sábado, 15 de março de 2025

Carnaval do Pão e do Circo


Edição Especial do O BLOG do Werneck em Homenagem ao Dia do Consumidor

Autora: Silvana Cristina Cavalcanti (*)

Terminado o Carnaval... finalmente iniciamos o ano de 2025.

Todos brasileiros já sabem... o ano só inicia após o Carnaval. Por estas terras, a festa vai muito além da brincadeira dos foliões. É a época que ocorrem os maiores golpes, já que é considerado um dos maiores eventos do país, movimentando bilhões de reais, atraindo turistas do mundo inteiro, aquecendo a economia mas também enchendo o bolso dos golpistas.

Enquanto os bloquinhos, desfiles de escolas de samba e outros eventos tomam conta das ruas, avenidas; bairros inteiros viram palcos e muitos consumidores acabam enfrentando problemas que transformam a brincadeira do pao e circo em tremenda dor de cabeça.

Enquanto os bloquinhos, desfiles de escolas de samba e outros eventos tomam conta das ruas, avenidas; bairros inteiros viram palcos e muitos consumidores acabam enfrentando problemas que transformam a brincadeira do pao e circo em tremenda dor de cabeça.


Além dos furtos de aparelhos celulares, clonagem de cartões de crédito, etc., o aumento da demanda por passagens aéreas faz os preços dispararem. Além disso, casos de overbooking e cancelamentos inesperados são frequentes, deixando passageiros frustrados. Recentemente em redes sociais, uma atriz brasileira, inclusive foi obrigada a se retirar de seu assento para dar lugar a outra passageira, sem maiores explicações – e, isto ocorre muitas vezes, principalmente em datas com excesso de movimentaçao entre as companhias aéreas.

Muitas companhias aéreas dificultam reembolsos e remarcações, ignorando direitos garantidos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). O artigo 14 do CDC deixa claro que as empresas são responsáveis por prejuízos causados aos clientes, mesmo sem culpa direta, o que inclui situações como o overbooking.

Outra grande frustração vem dos pacotes de viagem e hospedagem, que muitas vezes não entregam o que prometem. Hotéis lotados, serviços não prestados e ofertas enganosas são comuns. E não para por aí: muita gente compra camarotes e abadás para eventos exclusivos e, na hora da festa, descobre que a estrutura é precária ou, pior, que não poderá entrar. Nesses casos, o artigo 35 do CDC garante ao consumidor o direito de exigir a entrega do que foi prometido, escolher um serviço equivalente ou receber o dinheiro de volta, com correção monetária.

Mesmo com essas garantias, resolver problemas durante o Carnaval pode ser complicado. A fiscalização não dá conta de tantos casos, e muitas pessoas acabam aceitando prejuízos por não saberem seus direitos ou pela dificuldade de reclamar em meio à correria da festa.

A publicação deste artigo no Dia do Consumidor reforça a necessidade de estarmos atentos aos nossos direitos. O Carnaval é um momento de diversão, mas também de lembrar que respeito ao consumidor não pode ser jogado para escanteio. 

Se você passou por esta situação ou conhece alguém que tenha se frustrado em meio a folia, temos algumas dicas que podem reduzir estes acontecimentos no próximo carnaval: 
1) programe sua viagem e seu pacote com antecedência, tire print de tudo, imprima e guarde em uma pasta; 
2) Se houver qualquer situaçao de overbooking, a Companhia Aérea é obrigada a emitir uma `declaraçao de contingência` – essa obrigatoriedade está prevista na Resolução 400 da ANAC, onde você deve se ater as informações ali contidas para que possa pedir o reembolso de sua passagem e uma indenização prevista inclusive; 
3) Procure comprar ingressos e abadás diretamente dos organizadores, evite a utilizaçao de atravessadores e cambistas – o barato sempre sai caro... não existe cerveja de graça; e
4) Deixe seu aparelho celular em casa, ou o leve agarradinho a você e não use cartão... leve sua água e dinheiro trocado em uma `doleira`que pode ser colocada junto ao corpo. No mais: divira-se porque logo que passar a quarta-feira de cinzas, o ano brasileiro inicia...
Então, não se esquça: antes de comprar pacotes de viagem, ingressos ou passagens, pesquise bem, exija contratos claros e guarde todos os comprovantes. Se algo der errado, procure seus direitos. Assim, a festa continua sendo uma alegria e não se transforma em frustração.

Para evitar que o Carnaval represente o circo depois do pão, cabe a cada consumidor garantir que o espetáculo seja completo — sem truques desleais que estraguem a diversão.

Por fim, os abusos podem ser denunciados através de sites de defesa do consumidor, inclusive há aplicativos disponíveis para download. https://consumidor.procon.sp.gov.br/

SILVANA CRISTINA CAVALCANTI
























-Advogada, MBA em Business Law pela FGV;

- Pós Graduanda em Negócios Imóbiliários pela ESA – Escola Superior de Advocacia;

- Especialista em Direito do Consumidor e

-Proprietária do escritório da Cavalcanti Advocacia & Consultoria. Contatos: 11 2503-9988 ou Whats app 11 99351-8281 

Segundo suas palavras:
Seu escritório conta com especialistas em todas as áres do Direito. 
insta @dracriscavalcanti




Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 14 de março de 2025

Xadrez à brasileira


Autor: Michel dos Santos Reis(*)

No xadrez, cada peça tem um movimento específico, e a vitória só ocorre quando o rei adversário é encurralado sem possibilidade de fuga. No tabuleiro da política, no entanto, há partidas em que a lógica do jogo é invertida: define-se o xeque-mate antes mesmo de iniciar a partida, e todas as jogadas seguintes servem apenas para justificar o desfecho já decidido.

A condenação de um político, quando movida por interesses escusos e não pela busca da verdade, segue um roteiro parecido com essa inversão de regras. Em um devido processo legal, as provas levam ao veredicto, e não o contrário. No entanto, em certos casos, a narrativa da culpa é estabelecida antes, e o processo se torna uma corrida para encontrar qualquer peça que encaixe no tabuleiro dessa versão previamente definida.

O rei, figura central do xadrez, simboliza o alvo principal. Peões são sacrificados, bispos distorcem o discurso moral, e cavalos fazem movimentos inesperados para confundir a plateia. A rainha, poderosa e versátil, pode representar a mídia ou setores judiciais que conduzem os ataques mais incisivos. O objetivo não é a verdade, mas a rendição final do adversário, seja por desgaste, pressão ou pela impossibilidade de defesa diante de um tabuleiro manipulado.

Sem isenção, o jogo se torna previsível: evidências frágeis são amplificadas, testemunhos duvidosos ganham status de verdades absolutas, e qualquer argumento contrário é descartado como irrelevante. O destino do rei já foi selado antes mesmo do primeiro lance.

O xadrez é um jogo de estratégia e inteligência, mas, quando aplicado de forma distorcida no campo político, transforma-se em um simulacro de justiça onde o xeque-mate já estava decidido desde o início.

Qualquer semelhança com a realidade do Brasil é mera coincidência.

* MICHEL DOS SANTOS REIS












- Graduado no Curso de Pesquisa e Extensão sobre combate ao Bullying pela Universidade Estadual Sudoeste da Bahia;

Graduado no  curso livre de "Política Contemporânea" , da plataforma SABERES, oferecido pelo Instituto Legislativo Brasileiro(ILB), do Senado Federal ; 

-Graduado em História  pela UNOPAR EAD (01.2025);
 
- Professor de História no Centro Educacional Angelo Pinheiro de Azevedo- CEAPA  (Mata/BA);

-Palestrante e escritor amador

Nota do Editor:

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quinta-feira, 13 de março de 2025

Alteração de domicílio do menor e autorização em casos de genitores separados


:Autora: Angela Llase Gonçalves(*)


Uma questão comum entre os pais que coabitam com filhos menores é a necessidade de obter autorização do outro genitor em casos de mudança de residência para outra cidade ou estado.

Atualmente, é comum que a guarda compartilhada seja predominantemente adotada, pois esta prática visa atender ao melhor interesse da criança. Nesse arranjo, ambos os genitores dividem as responsabilidades e decisões cotidianas relativas ao menor.

No entanto, muitas vezes o compartilhamento não ocorre como esperado. Muitos pais discordam sobre atrasos nas visitas, participação em reuniões escolares e outras atividades do cotidiano.

Independentemente da modalidade de guarda estabelecida, os genitores precisam dialogar e chegar a um consenso sobre o domicílio do menor. Tal exercício decorre do poder familiar e não do sistema de guarda estabelecido em cada caso. Os genitores devem colocar em primeiro plano o bem-estar e a qualidade de vida das crianças ao tomar suas decisões.

O Código Civil assim determina:

Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;
De acordo com a legislação vigente, cabe aos pais tomarem a decisão sobre a mudança de domicílio do menor. A controvérsia surge quando um dos genitores não concorda com essa alteração de domicílio, o que pode resultar em considerável estresse e discussões.

Alguns operadores do direito interpretam este dispositivo como aplicável apenas em situações em que o menor esteja desacompanhado de seu guardião, ou ainda que essa obrigação seria pertinente apenas em casos de guarda compartilhada. No entanto, ao analisar o dispositivo, observa-se que ele não especifica tais situações.

A legislação visa prevenir e desencorajar atos que possam comprometer o relacionamento da criança com ambos os genitores e suas famílias (avós, tios, primos). Além disso, tal comportamento pode ser identificado como alienação parental.

Lei 12.318/2010

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Alterações de endereço realizadas com o objetivo de dificultar a convivência entre a criança/adolescente e seu genitor(a) caracterizam alienação parental. Tais ações podem resultar em sanções para o alienador, incluindo a modificação da guarda e a inversão da responsabilidade de buscar e devolver o menor à residência durante as visitas.

É importante esclarecer que a lei considera alienação parental mudanças de domicílio sem justificativa. No decorrer da vida, o genitor que reside com o menor pode trocar seu domicílio devido a melhores oportunidades de emprego ou para retornar à cidade dos pais e ter uma rede de apoio para auxiliar na criação do filho.

Infelizmente, a falta de diálogo entre os genitores é comum. Ressentimentos passados frequentemente fazem com que ambos esqueçam sua responsabilidade conjunta na formação física e psicológica dos menores.

A melhor abordagem em todos os casos é a comunicação sobre a alteração de domicílio e suas razões, sobretudo os genitores devem elaborar um plano a ser implementado para garantir a convivência, seja ampliando o período de tempo durante as férias e feriados prolongados ou através de vídeo chamada.

Cabe aos genitores em conjunto analisarem se essa mudança é realmente necessária, há casos em que infelizmente esta é a única opção, seja por condições financeiras ou apoio familiar.

É igualmente essencial avaliar se o genitor que não convive diariamente com a criança é presente e participativo. Não é suficiente visitas quinzenais; é fundamental acompanhar o desenvolvimento da criança e compartilhar responsabilidades, estando presente tanto nos momentos positivos quanto negativos. Afinal, não existe "ex-pai" ou "ex-mãe".

Não é razoável impor ao genitor que reside com o menor a proibição de mudança de domicílio por motivos triviais, especialmente quando esta opção é mais benéfica para a criança.

Portanto, o genitor que não convive diariamente com a criança não pode proibir mudanças, mas tem o direito de ser informado sobre elas e seus motivos. Ambos os pais devem organizar um plano de visitas para manter a convivência familiar.

Referências:





*ANGELA LLASE GONÇALVES
















-Graduada em Direito pela Universidade Paulista – UNIP (2017);

-Pós-graduada em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale – (2022);

Pós-graduanda em Direito Civil e processual Civil pela  Legale;

- Presidente da Comissão de Direito Civil e Processual Civil - subseção Praia Grande/SP (2025/2027) e

- Áreas de Atuação: Direito de Família e Sucessões, Direito Imobiliário e Direito Cível.

Nota do Editor:

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quarta-feira, 12 de março de 2025

Resposta do Judiciário às reclamações de atendimento ao consumidor


 Autora: Tayanne Cunha de Carvalho(*)

O atendimento ao consumidor é um direito inestimável garantido pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), e, embora a maior parte dos conflitos entre consumidores e empresas seja resolvida através do contato direto, muitas vezes é necessário recorrer ao sistema judiciário para resolver disputas mais complexas.

O acesso à justiça, nesse contexto, se torna a ferramenta ideal para garantir que os direitos dos consumidores sejam respeitados, principalmente quando o atendimento oferecido pelas empresas não é eficiente ou suficiente para solucionar o problema.

Nos últimos anos, tem-se observado uma crescente judicialização das demandas de consumidores, o que reflete, em muitos casos, a insatisfação com o atendimento ao cliente e a falta de soluções eficazes por parte das empresas. Logo, a proposta é analisar como os tribunais brasileiros estão se comportando quando os consumidores recorrem à via judicial e como o atendimento ao consumidor se relaciona com as decisões judiciais.

Antes de tudo, é importante entender as causas que levam o consumidor a recorrer ao Judiciário e o atendimento ao consumidor desempenha um papel central nesse cenário. Muitas vezes, o cliente não consegue resolver um problema diretamente com a empresa, seja por falta de canais de comunicação adequados, seja por um atendimento ineficiente ou até mesmo pela demora na resolução do problema.

Alguns exemplos de situações que podem levar à judicialização incluem:
• Cobranças indevidas: O consumidor é cobrado por serviços não contratados ou por valores acima do devido;

• Falhas na execução de serviços: Quando uma empresa não cumpre os prazos de entrega ou não executa o serviço conforme o combinado;

• Produto defeituoso ou com vícios de qualidade: O cliente compra um produto que apresenta defeito e a empresa se recusa a realizar a troca ou conserto e

• Práticas abusivas: Condições impostas pelo fornecedor que causam desequilíbrio nas relações contratuais, como cláusulas leoninas.

Quando a comunicação direta com a empresa não resolve o problema, muitos consumidores se vêem obrigados a recorrer ao judiciário, especialmente em busca de reparação de danos materiais, morais ou pela resolução de questões que envolvem a continuidade do fornecimento de serviços essenciais.

O judiciário brasileiro tem demonstrado uma postura protecionista em relação ao consumidor, principalmente em questões que envolvem práticas comerciais abusivas, cobrança indevida ou falhas na execução de serviços.

Exemplo disso são as decisões que favorecem consumidores vítimas de contratos obscuros e com dubiedade das cláusulas, colocando uma forte responsabilidade sobre as empresas para garantir que suas práticas contratação sejam transparentes e que as promessas feitas ao consumidor sejam cumpridas.

Exemplo recente:
•AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA. MORTE NATURAL. COBERTURA. CLÁUSULAS DÚBIAS. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO HIPOSSUFICIENTE. PRECEDENTES. 1. Esta Corte Superior já firmou entendimento de que, nos contratos de adesão, as cláusulas limitativas ao direito do consumidor contratante deverão ser escritas com clareza e destaque, para que não impeçam a sua correta interpretação. 2. A falta de clareza e dubiedade das cláusulas impõem ao julgador uma interpretação favorável ao consumidor (art. 47 do CDC), parte hipossuficiente por presunção legal, bem como a nulidade de cláusulas que atenuem a responsabilidade do fornecedor, ou redundem em renúncia ou disposição de direitos pelo consumidor (art. 51, I, do CDC), ou desvirtuem direitos fundamentais inerentes à natureza do contrato (art. 51, § 1º, II, do CDC). 3. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1331935 SP 2012/0134714-1, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 03/10/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/10/2013).
Para evitar que seus clientes recorram ao Judiciário, as empresas devem investir em um atendimento ao consumidor de qualidade, que envolva:

•Treinamento de equipes para resolução eficiente de problemas;

•Canais de atendimento acessíveis e rápidos, como telefone, chat online e redes sociais;

•Políticas claras de devolução e reembolso, de modo que o cliente não precise recorrer à via judicial; e

•Atenção às cláusulas contratuais, evitando termos que possam ser considerados abusivos ou ilegais.
Além disso, muitas empresas têm se beneficiado da criação de ouvidorias internas que buscam resolver as questões diretamente com os clientes antes que o problema se agrave.

Conclui-se, a chave para um bom relacionamento entre consumidores e empresas continua sendo um atendimento de qualidade, que respeite os direitos e as expectativas de ambos os lados.

*TAYANNE CUNHA DE CARVALHO
















- Advogada OAB/PR 115.098

-Bacharela em Direito pela ULBRA - Manaus-AM (2012);

-Pós Graduada em Direito e Processo Penal pela Unisc (2024);

-Pós graduanda em Direitos Humanos na América Latina pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana - UNILA e

-Advogada coordenadora do Núcleo de Prática Jurídica da faculdade Uniamérica Descomplica.

- E-mail: dratayanne@carvalhoadvogada.com

- Telefone: (45) 99118-9678


Nota do Editor:

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terça-feira, 11 de março de 2025

Irregularidade administrativa ou culpa concorrente?



 
Com o crescimento monumental da quantidade de veículos em circulação, não raro nos deparamos com acidentes de trânsito envolvendo dois ou mais carros. Graves ou não, os prejuízos refletem na esfera jurídica com pedidos de indenizações por danos morais, materiais e, em alguns casos, danos estéticos.

Quando falamos em culpa por acidente de trânsito estamos tratando da responsabilidade civil subjetiva e para configurar o dever de indenizar é indispensável à presença de requisitos específicos: conduta (ação ou omissão), dano e o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado danoso, tudo em conformidade com os artigos 186 e 927 do Código Civil.

Em breves palavras, a infração administrativa é a conduta contrária às normas jurídicas, como por exemplo, conduzir veículo sem portar a CNH, com a CNH vencida, licenciamento em atraso etc.

Culpa concorrente ocorre, nos termos do art. 945 do Código Civil, quando a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso e, por tal razão, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

A infração administrativa para ser considerada concausa do acidente de trânsito e atrair a culpa concorrente para a vítima deve ser determinante para o evento danoso, do contrário, não é argumento suficiente para afastar a culpa exclusiva do causador do dano.

Embora a questão pareça lógica, ainda hoje as infrações administrativas são apontadas como concausa em acidentes de trânsito, mesmo quando não existe prova de que a infração tenha contribuído de forma efetiva para o dano. Vejamos recente decisão:

"Nesse passo, discorro pela existência, em verdade, de culpa concorrente.
Conforme se depreende dos documentos juntados a fls. 86/87, o veículo da requerente possuía documentação vencida, com aptidão até o ano de 2019. Referida circunstância não foi refutada pela requerente, que não apresentou documentação contrária para comprovar a regularização do veículo à época do acidente.
Assim, emerge a ilegalidade do trânsito durante o período em que ocorreu o acidente, ensejando a impossibilidade de circulação, o que, por decorrência lógica, afastaria a configuração do dano alegado.
Por outro lado, o vídeo anexado à fl. 54 evidencia que o requerido realizou manobra irregular e ilegal, culminando no acidente em questão. Ao deslocar-se de maneira inadequada, o requerido foi o causador do evento danoso. Vale ressaltar que, mesmo na ausência do veículo da requerente, tal manobra incorreta poderia ter colocado outros veículos em risco. Dessa forma, o embate sobre a regularidade da documentação do veículo da requerente e a análise da manobra imprudente do requerido delineiam-se como aspectos cruciais para a correta apuração de responsabilidades no caso em análise."[1] (grifei)

No caso destacado acima, a irregularidade na documentação do veículo não deu causa ao acidente. A manobra do condutor do veículo contrária às regras basilares de trânsito foi única causadora do dano, mas, mesmo assim, a culpa concorrente foi reconhecida pelo juízo de primeiro grau.

Decisões tal como a proferida causam insegurança jurídica, contrariam a jurisprudência atual e dominante conforme comprovado a seguir:

RECURSO INOMINADO. REPARAÇÃO DE DANOS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MANOBRA EM MARCHA A RÉ. Sentença de improcedência dos pedidos primitivo e contraposto. Recurso da autora. Colisão entre veículos durante manobra de marcha a ré realizada pelo réu com oobjetivo de ingressar em outra via. A manobra de marcha a ré é arriscada e deve ser praticada com cautela emsituações indispensáveis, tais como ajustar a posição doveículo, a fim de estacionar ou sair da vaga. Ausência decomprovação de culpa concorrente. Circulação irregular de veículo com licenciamento vencido e ausência de CNH válida da condutora constituem meras infrações administrativas e não compensam nem afastam a responsabilidade civil decorrente da culpa exclusiva do causador do acidente. Presunção de culpa pela colisão traseira elidida pela manobra imprudente do réu. Conjunto probatório que evidencia culpa exclusiva do réu pelo acidente, em razão de manobra arriscada e imprudente. Responsabilidade do réu de ressarcimento dos danos materiais, relativos ao reparo do veículo da autora. Danos morais não configurados. Sentença reformada. Recurso parcialmente provido[2].(grifei)

ACIDENTE DE TRÂNSITO - Colisão em rodovia - Motocicleta e automóvel - Falecimento da condutora da motocicleta - Ação de indenização por danos morais e materiais proposta pela filha menor da vítima contra a condutora e o proprietário do automóvel - Sentença de procedência parcial - Apelos dos réus - Culpa exclusiva da condutora do automóvel - Culpa concorrente não caracterizada - Falta de licenciamento da motocicleta que se trata de mera irregularidade administrativa - Responsabilidade solidária do proprietário do automóvel - Presunção de dependência econômica da autora em razão da incapacidade civil absoluta - Direito ao recebimento de pensão mensal - Valor da indenização por danos morais estabelecido em harmonia com o artigo 944 do Código Civil - Sentença mantida - Apelações desprovida.[3] (grifei)

As irregularidades na documentação do autor, da motocicleta ou a simples alegação de ausência de acessórios obrigatórios configuram mera infração administrativa e não devem ser entendidas como causas eficientes ou concorrentes do acidente."[4] (grifei)

"Acrescente-se que a alegação de atraso no licenciamento da motocicleta configura irregularidade administrativa e que não guarda nexo algum com a dinâmica do acidente"[5]. (grifei)

A infração administrativa não deve ser ignorada, deve, sim, ser apenada, mas pelo órgão de trânsito, contudo, se ela não tiver contribuído para o evento danoso, não pode atrair a culpa concorrente em desfavor da vítima.

Fato é que "a simples existência de comportamento antijurídico da vítima em determinado evento não basta para a configuração da concorrência de culpas; é imprescindível que essa conduta tenha funcionado como nexo de causalidade em relação a alguma fração do episódio lesivo".[6]

REFERÊNCIAS

[1]Sentença
Processo nº:1002330-51.2023.8.26.0323 - publicação em 05/02/2024;

[2] Recurso
Inominado nº: 1002330-51.2023.8.26.0323;

[3]Recurso
 Apelação processo Nº 1000124-97.2020.8.26.0637;

[4]Recurso
 Apelação processo nº: 1004932-60.2019.8.26.0127

[5] Recurso 
Apelação nº 1000498-91.2017.8.26.0549 e

[6] (MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Código civil comentado: Lei n. 10.406, de 10.01.2002. 8. ed. São Paulo: LTr, 2019, p. 491).

*LIEGE KARINA DE SOUSA RIBEIRO SANTOS



















-Advogada graduada pela Universidade Salesiana de Lorena – UNISAL (2004);

- Pós-Graduação em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Salesiana de Lorena – UNISAL (2010) ;

- Pós-Graduação em Direito Previdenciário pela Universidade Salesiana de Lorena – UNISAL (2010) ;

-Sócia proprietária do escritório Sousa Santos Advocacia e Consultoria Jurídica; e

-Sócia da AS² Consultoria em Propriedade intelectual

Instagram:@liegesousa
Cel/WhatsApp: (12)99146-4530
E-mail:liegesousa@adv.oabsp.org.br

Nota do Editor:

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A proteção ao franqueado no direito previdenciário


Autor: Felipe Vianna Mendes (*) 


O sistema de franquias tem se consolidado como um dos principais modelos de expansão empresarial no Brasil, permitindo que franqueadores ampliem suas marcas e franqueados invistam em negócios já estabelecidos e testados no mercado. Contudo, o contrato de franquia envolve um complexo arranjo de direitos e deveres entre as partes, sendo necessária uma regulação precisa para garantir a proteção de ambos, especialmente do franqueado, parte geralmente mais vulnerável na relação.

O contrato de franquia é um acordo por meio do qual o franqueador concede ao franqueado o direito de explorar sua marca e seu modelo de negócio em determinado território, mediante pagamento de taxas ou royalties. Trata-se de uma relação jurídica de natureza comercial que envolve a cessão de um conjunto de direitos de propriedade intelectual, como marcas, patentes e know-how, além de orientações operacionais e gerenciais para o franqueado.

Por sua natureza, esse contrato é classificado como um contrato típico e bilateral, sendo regido pela Lei de Franquias (Lei nº 13.966/2019), que substituiu a antiga Lei nº 8.955/1994. A nova legislação trouxe maior detalhamento e modernização ao regramento das franquias, com especial atenção à Circular de Oferta de Franquia (COF), instrumento indispensável para garantir a transparência e a proteção do franqueado.

A Circular de Oferta de Franquia (COF) como Instrumento de Proteção ao Franqueado

A Circular de Oferta de Franquia é o documento por meio do qual o franqueador deve fornecer ao franqueado todas as informações relevantes sobre o negócio antes da celebração do contrato. A COF deve ser entregue ao potencial franqueado com pelo menos 10 dias de antecedência à assinatura do contrato de franquia ou ao pagamento de qualquer taxa. Esse prazo é estabelecido para garantir que o franqueado tenha tempo suficiente para analisar as condições da franquia e, se necessário, buscar consultoria jurídica e contábil.

As Obrigações do Franqueador e a Garantia de Suporte ao Franqueado

O franqueador tem a responsabilidade de garantir que o franqueado receba o suporte necessário para a operação bem-sucedida da franquia. Esse suporte inclui, geralmente, a realização de treinamentos iniciais, consultoria operacional, assistência contínua na gestão do negócio e, em muitos casos, suporte na área de marketing.

A Relação entre Franqueador e Franqueado: Limites à Interferência

Embora o franqueador tenha o dever de fornecer suporte ao franqueado, é importante destacar que a relação contratual não cria um vínculo trabalhista entre as partes. O franqueado é juridicamente considerado um empresário autônomo, sendo responsável pela gestão direta de seu negócio, inclusive pelos lucros e prejuízos decorrentes da operação.

A legislação e a jurisprudência brasileira têm sido firmes ao estabelecer a ausência de vínculo empregatício entre franqueador e franqueado, exceto em casos excepcionais onde há ingerência excessiva do franqueador nas atividades do franqueado, caracterizando, assim, uma subordinação atípica. Para garantir a autonomia do franqueado, o franqueador deve respeitar os limites contratuais de intervenção no negócio, atuando principalmente como orientador e não como gestor.

A Relação entre Franqueador e Franqueado: Limites à Interferência

O uso da arbitragem nas franquias tem sido crescente, especialmente por permitir maior especialização dos árbitros em questões empresariais e por proporcionar sigilo nas decisões, fator atrativo para ambas as partes envolvidas.

Proteção ao Franqueado no Campo Previdenciário

No âmbito previdenciário, o franqueado é considerado um empresário individual ou, dependendo da estrutura jurídica adotada, pode se enquadrar como empregador ou trabalhador autônomo. A proteção previdenciária do franqueado envolve contribuições para a Previdência Social, que garantem acesso a benefícios como aposentadoria, auxílio-doença e pensão por morte.

Desafios e Considerações

  • Responsabilidade Previdenciária: O franqueado deve assegurar o recolhimento correto das contribuições previdenciárias de acordo com sua condição (empresário individual, autônomo ou empregador);
  • Relação de Trabalho: Em alguns casos, a relação entre franqueador e franqueado pode gerar discussões sobre vínculo empregatício, especialmente se houver subordinação direta do franqueado ao franqueador e
  • Legislação Aplicável: Além da Lei de Franquias, outras normas trabalhistas e previdenciárias são aplicáveis à relação de franquia, influenciando direitos e deveres das partes.
* FELIPE VIANNA MENDES























-Graduado em Direito pelo Centro Universitário Braz Cubas, Mogi das Cruzes/SP(2022);

-Pós-graduando em Direito Previdenciário pela Instituição LEGALE Educacional e

-Atuante nas áreas do Direito Cível, Família e Sucessões, Trabalhista e Previdenciário. 

Nota do Editor:

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segunda-feira, 10 de março de 2025

Competências da Justiça Eleitoral no Brasil


 

Autora: Sarita de Lourdes Ferreira Goulart (*)


A Justiça Eleitoral no Brasil atualmente tem sua existência e regulamentação nos artigos 118 a 121 da Constituição Federal de 1988.

Posto isso é importante ressaltar as peculiaridades e a importância da Justiça Eleitoral na sua principal função que é a de garantir o zelo e a verdade das urnas que é a expressão soberana do povo além da função jurisdicional que lhe é típica administrativa que é o da condução do de todo o processo eleitoral desde o cadastramento dos eleitores até a diplomação dos candidatos eleitos, e da função consultiva ,e, ainda a sua função normativa e regulamentar.

É na esfera Administrativa que a Justiça Eleitoral atua no alistamento a na gestão do Cadastro Nacional de Eleitores , na preparação e Administrativa exerce um poder de polícia para coibir as praticas irregulares de propaganda a fim de preservar a equidade o equilíbrio e a lisura das campanhas eleitorais.

A Justiça Eleitoral é competente também para responder consultas sabemos que o Poder Judiciário via de regra não emite pareceres diante de casos concretos mas a Justiça Eleitoral tem função consultiva exercendo papel relevante diante dos postulados para garantir segurança jurídica , principalmente para os sujeitos envolvidos no processo eleitoral material e procedimental.

Compete à Justiça Eleitoral sem prejuízo de outras matérias relevantes , função consultiva que não encontra correspondência em outros órgãos do Poder Judiciário. O Código Eleitoral, a despeito de não haver previsão constitucional, foi recebido como material complementar ( Art !21 CF ) abarcando assim as competências da Justiça Eleitoral bem como ali codificar as normas similares aos Tribunais Regionais para responder às consultas apresentas por autoridades públicas ou Partido político no âmbito de suas jurisdições.

Quanto a natureza jurídica dos pronunciamentos emitidos pelo TSE em respostas às consultas , trata-se de atos de caráter administrativos bem como as instruções ou regulamentos expedidos em Tribunais Regionais também são de natureza administrativos.

Falamos sobre matéria de competência em Direito Eleitoral e não pensem que é matéria tranquila ou pacífica pois se fosse assim o TSE e o próprio STF não estaria com ações tratando deste tema competências ou conflito delas para serem decididas .Espero ter contribuído um pouco para um bom entendimento.

Bibliografia:

Constituição Federal de 1988; 
Código Eleitoral; 
Livro- DIREITO ELEITORAL E DEMOCRACIA -Ed. da UFMA

*SARITA DE LOURDES FERREIRA GOULART

-Advogada graduada em Direito pela UNISINOS-São Leopoldo (1988);

-Pós graduada no Curso de Especialização em Direito Político pela UNISINOS em 1990; 
e
- Natural de Canoas - RS  aonde advoga.

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