Nos últimos cem anos, o Efeito Flynn demonstrou um aumento contínuo nos escores de QI de geração para geração. Este fenômeno, nomeado em homenagem ao pesquisador James Flynn, foi observado em diversos países e atribuído a fatores como melhor nutrição, educação mais acessível e estímulos cognitivos mais ricos. Em outras palavras, cada geração, com suas melhorias socioeconômicas e educacionais, tornou-se naturalmente mais inteligente que a anterior.
Contudo, há evidências recentes que sugerem uma reversão dessa tendência. Pesquisas realizadas em diversos países, incluindo Noruega e Dinamarca, indicam que o QI das gerações mais jovens pode estar diminuindo em comparação com seus predecessores. Essa descoberta levanta preocupações sobre os fatores que podem estar contribuindo para essa mudança.
A Superexposição às Telas e o Declínio do QI
Uma das causas mais prováveis para essa diminuição do QI é a superexposição às telas. Michel Desmurget, em sua obra "A Fábrica de Cretinos Digitais", argumenta que o uso excessivo de dispositivos digitais tem um impacto negativo significativo no desenvolvimento cognitivo das crianças e adolescentes. Desmurget destaca que a interação constante com telas pode reduzir a capacidade de atenção, memória e habilidades linguísticas, que são cruciais para o aprendizado e a compreensão.
O Processo de Aprendizagem e a Necessidade de Concentração
O processo de aprendizagem exige que o indivíduo coloque sua atenção em um objeto e se dedique a ele para que possa compreendê-lo verdadeiramente. Este ato de "inteligir", ou seja, compreender profundamente um objeto ou conceito, requer tempo e concentração. Outro fator importante para a aprendizagem é a memória que é adquirida ao longo deste processo. No contexto educacional, é essencial que os alunos possam se debruçar sobre um assunto por um período prolongado, permitindo uma assimilação profunda e significativa.
Entretanto, a proliferação de dispositivos digitais e o uso frequente de telas têm prejudicado essa capacidade. A exposição constante a estímulos digitais fragmentados e de curta duração pode levar à diminuição da capacidade de concentração e ao desenvolvimento de hábitos de atenção superficial e diminuição da memória. Isso compromete a habilidade dos estudantes de se envolverem profundamente com o material de estudo, impactando negativamente seu processo educacional e de formação. E pode levar a um desenvolvimento menor de sua inteligência.
O Desafio da Educação na Era Digital
Diante desse cenário, surge a pergunta: é possível formar crianças afastadas dessas tecnologias? Embora seja um desafio significativo, especialmente em um mundo cada vez mais digitalizado, é possível adotar estratégias para minimizar os efeitos negativos da superexposição às telas. Isso inclui:
Limitar o Tempo de Tela: Estabelecer limites claros para o uso de dispositivos digitais, incentivando atividades offline que promovam a concentração e o desenvolvimento cognitivo.
Promover Atividades Físicas e Criativas: Encorajar a participação em atividades físicas, artísticas e lúdicas que não envolvam telas, promovendo o desenvolvimento de habilidades motoras e criativas.
Educação sobre o Uso Consciente da Tecnologia: Ensinar crianças e adolescentes sobre o uso consciente e equilibrado da tecnologia, destacando os benefícios e os riscos associados ao seu uso excessivo.
Incentivar a Leitura e a Literatura: A leitura de livros literários é uma ferramenta poderosa para educar a imaginação e ajudar na concentração. A literatura exige que o leitor se dedique ao texto, compreendendo a narrativa e os personagens, o que promove a habilidade de focar e interpretar informações complexas.
Conclusão
A superexposição às telas representa um desafio significativo para o desenvolvimento cognitivo e a capacidade de compreensão das gerações mais jovens. É fundamental que professores, pais e responsáveis estejam atentos aos impactos dessa exposição e adotem estratégias para promover um ambiente de aprendizagem que favoreça a concentração e o entendimento profundo. Ao questionar se é possível formar crianças afastadas das tecnologias, devemos considerar não a exclusão completa, mas o uso equilibrado e a partir de uma certa idade sobre essas ferramentas, garantindo que o desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças não seja comprometido.
Diante disso, cabe a nós refletir: Como podemos integrar a tecnologia de forma saudável e produtiva no processo educacional, garantindo que as futuras gerações alcancem todo o seu potencial cognitivo? Além disso, como podemos incentivar o uso da literatura como uma ferramenta fundamental no desenvolvimento da concentração e da imaginação?
Algumas fontes utilizadas:
Entrevista com Michel Desmurget https://www.bbc.com/portuguese/geral-54736513 (Acessado em 10/07/2024)
Artigos científicos sobre o tema:
Effects of Excessive Screen Time on Neurodevelopment, Learning, Memory, Mental Health, and Neurodegeneration: a Scoping Review - Internacional Journal of mental health:
https://link.springer.com/article/10.1007/s11469-019-00182-2 (Acessado em 10/07/2024)
Screen Time and the Brain-News & Research:
https://hms.harvard.edu/news/screen-time-brain (Acessado em 10/07/2024)
A educação da Imaginação por meio da literatura:
http://repositorio.ufla.br/jspui/bitstream/1/38548/1/DISSERTA%C3%87%C3%83O_A%20educa%C3%A7%C3%A3o%20da%20imagina%C3%A7%C3%A3o%20por%20meio%20da%20literatura.pdf (Acessado em 10/07/2024)
* FÁBIO DA FONSECA JÚNIOR
-Graduado em Filosofia e História
-Mestre em Educação
-Professor da Rede Pública e Privada do Estado de Minas Gerais