Política é o reflexo do existir em comunidade, nascendo a partir dos conflitos humanos, através da busca da harmonia social; bem como das pretensões individuais e coletivas de exercer o domínio, e para tal os seres humanos necessitam do diálogo, negociando pactos sociais e refletindo sobre os problemas reais que atormentam os Estados. Vale citar que, este fenômeno político e social ocorre desde a Antiguidade, tanto é verdade que já nos tempos de Platão e Aristóteles vemos a necessidade de teorizar sobre os problemas vivenciados pelas sociedades em virtude da convivência humana.
Insta salientar que, a Filosofia Política foi o começo de tudo, pois desde a mais alta Antiguidade Clássica, principalmente desde Sócrates, Platão e Aristóteles, a Política tem o dom de impressionar o gênero humano, sequioso de conhecê-la cada vez mais profundamente. O Professor Universitário Filipe Celeti, nos explana em seus ensinamentos que entre as diversas questões que a Filosofia visa investigar, possui enorme destaque os questionamentos acerca de como é e como deveria ser o convívio em sociedade. A Etimologia nos explica que, a palavra “Política”, com origem na língua grega, possui seu fundamento em “Politika”, a qual refere- se aos assuntos da cidade (ou a “Polis”).
Na Clássica obra “Dicionário de Filosofia” do admirável doutrinador e ex Professor de História da Filosofia da renomada Universidade de Turim, Nicola Abbagnano, fica claro que Filosofia Política é uma área de atuação de enorme importância para as Ciências Humanas tendo como objetivo primordial a indagação do âmbito dos fenômenos Políticos. Todavia, cumpre-se trazer à baila que, através dos tempos esta disciplina foi entendida de maneiras diversas e às vezes, até mesmo opostas.
Conforme nos aprofundamos nos ensinamentos do Filósofo e Historiador do pensamento Político, o admirável Escritor e Político italiano, Noberto Bobbio, podemos distinguir quatro acepções principais acerca da Filosofia Política, primeiramente como a busca da melhor forma de Governo; bem como, a identificação do fundamento último do poder, ou seja, como determinação do critério de legitimidade da obrigação Política; além da explicitação do conceito geral de Política, ou seja, como determinação da categoria do fenômeno Político; e, por último, como a análise reflexa dos mapas linguísticos e conceituais da linguagem Política, ou seja, como metodologia da Ciência Política.
O primeiro significado compreende os pensadores que, desde Platão aos Modernos Utopistas, formularam o problema do Estado Ideal, ou seja, de um modelo perfeito (ou o menos imperfeito possível) de comunidade humana. O segundo àqueles que formularam o problema de origem do Poder, destacando-se Hobbes, Locke e Rousseau. O terceiro compreende os pensadores que se interrogaram sobre características peculiares da Política, ou seja, sobre o que caracteriza e distingue o fenômeno Político. E, o último engloba os estudiosos do século XX que conceberam a Filosofia Política como uma disciplina de “segundo grau”, destinada à elucidação das linguagens e dos métodos da Ciência Política.
O primeiro filósofo a sistematizar uma ideia política foi Platão (428-7 – 348-7 a.C.) abordando o assunto, principalmente, em dois livros, quais sejam: “A República” e “As Leis”, nos quais apresenta a ideia de que uma sociedade bem ordenada é aquela em que cada indivíduo desempenha a função na qual é mais habilidoso; sendo que, os hábeis com as mãos deveriam ser artesãos, os fortes devem proteger a cidade e os sábios devem governá-la.
Aristóteles (384 – 322 a.C.), por sua vez discorda de seu mestre, pois na obra clássica “Política”, defende que a cidade ideal de Platão, onde há prioridade daquilo que é público sobre aquilo que é privado, não funcionaria bem, já que as pessoas dão mais valor ao que pertence a si mesmo, do que ao que pertence a todos. Ele se preocupou menos com hipóteses de uma sociedade perfeita e mais em compreender a realidade Política de seu tempo, estudando as Leis de diferentes cidades e as formas de Governo existentes.
Discorre no sentido de que a melhor forma de organização Política é um sistema misto de Democracia e Aristocracia, chamado “Politia”, para evitar os conflitos de interesses entre os ricos e pobres. É dele também a ideia de que o homem é um animal Político, isto é, que faz parte da natureza humana se organizar politicamente. Aristóteles é considerado o pai da Ciência Política, porque considerou a Política a Ciência “maior”, ou mais importante do seu tempo. Preocupava-se com um governo capaz de garantir o bem-estar geral, ou seja, o bom governo.
Ademais, temos como outro grande expoente da Filosofia Política da Antiguidade, o Filósofo Romano, Marco Túlio Cícero, o qual se encarregou de dar continuidade à análise do melhor Sistema Constitucional defendendo a existência de três Regimes Políticos: a Monarquia, Aristocracia e a Democracia; bem como, seus desvios respectivos. A primeira consideração importante a ser feita é que, para ele, toda comunidade é propriedade de um povo, contudo, este não se trata de um aglomerado qualquer de pessoas, mas sim um grupo numeroso de cidadãos em comum acordo de respeito às leis e orientado ao bem comum. Como essa comunidade é propriedade do povo, ela precisa ser governada por um corpo deliberativo permanente, seja ele formado por um homem, por um número seleto de cidadãos ou por todo o corpo de cidadãos da cidade.
A Civilização Romana foi, sem qualquer sombra de dúvida, de imensurável importância para a configuração das sociedades modernas, notadamente as do Ocidente, uma vez que a grande maioria dos Institutos Jurídicos e Instituições Políticas e até mesmo Culturais que conhecemos e cultivamos hodiernamente, têm suas raízes nela. Após a Queda do Império Romano veio a Idade Medieval que os Historiadores costumam demarcar como o período que vai do ano 476 até a tomada de Constantinopla pelos Turcos Otomanos, em 1453.
O Período Medieval foi chamado por muitos pesquisadores de Idade das Trevas e havemos de concordar que a ideologia moralista da Igreja Católica acabou por contribuir e reduzir a produção do pensamento humano, tanto que toda a produção teórica acerca da Política buscava a formulação de um sistema de Governo calcado na moral cristã. Nesse período histórico encontramos Santo Agostinho (354-430), o qual escreveu o livro “A Cidade de Deus”, em que afirmou que a cidade humana era essencialmente imperfeita e que aqueles que vivessem em conformidade com os preceitos cristãos habitariam, após a morte, na Cidade de Deus, onde tudo era justo e perfeito. Podemos observar a inexistência de uma síntese filosófica fora do contexto teológico.
Outrossim, este período escuro da história humana conheceu outro Filósofo de incomparável importância que foi Santo Tomas de Aquino (1224/25 – 1274), nascido no Castelo de Roccasecca, próximo de Nápoles na Itália. Os temas mais importantes do seu ponto de vista filosófico são: Teoria do Conhecimento, Metafísica e Ética, dividindo a Filosofia em três grandes áreas: a Filosofia Natural que trata da ordem das coisas da natureza e do ser real; a Filosofia Racional ou Lógica que tem por objeto o pensamento e a Filosofia moral ou ética que estuda a moral e as suas relações com o Estado, a política e a economia. Com acuidade e rigor, trata metodologicamente de matérias como Lógica, Metafísica, Antropologia, Ética, Teologia e Política (em que examina e expõe com riqueza de conhecimento questões sobre a natureza das leis).
Suplantado este momento escuro da história social do homem, nasce o movimento conhecido como Iluminismo que foi um influente Processo Cultural, Social, Filosófico e Político com origem ainda no século XVII, através da Revolução Científica possibilitada pela pesquisa efetuada por nomes como o Filósofo, Físico e Matemático francês, René Descartes (1596-1650) e o Astrônomo, Alquimista, Filósofo Natural, Teólogo e Cientista inglês, mais reconhecido como Físico e Matemático, Isaac Newton (1643-1727), se desenvolvendo plenamente durante o século seguinte, o chamado “Século das Luzes”.
Os pensadores que defendiam os ideais Iluministas acreditavam que o pensamento racional deveria ser levado adiante substituindo as crenças religiosas e o misticismo, que, bloqueavam a evolução do homem. O homem deveria ser o centro e passar a buscar respostas para as questões que, até então, eram justificadas somente pela fé. Influenciou vários movimentos do Século XVIII na América, como, por exemplo, a Independência dos EUA e a Inconfidência Mineira. No que se refere à Filosofia Política teve enorme destaque os Filósofos Iluministas Charles Secondat de La Brède, “O Barão de Montesquieu (1689 – 1755); Jean Jacques Rousseau (1712 – 1778); e, Immanuel Kant (1724 – 1804).
O francês conhecido como “Barão de Montesquieu”, foi fortemente influenciado pelo pensamento Aristotélico consagrado na clássica obra “Política”, bem como pela sociedade inglesa da época. Escreveu diversas obras importantes, sendo unânime que a mais marcante foi “O Espírito das Leis”, na qual buscou a origem do Sistema Legislativo nas características climáticas, étnicas e culturais de um povo. Sua visão iluminista é particularmente acentuada pela importância da racionalidade em sua exposição do significado do Estado como instituição não só Política, assim como Jurídica e Social; sendo que, tal concepção de Estado integra a ideia de Estado Moderno, como garantia para os cidadãos contra a vontade individual do soberano, fazendo-se necessário a existência de corpos intermediários entre o indivíduo e o Estado, como, por exemplo, o Poder Judiciário, o Legislativo e os Partidos Políticos, partindo dessa tese para defender a tripartição dos poderes; deste modo, seguindo de perto John Locke.
O Filósofo suíço, Jean Jacques Rousseau, é considerado um Contratualista Revolucionário e foi autor de várias obras respeitáveis, sendo para a Filosofia Política, as mais importantes, “O Discurso da Origem da Desigualdade entre os Homens” de 1755 e, principalmente “O Contrato Social” de 1762. Defende em seus ensinamentos que, no momento em que todos renunciam a seus direitos com a criação do Contrato Social, forma-se um corpo político detentor de todos os direitos e do qual todos participam; sendo que, o “eu absoluto” cede ao “eu relativo”. Rousseau ensina que é contra a própria natureza da soberania na qual o outro se faz representar, pois os Deputados do povo não são seus representantes, mas, simplesmente, seus comissários, que não estão aptos a decidir nada definitivamente, portanto, todo o povo deve participar da obra legislativa, através da Democracia Direta.
Já o Filósofo Prussiano, Immanuel Kant, afirmou que a passagem do Estado Natural para o Estado Político ou Civil é um Contrato Social, considerado não como realidade histórica, mas como hipótese metafísica, a priori lógico do Sistema Jurídico, portanto, diferentemente de Rousseau, não é um teórico da origem da sociedade e do Estado, pois considera o Estado Natural não do ponto de vista cronológico, mas sim do ponto de vista lógico. O ciclo histórico em que viveu foi da grande contestação dos Regimes Absolutistas e consequente postulação da Soberania Popular, em que viveu os “déspotas esclarecidos”, como Catarina II da Rússia, Frederico II da Prússia e o Marquês de Pombal em Portugal, que se diziam partidários das novas idéias; todavia, pretendiam implementá-las eles mesmos, em razão de considerarem o povo ignorante demais para perceber a necessidade de uma Reforma Política e Social em profundidade.
Na Pós-Modernidade, no âmbito do Estado, a Filosofia Política pode retratar algumas mudanças que surgem na atualidade, como, por exemplo, a atuação cada vez mais constante e importante das organizações não vinculadas diretamente ao Estado, tais como o chamado Terceiro Setor, composto pelas Organizações Não Governamentais (ONGs) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e etc. Vale citar as características mais marcantes desse período histórico conhecido como “Pós-Moderno”, quais sejam: uma Sociedade de Massa e de Consumo; regida pelo Individualismo; mantida pela Era da Informática com o tratamento extremamente computadorizado das informações; marcada pelo Hedonismo (filosofia que coloca o prazer como bem supremo da vida humana); e, apegada à Filosofia Niilista, que nega a existência de valores absolutos como verdade e preceito ético.
POR CAIO RIVAS
-Advogado membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP;
-Pós-Graduado em Direito Penal, em Processo Penal e em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Damásio;
-Pós Graduado em Direito Internacional Ambiental pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul;
-Possui Habilitação para o Magistério Superior (nota 10 na disciplina Didática do Ensino Superior);
-Graduando em História ;e
-Certificado por mais de 100 Cursos de Extensão pela USP, FGV, CNJ, Instituto Reinaldo Polito, Universidade Candido Mendes, CERS, Instituto do Legislativo Brasileiro, Escola Nacional de Administração Pública, Instituto do Legislativo Paulista, Escola Paulista de Direito e Associação dos Delegados de Polícia Federal .
Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.