas
práticas nocivas e quando compreenderem que é possível abandonar esses
comportamentos sem colocar em causa os aspectos primordiais das suas culturas.
Este é o compromisso do Governo Português para combater e eliminar práticas
nocivas como a Mutilação Genital Feminina.
REFERÊNCIAS
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culturais como factores de violação dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.angop.ao/angola/pt_pt/noticias/sociedade/2015/3/17/html.
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WOLKMER, Antônio Carlos (Org.). Os ‘Novos’ Direitos no Brasil –
natureza e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2003;
POR KELLY CRISTINA LIMA MARTINS
-Bacharela em Direito pela Faculdade Maurício de Nassau/PB;e
-Pós graduada em criminologia e psicologia investigativa criminal pela UNIPÊ/PB;
Nota do Editor:
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