Antonia, nome fictício, encontrava-se com seu aparelho celular no painel do carro. Acesso aberto para um dos aplicativos de localização, já que não sabia o caminho até o Centro. Vidros fechados, calor de mais de 35 ° daqueles que só o ar condicionado alivia... de repente leva um susto com um barulho que vem do lado direito do veículo, logo se apercebe com o meliante meio corpo dentro do seu carro que puxa o celular do painel e sai correndo...
A situação narrada é bem comum, principalmente nos grandes centros urbanos.
O procedimento recomendado é o padrão... ligar na operadora, pedir o bloqueio do celular, o IMEI já anotado, ligar para o banco porque se lembra que havia informações no seu aplicativo , vai a delegacia e lá encontra outros cidadãos na mesma situação.
Após horas de espera, retorna para casa, preocupada em ter “perdido” as informações, fotos, arquivos que não estão na “nuvem” (espécie de arquivo de back up)... acessa seu notebook para verificar sua conta corrente, e lá outro susto: O roubo do aparelho celular causou-lhe ainda mais prejuízo: R$ 15.000,00 são retirados de sua conta às vésperas do Natal.
Mas como? Se para acessar o sistema do banco, é necessário o uso da digital? De que forma estes bandidos da tecnologia conseguiram acessar a conta se além do aplicativo do Banco, há um i token que teoricamente deveria estar preparado para o acesso indevido?
E mais, todas as recomendações de segurança estavam ativas ... antivírus atualizado, proteção contra wi-fi duvidoso, verificação em duas etapas... e, mesmo assim, os hackers conseguiram invadir o aplicativo e realizar as operações fraudulentas de forma muito rápida!
Ao consultar seu saldo notou que as transações fraudulentas foram realizadas após a comunicação a Operadora Móvel e ao Próprio Banco, ou seja, entre as providências de praxe (Aviso a operadora, ao banco e a autoridade policial) se passaram apenas 50 minutos!
As transações indevidas seguiram os padrões de segurança digital do aplicativo e as opções de segurança do banco, como por exemplo o valor máximo por transação o número de operações, foram "respeitados pelos hackers". No total foram 5 transações... desde transferência bancária até pagamento de boleto em banco digital.
Imediatamente Antonia telefonou ao Banco... e qual não foi sua decepção: O Banco não ressarciria as transações indevidas...
E agora? Como Antonia deve proceder?
Primeiramente, vale a máxima: "Se informou a senha do banco a terceiros fora das dependências da instituição bancária, independente de serem bandidos ou pessoas próximas, íntimas ou conhecidas" : o banco dificilmente estornará os valores retirados indevidamente de sua conta.
Absurdo? Nem tanto.
O princípio básico para que haja a obrigatoriedade ao ressarcimento pelas instituições financeiras ao cliente, encontra-se na falha da prestação do serviço, ou seja, na falha da segurança do sistema do banco, conforme preceitua o Artigo 14 do Código Brasileiro do Consumidor.
Se no momento em que o cliente informou sua senha pessoal, estava fora das dependências da instituição financeira, não houve falha no sistema de segurança bancário (seja segurança física ou virtual) havendo o entendimento que a questão é de Segurança Pública.
Ou seja, se você informou a senha para alguém e foi obrigado a sacar ou comprar sob coação, em um sequestro relâmpago ou situação parecida, já é entendimento pacificado nos Tribunais de todo País, que a instituição financeira não tem responsabilidade, tendo em vista que a ocorrência não implicou em falha no sistema de segurança do Banco.
Mas, e no caso de Antonia, em que não houve a divulgação da senha, e sim a invasão do sistema de segurança do banco através do aplicativo fornecido por este? Como os hackers agiram? E como fica o consumidor lesado?
Lembram que nossa personagem estava com o aplicativo de GPS aberto? Pois bem: Apesar de Antonia não ter acessado a Aplicativo fornecido pelo banco naquele dia, os hackers conseguiram acessar o sistema, alterando seus dados de acesso, inserindo nova senha no próprio aplicativo e, inclusive alterando sua digital. E, neste caso, a responsabilidade pela segurança do aplicativo colocado a disposição do correntista (Consumidor) é sim da Instituição Financeira, ou seja, o Banco.
O princípio para que a instituição venha a ressarcir as transações indevidas é a FALHA do sistema de SEGURANÇA virtual ou física do BANCO.
Desta forma, a indenização é devida, independente da “culpa” do Banco. No caso de Antonia, ficou provado que os hackers invadiram o aplicativo, geraram nova senha digital através do I token fornecido e realizaram as transações fraudulentas. Neste caso, é possível conseguir o dinheiro de volta, senão de forma administrativa junto ao serviço de atendimento ao cliente, através de uma Ação na Justiça.
Como proceder?
A maioria dos bancos, uma vez que o cliente envia toda a documentação necessária, encaminha esta documentação para o departamento de fraudes (boletim de ocorrência, copia das transações indevidamente realizadas, e carta de próprio punho relatando o ocorrido, sob as penas da Lei em razão da veracidade).
Após o processo administrativo efetuado pelo banco, a instituição acaba estornando os valores desviados de sua conta.
Mas se o banco se negar ao ressarcimento, a única maneira de ter o seu dinheiro de volta, com juros e correção monetária, e ainda sobejar os danos morais advindos, é através de uma ação judicial.
Como especialista em Direito do Consumidor, meu conselho é para que a vítima anote todos os protocolos de solicitações a instituição financeira, formalize os pedidos por e-mail ou por SMS, tire prints das conversas com as atendentes, imprima todos os comprovantes das transações indevidas. Junte tudo.
Se dirija até um cartório de Notas e peça para registrar esta documentação – desta forma, caso os bandidos se utilizem dos dados, fotografias, ou qualquer documentos que estavam no aparelho celular para novas operações fraudulentas, como abertura de empresas, contas fantasmas em bancos físicos ou digitais, e um dia chegue a cobrança na sua casa, você terá a prova pública que não foi você o responsável pela fraude.
Até 20 salários mínimos, você mesmo pode se dirigir ao Juizado Especial Cível mais próximo e ingressar com uma Ação Judicial, juntando os documentos já registrados. Acima de 20 salários mínimos (incluindo os danos materiais e os danos morais) você terá que consultar um Advogado que lhe orientará.
O registro no Cartório de Notas não é a condição para que você ingresse na Justiça ou ainda garanta o ressarcimento aos prejuízos – isto quem decidirá é o judiciário, mas na maioria das vezes, o banco é condenado ao ressarcimento, inclusive aos danos morais advindos desta invasão fraudulenta na sua conta.
Nosso conselho quanto ao registro de toda ocorrência no cartório de notas é uma precaução a segurança de seus dados e dificultam outras fraudes trazendo prevenção de responsabilidade a vítima.
O Código Brasileiro do Consumidor, no seu Artigo. 14, caput determina que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores, por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Segundo a Sumula 297 as instituições bancárias inserem-se no rol de Prestadores de Serviço, amparados pelo Estatuto Consumeirista. O mercado de serviços constitui o elo da relação de consumo, não podendo, de forma alguma, ser excluído desta regra protetiva. A maioria dos serviços bancários constitui-se em "obrigações de resultado", e todas as regras estabelecidas na Lei Consumeirista direcionadas para o fornecedor de serviços podem e devem ser aplicadas às instituições financeiras.
A adequação para que o Banco seja obrigado ao ressarcimento aos clientes, decorre do dano não ter sido provocado pela própria vítima, ou ainda quando poderia ter sido evitado. Assaltos e Furtos ocorridos dentro do estabelecimento bancário, ou ainda nos estacionamentos, são casos fortuitos internos – conforme Sumula 479 do Superior Tribunal de Justiça.
No caso de nossa vítima, o aplicativo foi acessado diretamente pelos hackers, e estes invadiram o sistema de segurança do banco, realizando as transações. Portanto, além dos danos materiais (Valores transacionados indevidamente), cabe ainda indenização pelos danos morais relativos aos percalços advindos da fraude – o que, certamente extrapola os meros aborrecimentos do cotidiano.
No entanto, recomendável que sempre haja a orientação de um Advogado de confiança da vítima. Certamente, ele saberá como agir.Alguns detalhes técnicos são imprescindíveis para que se faça a escorreita prestação jurisdicional, e você tenha seu dinheiro de volta, incluindo os danos materiais, morais, e até lucros cessantes, a depender do caso concreto.
POR SILVANA CRISTINA CAVALCANTI
-Administradora de Empresas;
- Proprietária do Escritório de Advocacia Cavalcanti Advocacia & Consulto/ria Internacional e
-Partner do Escritório de Advocacia Neris Mota Assessoria e Consultoria de Propriedade de Dra. Nelian na Neris Mota, especialista em Direito Criminal –
Contatos (11) 96136-1216 ou (11) 2574-5522.
Nota do Editor:
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