sábado, 16 de setembro de 2023

Considerações sobre Inteligência e Inteligência Artificial


 Autor: Antonio Carlos Arruda (*)


Segundo o site: https://www.europarl.europa.eu/news/pt/headlines/society/20200827STO85804/o-que-e-a-inteligencia-artificial-e-como-funciona, conceitua-se Inteligência Artificial como "a capacidade que uma máquina para reproduzir competências semelhantes às humanas como é o caso do raciocínio, a aprendizagem, o planejamento e a criatividade".

Em tempos atuais de discussões teóricas e éticas, sobre o uso da Inteligência Artificial em nossos dias, suas possibilidades e limites, pensei ser importante em escrever este texto, parte dele extraído de minha tese de Doutorado, em compreender o que seja de fato a inteligência humana, segundo uma perspectiva teórica.

Além de escrever este, deixo como contribuições que o leitor compreenda melhor este conceito e sua riqueza e ainda, que possa estabelecer (se isso for possível), relações e distanciamentos entre a inteligência humana e a inteligência artificial.

Fico à disposição para debates e esclarecimentos.

Boa leitura.    

De acordo com Piaget (1987), deve-se levar em conta que o indivíduo possui uma base estrutural biológica com esquemas que nos primeiros anos de vida, através de suas ações, assimila dados provindos do mundo e à medida que o indivíduo se desenvolve, os esquemas mentais ultrapassam "esse núcleo estrutural", fazendo com que através de ações coordenadas, possa de maneira intencional assimilar os objetos através da criação de novas formas de organização dos mesmos.

Neste sentido, é necessário compreender como se dá esse processo, ou seja, como a relação entre o biológico e o cognitivo caminha e se desenvolve, levando-se em conta que a intenção, sobretudo, é entender o que é esse mecanismo denominado inteligência.

Piaget considera o conhecimento como um vir a ser e consiste em passar de um conhecimento menor para um estado mais completo.
 

"Entretanto esse vir a ser não ocorre ao acaso, mas constitui um desenvolvimento, este mesmo deve ser examinado desde os estágios denominados de formação; é verdade que essa última, que ainda consiste, pois, num desenvolvimento a partir de condições anteriores (conhecidas ou desconhecidas), existe o risco de regressão sem fim (isto é, de um apelo à biologia): apenas como o problema é o da lei do processo e como os estágios finais (isto é, atualmente finais) são tão importantes sob este aspecto quanto os primeiros conhecidos, o setor de desenvolvimento considerado pode permitir soluções pelo menos parciais, com a condição, porém, de assegurar uma colaboração da análise histórico-crítica com a análise psicogenética (PIAGET, 1987, p.13)."

Os dados psicológicos devem constituir-se em material fundamental para a análise da questão do conhecimento, pois permite a análise dos fatos e permite caracterizar o processo.

Piaget utiliza a linguagem da biologia para pensar a inteligência. Ao mesmo tempo apresenta um paralelismo entre os dados biológicos e as teorias sobre a inteligência, pois são imprescindíveis para entender a origem e o desenvolvimento do conhecimento:

1) Lamarckismo – entende que o organismo é amoldado pelo meio, o qual através de imposições e pressões, condicionando hábitos, sem que haja nenhuma atividade interna do sujeito, portanto, ao se defender a tese do lamarckismo se evoca a idéia de que o conhecimento é refém de hábitos adquiridos através de pressões do ambiente exterior, não revelando assim nenhuma atividade e criação de novidades por parte do sujeito;

2) Vitalismo – defende a tese de explicar a inteligência por si mesma, atribuindo a esta uma capacidade inata de conhecer as coisas (elemento vital), revelando dessa maneira, certo intelectualismo natural, onde a inteligência por si própria se justifica, sem contribuição do mundo exterior;

3) Pré-formismo – de caráter endógeno, ao que as estruturas mentais são anteriores à experiência, sendo que o conhecimento se estrutura de acordo com as formas a priori da razão, independendo da experiência. A própria inteligência, do modo como está estruturada, não necessita e não precisa de dados exteriores afim de construir conhecimento sobre as coisas;

4) Mutacionismo – as estruturas mentais são endógenas e surgem porque há transformações internas e somente depois se adaptam ao meio, através de uma seleção, ou seja, de acordo como somos afetados por percepções exteriores, nossas estruturas mentais se encarregam de selecionar aquilo que permite melhor nos ajustarmos aos dados do mundo exterior;

5) Interação entre organismo e meio - explicação dada por Piaget, onde não há predominância entre os dados externos e internos, mas interação contínua. Há uma interdependência entre sujeito e objeto. O sujeito através de um esquema de assimilação do objeto constrói o conhecimento sobre este quando da experiência. Segundo Piaget:

"[...] a inteligência está integrada, em virtude das adaptações hereditárias do organismo, numa rede de relações entre este e o meio.

[...] está vinculada desde o começo, pelos a priori biológicos: a inteligência nada tem de absoluto independente, é uma relação entre outras entre o organismo e o meio (PIAGET, 1987, p.29)."


Assim, no Interacionismo há um processo contínuo de relações entre organismo e meio, pois há adaptação ao meio se o organismo estiver organizado e só é organização se o meio exercer influência decisiva.

Essa relação com o meio pressupõe um caráter de assimilação, que segundo Piaget (1987, p. 17), "... é uma adaptação ao meio, onde o pensamento se organiza e organizando estrutura as coisas"ou ainda, "... estruturação por incorporação da realidade exterior a formas devidas à atividade do sujeito".

A adaptação não se dá tão somente por assimilação, mas também por acomodação: o sujeito, além de incorporar elementos do meio, realiza modificações necessárias (no sujeito) para assimilar os objetos.

Dessa maneira, a inteligência define-se como algo que possui intencionalidade, pois o sujeito de posse de esquemas que servem de meio para assimilar dados do mundo real, direciona seus atos com intenção e desejo para a realização de um ato.

"Pelo contrário, assim que o sujeito, na posse de esquemas coordenados de preensão, visão etc., utiliza-os para assimilar a si o conjunto do seu universo, as múltiplas combinações que então se oferecem (por assimilação generalizadora e acomodação combinadas) acarretam as hierarquias momentâneas de fins e meios, isto é, ocorre uma conscientização da direção do ato ou de sua intencionalidade (PIAGET, 1987, p. 146)."
Um ato inteligente constitui um processo de adaptação intencional. De início a origem da inteligência está vinculada a reflexos que possibilitam ações que se esquematizam através do estabelecimento de relações com o meio. À medida que o sujeito se desenvolve, as elaborações e significações vão se tornando cada vez mais complexas, pois além de incorporar dados desse meio, ocorre uma re-organização dos esquemas.

 "O organismo adapta-se construindo materialmente novas formas para inseri-las nas do universo, ao passo que a inteligência prolonga tal criação construindo, mentalmente, as estruturas suscetíveis de aplicarem-se às do meio" (PIAGET, 1987, p. 15 e 16).

 

O mecanismo da inteligência funciona de maneira adaptativa ao meio, não no sentido de se amoldar a ele, mas através de construções contínuas a fim de poder interpretá-lo de maneira construtiva por ocasião da experiência. Neste sentido, a inteligência é a expressão das formas construídas pelo sujeito que possibilita a adaptação criativa ao meio.

Mas como explicar então os atos da inteligência?

É entendendo que a inteligência possui sistemas de implicações e significações com o meio, como por exemplo, as relações numerais, espaciais, temporais, causais, etc. Neste sentido, como diz o próprio Piaget (1987, p. 19) "... é adaptando-se às coisas que o pensamento se organiza e é organizando-se que estrutura as coisas".

 Ainda segundo Piaget:

"A primeira é que todo organismo possuindo uma estrutura permanente, que se pode modificar sob as influências do meio, mas não se destrói jamais enquanto estrutura de conjunto, todo conhecimento é sempre assimilação de um dado exterior a estruturas do sujeito. A segunda é que os fatores normativos do pensamento correspondem biologicamente a uma necessidade de equilíbrio por auto-regulação: assim a lógica poderia corresponder no sujeito a um processo de equilibração (PIAGET, 1983, p. 96)."

Neste sentido, há que se afirmar a tese piagetiana de que construir conhecimento revela uma perspectiva que sempre será o sujeito quem dá forma aos objetos e às coisas, isto é, todo um dado exterior é assimilado às estruturas do sujeito. No entanto, os objetos precisam ser dados e desempenham papel capital para o conhecimento.

Assim, a organização do meio é feita pelo mecanismo de adaptação, já que a atividade do sujeito é a assimilação dos dados do meio.

Quais as coordenações necessárias para o desenvolvimento do sujeito para se falar em inteligência?

À medida que o sujeito se desenvolve, seu nível de compreensão e relação com o meio se intensifica, se aprofunda, ocorrendo cada vez mais a conscientização de uma atividade organizadora.

Neste percurso, cabe então apresentar como são as primeiras adaptações, as adaptações sensório-motoras elementares e como estas repercutem no indivíduo e na constituição do pensamento inteligente.

Fase 1 – O Exercício dos Reflexos (Adaptações sensório-motoras elementares – primeiros dias de vida)

Quem nunca se perguntou sobre o espetáculo do nascimento de uma vida? Qual pai ou mãe não ficou na expectativa de ouvir o primeiro choro de seu filho? O primeiro espreguiçar? A primeira abertura dos olhos? E quem nunca se perguntou: “Será que ele me reconhece?” “Ele tem consciência do que acontece ao seu redor?”

Essas e tantas outras perguntas levam a refletir se na verdade se conhecem de fato o desenvolvimento do sujeito, suas relações com o mundo, entre tantas outras questões!

Cometem-se muitas vezes inúmeros erros em querer entender e compreender o desenvolvimento do sujeito "utilizando-se de óculos de adulto", em até achar que desde pequeno ele já entende quase tudo o que acontece ao seu redor e que já nasce de certa forma "meio pronto".

Como já abordado, deve-se levar em conta que a inteligência não aparece por acaso e sim que é fruto de uma continuidade a qual respeita fases do desenvolvimento no sujeito.

Na primeira fase denominada exercício dos reflexos há que se entender que para o exercício de tal mecanismo o sujeito já vem dotado de certo aparato biológico, que proporciona ao mesmo tempo contato e adaptação ao meio externo.

Este mesmo aparato fornece base para que o sujeito através do desenvolvimento de suas ações e coordenações construa uma história de adaptação, já que estes processos dependem de fases que o sujeito atravessa, cada uma atualizando mais as anteriores, ou seja, fazendo releituras.

Neste sentido, apresenta-se desde as primeiras semanas de vida do indivíduo "os reflexos de sucção e de preensão, gritos e fonações, gestos e atitudes dos braços, da cabeça e troncos, entre outros” (PIAGET, 1987, p. 34).

Para melhor compreensão serão traçadas breves considerações sobre os reflexos através da sucção.

Nos primeiros dias de vida, observa-se que a criança esboça um movimento de sucção no vazio, mexendo os lábios de maneira impulsiva, de maneira descoordenada com os braços e cabeça. Já no segundo dia de vida, nota-se uma busca do mamilo através dos lábios e no terceiro dia de vida, basta-lhe tocar os lábios no mamilo ou nas regiões circunvizinhas, que o mesmo inicia as tentativas de encontrar o mamilo. Por volta do nono dia, a criança roça os lábios com a mão e já por volta de 30 dias de vida, estando esta a uma distância aproximada do seio, vira a cabeça para esquerda e para a direita, na tentativa de encontrá-lo. Através destas rápidas considerações, pode-se "compreender melhor que um sistema de reflexos constitui em comportamento psicológico, quando estes sistematizam seu funcionamento" (PIAGET, 1987, p. 39).

Mas o que essas considerações trazem como contribuição?

Deve-se entender que na medida em que o sujeito entra em contato com o objeto, modifica sua postura em relação ao mesmo, pois mesmo que esta atividade esteja biologicamente orientada para tal, só há modificação porque o sujeito aciona seus esquemas de assimilar o objeto as suas próprias atividades.

À medida que vai adquirindo a capacidade de coordenar seus reflexos, sua relação com o objeto assimilado, vai construindo maior complexidade, visto que aos poucos o objeto passa cada vez mais a ser modificado pela ação do sujeito. Há "uma aprendizagem em função do meio" (PIAGET, 1987, p. 41).

Com a repetição dos movimentos de reflexo há um reforço do próprio ato de assimilar os objetos. Neste sentido, o objeto cumpre uma função de excitação dos reflexos, que ao repetirem-se várias vezes, o sujeito realiza a "assimilação generalizadora” à medida que os objetos são incorporados aos seus esquemas de reflexos através de coordenação. No exemplo explicitado da sucção, pode-se observar que o recém-nascido não faz distinção sobre os objetos assimilados, apenas assimila-os as suas atividades reflexuais já que é esta de início que coordena suas atividades. Esta forma de assimilação é, portanto, em caráter de indiferenciação, pois é generalizadora de um esquema. É claro que à medida que a criança está com fome busca o mamilo para saciedade. Há aí um início de diferenciação, que mesmo sendo em caráter motor, mostra-se em aspecto de um "resentido" ou nas palavras do próprio Piaget "assimilação recognitiva".

Cabe dizer que não é o meio quem dá significado à ação da criança e sim que por uma ação da própria criança é ela descobre o esquema sensório-motor, quando em contato com o meio, ao que se afirma que sugar algo não se constitui ainda em um ato inteligente, pois não há significação e uma busca dirigida de maneira intencional, somente há exercício de reflexos; para se ter significado a ação deve revelar uma intenção significada de desejo e satisfação ao mesmo tempo. O ato de sugar revela uma simples sequência de tentativas, de erros e de acertos em direção ao objeto experenciado, ou seja, nada vai além deste, mesmo notando que há neste quadro assimilação e acomodação, pois através de uma bagagem hereditária biológica, ou seja, esquemas que permitem sugar o mamilo, ainda há acomodação, pelo fato da necessidade em se ter interação com o meio, através de explorações sucessivas e organizadas, constituindo assim uma aprendizagem. "Quando o bebê reconhece o mamilo, não se trata de reconhecimento de uma coisa ou de imagem, mas de assimilação de um complexo sensório-motor e postural a outro" (PIAGET, 1987, p. 49). Porém tal quadro é em função "tão somente de uma necessidade", pois uma aprendizagem de fato não se restringe tão somente a um dado sensorial, necessita de um valor pré-estabelecido.

Fase 2 – As primeiras adaptações adquiridas e a reação circular primária (por volta do 1º até o 3º mês de vida)

Em relação à sucção, pode-se afirmar que em uma etapa posterior "sugar algo significa transcender o próprio objeto", ou seja, ter "certa consciência e certo domínio do corpo", pois as atividades sensório-motoras começam a ter certa significação e, a partir desta segunda fase, significa afirmar que, mesmo ainda a criança não conservando noções como permanências substanciais e espaciais do objeto, já estão presentes as relações entre sujeito e objeto.

A este fato dá-se o nome de "reação circular primária", evidenciando-se dessa maneira a capacidade de assimilação, ou seja, na medida em que se constitui um exercício funcional, no caso da sucção, em colocar em ato (movimento, em ação) as capacidades biológicas de se poder sugar um objeto.

E ainda é acomodação na medida em que há coordenação dessas ações, já que agora envolve não somente o sugar, mas o olhar do objeto a ser sugado e isso implica em um reconhecimento gradual visual do objeto, já que outrora era um mero exercício funcional. Neste momento há um implicar de certo desenvolvimento e maturação do aparelho visual, "envolvendo o cristalino, o reflexo à distância e a convergência binocular" (PIAGET, 1987, p. 73), pois olhar significa realizar uma atividade.

Esta atividade está diretamente ligada a um aspecto fundamental deste processo: a organização, pois para se "olhar algo" é necessário coordenar posições, distâncias, dimensões e ainda identificar cores, luz, entre outros aspectos.

Quando se reforça a idéia de que olhar um objeto é algo extremamente complexo, leva-se em conta que para olhar algo é necessário possuir de imediato um aparato biológico, que no caso se constituem em esquemas visuais que permitam olhar aquilo que está em jogo. Porém, para que efetivamente isso aconteça, é necessário que esses esquemas entrem em ação, em interação com o meio.

A visão não é um fim em si mesmo, pelo contrário, na medida em que esta se coordena com outros esquemas, segundo Piaget "... torna-se um simples meio ao serviço de fins superiores e, por consequência, um valor derivado em relação aos valores principais" (PIAGET, 1987, p. 83).

A Fonação e a Audição

Ambas também superam a "agagem hereditária biológica" de seus esquemas a partir de adaptações adquiridas quando são acionadas ou colocadas em ação.

No caso da fonação, é possível verificar sua ação já nas primeiras semanas de vida, quando da manifestação de gritos e do próprio choro. Porém, como se relacionam fonação e audição? Segundo Piaget (1987), pode-se perceber que neste processo está intrínseco um relacionamento que ao mesmo tempo também é assimilação e acomodação, pois é "... acomodação, em primeiro lugar, porque a reação circular é um esforço para reencontrar o novo som descoberto por acaso; assim há uma acomodação perpétua dos órgãos vocais à realidade fônica percebida pelo ouvido" (PIAGET, 1987, p. 86), ou seja, de aquilo que a criança ouve procurará imitar através da fonação, melhor dizendo, a criança acomoda-se progressivamente aos sons e, por outro lado, assimila-os inicialmente por um simples prazer de escutá-los; posteriormente, quando começa a discriminá-los através de uma assimilação generalizadora procede ao reconhecimento.

Com ênfase à relação audição e visão, há que se ressaltar que a partir do 3º mês de vida já há certo quadro: a criança através do som da voz de alguém, por exemplo, busca através da visão o rosto referente a quem corresponde essa voz, ou seja, não há aqui uma associação passiva, nem tampouco uma relação de compreensão, mas sim uma associação entre diversas assimilações, havendo uma reciprocidade entre ou como diz Piaget (1987) "ouvir o rosto e ver a voz". Este quadro indica uma busca pela causalidade, pois a criança tenta através de uma coordenação entre o ouvido e voz estabelecer correspondências. Nesta fase, a coordenação entre ouvido e voz se estabelece por algumas características: de início se refere a tudo aquilo que a criança fala, estando diretamente relacionada ao que se ouve, ou seja, há uma reação circular. Exemplificando: ao ouvir o som da voz de uma pessoa a criança também ouve a voz de outra e na medida em que os sons são análogos àqueles sons que ela emite, só percebidos porque possui esquemas audiovocais e conforme tenta imitá-los, de início não é mais do que uma confusão de sua própria voz com a de outro, assimilada pelos esquemas de fonação. Em suma, no início a assimilação se dá por repetição pura, posteriormente é de caráter generalizador, pois escuta ao produzir sons cada vez mais diversos e finalmente é assimilação recognitiva, pois tenta reencontrar um som preciso.

PREENSÃO

1ª Etapa – Quando recém-nascida, a criança realiza movimentos impulsivos ou de puro reflexo, caracterizando-se por um fechar de mão assim que a sua palma da mão é tocada ou pressionada por algo, porém, logo que faz o movimento de tocar imediatamente o solta. Mas mesmo que isso seja entendido como "um simples exercício" não se deve concluir que tal gesto revela um automatismo puro e sim um exercício, pois para praticar tal exercício já se caracteriza uma acomodação e uma assimilação ativa, revelando que quando a criança agarra um objeto já há certo interesse;

2ª Etapa – Primeiras reações circulares relativas aos movimentos das mãos. Neste período apresenta-se um conjunto de reações circulares, sendo o foco principal a preensão por ela mesma, ou seja, manter os objetos na mão sem vê-los, nem procurar levá-los à boca, as chamadas reações táteis-cinestésicas, mexer dedos e mãos, coordenar sucção com movimentos da mão, por exemplo, chupar os dedos e tentar coordenar visão e movimentos gerais;

3ª Etapa – Coordenação entre sucção e preensão – apanhar um objeto e levá-lo à boca, caracterizando assim o que se denomina de preensão sistemática, havendo o estabelecimento do interesse em relação ao que foi estabelecido de contato pela preensão e visão. Portanto, há assimilação do real em relação a outros esquemas, no caso o da visão (coordenação). O que significa dizer que a mão agarra aquilo que o olhar observa, ao mesmo tempo em que este observa e também assimila o domínio visual. Essa assimilação recíproca indica um associacionismo entre o assimilado pelos esquemas de preensão e os esquemas visuais, sendo isso garantido pela imagem visual que se tem do objeto frente a esta experiência realizada, implicando diretamente um relacionamento e uma assimilação ativa e recíproca já que está presente nesta situação a presença de dois esquemas: o da preensão e o visual;

4ª Etapa – Há a preensão do objeto com percepção do objeto percebido e da mão, ou seja, a criança apanha os objetos que vê e não somente aqueles que suga ou toca. Isto significa que importa para a criança "ver agarrar", ou seja, "... assimilar a visão da mão ao esquema visual e motor do ato que consiste "ver agarrar" (PIAGET, 1987, p. 119). Aqui está presente um duplo esquema de assimilação: o de ver e o de agarrar o objeto, que se coordenam;

5ª Etapa – Faz-se presente uma generalização das coordenações presentes na quarta etapa: “... tudo o que é para ver também é para agarrar e tudo o que é para agarrar também é para ver...” (PIAGET, 1987, p. 123).

Para isso ocorrer é necessário que haja certa organização dos esquemas de preensão, com a sucção e a visão que permita com que se possa chegar a esta etapa. Estes esquemas quando organizados permitem que o sujeito adapte-se melhor ao mundo exterior, já que adaptação comporta um equilíbrio entre aquilo que se acomoda e se assimila do mundo exterior através dos esquemas mentais, coordenados em uma organização interna e externa dos esquemas adaptativos, conquistando assim um conjunto de significados.

Fase 3 – As adaptações sensório-motoras intencionais: A Inteligência propriamente dita

Por que somente nesta fase se evidencia a intencionalidade ou a ação propriamente inteligente? Porque para se falar em intencionalidade, segundo Piaget (1987), é necessário que se tenha coordenação de meios e fins, ou seja, aquilo que o indivíduo assimila deverá obrigatoriamente ser através de uma coordenação de esquemas, sendo estes dirigidos por uma consciência de um desejo a ser realizado.

Piaget (1987) afirma que quando um bebê de dois meses chupa o polegar, há tão somente uma coordenação da mão e da sucção de maneira simples e direta, pois bastará à criança o ato de se alimentar, satisfazendo tão somente uma necessidade.

E do contrário, quando uma criança por volta de oito meses de vida afasta coisas ou obstáculos para que possa atingir um objetivo, pode-se falar que aí está presente uma intencionalidade, ou seja, está presente uma consciência que busca satisfazer um desejo, havendo um despertar através de um estímulo de se agarrar algo, somente se satisfazendo quando se ultrapassam os atos intermediários, no caso os objetos a serem afastados. Também se pode falar de intencionalidade, visto que para se atingir um objetivo final há um caminho a ser percorrido ou vencido até efetivamente se atingir o que se quer, ou seja, transpor obstáculos. Neste quadro, pode-se afirmar que para chegar àquilo que foi planejado inicialmente há a necessidade de se coordenar esquemas, no caso, da visão e da preensão. Assim, para haver intencionalidade é necessário que o sujeito coordene e organize as suas ações. Neste sentido, a assimilação dos objetos começa a apresentar um quadro mais móvel, porque superará os dados até então visto como isolados pelo sujeito, uma vez que havendo coordenação e intencionalidade, seus atos passam a ser dirigidos e coordenados não somente para um evento ou uma situação, mas para outras situações que serão advindas, inclusive para aquelas que a posteriori necessitarão por acomodação o estabelecimento de relações espaços-temporais, de causalidade e de substância.

Esta inteligência possui sempre uma história até as combinações mentais e os novos meios para inventar algo e resolver as ações.

As reações Circulares Secundárias (por volta do 3º até o 7º mês de vida)

 Piaget (1987, p. 150) diz que: "... toda ação implica uma organização móvel, com dissociações e reagrupamentos indefinidos, podendo o sujeito atribuir-se, desse modo, finalidades cada vez mais independentes da sugestão do meio imediato".

Nas suas fases de evolução, deve-se levar em conta que na medida em que o sujeito se desenvolve, o mesmo vai fazendo "releituras" mais complexas da realidade, pois de posse de coordenação de seus esquemas, consegue vencer seu “egocentrismo inicial”, de que tudo que gira e/ou acontece é em função de si mesmo, passando a encarar o mundo como algo complexo e que necessita ser reinterpretado, pois o que está em jogo são as capacidades não só de assimilar dados desse meio, mas também em oferecer ao mesmo, elaborações mais completas daquilo que o cerca. É fundamental então não só oferecer respostas imediatas àquilo que o meio exerce pressão, mas reinventá-lo, recriá-lo, construí-lo.

Esta fase, portanto, apresenta um caminho altamente relevante e significativo: proporcionará um intermediário, que é um caminho entre o universo relativamente "obscuro" das fases anteriores e o universo relativo ao mundo da inteligência.

1 – Os fatos e a assimilação reprodutora

São atos destinados a reproduzir os movimentos dos órgãos acionados ou utilizados. Podemos exemplificar através de uma situação quando uma criança por volta dos três meses de idade, estando à frente de um objeto, no caso de uma argola presa por uma corrente; a criança olha primeiro para a argola e depois para a corrente, agarrando-a posteriormente. Neste sentido, a corrente não só se tornou um valor visual para a criança, mas também tátil. Para que a criança posteriormente agarre a corrente e a balance, afim de que a corrente e a argola sejam colocadas em movimento pela ação da criança, é necessário que haja uma coordenação tátil-visual, não implicando que ela entenda os mecanismos relativos à relação corrente-argola.

Nesta situação, segundo Piaget (1987), há uma ligação de eficácia entre a preensão da corrente, movida por uma adaptação do braço e os movimentos da argola, o que equivale a dizer que a criança não concebe a corrente como prolongamento da argola e sim uma "simples coisa a sacudir, balançar", quando se deseja ver e ouvir o movimento. Esse exemplo evidencia uma ação exercida sobre as coisas e assimilar as coisas pressupõe de início uma base puramente fisiológica, que depois se prolonga e aos poucos segundo as fases de desenvolvimento que o sujeito atravessa, vai elaborando novas leituras sobre as coisas e os objetos que a circunda, pois a base fisiológica se subordina à dimensão psicológica, que também possui leis próprias de funcionamento, porém, que não se encerram em si mesma e sim que "se abrem para o exterior" e se presentificam na elaboração e construção do conhecimento sobre o mundo exterior. Melhor: que as operações de um mecanismo já organizado se consolidam em seu funcionamento e este funcionamento se dá utilizando um dado do meio exterior a si; aquilo que o objeto é, é segundo aquilo que o sujeito impõe sobre os objetos, através de suas atividades de assimilação e acomodação. Para a criança, o objeto só passa a ter sentido e valor quando são entendidos mediante as suas atividades, embora ainda não saiba prever quais os resultados que serão advindos.

2 – A acomodação e a organização dos esquemas

Piaget (1987, p. 171) diz que: "Reencontrar os movimentos que levaram aos novos resultados observados".

Esse movimento faz com que a criança exerça acomodações infinitas, já que o real e os objetos proporcionam tais possibilidades. É claro que nunca uma acomodação é pura, pois envolve a priori assimilações primárias anteriores. A diferença fundamental neste período é que entre as reações secundárias e as reações primárias está centrado em um interesse fundamental: no resultado exterior e não mais na pura atividade do sujeito. Neste sentido, a intencionalidade e a atenção são dirigidas forçosamente para o exterior e não apenas no funcionamento. Sendo assim, essas atividades são ao mesmo tempo conservadoras, pois demonstram a atividade do sujeito através de seus esquemas mentais e prolongadoras, pois se exteriorizam quando entram em contato com o objeto, repercutindo em uma ação direcionada, resultando em uma materialidade.

Pressupõe-se aqui um caráter de organização ou totalidade, pois se deve levar em conta que cada esquema mental possui sua "totalidade", porém cada totalidade não é independente, possui uma relação intrínseca com outros esquemas, os quais inter-relacionados, através de uma coordenação de meios e fins, oferecem um “acabamento final” da chamada organização.

Essas totalidades de organização funcionam de maneira a constituir ou a reconstituir o todo ou a originalidade. Um esquema novo é elaborado a partir do contato com as coisas ou com os objetos. É na constituição das relações dos objetos que começam a se constituir "valores" no sentido de se dar significado às coisas, ou seja, quando o sujeito de posse de coordenações de seus esquemas mentais, por exemplo, visão e preensão, verifica os resultados, podendo afirmar que constituiu ou elaborou um sentido chamado "ideal", pois tal quadro foi submetido às totalidades do sujeito.

Neste sentido, se enuncia um esboço de um ato inteligente e não um ato completo de inteligência, que se caracteriza não submeter-se a uma necessidade, mas em adaptar-se em uma assimilação uma situação nova a esquemas anteriores e acomodar estes esquemas a novas circunstâncias.

3 – A assimilação recognitiva e o sistema de significações

Nesta fase, pode-se falar de assimilação recognitiva, no sentido de que para a criança, o significado da adaptação é restrito no sentido de registro do acontecimento e de reconhecimento do objeto. Neste aspecto, pode-se afirmar que tal assimilação implica tão somente o reconhecimento de um esquema sensório-motor. Tal assimilação é reprodutora porque implica o reencontrar um resultado interessante, configurando assim a reação circular secundária.

Esse reencontro reforça a tese de que cada vez mais esse reconhecimento é mais preciso, visto que um esquema é novamente acionado através de um contato com os objetos, porque há uma espécie da significação, pois esta só é possível graças a uma assimilação do objeto a um sistema de esquemas presentes no sujeito, que se organiza quando defronta situações perante os objetos.

Mas para que os objetos tenham sentidos ou significados, faz-se necessário esclarecer o que é significado e o que é significante diante do quadro da assimilação recognitiva.

Significado é o que se leva em conta dos objetos, definidos não só através de contato sensório-motor com os mesmos, mas também pelo estabelecimento de conceitos gerais e ainda por suas características individuais, como posição espacial, solidez, entre outros. Tal quadro, portanto, revela que um significado não se dá tão somente por aquilo que se assimila diretamente dos objetos, mas em conjunto com uma elaboração intelectual do sujeito, envolvendo, ao mesmo tempo, mecanismos de assimilação e acomodação e uma conseqüente organização por parte deste mesmo sujeito.

Significantes são todas as qualidades sensíveis dos objetos que se registra de uma única vez através dos órgãos sensoriais, envolvendo o acionamento de esquemas para tal, sendo que, portanto, os dados perceptíveis dos objetos servem apenas como se fossem indícios à dimensão intelectual.

Percebe-se então que essa relação entre significante e significado faz parte de um sistema constituído. Dessa maneira, quando um bebê enxerga um objeto, a aparência visual deste é apenas um significante, o significado é dado quando é constituído pelas outras qualidades que estão presentes no objeto, porém elaboradas pelo sujeito.

4 – A assimilação generalizadora e a constituição dos processos

A constituição desses processos generalizadores visa a estabelecer que a criança assimile algo quando é colocada diante de objetos, assimilando-os a seus esquemas. Essa assimilação não apresenta ainda o caráter de investigação, mas de interessar-se pelo que ocorre em sua relação com os objetos.

Essa experiência visa, sobretudo, em procurar "compreendê-los", através de atividades generalizadoras, que o sujeito desenvolve durante essa relação, ou seja, em como assimila os objetos a seus esquemas. Esse exercício revela que independente da situação em que se encontra, a criança procura sempre de uma mesma determinada maneira assimilar os objetos. Por exemplo, em uma situação que a criança vê o objeto de longe, a mesma não consegue avaliar a distância, se está longe de si; por conseqüência, reage de maneira como se o mesmo estivesse.  Neste sentido, por meio de uma restrita coordenação de esquemas visuais, de uma maneira quase que imediata, tenta agarrar ou pegar o objeto. Nesta situação, a criança reproduziu seus gestos de acordo com experiências anteriores que teve com outros objetos, não avaliando a experiência com que está se defrontando.

Estes fatos levam ao entendimento de que, quando a criança em uma posição de testemunha perante os objetos, tenta através de sua ação fazer com que as situações se tornem, segundo Piaget (1987), "espetaculares", equivalendo a dizer que tal atividade nesta fase constitui-se em um "hábito", centrada e lógica em si mesma e não na realidade dos objetos, portanto, não havendo ainda um caráter de investigação, mas tão somente pelo interesse que possui pelos mesmos.

Fase 4 – A coordenação dos esquemas secundários e suas aplicações a novas situações

Esta fase ocorre aproximadamente entre oito a nove meses de idade e se caracteriza por transformações solidárias no que se refere ao mecanismo da inteligência à construção de grupos espaciais, séries causais e temporais.

Nesta fase, há a coordenação mútua dos esquemas secundários, equivalendo a dizer que quando da experiência com os objetos tal relação não está mais restrita a reproduzi-lo, porém a estabelecer novas combinações. Exemplificando tal situação, supondo que no caso da procura de um objeto desaparecido, sendo este ocultado por outros, a criança afasta os obstáculos, aqueles que escondem o objeto a ser procurado, o que vale dizer que a criança já situa os objetos uns em relação aos outros e percebe não só a relação que ela própria tem com o objeto, mas também as relações deste com outros, evidenciando coordenações de caráter espacial e causal, já que busca a origem, ou seja, onde está o objeto que até então estava presente e ainda certo entendimento da duração do tempo da experiência que teve com o objeto.

Há que se ressaltar que mesmo constatando um avanço no que se refere às coordenações em caráter espacial, causal e temporal, ainda assim a percepção da criança está diretamente relacionada ao objeto experenciado, ou seja, seus atos ainda são "conservadores" no sentido de que estas coordenações estão ligadas à necessidade da presença do objeto.

Porém, há que se salientar que na procura pelo objeto desaparecido, afastando os obstáculos, há uma intencionalidade direcionada para a resolução de um problema, o que caracteriza um ato inteligente ou uma adaptação inteligente, pois tal ato não se restringe tão somente em assimilar através de seus esquemas as particularidades do objeto e sim "interpretá-lo, buscar relações, estabelecer sentidos".

Deve-se levar em conta também que nesta fase, apresentam-se duas situações altamente relevantes e que vêm se diferenciar da fase anterior, a qual reforçava reações circulares secundárias:

1) O sujeito, no contato com os objetos, atinge o resultado através das dificuldades encontradas;

2) Coordenação de dois esquemas independentes, o que inclui a coordenação de meios e fins, ou seja, que para se agarrar um objeto, é necessário coordenar um esquema sensório-motor e ainda dirigir uma intencionalidade para a concretização de uma ação. Neste sentido, a adaptação inteligente se reveste de duas novas características, segundo Piaget (1987, p. 220): "A escolha e a prosecução de fins constituem a primeira dessas adaptações; o ajustamento dos meios aos fins implica, por outra parte, uma segunda adaptação, doravante imprescindível à primeira".

A relação entre essas duas características pode ser explicada da seguinte maneira: uma atividade inteligente só pode ter início através de esquemas os quais permitem assimilar dados dos objetos, sendo conservadora no sentido de poder experimentar dados desses mesmos através de ações como agarrar os objetos, agitos breves, entre outras reações. E as adaptações são provenientes de situações nas quais se encontram obstáculos a serem transpostos pelo sujeito quando da presença dos objetos.

O ultrapassamento desses obstáculos só é possível quando há uma ação intencional de transpô-los. Em outras palavras, só é possível o ultrapassamento se houver primeiro assimilação dos dados do objeto, através da coordenação de esquemas presentes no sujeito e, por fim, uma coordenação final que possibilite ao mesmo tempo assimilar dados e transpô-los, quando se deseja alcançá-lo através de obstáculos intermediários. E esses esquemas continuam a se desenvolver na medida em que a criança encontra em várias situações diversos objetos a sua frente. Aí surge a necessidade de se realizar operações de inclusão, de ordem, de interferência e de negação.

Essas coordenações ao mesmo tempo em que se integram em um todo, também se diferenciam para reagruparem-se quando da diversidade de situações encontradas.

Essas mobilidades de esquemas, no caso sensório-motores, permitem entender que as relações estabelecidas com os objetos possuem e supõem definições espaciais, temporais e causais, porque ao mesmo tempo em que fazem inferência aos objetos, interferem no entendimento sobre eles. E essa coordenação permite à criança não atingir um novo objetivo ou ainda descobrir um novo processo, mas limita-se a coordenar dois esquemas: o do meio e dos fins (acomodação).

Portanto, organizar algo é colocar algo sob as formas que o sujeito possui, ou seja, através de seus esquemas coordenados de assimilação e acomodação, havendo dessa maneira a organização dos objetos por parte do mundo interno do sujeito. À medida que o sujeito se desenvolve, a organização dos objetos através da assimilação e acomodação irá ser tornando cada vez mais complexa, pois revelará a descentração do "eu", uma vez que implicará a consciência e separação do "eu" e do mundo exterior.

Por último, pode-se afirmar que nesta fase ainda não há representação, porque há uma ausência da função simbólica ou simbolismo, visto que o sujeito necessita ainda estar "à frente dos objetos" e o objeto terá valor tão somente mediante sua utilização.

Fase 5 – A reação circular terciária e a descoberta de novos meios por experimentação ativa (por volta do 10º mês de vida até 1 ano e 3 meses de vida)

Esta fase se caracteriza por uma coordenação superior dos esquemas, ou seja, uma coordenação dirigida. Essa coordenação visa não apenas reproduzir o efeito obtido, mas modificá-lo, pois já não se trata tão somente de utilizar os esquemas, mas procurar novos meios de entender os objetos, constituindo dessa maneira "as reações circulares terciárias".

Essas reações se caracterizam por uma espécie de emissão de juízos quando do ato de interpretar o objeto. O que equivale dizer que a assimilação é um dado de juízo à medida que compreende uma dedução virtual (ou ato), quando da experimentação de algum objeto. Exemplificando: quando uma criança deixa um objeto cair de sua mão, agora ela acompanha o cair deste objeto quantas vezes assim o desejar, independente se cai do lado esquerdo ou direito, aliás, o persegue especialmente o lado pelo qual cai quando solto. Neste sentido, ao repetir tal gesto, procura compreender o porquê da queda deste objeto, mesmo descobrindo por acaso o acontecimento.

Portanto, a novidade está em buscar o objeto em si mesmo e não apenas em aplicar seus esquemas ao objeto, havendo então o que se chama de "descentração", pois a criança ao mesmo tempo em que se interessa pelos resultados de seus movimentos, ainda tenta enquadrar todos os objetos em seus esquemas em função de uma experiência. Em suma:

 "Sempre há acomodação de um esquema e o fato de acomodar um esquema anterior de assimilação consiste em diferenciá-lo em função da experiência atual. Com efeito, a "experiência pura" jamais existe. Para descobrir algo novo, a criança só percebe e só concebe o real em função de seus esquemas assimiladores (PIAGET, 1987, p. 263).

Neste sentido, toda vez que a criança assimila algum dado do objeto por ocasião de uma experiência, um esquema de assimilação sempre será acionado por ocasião desta e de outras situações, sendo que os objetos subseqüentes a serem assimilados o serão mais rapidamente.

Sendo assim, Piaget (1987) designa que neste momento há a aprendizagem, pois a partir da assimilação haverá um ajustamento às novas situações dos esquemas que já foram anteriormente constituídos. Esse ajustamento configura a acomodação, que se orienta primeiramente pelos esquemas inicias de ajustamento a uma situação e depois pelo caráter da intencionalidade, ou seja, pela ação do sujeito sobre as coisas.

É importante ainda salientar que uma experiência só tem sentido através das ações que o sujeito tem sobre as coisas e essas ações possuem significado porque são apreendidas pela consciência do sujeito, portanto é impossível a realização de uma experiência por ela mesma. Aliás, ela existe porque o sujeito a faz, a realiza, a concretiza, já que uma acomodação de experiências prevê uma série de experiências cumulativas que o sujeito tem com o meio e que são assimiladas e a partir dessas assimilações, através dos esquemas que o sujeito possui, formando dessa maneira uma totalidade, sendo que pelo funcionamento dos esquemas, ou seja, de uma estrutura, se dá a coordenação das ações. Portanto, quando de um funcionamento é que um esquema se estrutura. 

                       "A aprendizagem não é outra coisa, com efeito, senão uma reação circular que se desenvolve por meio de assimilações reprodutivas, recognitivas e generalizadoras" (PIAGET,1987, p.279).

Pode-se concluir, então, que a inteligência sensório-motora é representada através de dois grupos:

1) O das reações circulares, secundárias e terciárias – a repetição de um resultado obtido por acaso e relativo à exploração de um dado exterior se impondo sem ter sido escolhido, levando o sujeito a assimilá-lo. Pode-se considerar este grupo como um grupo que procura ajustar os meios e os fins. São atos inteligentes, porém limitados, porque se encerram em uma perspectiva que procura reencontrar os meios que possibilitam a garantia de um resultado (reação circular secundária) e ainda fazer o objeto se enquadrar em um ou vários esquemas pertencentes ao sujeito;

2) Caracteriza-se pela intencionalidade do sujeito. Segundo Piaget (1987), esse grupo possui como particularidades a "aplicação de meios conhecidos às novas situações”, “a descoberta de novos meios por experimentação" e a "invenção de novos meios por combinação mental". Em outras palavras, o sujeito diante das situações novas que se encontra, necessita descobrir quais são os meios adequados que precisa utilizar para atingir os fins, os quais não são fornecidos imediatamente, portanto realizar experimentação, sendo que a posteriori esta experimentação torna-se interiorizada, já que se converte em experiência mental.

Tal experiência apresenta um quadro novo: o interesse pelos resultados exteriores, pois a acomodação que se realiza ainda é devida por pressões do meio exterior e não por abstração mental do sujeito. Porém, esta experimentação já implica a tentativa de se combinar ou unir a experiência que o sujeito realiza com a atividade assimiladora, ou seja, de que a representação dos objetos está ainda vinculada à percepção dos mesmos.  Tal grupo apresenta ainda a chamada "previsão", pois no âmbito de outras novas experiências o sujeito tende a generalizá-las, ou seja, repetir as mesmas ações, criando uma tendência de antecipar condutas quando das experiências realizadas.

Finalizando, reforçando a idéia de Piaget que:

 "... as condutas características das diferentes fases não se sucedem de maneira linear (desaparecendo as de uma determinada fase no momento em que desenham as da seguinte), mas à maneira das fases de uma pirâmide (direita ou invertida), em que os novos comportamentos se somam, simplesmente, aos antigos para complementá-los, corrigi-los ou combinar-se entre eles" (PIAGET, 1978, p. 309).

Fase 6 – A invenção de novos meios por combinação mental (a partir do 1 ano e 4 meses de vida aproximadamente)

Nesta fase, já se pode falar em uma inteligência sistemática, a qual se caracteriza pela dedução em ato ou combinação mental.

Essa inteligência sistemática remete a um principio do estabelecimento de relações, implicando a combinação mental das experiências realizadas, culminando com a dedução obtida através de uma experimentação ativa em relação aos objetos.

Essa experimentação pressupõe levar em conta que os objetos a serem assimilados não o mais serão por um simples contato, por assim dizer, mas que os próprios objetos muitas vezes apresentarão obstáculos a serem transpostos, já que neste momento a intencionalidade se dirige a um objeto que muitas vezes não está ao alcance direto, portanto havendo a necessidade de serem transpostas barreiras, as quais impedem momentaneamente um contato direto com o mesmo.

Sendo assim, a criança precisará inovar, movimentar, transpor obstáculos, necessitará interpretar os dados e não mais apenas percebê-los. Para isso, é necessário combinar mentalmente operações e o executar para poder atingir aquilo que se deseja.

Há que se ressaltar que a criança não evocará memória de imagens e sim que este processo nesta fase nada mais é do que um auxiliar, um ajudante no sentido de se construir uma sistematização inicial das relações entre sujeito e objeto.

Porém, aqui há a necessidade de explicar o funcionamento deste mecanismo, ou seja, de como se dá essa reorganização entre o assimilado através da inteligência sensório-motora e a reorganização dos esquemas?

É importante frisar que isso se dá através de uma assimilação recíproca, ou seja, cada esquema assimilador possui sua estrutura, suas funções; porém em determinadas situações há a necessidade de o sujeito organizar o real, ou melhor, entender o que de fato realmente está acontecendo; há uma convergência por parte de todos os esquemas envolvidos (visão, audição, tato, etc.), a fim de que através de uma coordenação de esquemas, o objeto em questão seja assimilado.

Porém tal assimilação ultrapassa o dado imediato, e culmina através de uma atividade do sujeito, por meio de dedução ou combinação mental, que resulta em "resolver problemas", ou seja, tentar interpretar o objeto nas suas mais variadas manifestações.

Sendo assim, os dados assimilados pelo sujeito através de suas percepções, segundo Piaget (1987), "excita e faz funcionar", no sentido de que são interiorizados através de uma experiência mental, o qual possui esquemas de funcionamento e que prolongam e ultrapassam os dados iniciais fornecidos pelo contato direto com os objetos.    

Dessa maneira, reforça-se a tese de que o esquema de assimilação não é uma atividade em si mesma, mas que ao mesmo tempo é assimiladora e acomodadora, pois só se apresenta como tal através da experiência, portanto é uma atividade e não só estrutura. Portanto, esta fase apresenta uma grande novidade: a combinação mental que se caracterizará por uma representação interna dos objetos, isto é, de que intencionalmente poderá se planejar ações em virtude de situações que a realidade apresenta, ou seja, por meio de uma interação entre os objetos e o sujeito, o próprio sujeito representa ou "inventa" o real, ou seja,constrói imagens do mundo.

Conclusões sobre a Inteligência

Há várias teorias que defendem a idéia de que as operações da inteligência derivam de certos mecanismos passivos, comumente relacionados ao hábito, costume ou reflexo condicionado, colocando assim certa passividade neste processo.

Pode-se afirmar que se há a possibilidade de se "conhecer" o mundo, levando-se levar em conta que inicialmente o indivíduo possui esquemas ativos (sucção, visão, fonação, audição e preensão), que por intermédio da experiência que se estabelece com os objetos, os fazem "conhecer" o mundo que o rodeia, pois desde o início da vida já há o desafio de compreendê-lo, e isso só é possível adaptando-se a ele. Esta adaptação é caracterizada por incorporação dos dados do mundo, através de esquemas herdados do ponto de vista funcional biológico, que quando ativados, ou melhor, colocados em funcionamento através de nossas atividades perceptivas, possibilitam que assimilemos dados do mundo real, incorporando-os assim à nossa atividade intelectual.

Ao que afirmamos que o meio é assimilado à atividade do sujeito.

Sendo assim, os hábitos e as associações existem graças às atividades do sujeito que preparam a atividade da inteligência. Se a criança encontra um objeto ou estabelece algum resultado interessante é porque esse resultado é assimilado a um esquema que o acomodou. E essa acomodação se dá por um processo, por intermédio de um esquema existente havendo inserção de novos elementos sensório-motores.

Portanto, há atividade reflexa, porque já existe uma série de esquemas hereditariamente (biologicamente) montados e o seu funcionamento representa uma atividade assimiladora à medida que se apóia em uma base biológica que supera esta por intermédio da ação ou atividade sensório-motora. Neste sentido, de início, esta atividade assimiladora é meramente funcional. Posteriormente, quando esta se estende a outros objetos, torna-se generalizadora e por último torna-se recognitiva quando se percebe o objeto a partir das coordenações sensoriais, pressupondo assim uma organização tanto dos esquemas quanto do ato de assimilar.

Neste sentido, durante um longo percurso processual a inteligência culmina como algo que constrói novidades, ou seja, em cada fase que atravessa há releituras da realidade e dos objetos que circunda o sujeito, para compreender melhor o mundo que o cerca.

Se de início as leituras que o sujeito faz do mundo estão relacionadas diretamente sobre atividades sensório-motoras que realiza sobre os objetos, à medida que vai se desenvolvendo, suas releituras da realidade vão se tornando cada vez mais complexas, já que começa a ter uma maior compreensão da realidade, construindo explicações cada vez mais especializadas e complexas.

Dessa maneira, a inteligência se constrói ao longo de um processo e não um dado a priori, pois para o sujeito compreender a realidade é necessário que interaja com o mundo, assimilando dados deste, interpretando-o e reinterpretando-o.

O estudo da inteligência de Piaget leva a compreender melhor o que é este aparato e investigar como se constrói o conhecimento e as fases de desenvolvimento cognitivo que o sujeito atravessa.

BIBLIOGRAFIA

ARRUDA, A. C. J. Z. Inteligência e Ensino de Ciências: um estudo fundamentado na Epistemologia Genética de Piaget. Tese de Doutorado. Bauru: UNESP, 2009;

BECKER. F. Da ação à operação . O caminho da aprendizagem em J. Piaget e P. Freire. Rio de Janeiro. DPA. 1997;

PIAGET, J. Biología e Conhecimento. Petrópolis: Ed. Vozes, 1973;

PIAGET, J. Estudos Sociológicos. RJ: Forense, 1973;

PIAGET, J. Introduccion a la Epistemologia Genetica. 1 – El pensamento físico. Buenos Aires: Paidos, 1975;

PIAGET. J. A Construção do Real na Criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1975;

PIAGET, J. Psicologia da Inteligência. RJ: Zahar Editores, 1977;

PIAGET. J. Psicologia e Epistemologia. Rio de Janeiro: Forense, 1978;

PIAGET, J. A Epistemologia Genética. São Paulo: Abril Cultural.1978PIAGET. J. Seis Estudos de Psicologia. Rio de Janeiro: Forense, 1984;

PIAGET. J. O Nascimento da Inteligência na Criança. Rio de Janeiro: Zahar,1987; e

PIAGET, J., INHELDER, B. A Psicologia da Criança. Rio de Janeiro: Bertrand, 1994;

*ANTONIO CARLOS JESUS ZANNI DE ARRUDA











-Graduação em Pedagogia pela Universidade do Sagrado Coração (2017);

- Graduação em Filosofia pela Universidade do Sagrado Coração (1996);

- Mestrado em Educação para a Ciência pela UNESP (2004);

-Doutorado em Educação para a Ciência pela UNESP (2009); e

- Pós doutorado em Educação pela UNESP (2020)


-Trabalha no Ensino Superior nas mais variadas disciplinas, como filosofia, ética e responsabilidade social, antropologia, metodologia científica e filosofia da educação) ;

-Possui experiência na EAD (Educação a Distância) como tutor e elaborador de conteúdos, de projeto pedagógico e gestão de processos;

-Possui conhecimento em metodologias ativas;

- É parecerista ad hoc de avaliação de artigos científicos na Revista Educação e Filosofia na UFU (Universidade Federal de Uberlândia);

- Participa do grupo de estudos em Desenvolvimento Moral na UNESP de Bauru - SP;

-Possui competências em Gestão Educacional, incluindo em especial a liderança e gerenciamento de professores, coordenadores universitários e processos acadêmicos;

 -Possui contato e experiência com o SINAES, ENADE, FIES, PROUNI, Censo de Ensino ;CPC’s de Curso Superior, Projetos Pedagógicos de Curso, Projetos de Desenvolvimentos Institucional, Avaliações de Cursos, projeto de elaboração e solicitação de abertura de cursos na modalidade EAD junto ao MEC e ainda recepcionar avaliadores do próprio MEC. 

-Lider de Grupo de Pesquisa em Epistemologia e Filosofia. 

-Possui conhecimento em metodologias ativas. É parecerista ad hoc de avaliação de artigos científicos na Revista Educação e Filosofia na UFU (Universidade Federal de Uberlândia). Participa do grupo de estudos em Desenvolvimento Moral na UNESP de Bauru - SP.


Contatos:

e-mail: arrudafilosofia@hotmail.com

linkedin: Carlos Arruda

Tel: (14) 991152195

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Nota do Editor:

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sexta-feira, 15 de setembro de 2023

As raposas que estão destruindo a Terra do Nunca


Autor: Alberto Romano Schiesari(*)

Imagine que você está na Terra do Nunca. É onde nunca as coisas certas vão vencer, nunca o bem vencerá o mal, nunca a "verdade verdadeira" dos fatos poderá ser revelada, nunca se viu tanta pilantragem como nesse momento em que você olha à sua volta.

O que você vê?

Do lado esquerdo: raposas do mal dizendo-se coelhinhos. Do lado direito: mais raposas fingindo serem coelhinhos. O mal disfarçado de bem. Em baixo, sendo pisados pelas raposas, há coelhos inocentes e ingênuos que são apenas objetos da volúpia das raposas. É o bem sendo massacrado pelo mal.

Há décadas se escuta o mantra "A Terra do Nunca é o país do futuro", provavelmente criado por raposas especialistas em marketing. A grande esperteza dessa frase é que ela mata dois coelhos com uma única cajadada.

O primeiro coelho é a criatura ingênua que acredita que "o país do futuro" significa "o país que no futuro será melhor, mais desenvolvido, menos corrupto, com uma justiça justa de verdade, onde a justiça injusta não tem vez. E, obviamente, com mais cenouras, a preços acessíveis, para todos os coelhos se fartarem".

Nem passa pela cabeça dos coelhos ingênuos que a interpretação correta da frase é "o país do futuro medíocre, da continuidade e aprofundamento da desigualdade entre os pobres coelhos e as ricas raposas (não existem raposas pobres), do futuro pior do que o presente e o passado, da educação servil às safadezas raposais".

O segundo coelho é aquele que recebe a mensagem subliminar de que algo está sendo feito para que o futuro dos coelhos seja melhor, e ainda acredita piamente nessa mentira esfarrapada. Isso é algo muito distante da realidade. O que de fato está sendo feito pelas raposas é uma ampla ação orquestrada por raposas pilantras, cujo objetivo único é estabelecer fundações sólidas, capazes de sustentar um sistema que apenas as favorece.

Benesses financeiras, jurídicas, de poder, e de controle de orçamento são distribuidas a uma minoria de raposas privilegiadas, poucas das quais têm as condições mínimas necessárias para exercer as funções e cargos que lhes são confiados.

São raposas cuja única função é amealhar beneficios para si próprias e para a raposada, às custas da exploração de coelhos servis, idiotizados. É um processo harmônico, em âmbito mundial: se assim não fosse, por qual razão uma raposa que finge ser do bem iria publicamente defender raposas do mal?

Isso tudo é um projeto coordenado por raposas de elevado QI, para as quais vale tudo para atingir seus maléficos objetivos. Elas são capazes de iludir coelhos tal qual efeitos especiais iludem espectadores nos cinemas e na TV.

É de amplo conhecimento o fato de que nos regimes raposo-ditatoriais a escolha das raposas que devem chefiar coelhos é baseada apenas no nível de aderência que as candidatas mostram ao projeto de poder das raposas que são as poderosas chefonas.

Além dos coelhos ingênuos há, sim, coelhos que conhecem a verdade dos fatos, pronunciam-se sobre isso, e também são valentes e determinados. Preocupam-se em denunciar e brecar os movimentos das raposas. Mas tais coelhos têm sua reputação vilipendiada com deslavadas mentiras raposais. Eles são castrados, destituidos de seus legítimos direitos, pressionados a calar a boca, ameaçados de prisão e morte. É o método da castração e extermínio sem razão, sem dó nem piedade, fartamente usado pelas raposadas hitleristas, stalinistas, putinistas, maduristas, castristas, e assim por diante.

As raposas constituem, isso sim, uma agremiação de pilantragem.

Qualquer que seja o lado em que você vê uma raposa, à direita ou à esquerda, elas têm muita coisa em comum, um 
lugar comum que as faz farinhas do mesmo saco.

Uma delas certamente é o esmero em lamber as partes baixas das raposas-líderes acima citadas. Por falar nisso, é impossível, neste momento, deixar de comentar uma notícia bem fresquinha. Merece “menção honrosa” a podre e recente manifestação da líder máxima das raposas católicas, a qual engrossou a fila dos adoradores da raposa-mor russa, uma notória vigarista, viciada em assassinar quem ousa se opor a ela.

Mas, voltando às raposas da Terra do Nunca,, temos que nos render à sua pontualidade. De forma a não perder a hora, há aquelas do lado direito que adoram usar Rolex, e sabem direitinho o preço desse hábito. Tanto que, coitadinhas, tentam vender tal produto nas lojas de penhor dos EUA para, talvez, terem o que comer.

De forma similar, há raposas do lado esquerdo que adoram ver a hora no Patek Phillippe que adorna seus pulsos, presenteado por não sei quem, oferecido sabe-se lá sob quais pretextos, mas avaliado sabe-se exatamente por quanto.

Outra característica comum às raposas, sejam elas do lado esquerdo ou direito, é o empenho, o prazer e a alegria de observar sua prole se tornar bem sucedida como raposas empreendedoras. Pequenos negócios que, nas mãos dos mais sábios coelhos, seriam fadados a se enquadrar como micro-empresas, se dirigidos por descendentes de raposas tornam-se nascedouro de grandes fortunas. É a mágica contabilidade raposal...

Quer mais smelhanças entre as raposas do lado direito e do lado esquerdo? Elas fingem ser defensoras dos coelhos pobres e oprimidos, mas todas são extremamente ricas. Vivem na opulência, gastam fortunas com raposas advogadas para se livrarem das ilegalidades que cometem. Gastam dinheiro grosso também com pernoites em tocas de alto luxo quando viajam a serviço. E quem paga isso tudo? Os coelhos...

Citemos mais outros denominadores comuns entre as raposas de ambos os lados.

A soberba é o primeiro que deve ser lembrado. Sempre falam com uivo grosso aos coelhos, principalmente com os insurgentes. É a forma de dizer: "Aqui quem manda sou eu" ou "Aqui eu faço o que quero, não importa a lei. Se eu precisar e se eu quiser eu mudo a lei, eu pago para que ela seja mudada ".

As raposas que detêm o poder também engrossam as cordas vocais ao falar com algumas outras raposas. Mas, nesse caso, debaixo dos lençois todas elas se abraçam e conversam amigavelmente. Nem abordam a questão de serem de um lado ou de outro. Entre um uísque 30 anos e outro, acertam os rasgos temporários de sua relação, serzindo-os com emendas inimagináveis e polpudas.

Ao final das contas tudo é apenas uma encenação para justificar acordos repugnantes, que prolongam a continuidade do poder máximo às raposas da vez, e certos privilégios indizíveis para as raposas que nem se importam muito com o poder máximo, visto que conseguem se beneficiar independentemente de quais raposas sejam as chefonas. São hermafroditas das ideologias, raposas que ora correm para a esquerda, ora estão comodamente alojadas ao lado direito. A escória da raposada.

Todas as raposas se dizem cumpridoras da lei. mas quando elas mesmas têm que enfrentar a justiça justa, elas se borram de tanto medo. C omo consequência, vão bater nas portas da justiça injusta, e assim se livram de qualquer mal...

Para as raposas, vencer os coelhos bons e de coragem não basta, é preciso F**** com eles. De forma cruel, violenta, desleporídica. Para humilhá-los, espalhar o medo e calar a boca dos coelhos corajosos que ousam discordar delas. Para desencorajar as oponentes a se manifestar.

As raposas se travestem de diversas formas e agem seguindo diversas técnicas, consagradas e refinadas por várias gerações de raposas.

Elas se travestem de inocentes cordeirinhos, fingem que são como os coelhinhos, qualificam-se como animaizinhos inofensivos e democratas.]

Elas se fantasiam de criaturas honestas, não importa a obviedade de seus atos desonestos, como por exemplo o exercício ilegal da medicina.

Elas mentem deslavadamente, caçoando da inteligência dos coelhos. Tem até aquela que admite em público que mente, pois sabe ser impune.

Elas brindam e festejam vitórias contra os coelhos, obtidas com o demérito de terem sido compradas, pois se assim não fosse nunca teriam sido conquistadas.

Elas são fúteis, gostam de joias e objetos de valor, que surrupiam do patrimônio público coelhal.

Ladram, mas na hora H dão um jeito de fazer com que qualquer punição recaia sobre suas raposas camaradas e idiotas.

E assim a vida segue, raposas explorando coelhos. Estes, em infantil ingenuidade, vivem com a falsa esperança de que seus filhos viverão melhor, quando, na verdade, a vida deles certamente será muito pior, enquanto o domínio das raposas continue firme e forte.

E aqui, no final, vai o spoiler: as futuras gerações de coelhos serão cada vez mais desinformadas, informadas apenas com mentiras, criadas sobre falsas bases de conhecimento. Os coelhos ingênuos do bem terão como única finalidade servir as vitoriosas raposas do mal.

Haverá um momento em que talvez nenhum coelho saberá nada sobre como foi, de fato, o passado, este trágico presente que estamos vivendo. Será um tempo onde só haverá coelhos idiotizados, que viverão sob o domínio das raposas.

Esse tempo está muito mais perto do que sonham as vãs consciências dos inocentes coelhos. Hoje em dia a coisa já é parcialmente assim. Muito em breve quase todos os coelhos da Terra estarão dominados. A esperança é que antes disso haja algum fenômeno da natureza que destrua todas as raposas e os coelhos idiotizados. Que sobrem apenas os poucos coelhos que hoje combatem a dominação das raposas. Assim pode haver esperança.

E aqui uma dica aos coelhos cientistas e aos coelhos ingênuos: as raposas são seres vivos resultantes de uma putrefata involução dos seres humanos. Pesquisem nessa linha, reflitam sobre essa assertiva, e lhes serão reveladas coisas inimagináveis sobre a podridão que se instalou nesse ramo das criaturas vivas, a ponto de originar raposas tal qual elas são hoje em dia.

* ALBERTO ROMANO SCHIESARI


















-Economista;
-Pós-graduado em Docência do Ensino Superior;
-Especialista em Tecnologia da Informação, Exploração Espacial e Educação STEM; 
-Professor universitário por mais de 30 anos;
-Consultor e Palestrante.

Nota do Editor:

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