quinta-feira, 17 de abril de 2025

A Colação e os devidos cuidados


 Autora: Denise Tusato (*)

Nunca se falou tanto sobre planejamento sucessório como nos últimos anos. Nada contra, afinal, muito melhor prevenir e estruturar uma sucessão do que imaginar que os herdeiros podem ficar anos brigando na justiça enquanto um patrimônio construído com esmero e suor foi se deteriorando em meio a uma guerra pela herança.

Mas verdade seja dita: mais se fala do que se pratica. A resistência de pensar na própria morte ainda é bastante grande na nossa cultura.

Ainda assim, as formas mais comuns e mais praticadas, até por serem mais acessíveis financeiramente, são a doação em vida e o velho e conhecido testamento.

Mas tem uma figura jurídica que pouca gente conhece e que pode ser uma pedra no sapato de quem recebeu uma doação: a colação.

A colação é uma exigência que a lei faz para que os descendentes, quando na qualidade de herdeiros, e os cônjuges na qualidade de herdeiros concorrentes, tragam à sucessão todos os bens recebidos em doação pelo falecido.

É uma espécie de prestação de contas do que já recebeu do falecido.

A ideia do legislador é de que os descendentes devem receber partes idênticas da legítima. Logo, se recebeu uma doação anterior, ela é considerada adiantamento da legítima. (art. 544 CC)

O problema é que esse bem vai ser calculado pelo valor atual, ou seja, da abertura da sucessão (art. 639 § único do CPC). O valor atualizado vai ser acrescido da legítima e refeita e distribuição entre todos os herdeiros de forma absolutamente igualitária.

Em outras palavras, se houver patrimônio suficiente no acervo hereditário para que todos saiam com partes iguais e quem recebeu essa doação não tenha que devolver nada, ótimo! Mas existem casos em que quem recebeu essa doação vai precisar restituir valores para o espólio e é aí que mora o perigo.

Vale lembrar que o legislador se preocupou com os descendentes, que são herdeiros necessários. Os ascendentes, embora herdeiros necessários não têm o dever de colacionar, e o cônjuge, apenas em relação ao direito concorrencial porque é a única situação em que ele é herdeiro necessário ao lado de outros herdeiros necessários. Nas demais situações ou ele não herda e é apenas meeiro, ou é herdeiro universal, o que também não impacta em nada.

O descendente que renuncia a herança ou é deserdado não fica de fora dessa obrigação. Também está obrigado a colacionar qualquer doação que tenha recebido em vida do ascendente para igualar as legitimas. (art. 2008 CC)

Já o herdeiro testamentário não tem esse dever.
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Uma observação importante: o dever de colacionar é do descente apenas quando na qualidade de herdeiro. Exemplo. Se um neto recebe uma doação de um avô enquanto o pai dele (filho desse avô) está vivo, ele é um descendente, mas não ostenta a qualidade de herdeiro desse avô, então ele não terá o dever de colacionar essa doação recebida caso o avô venha a falecer. Mas se por acaso, quando esse mesmo neto recebeu essa doação do avô o seu pai (filho desse avô) já era falecido, aí esse neto ostenta a qualidade de descendente e herdeiro por representação do pai pré-morto, e aí terá o dever de colacionar essa doação recebida.

Outra questão importante é que o valor dessa colação será acrescido da parte indisponível.

Aí surge uma questão importante: e se o herdeiro não trouxer essa informação ao inventário? Se ele sonegar essa informação?

Se o herdeiro não trouxer essa informação, ele faltará com a verdade, e corre o risco de ser surpreendido com uma Ação de Sonegação onde muito provavelmente será condenado a restituir o bem ao espólio ou até perdê-lo por completo.

Uma saída importantíssima, em casos de doações é ficar atento aos valores. Se o valor do bem ou o numerário que se quer doar está dentro do teto autorizado pela lei, 50% do patrimônio total caso tenha herdeiros necessários, faça constar uma cláusula expressa na escritura de doação de que esse bem está saindo da parte disponível do doador, e que o donatário, portanto, está dispensado da colação. (art. 2005 do Código Civil)

Se a doação for de valores, que obviamente não tem escritura, coloque essa cláusula de forma expressa no testamento, assim evita problemas futuros para o donatário e as fatídicas brigas entre irmãos. (art. 2006 do CC)

Essa simples, mas importantíssima providência muda por completo a situação. Com isso quem recebeu a doação fica desobrigado a colacionar porque fica consignado que o que recebeu saiu da parte disponível do acervo hereditário e os demais herdeiros não poderão reverter a situação.

Ainda assim, é importante realmente respeitar os limites da lei no sentido de não extrapolar os 50% estipulados como disponíveis. Qualquer excesso será considerado uma doação inoficiosa e aí novamente esse donatário terá problemas e terá que devolver ao espólio esse excesso. (art. 2007 CC)

Conclusão, planejamento sucessório é coisa séria. Não pode ser tratado como modismo que qualquer um sabe e qualquer um faz. Se é para tomar medidas preventivas e evitar os famosos litígios familiares por herança, que seja bem feito para realmente evitá-los e não apenas mudar o endereço da guerra.

*DENISE TUSATO















.- Graduada pela PUC/SP (1993);

- Especializada em Direito de Família pelo  Centro de Extensão Universitária - CEU (1998);

-Pós Graduada em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale ( 2017);

-Pós Graduação em Direito Sistêmico pela EPD ( 2024);

-Advogada Civilista, atuante na área de Família e Sucessões;

-Mediadora certificada pelo CNJ( 2020)

Instagram: @dra.denisetusato

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

quarta-feira, 16 de abril de 2025

Atraso no meu voo, o que fazer?

Autor:Alex Shinji Hashimura (*) 
 

Estamos chegando próximo ao período em que muitas pessoas e famílias mais ficam ansiosas: o período de férias. Inclusive temos um feriadão prologando neste mês de abril (18 a 21/04), onde muitos já se programaram para poder curtir uma praia, conhecer novos lugares ou até mesmo outro país.

Hoje, com a praticidade e os preços atrativos, muitos viajam por meio aéreo, já que conseguem se programar com antecedência. Chegam no aeroporto com antecedência, despacham as malas (quando for o caso), se deslocam para o portão de embarque e... a companhia aérea anuncia que o voo está atrasado. E agora, o que fazer?

Alguns ficam desesperados, outros ficam frustrados, outros começam a fazer barraco no meio do aeroporto, mas muitos não sabem o que realmente deve ser feito e quais são os seus direitos, e o intuito deste artigo é para te deixar por dentro do assunto.

Primeiro, você precisa saber que o Código de Defesa do Consumidor – CDC já prevê, no caput do art. 14, que a responsabilidade de fornecedor de serviço é objetiva:

"Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos."
Em resumo, o prestador de serviço (no caso, a companhia aérea), deve responder de forma objetiva, ou seja, sem verificar se há culpa ou não no atraso do voo, pois o risco de eventuais atrasos, independente do motivo, é um dos riscos inerentes à atividade da companhia.

Juntamente com o CDC, é necessário saber que a Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, órgão responsável por regulamentar e fiscalizar a atividade da aviação civil em território nacional, prevê as obrigações das companhias aéreas. Tal regulamentação está prevista na Resolução n.º 400, de 13 de dezembro de 2016[1].

Ao se analisar a referida resolução, percebe-se que a ANAC dispõe sobre as obrigações das companhias aéreas para os casos em que aconteça atraso no voo, como por exemplo os arts. 20 e 21:


"Art. 20. O transportador deverá informar imediatamente ao passageiro pelos meios de comunicação disponíveis:

I - que o voo irá atrasar em relação ao horário originalmente contratado, indicando a nova previsão do horário de partida; e

II - sobre o cancelamento do voo ou interrupção do serviço.

§ 1º O transportador deverá manter o passageiro informado, no máximo, a cada 30 (trinta) minutos quanto à previsão do novo horário de partida do voo nos casos de atraso.

§ 2º A informação sobre o motivo do atraso, do cancelamento, da interrupção do serviço e da preterição deverá ser prestada por escrito pelo transportador, sempre que solicitada pelo passageiro.

Art. 21. O transportador deverá oferecer as alternativas de reacomodação, reembolso e execução do serviço por outra modalidade de transporte, devendo a escolha ser do passageiro, nos seguintes casos:

I - atraso de voo por mais de quatro horas em relação ao horário originalmente contratado;

II - cancelamento de voo ou interrupção do serviço;

III - preterição de passageiro; e

IV - perda de voo subsequente pelo passageiro, nos voos com conexão, inclusive nos casos de troca de aeroportos, quando a causa da perda for do transportador.

Parágrafo único. As alternativas previstas no caput deste artigo deverão ser imediatamente oferecidas aos passageiros quando o transportador dispuser antecipadamente da informação de que o voo atrasará mais de 4 (quatro) horas em relação ao horário originalmente contratado."

Ademais, a mesma resolução também prevê a assistência material que as companhias aéreas são obrigadas a fornecer, de acordo com o tempo de atraso:


"Art. 27. A assistência material consiste em satisfazer as necessidades do passageiro e deverá ser oferecida gratuitamente pelo transportador, conforme o tempo de espera, ainda que os passageiros estejam a bordo da aeronave com portas abertas, nos seguintes termos:

I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação;

II - superior a 2 (duas) horas: alimentação, de acordo com o horário, por meio do fornecimento de refeição ou de voucher individual; e

III - superior a 4 (quatro) horas: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta.

§ 1º O transportador poderá deixar de oferecer serviço de hospedagem para o passageiro que residir na localidade do aeroporto de origem, garantido o traslado de ida e volta.

§ 2º No caso de Passageiro com Necessidade de Assistência Especial - PNAE e de seus acompanhantes, nos termos da Resolução nº 280, de 2013, a assistência prevista no inciso III do caput deste artigo deverá ser fornecida independentemente da exigência de pernoite, salvo se puder ser substituída por acomodação em local que atenda suas necessidades e com concordância do passageiro ou acompanhante.

§ 3º O transportador poderá deixar de oferecer assistência material quando o passageiro optar pela reacomodação em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro ou pelo reembolso integral da passagem aérea."

Também é importante mencionar que, além das obrigações acima mencionadas, as companhias aéreas também tem a obrigação de fazer a reacomodação em outros voos da companhia ou de terceiros, desde que seja para o mesmo destino:

"Art. 28. A reacomodação será gratuita, não se sobreporá aos contratos de transporte já firmados e terá precedência em relação à celebração de novos contratos de transporte, devendo ser feita, à escolha do passageiro, nos seguintes termos:

I - em voo próprio ou de terceiro para o mesmo destino, na primeira oportunidade; ou

II - em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro.

Parágrafo único. Os PNAEs, nos termos da Resolução nº 280, de 2013, terão prioridade na reacomodação."

Portanto, caso aconteça de haver o atraso de seu voo, faça valer o seu direito, peça todas as informações por escrito, solicite toda a assistência prevista na resolução da ANAC, registre tudo que for possível com fotos e vídeos, testemunhas, e havendo recusa e/ou insuficiência no fornecimento de assistência, procure os órgãos competentes ou as medidas judiciais para eventual pedido de reparação de indenização por danos morais.

REFERÊNCIA


*ALEX  SHINJI HASHIMURA - OAB/DF n.º 52.833













-Sócio Fundador do Escritório Alex Hashimura Advocacia e Assessoria Jurídica;

-Graduado em Direito pela Universidade Projeção – UniProjeção (2016);

-Pós-graduado em Direito Previdenciário e Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Legale (2021);

-Pós-graduado em Direito Tributário e Processo Tributário pela Faculdade Legale (2023); e

-Graduando em Ciências Contábeis pela Universidade Anhembi Morumbi – UAM 

Nota do Editor:

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terça-feira, 15 de abril de 2025

Direito de resposta no caso de lesão à honra através da Imprensa



Autora: Eryca Mattos (*)

A lesão à honra por meio da imprensa ocorre quando uma pessoa tem sua dignidade, imagem, reputação ou intimidade violada por publicações ofensivas ou inverídicas veiculadas por meios de comunicação. Esse tipo de violação pode atingir tanto pessoas físicas quanto jurídicas e, embora exista a liberdade de imprensa e de expressão, esses direitos não são absolutos — devem coexistir com os direitos da personalidade.

O direito de resposta é o instrumento jurídico que visa restabelecer o equilíbrio, permitindo que o ofendido se manifeste no mesmo meio em que foi feita a ofensa, com igual destaque, proporcionalidade e, se necessário, com a devida retratação.

Esse direito está garantido no artigo 5º, inciso V, da Constituição Federal de 1988:
"é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".Além da Constituição, há a Lei nº 13.188/2015, que regulamenta especificamente o direito de resposta, prevendo prazos e formas para que a parte prejudicada possa exigir a reparação, judicialmente se necessário."
Aspectos importantes:
  • A resposta deve se ater aos fatos ofensivos e não pode ser usada para novos ataques;
  • Caso o meio de comunicação se recuse a publicar a resposta, cabe ação judicial;
  • Pode-se acumular o direito de resposta com ação por danos morais;e
  • Esse instrumento é essencial para preservar a dignidade do indivíduo em uma sociedade democrática, equilibrando o direito à informação com o respeito aos direitos fundamentais.
Iremos resumir de forma mais técnica sobre a natureza jurídica e exemplos para melhor entendimento:

I. Natureza Jurídica e Fundamento

O direito de resposta tem natureza de direito fundamental e objetiva restabelecer a verdade dos fatos ou minimizar os efeitos de uma publicação ofensiva. Ele não depende da comprovação de dolo ou culpa do veículo de comunicação — basta que a informação divulgada seja inverídica, imprecisa ou ofensiva à honra, imagem ou intimidade da pessoa.

Exemplo prático 1: Pessoa Física

Imagine que um jornal publica, de forma equivocada, que determinado advogado está sendo investigado por corrupção, quando na verdade se trata de homônimo ou sequer existe investigação. Ainda que o jornal alegue erro, o dano está feito. Nesse caso:

"O advogado pode solicitar administrativamente ao jornal o direito de resposta; Se negado, pode buscar o Judiciário, com base na Lei 13.188/2015;"

Além disso, pode propor ação por danos morais cumulativamente.

Exemplo prático 2: Pessoa Jurídica

Uma empresa é acusada por uma emissora de TV de vender produtos vencidos, mas a informação é falsa ou baseada em fonte duvidosa. Mesmo que a notícia alegue ser de interesse público, há ofensa à imagem empresarial. A empresa, então:
1.Solicita direito de resposta para esclarecer a verdade;

2.Se necessário, aciona o Poder Judiciário para garantir a publicação; e

3.Pode também pedir indenização por danos à imagem e lucros cessantes.
II. Procedimento judicial

De acordo com a Lei 13.188/2015:
  • O ofendido tem até 60 dias a contar da publicação ofensiva para requerer o direito de resposta;
  •  O juiz deve decidir sobre o pedido liminar em até 24 horas; e
  • A resposta deve ser publicada no mesmo espaço, dia da semana e destaque da matéria ofensiva.

III.Conflito entre liberdade de imprensa e direitos da personalidade

A jurisprudência brasileira já consolidou o entendimento de que:

"A liberdade de imprensa é essencial, mas não pode ser utilizada como escudo para agredir a honra alheia."

O STF e o STJ reconhecem a necessidade de ponderação, com base no princípio da proporcionalidade.

*ERYCA MATTOS
















-Bacharel em Direito pela Universidade Estácio de Sá (2022);
 
-Pós Graduada em Direito e Processo Civil na Instituição pela Legale Educacional S/A.(2024); 

-Advogada OAB/RJ -247.668 e;

-Área de atuação: Cível com foco em Família.

Nota do Editor:

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Posso complementar depois a contribuição de baixa renda feita ao INSS?


 Autor: Alexandre Triches (*)

Muita gente sem emprego e que decide contribuir com o INSS no percentual de 5% sobre o salário-mínimo, destinada ao chamado segurado facultativo de baixa renda, enfrenta problemas por não saber, à época do recolhimento, sobre a necessidade de inscrição atualizada no Cadastro único para programas sociais do Governo Federal (CadÚnico). Nesta situação, o INSS não irá considerar estas contribuições como válidas na hora de contar o tempo de contribuído, não sendo possível, consequentemente, obter o direito da aposentadoria.

A inscrição no CadÚnico, nestes casos, exige o comparecimento ao CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) com documentos de todos os moradores da residência, e, depois de inscrita, a família precisa manter os dados atualizados, especialmente quando há mudanças na renda, endereço, composição familiar ou local de trabalho. Somente após este ato é que deve ser efetuado o recolhimento das contribuições.

Mas surge a dúvida: quem pagou com o percentual reduzido sem ter feito a inscrição prévia no Cadúnico pode regularizar a situação posteriormente? Sim, é possível, porém não mais no percentual reduzido. Nestes casos será possível complementar a diferença entre os 5% e a alíquota normal, que poderá ser de 11% ou 20%, conforme a opção desejada.

Ao fazer essa complementação, aquelas contribuições que antes não eram aceitas passam a contar normalmente para o tempo de contribuição e para a carência. Com isso, é possível regularizar a situação, e garantir o direito às prestações previdenciárias, como a aposentadoria por idade ou salário-maternidade, por exemplo.

Quem se encontra nessa situação deve procurar uma agência do INSS, ligar para o 135 ou então acessar o aplicativo Meu INSS, e solicitar o cálculo da complementação. Com o pagamento da guia de recolhimento complementar, o problema será resolvido, sendo possível utilizar o período contribuído para obtenção da aposentadoria.

Pagar menos é bom e vantajoso, mas seguir todas as regras é fundamental para não perder dinheiro e garantir seus direitos no futuro. Por isso, é fundamental, nestes casos, não apenas contribuir, mas também não se esquecer de manter atualizado o cadastro no Cadúnico, sempre que for realizar a contribuição por meio deste percentual reduzido.

*ALEXANDRE TRICHES



 








-Graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul -PUC/RS (2005);

-Especialização em Direito Público pela PUC/RS(2007)
-Mestrado pela PUC/RS (2012); e

-Atualmente é advogado especializado em Previdência Social e é Professor Universitário .

Contatos
Nota do Editor:
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segunda-feira, 14 de abril de 2025

O Direito e as Eleições Brasileiras


 


Autora: Rosana Antoniaci Platero(*)

As eleições representam um dos pilares fundamentais da democracia, permitindo aos cidadãos escolherem seus representantes e definirem os rumos políticos e sociais do país. No Brasil, a relação entre o Direito e as eleições é intrinsecamente ligada, sendo regida por um amplo arcabouço jurídico que busca assegurar a legitimidade, transparência e equidade do processo eleitoral. Este artigo analisa os principais aspectos do Direito Eleitoral no Brasil, sua evolução histórica, desafios contemporâneos e o papel das instituições no fortalecimento do regime democrático.

 1. Evolução Histórica do Direito Eleitoral no Brasil 

O processo eleitoral brasileiro tem raízes na época colonial, mas foi somente após a independência, em 1822, que as eleições começaram a se estruturar formalmente. A Constituição de 1824 estabeleceu as primeiras normas, ainda que restritas a uma elite masculina e alfabetizada. Ao longo dos séculos XIX e XX, o sistema eleitoral brasileiro passou por várias mudanças significativas:

•República Velha (1889-1930): As eleições eram marcadas por fraudes e manipulações, como o famoso "voto de cabresto";

•Período Vargas (1930-1945): A introdução da Justiça Eleitoral em 1932 trouxe avanços, como o voto secreto e a inclusão das mulheres no processo eleitoral;

• Regime Militar (1964-1985): Apesar da centralização do poder, eleições indiretas e manipulações restringiram a democracia; e

• Redemocratização e Constituição de 1988: A Constituição Cidadã consolidou o voto direto, obrigatório e universal, garantindo maior participação popular.

Essas mudanças demonstram a evolução do Direito Eleitoral como instrumento de fortalecimento da cidadania e combate às desigualdades políticas. 

2. O Arcabouço Jurídico das Eleições 

O Direito Eleitoral brasileiro está ancorado em diversas normas e instituições que asseguram a legalidade e a justiça do processo eleitoral. Entre os principais marcos, destacam-se: 

•Constituição Federal de 1988: Estabelece os princípios fundamentais, como a  soberania popular, o voto direto, secreto e universal, além dos direitos políticos;

•Código Eleitoral (1965): Define as regras gerais para organização das eleições e funcionamento da Justiça Eleitoral; 

•Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997): Regula aspectos específicos, como  propaganda eleitoral, financiamento de campanhas e prestação de contas.; e

• Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010): Impede a candidatura de  pessoas condenadas por crimes graves, promovendo maior moralidade nas disputas eleitorais. 

Além disso, resoluções e normas complementares editadas pelo Tribunal  Superior Eleitoral (TSE) detalham aspectos técnicos e adaptam o ordenamento jurídico às necessidades contemporâneas. 

3. A Justiça Eleitoral e seu Papel 

A Justiça Eleitoral é a instituição responsável por garantir a lisura do processo eleitoral no Brasil. Criada em 1932, ela desempenha um papel essencial em todas as etapas do pleito:

•Organização das Eleições: Inclui a elaboração do calendário eleitoral, registro de candidaturas e preparação das urnas eletrônica;

•Fiscalização: Supervisiona a propaganda eleitoral, financiamento de campanhas e condutas vedadas;

•Resolução de Conflitos: Atua como instância julgadora em casos de  irregularidades, como abuso de poder econômico ou político; e 

•Divulgação de Resultados: Garante a transparência e agilidade na apuração e divulgação dos resultados. 

Composta por tribunais de diferentes níveis (TSE, TREs e zonas eleitorais), a  Justiça Eleitoral é um modelo único no mundo, destacando-se pela centralização e eficiência. 

4. O Voto Eletrônico e a Segurança do Processo 

Desde 1996, o Brasil utiliza a urna eletrônica como principal ferramenta de votação. Este sistema visa reduzir fraudes e agilizar a contagem dos votos. Embora seja amplamente elogiado, o voto eletrônico também enfrenta questionamentos: 

•Auditoria e Transparência: O TSE realiza testes públicos de segurança e auditorias para garantir a confiabilidade do sistema;

•Desinformação: Fake news sobre a vulnerabilidade das urnas podem comprometer a confiança popular, exigindo campanhas educativas constantes; e

•Inclusão Digital: A ampliação do acesso às tecnologias e capacitação de eleitores e mesários é fundamental para evitar exclusões. 

A modernização do processo eleitoral brasileiro coloca o país como referência  mundial, mas demanda vigilância constante para preservar sua integridade. 

5. Desafios Contemporâneos do Direito Eleitoral 

O Direito Eleitoral brasileiro enfrenta desafios crescentes, especialmente no contexto das transformações sociais e tecnológicas. Alguns desses desafios incluem:

•Desinformação e Fake News: O impacto das redes sociais exige regulamentações mais robustas para combater a disseminação de notícias falsas que podem influenciar o voto; 

•Financiamento de Campanhas: A proibição de doações empresariais em 2015 trouxe avanços, mas o financiamento público ainda enfrenta críticas sobre sua distribuição e eficiência; 

•Inelegibilidade e Moralidade: A Lei da Ficha Limpa é um marco, mas casos de candidaturas questionáveis continuam a gerar debates sobre os critérios de inelegibilidade e 

•Inclusão e Representatividade: Apesar de avanços, a sub-representação de mulheres, negros e indígenas nos espaços de poder persiste como um problema estrutural. 

Esses desafios refletem a necessidade de constante aprimoramento do marco jurídico-eleitoral para acompanhar as mudanças da sociedade. 

6. Educação Política e Participação Cidadã 

Para além das normas e instituições, o fortalecimento da democracia exige uma população informada e engajada. A educação política desempenha um papel crucial na conscientização dos eleitores sobre seus direitos e deveres. Iniciativas como debates públicos, campanhas de esclarecimento e ações voltadas aos jovens são essenciais para ampliar a participação cidadã. 

A transparência e a acessibilidade do processo eleitoral também contribuem para a confiança no sistema. A Justiça Eleitoral tem investido em ferramentas digitais, como aplicativos e portais, para facilitar o acesso às informações pelos eleitores. 

7. Conclusão 

O Direito Eleitoral brasileiro é uma das bases mais importantes da democracia no país, consolidando-se como um sistema robusto, mas em constante transformação. Desde a introdução do voto secreto até o uso da urna eletrônica, o Brasil tem demonstrado avanços significativos na promoção de eleições justas e democráticas. 

Entretanto, desafios como a desinformação, o financiamento de campanhas e a representatividade ainda demandam atenção e reformas contínuas. O fortalecimento do marco jurídico-eleitoral deve ser acompanhado de educação política e participação ativa da sociedade, garantindo que as eleições continuem  sendo o reflexo da vontade popular. 

Somente assim será possível consolidar um sistema eleitoral que não apenas respeite a legislação, mas também promova igualdade, inclusão e confiança no futuro democrático do Brasil. 

Bibliografia 

https://www.tre-pi.jus.br/institucional/memoria-e-cultura/evolucao-da-justica-eleitoral-no-brasil; 

https://www.tse.jus.br/institucional/escola-judiciaria-eleitoral/publicacoes/revistas-da-eje/artigos/revista-eletronica-eje-n.-2-ano-3/fontes-do-direito-eleitoral; e

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4737.htm

ROSANA ANTONIACCI PLATERO


-Graduada pela Universidade do Grande ABC (1999); 

-Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2013);

-Mestre em Psicologia Social do Direito pela PUC-Campinas (2013);

-Conciliadora e Mediadora Judicial e Extrajudicial pela Escola Superior de Advocacoia - ESA (2019);

-Docente,com experiência na Graduação e Pós-Graduação e Membro do Comitê de Avaliação do MEC (desde 2010) 
e
Advogada com 25 anos de experiência em empresas nacionais e multinacionais.

Nota do Editor:

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domingo, 13 de abril de 2025

Compreendendo os conflitos e possibilidades de transformação na adolescência


Autora: Valéria Carvalho Ribeiro (*)

  
A adolescência é uma fase de intensas mudanças psíquicas, marcada por desafios na construção da identidade, na relação com o desejo e na busca por autonomia. O jovem enfrenta conflitos internos e externos que afetam sua maneira de se relacionar com a família, a escola e a sociedade. Muitos pais e educadores se sentem despreparados para lidar com essa fase, que pode ser repleta de angústias, impulsividades e questionamentos existenciais.

A psicanálise, desde Freud, vem contribuindo para uma compreensão mais profunda da adolescência. O olhar psicanalítico não busca rotular ou corrigir comportamentos, mas criar um espaço de escuta e elaboração subjetiva. Neste artigo, exploraremos como a psicanálise compreende essa fase e como pais, educadores e terapeutas podem auxiliar os adolescentes a atravessarem seus conflitos de forma mais saudável.

A Adolescência como Momento de Reconfiguração Psíquica

Freud, ao desenvolver sua teoria do desenvolvimento psicossexual, destacou a adolescência como um período de reorganização psíquica, no qual o sujeito revisita conflitos infantis e busca novos caminhos para lidar com seu desejo. Essa fase está fortemente ligada à puberdade e às transformações do corpo, que geram impacto na forma como o adolescente se percebe e se relaciona com o outro.

Para Freud, a adolescência representa um momento de luto da infância e da posição simbólica de dependência dos pais. O sujeito precisa ressignificar sua relação com as figuras parentais, o que pode gerar resistências, revoltas e dificuldades emocionais. Esse processo, embora natural, pode ser intenso e, quando não bem elaborado, levar a sintomas como ansiedade, depressão, automutilação ou até mesmo comportamentos de risco.

Jacques Lacan aprofunda essa questão ao destacar que a adolescência é marcada pela busca de novas identificações e pela influência dos significantes sociais. O adolescente se depara com a necessidade de construir sua identidade para além da família e, nesse percurso, pode experimentar sentimentos de angústia e alienação. A necessidade de pertencimento pode levá-lo a se identificar fortemente com grupos, ídolos ou influenciadores, buscando referências que deem sentido ao seu lugar no mundo.

Os Conflitos Adolescentes e a Expressão do Inconsciente

Os conflitos da adolescência nem sempre se manifestam de forma clara ou verbalizada. Muitas vezes, aparecem por meio de sintomas como isolamento, irritabilidade, compulsões ou até mesmo comportamentos autodestrutivos. O adolescente pode recorrer a mecanismos inconscientes para lidar com sua angústia, como a atuação impulsiva, a negação ou a projeção.

Winnicott destaca que o adolescente precisa de um ambiente suficientemente bom para se desenvolver psiquicamente de forma saudável. Isso significa um espaço no qual ele possa expressar suas dúvidas, medos e desejos sem ser excessivamente controlado ou julgado. Quando o ambiente não oferece essa segurança, o jovem pode recorrer a formas mais extremas de expressão, como desafios perigosos, uso de substâncias ou até mesmo relações tóxicas.

Françoise Dolto reforça a importância de a família e os educadores reconhecerem o adolescente como um sujeito desejante, com autonomia para construir sua própria identidade. O excesso de repressão ou a superproteção podem dificultar esse processo, gerando ainda mais resistência e conflito.

O Papel da Escuta Psicanalítica na Adolescência

A escuta psicanalítica é um dos recursos mais valiosos para compreender o adolescente. Diferente de abordagens diretivas ou moralizantes, a psicanálise oferece um espaço no qual o jovem pode expressar suas angústias e construir seu próprio discurso.

A clínica psicanalítica com adolescentes exige do analista uma postura de abertura para o que o sujeito traz, sem impor respostas prontas. O objetivo não é encaixar o adolescente em um diagnóstico, mas ajudá-lo a elaborar suas questões e encontrar formas mais saudáveis de lidar com seus conflitos internos. Muitos adolescentes resistem à ideia de terapia, pois sentem que serão analisados ou corrigidos. No entanto, quando encontram um espaço de escuta genuína, podem se abrir para um processo de autoconhecimento que lhes permite lidar melhor com seus desafios.

O Papel dos Pais e Educadores na Construção do Sujeito Adolescente

Pais e educadores têm um papel fundamental no desenvolvimento emocional do adolescente. No entanto, essa fase costuma gerar insegurança e medo nos adultos, que muitas vezes reagem de forma punitiva ou permissiva demais. A psicanálise sugere que, em vez de buscar um controle rígido, é essencial oferecer um ambiente no qual o adolescente possa se sentir ouvido e respeitado. Algumas diretrizes importantes incluem:

1. Estabelecer limites claros, sem autoritarismo – O adolescente precisa de referências e segurança para se desenvolver. Limites são importantes, mas devem ser dialogados, não impostos de forma arbitrária;

2. Evitar julgamentos e críticas excessivas – O jovem está construindo sua identidade e precisa sentir que pode errar e aprender sem ser rotulado;

3. Promover um espaço de diálogo – Ouvir o que o adolescente tem a dizer, mesmo quando suas opiniões parecem exageradas ou radicais, é essencial para que ele se sinta reconhecido e

4. Reconhecer o sofrimento do adolescente – Muitas vezes, os adultos minimizam as angústias dos jovens, tratando seus problemas como banais. Para o adolescente, no entanto, suas dificuldades são reais e precisam ser acolhidas.

Conclusão

Lidar com adolescentes sob a ótica psicanalítica significa compreender que essa fase é marcada por um intenso trabalho psíquico de reorganização da identidade. Os conflitos, muitas vezes expressos de forma impulsiva ou silenciosa, refletem o esforço do sujeito para lidar com suas transformações internas e encontrar um lugar no mundo.

A escuta psicanalítica permite que o adolescente elabore suas angústias e encontre novos caminhos para sua subjetividade. Pais e educadores, ao adotarem uma postura de acolhimento e respeito, podem contribuir para um desenvolvimento mais equilibrado e saudável.

A adolescência não é apenas um período de desafios, mas também de possibilidades. Quando há espaço para a escuta e o reconhecimento, o jovem pode transformar sua angústia em crescimento, fortalecendo-se para as próximas etapas da vida.

Referências

Dolto, F. (1988). Quando os pais se separam. Martins Fontes;

Freud, S. (2016). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905). Companhia das Letras;

Lacan, J. (1998). Função e campo da fala e da linguagem (1953). In Escritos. Zahar; e

Winnicott, D. W. (1975). O ambiente e os processos de maturação (1965). Artmed.

*VALÉRIA CARVALHO RIBEIRO(*)















- Graduada em Psicologia pela PUC RR (2014);

- Utiliza desde 2018 a escuta psicanalítica em consultório;

-Com experiência no atendimento clínico, ajudando seus pacientes a explorarem suas questões emocionais profundas, oferecendo suporte através de uma compreensão baseada nos princípios da psicanálise.

Nota do Editor:

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