[...] A meu ver, (a maledicência) é a mais esplêndida
arma da razão na luta contra as potências das trevas e da fealdade. A
maledicência, senhor, é o espírito da crítica, e a crítica representa a origem
do progresso e do esclarecimento.
(Diálogo entre Setembrini e Hans Castorp em: A Montanha Mágica, de Thomas Mann, 1924 – Ed. 2016, p.76)
A pergunta que coloco em discussão, com os meus
colegas educadores e leitores, nesse breve espaço, é: Considerando que a
Inteligência Artificial (IA ) está disponível indistintamente e que o
desenvolvimento tecnológico continuará impelindo, em ritmo cada vez mais
célere, a necessidade de adaptação a essa realidade, onde se encaixa o
pensamento crítico nesse contexto?
Como tudo na vida, a IA tem o seu lado muito bom e o lado muito ruim e, entre esses dois extremos, existe toda uma gradação de possibilidades. Trago essa análise para o campo da Educação, que é o meu métier.
Na área da educação identifico benefícios importantes para os professores, notadamente na interação com alunos em ambientes virtuais criativos e, para os estudantes, na assimilação do conhecimento e agilidade das pesquisas, além de otimizar a própria gestão das instituições de ensino.
Ocorre que, no meu entendimento, e independentemente do ambiente em que se aplique a IA, o pensamento crítico aliado à uma conduta ética são indispensáveis (aliás, como tudo na vida), visto que no uso da IA se tem que analisar tanto o conteúdo, quanto o direcionamento do texto por ela produzido.
Vejamos por quê.
É de conhecimento geral que os textos produzidos pelos
aplicativos de IA não são totalmente confiáveis, em termos de veracidade dos
fatos Exemplo: consultei quem é Maria Thereza Pompa Antunes, ou seja, eu.
Resposta: Maria Thereza Pompa Antunes é uma professora e pesquisadora
brasileira, formada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ora,
embora eu seja uma professora e pesquisadora brasileira, eu nunca estudei na
UFSC.
Esse exemplo caseiro se refere a um aspecto pontual, quanto à veracidade de um dado, cuja consequência é o descrédito do autor do texto que incorpora esse dado como de sua autoria.
Porém, a meu ver, o mais importante está no direcionamento ideológico, pois nas palavras de Natalia Pasternak, "em ciência dificilmente temos respostas binárias, pois a ciência trata com incertezas" e, como sabemos, os textos produzidos pela IA, via de regra, não deixam isso claro levando o leitor a crer que existem verdades absolutas.
Sabemos que existem várias formas de se abordar um problema, que produzem resultados diferentes e, por vezes, até opostos, de acordo com a visão de mundo que se tem. Exemplificando: se perguntarmos a um liberal e a um socialista qual é a função do estado, obteremos respostas opostas.
Em resposta a minha pergunta inicial, considero que o exercício da crítica seja essencial, de forma a não se aceitar como verdade absoluta os textos científicos produzidos em tempos de IA.
A quem se dispõe a produzir um texto baseado na IA, entendo que seja, primeiramente, necessário saber elaborar a pergunta certa, ou seja, conhecer o significado das palavras e o contexto em que vai utilizá-las, o que requer uma riqueza de vocabulário que só pode ser obtida por meio do estudo e de aprofundada leitura e, ainda assim, posteriormente, analisar de forma crítica o texto que foi produzido. Afinal, como pensar e exercer a crítica sem conhecimento (leitura)?
Muito cuidado, pois a aparente facilidade no desenvolvimento de textos pode resultar em desde no descrédito do autor, por escrever besteiras, até em processos por plágio, complicando a sua vida.
Senso crítico (em tudo) especificamente na utilização da IA: um filtro crítico para se separar o joio do trigo.
Concluindo...
Inteligência Artificial: a IA não substitui o
conhecimento que se obtém pela leitura, estudo e experiências de vida, sendo apenas
mais uma ferramenta que pode ser útil para a evolução de uma sociedade.
Educação: formar cidadãos com capacidade de transformar a realidade.
Pensamento crítico: sem um pensamento crítico corremos o risco de viver as distopias imaginadas (talvez previstas) por George Orwell na sua obra 1984, ou Ray Bradbury em Fahrenheit 451º.
REFERÊNCIAS:
MANN, Thomas. A montanha mágica. São Paulo: Companhia das Letras, 2016; e
PASTERNAK, Natalia. Ciência e pensamento crítico. O Globo. Caderno Saúde, p. 14, 10/06/2024.
*MARIA THEREZA POMPA ANTUNES
-Professora Adjunta da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios (EPPEN) da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP);
Mestre e Doutora em Ciências Contábeis pela FEA/USP; Graduação em Administração pela PUC/RJ, com Especialização em Finanças pelo IAG/PUC/RJ, e em Ciências Contábeis pela FEA/USP, com 26 anos de experiência na área da educação atuando como docente, pesquisadora e gestora.
E-mail: teantunes@uol.com.br
WhatsApp: (11)-98338-4343
Currículo
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6278852648499064
Nota do Editor: