sábado, 5 de setembro de 2020

Histórias de ser professora na pandemia: ainda na pandemia


Autora: Marilice  Mello(*)

Vivemos esperando dias melhores,
dias de paz,
dias a mais,
dias que não deixaremos para traz,
vivemos esperando o dia em que seremos melhores,
melhores no amor,
melhores na dor,
melhores em tudo! .....
vivemos esperando o dia em que seremos para sempre! 

JOTA QUEST

Para iniciar esse texto é importante lembrar que além de sermos professoras e professores também somos mães, pais, filhas, filhos, esposo, esposa e tantas coisas mais que a vida nos convida a ser. Nossos sentimentos são variados, mas o amor deve ser o maior deles e, estar presente em todos os momentos.


Os medos são muitos, e num instante vem uma enxurrada de pensamentos que nos faz refletir. Pais e mães que lutaram tanto para a educação dos filhos (médicos) passam a querer todos no seu aconchego para protege-los. Mas a decisão não pode ser o que queremos, afinal sua formação foi exatamente para tratar e curar os doentes nesses momentos em que mais precisam. Filhos se contaminam, mães não podem vê-los, mães e pais se contaminam e filhos não podem vê-los. A morte tão próxima de todos e aleatoriamente!

Pensar em uma escola enlutada não fazia parte do nosso cotidiano, e quando isso acontece, nos deixa muito mais que tristes e assustados, nos deixa assombrados. A comoção é geral e nesta hora precisamos nos unir ainda mais e enfrentar a tristeza.

De repente, muito além do que imaginamos, tudo mudou, o mundo mudou! Nossa espera agora torna-se real e, contraditoriamente, não podemos mais esperar, nossas crianças precisam de nós educadores. As famílias que já nos pediam socorro agora gritam por ajuda! O papel da escola muda e amplia, a ressignificação é necessária e urgente.
Professores se desesperam e perguntam: como fica tudo aquilo que planejamos para realizar em 2020? Como as crianças irão aprender sem irem para a escola e sem a nossa ajuda? O que fazer agora?

Buscamos alternativas por todo lado, o que vivemos hoje jamais pensamos viver um dia. Sentimentos dos mais variados - medo, angústia, tristeza e outros - nos rodeando a todo o momento. É hora de nos unirmos e pensar em alternativas. Nunca antes a postura interdisciplinar esteve tão necessária, para conseguirmos até mesmo sobreviver. A dimensão de olhar para dentro de si mesmo e para o outro, com um olhar sensível para as necessidades do outro, torna-se ainda mais abrangente.

Em tempos de pandemia a falta da inclusão é escancarada de todas as maneiras. E então o que fazer nesse momento? Mais do que nunca precisamos nos transformar para incluir.
As ações iniciam já nos primeiros dias de suspensão de aula e isolamento social. Desde 2018 realizamos em Piracicaba-SP a semana de conscientização do TEA no mês de abril e em 2020 não foi possível acontecer devido à pandemia. A primeira manifestação foi realizar um vídeo explicativo sobre o que vem sendo feito (ou ainda não está sendo feito) em favor da criação de um espaço público de atendimento à crianças pequenas com TEA em nossa cidade de Piracicaba/SP, já que não iria acontecer o evento.

Neste vídeo ressaltamos a possibilidade de aprendizado num momento em que muitos profissionais estavam dispostos a compartilhar seus conhecimentos por meio de lives, e tantas outras ferramentas que nos foram apresentadas. Foi enfatizada a importância de uma organização das famílias de crianças com TEA em busca de políticas públicas para o atendimento na cidade.

Em paralelo a isso, as escolas fecharam para férias de 15 dias, enquanto técnicos da educação municipal se organizaram para um trabalho por meio de vídeos em que as crianças poderiam assistir as professoras contando histórias, cantando e sugerindo brincadeiras para as famílias realizarem com as crianças. Houve muitos questionamentos com relação a isso, como por exemplo: seria a melhor forma de garantir o aprendizado das crianças em tempo de pandemia?

Estudos nos mostram que a criança aprende independente do professor, porém crianças que convivem com outras crianças no espaço escolar tem um desenvolvimento muito acima daquelas que não frequentam a escola na primeira infância. Essa convivência comprometida não tem como ser reposta, porém a sobrevivência neste momento é o mais importante.

Com o pedido de socorro dos pais, que veio rápido, decidimos fazer uma live para auxiliar as famílias, e tirar o peso de ser professor de seus filhos em tempos de suspensão de aulas presenciais. 

Nossa fala sobre o direito de aprendizagem da criança em tempos de pandemia e o que estávamos fazendo, e continuamos realizando de uma forma ainda melhor, foi muito inspiradora para pais, educadores e comunidade escolar em geral.

Com a pandemia, a parceria escola e família caminhou para se intensificar a cada dia, mesmo com alguns pais perdendo o ritmo das respostas das atividades propostas, os frutos foram plantados e as atividades acontecem com muita qualidade. Reuniões com as famílias e encontros on-line com as crianças acompanhadas de seus familiares, passam a acontecer com frequência. Está sendo uma forma de manter o contato com as famílias, orientando os mesmos na relação entre os seus em tempo de suspensão de aula presencial. Como tornar a rotina da casa um campo de aprendizagem.

Posto isso, infelizmente esta não é a realidade em todas as escolas da cidade e tão pouco do país e do mundo. A exclusão social aumentou e a aprendizagem como direito neste momento precisa deixar de ser prioridade e sim o direito à vida volta a preocupar a sociedade. Há relatos de grande número de crianças sem a devida alimentação necessária, sendo violentadas e tantas outras situações de risco.

Hoje discutimos:  realmente devemos voltar às aulas presenciais? seria seguro este retorno? As autoridades em nosso pais e no mundo estão realmente preocupadas com nossas vidas? Os protocolos da saúde se encaixam para crianças de 0 a 5 anos? Muitos pais não querem mandar seus filhos para a escola, a incerteza deste momento os apavora.

Não esperemos mais por dias melhores, sejamos melhores,
Não esperemos mais por dias de paz, sejamos a paz,
Não esperemos mais por sermos melhores no amor, vamos amar mais e sermos melhores em tudo!
Vivemos esperando e não podemos mais esperar, temos que ser melhores hoje, nosso dia aqui e agora precisa ser melhor. A transformação é agora!

*MARILICE  PEREIRA RUIZ DO AMARAL MELLO 













-Doutora em Educação (PUC-SP);
-Especialista em ABA (LAHMIEI- UFSCar);
-Graduada em Pedagogia; Dra. Marilice foi 
-Foi coordenadora pedagógica da Associação de pais e amigos de Autistas de Piracicaba- AUMA;
-Diretora de escola de Educação Infantil;
 -Palestrante dos temas voltados à inclusão e em especial a inclusão de crianças com TEA;
-Pesquisadora do Grupo de Pesquisas Interdisciplinares- GEPI e Grupo de Pesquisa em Espiritualidade e Interdisciplinaridade- INTERESPE da PUC-SP e Grupo de Pesquisa em Práticas de Aprendizagem Inovadoras e Inclusivas- GP PAII da UFAL todos relacionados a Interdisciplinaridade e Inclusão.
Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Inquietude

Autora: Sarita  Goulart(*)

Inquietos são os momentos que temos vivido, inquieta está a minha alma frente aos últimos acontecimentos tanto aos que afligem a nossa pátria bem como aos que atingem quase todo o mundo. Minha alma está inquieta mas não abatida.

Acredito que um indivíduo que tenha uma crença acrescente a sua fé a esperança de que os dias tristes e sombrios passarão e possui firme certeza de que o futuro trará coisas boas e confortadoras mesmo diante de uma situação caótica e perturbadora que se nos apresente ou queiram nos apresentar. Assim como o caos e a desordem, façam parte da vida, tanto interna como externamente a cada um de nós compete organizar e ordenar do melhor jeito possível para vencermos e seguirmos adiante apesar das dificuldades e tropeços naturais que nos são impostos. 

Certo é que inquietos atravessamos um mar de incertezas diante de mais um infortúnio, uma pandemia de coronavírus que assola o mundo e que no Brasil assume características diferentes do resto do planeta pois além da questão de saúde pública tem contornos políticos desumanos e desrespeitosos para com as vítimas desse terrível vírus pois maus políticos estão utilizando-se dessa crise sanitária para obter lucros políticos e o que é vil, para a prática criminosa de corrupção onde já está em andamento uma operação da Polícia Federal em todo o país investigando indícios de desvios de dinheiro público destinado pelo Governo Federal aos Estados e Municípios para o combate da COVID-19.

É inadmissível que os recursos públicos que tenham sido destinados aos governadores e prefeitos e tenha sido dado a eles legitimidade para gerirem tais recursos tais como: a compra de respiradores que mantém vivas às pessoas nos leitos das UTIs , compra de leitos em hospitais particulares para uso do SUS , construção de hospitais de campanha para atendimento das vítimas da COVID tenha sido desviado para outro fim que não este ou tenha sido fruto de uma má gestão. Por mais que uma epidemia dessas não mande aviso que esteja chegando não se admite que vidas sejam tratadas dessa forma em detrimento de pessoas nefastas aproveitando-se de uma tragédia para roubar o dinheiro cujo destino era pra saúde ou dar-se ao luxo de ser incompetente a ponto de gerir mal o recurso.

Por essas e outras que eu me faço indagações inquietantes que provocam várias interrogações; Porque tais coisas acontecem no Brasil onde todas as forças políticas e da sociedade civil deveriam estar unidas para vencer um inimigo poderoso e destrutivo? E o que estamos vendo é justamente o contrário? Este inimigo por vezes parece contar com torcida? O que por si já é um absurdo. 

São perguntas que por enquanto estão em aberto o que eu posso responder com certeza é que inquieta está a minha alma, tristes tem sido os dias enquanto essa pandemia não passa mas acrescentada está minha fé com esperança em dias melhores sem ranços, maus humores, quarentenas intermináveis , e que os oportunistas de carreira tenham suas respostas porque eles parece esqueceram que às eleições estão logo ali.

Por aqui me despeço! Queira Deus com mais leveza e quietude até a próxima! 

*SARITA DE LURDES FERREIRA GOULART















- Formada em Direito pela UNISINOS-São Leopoldo-RS - Turma de Janeiro/1988;
- Pós graduada no Curso de Especialização em Direito Político pela UNISINOS em 1990; e
- Natural de Canoas - RS  aonde advoga.
-Email: saritagoulart@gmail.com
-Twittter: @saritagoulart
- Celular: 51 9 9490-0440

Nota do Editor:

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quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Casamento Virtual, Direito de Visitas e Pensão Alimentícia em Tempos de Covid-19


Autor: Erick Carrasco(*)



Sumário
          Introdução;
      1.O “Casamento à Distância”;
      2.O Direito de Visitas Durante a Covid-19;
      3.Pensão Alimentícia e a Covid-19
     Conclusão
       

INTRODUÇÃO

O mês de dezembro de 2019, na cidade de Wuhan, China, surge um novo vírus decorrente da família do coronavírus denominado SARS-CoV-2 que, transmitido de pessoa a pessoa, fez o mundo parar. Nunca se falou tanto em mudança e renovação como nos dias atuais.


No dia 30 de janeiro de 2020 a OMS declarou a doença causada pelo novo vírus, a tal COVID-19 como Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional. No dia em que este artigo foi escrito, 28 de agosto de 2020 já são aproximadamente 24.316.245 (vinte e quatro milhões, trezentos e dezesseis mil, duzentos e cinquenta e quatro) pessoas infectadas e 828.575 (oitocentos e vinte e oito mil, quinhentos e setenta e cinco) pessoas que faleceram[1].


Muito se discute, até os dias atuais, qual o melhor meio de conter o avanço da epidemia que tomou conta do globo em sua totalidade. Apesar de ninguém estar certo disso ainda, de uma coisa todos têm plena convicção: muita coisa mudou. A doença contribuiu, de certo modo, para que muitas coisas evoluíssem e isso em várias áreas distintas ao passo em que também causa imbróglios tanto na questão da saúde pública quanto em relação à economia de todo o globo. 

Como exemplo de mudanças ocorridas vale citar até mesmo o Poder Judiciário. Os processos judiciais sempre foram tratados de modo arcaico. Apesar da "digitalização" dos processos judiciais estar cada vez mais em evidência, muita resistência ainda existe tanto por parte de advogados quanto por parte de serventuários e juízes. Fato é que, como explica ARNOUD (2014)[2] "em meados da década de 80 e 90 surgem os primeiros computadores e 20 anos depois, o poder judiciário está passando por uma revolução cultural na qual o processo passa a tramitar exclusivamente pela via eletrônica, tendo por fim processos mais céleres e acessíveis ás partes".

Apesar de tantas inconsistências ainda enfrentadas por advogados ao redor de todo o Brasil com a utilização dos programas que armazenam os processo judiciais que vão desde indisponibilidades do sistema até o fato de que não há padronização entre os sistemas (cada tribunal utiliza um programa diferente, a exemplo do TJMG e do TJSP), fato é que o programa tornou-se essencial em tempos de isolamento social. 

Além disso, um outro fator que vinha sendo utilizado por um ou outro tribunal torna-se mais comum no presente: a aplicação das audiências virtuais. Apesar de que alguns juízes ainda não terem adotado essa nova realidade, seja por resistência ou seja por falta de estrutura, esta é uma realidade que veio para ficar. Um exemplo disto é a edição da Lei n. 13.994/2020 que alterou a Lei dos Juizados Especiais, Lei. 9.099/95, possibilitando a realização de audiências de conciliação virtuais nos juizados especiais cíveis e fez mais que isso. A lei obrigou a parte a comparecer à audiência sob pena de, não o fazendo, ser proferida sentença pelo Juiz Togado, nos termos do art. 23 da referida lei.

Neste sentido, em tempos onde a mudança passa representar uma palavra chave, onde a evolução passa a representar um anseio social mais visível, o Direito de Família, ramo do direito mais ligado às mudanças sociais, não poderia ficar de fora. Várias mudanças, mesmo que temporárias podem ser percebidas tanto positivas, quanto negativas.

1 – O "CASAMENTO À DISTÂNCIA"

Apesar do isolamento social e da impossibilidade de aglomerações, um dos principais acontecimentos na vida de uma pessoa, a maior representação do amor e do desejo à vida em comum de um casal, os casamentos, não poderiam deixar de ocorrer. Pensando nisso, diversos tribunais ao redor do país passaram a adotar medidas para que o sonho não tivesse que ser adiado.

Tribunais de Justiça como o de Minas Gerais, Pernambuco e São Paulo passaram a autorizar a realização de casamentos online. Ainda que sejam medidas temporárias, os casamentos online têm atingido resultados satisfatórios. A título de exemplo cabe citar o TJMG que em abril deste ano iniciou o projeto-piloto em alguns cartórios da capital e algumas comarcas e em julho estendeu a autorização a todo o Estado.

Estas medidas abrem precedentes para que, posteriormente, cumprindo todos os requisitos legais, seja possível a realização de casamentos a distância, facilitando a vida dos noivos e reduzindo até mesmo o número de casamentos desmarcados por viagens de negócios, por exemplo.

2 – O DIREITO DE VISITAS DURANTE A COVID-19

É cristalino o direito à convivência familiar da criança e adolescente, sendo este uma garantia constitucional prevista no art. 227, caput, da carta magna, sendo dever da família, da sociedade e do Estado garantir que este direito seja preservado.

Neste sentido, conforme ensina SUAREZ (2020)[3] "este direito de convivência é inarredável e somente ocorre seu afastamento pelo Judiciário em casos extremos e alicerçados na doutrina da proteção integral do infante, a qual preleciona que a preocupação central dos cuidadores ou genitores sempre deverá ser o atendimento ao melhor interesse da criança".

Em um evento sem precedentes como a atual pandemia causada pela COVID-19, é natural que discussões que, antes, pareciam de fácil solução se tornem discussões e, na falta do esperado bom senso, sejam levadas ao judiciário e uma destas questões é: como fica o direito de visitas durante a pandemia? O pai que detém a guarda pode impedir que o outro visite o filho apenas por medo de contágio?

Antes de se chegar a uma conclusão acerca das respostas, vale refletir que em ações envolvendo o direito das crianças e adolescentes sempre será observado o melhor interesse da criança, observando-se o princípio da proteção integral, implementada pela constituição e amplamente regulamentado pelo Estatuto da Criança. 

Assim, cada caso deverá ser analisado em particular. A título de exemplo, valem ser citados dois casos. O primeiro caso ocorreu no Distrito Federal. No caso em voga, um pai pediu que o direito de visitação fosse suspenso alegando que vive com seus pais, idosos, e que, no deslocamento poderia ser infectado, colocando em risco a sua saúde e de seus pais. A mãe da criança manifestou-se contrariamente no sentido de que não houve alteração de fatos ou de direitos capazes de modificar o acordo de convivência paterna firmado anteriormente, o que foi acolhido pela magistrada em primeira instância.

Em sede de recurso, o pai voltou a se pautar na gravidade da doença e citou recomendação do Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes visando impedir que crianças e adolescentes sejam submetidos a risco em decorrência das visitas ou período de convivência. 

Neste sentido, o TJDF decidiu pela suspensão ao direito de visitação, entendendo que, diante de todo o fato narrado, tanto os pais do requerente quanto a criança estaria em risco, entendendo que, assim, o melhor interesse da criança estaria melhor resguardado[4]

Em outro caso, um juiz de primeira instancia da 2ª vara de Família e Sucessões de Jacareí/SP, por sua vez, negou um pedido de suspensão do direito de visitas, entendendo que no caso não havia elementos suficientes para a concessão do pedido e que a pandemia não poderias ser utilizada genericamente como fundamento para tanto[5].

Conclui-se que, tratando-se da possibilidade ou não da suspensão do direito de visitas durante a pandemia, dever-se-á observar caso a caso, analisando se há risco à integridade da criança e qual é o melhor interesse dela em cada situação.

3 – PENSÃO ALIMENTÍCIA E A COVID-19

Além das questões sociais, outra questão que tem tudo a ver com a COVID-19 é a questão econômica. Segundo dados do IBGE[6], 44,8% (quarenta e quatro vírgula oito por cento) das empresas reportaram que a pandemia trouxe um efeito negativo. Além disto, o estudo ainda mostra que 13,5% (treze vírgula cinco por cento) reduziram o número de funcionários, sendo que, entre estas, 10,7% (dez vírgula sete por cento) reduziram em mais de 50% (cinquenta por cento) o número de funcionários.

Ainda conforme o estudo, 3,2 milhões de pessoas foi afastado do trabalho e deixaram de receber remuneração. Além disso, 30,1% (trinta vírgula um por cento) das pessoas empregadas tiveram redução em seus salários, sem contar o crescente número de desempregados.


Tendo em vista toda esta alteração fática vários devedores de pensão alimentícia correram ao judiciário visando reduzir ou até mesmo buscando a exoneração da obrigação. A questão principal é: como fica a questão de quem deve pensão face a pandemia que enfrentamos?

A resposta inicial é: nada mudou. "Mas como assim? Já vi vários casos em que a pensão foi alterada...". Sim, o que mudou foi o número de ações, conforme mencionado, já que a simples situação de desemprego ou a pandemia, por si só, não são fatos que exoneram ou ensejam a redução da pensão alimentícia.


Veja bem, dispõe o § 1.º do art. 1.694 do Código Civil que os alimentos devem ser fixados cotejando-se a necessidade de quem os reclama e a possibilidade de quem os prestará. A doutrina aponta ainda um terceiro critério: a proporcionalidade. Assim, para que haja a alteração da obrigação, é necessária que haja a modificação do status financeiro de alimentando e alimentado, conforme dispõe o art. 1.699 do Código Civil, arts. 13, §1º, e 15 da Lei 5.478/1968 e art. 505, inciso I, do CPC/2015.

A simples argumentação de que a pandemia prejudicou a economia global não é o bastante para que a redução do valor a ser pago seja reduzido, muito menos para que haja a exoneração da obrigação. O autor da ação revisional deve ser capaz de comprovar a efetiva alteração, o que só poderá ser analisado caso a caso, e com muito zelo.

Neste sentido, SILVA (2020)[7] ensina que

As mudanças causadas pela pandemia não ficam adstritas à condição financeira das partes, mas, também, à mudança dos seus hábitos, o que impacta diretamente em suas finanças. Por exemplo, durante este período, muitas visitas foram suspensas, o que acaba atribuindo uma carga financeira maior ao genitor que detém a guarda física do menor. Não somente: com a suspensão das aulas, gastos ordinários com alimentação, água, luz, internet, serviços de streaming, etc, possivelmente, sofreram certa majoração. Some-se a isso a ampliação do tempo destinado ao menor e que é suportado exclusivamente pelo genitor detentor da guarda.
Ao revés, outros gastos ordinários podem ter sido reduzidos, como: combustível, alimentação fora de casa, lazer, atividade física em academias particulares, entre outras.

Assim, para além do fator econômico, será necessária a análise da real alteração fática da necessidade x possibilidade, analisando o juiz a proporcionalidade da real alteração para só assim decretar a revisão dos valores. 

Cumpre lembrar a todos os devedores que não basta apenas uma notificação informal ao outro pai da criança que não tem condições de pagar o valor integral da obrigação alimentícia. É necessária uma decisão judicial para tanto. Do contrário, corre-se o risco de ser decretada a prisão cível do devedor ou serem penhorados tantos bens quanto bastem para preencher o valor da dívida.

CONCLUSÃO

Toda alteração brusca, em qualquer área da vida, traz consequências desconhecidas. Essas consequências podem ser positivas ou negativas. E não foi diferente com a COVID-19, que mudou a realidade de todo o planeta, em várias áreas, e, principalmente na social e econômica.

Aprender a conviver com as mudanças e se preparar para enfrenta-las, buscando absorver os ensinamentos por elas impostos é necessário e, muitas vezes, sozinho não se consegue.

O que resta a todos é buscar o conhecimento e os ensinamentos que a vida transmite todos os dias. 

Ao Direito resta se adequar as realidades da sociedade e, por mais que essa adequação seja morosa, um dia tudo se acerta. Principalmente no que tange ao Direito de Família, várias alterações já foram observadas pela mudança da realidade e agora não é diferente. 

Caberá aos legisladores e aplicadores do direito observarem estas alterações e aplica-las nas leis e em suas aplicações nos casos que surgirem para que o objetivo final do direito seja atendido: a busca pela pacificação social e pela ordem.

REFERÊNCIAS

[1] BRASIL; Folha informativa COVID-19 - Escritório da OPAS e da OMS no Brasil; publicado em 28 de Agosto de 2020
Disponível em: https://www.paho.org/pt/covid19; Acesso em 28/8/2020;
[2] ARNOUD, Analu Neves Dias; Do Contexto Histórico do Processo Judicial Eletrônico. 2014.
Disponível em
[3] SUAREZ, Gabrielle Gomes Andrade; A suspensão do direito de visitas em tempos de coronavírus; publicado em 2 de abril de 2020
Disponível em
[4] TJDFT; Justiça suspende visitas paternas temporariamente para evitar disseminação do coronavírus; publicado em abril de 2020.
[5] TJSP; Pandemia não pode ser invocada genericamente para suspender visitas entre pais e filhos; publicado em 21 de agosto de 2020.
Disponível em
[6] IBGE; Pulso Empresas;
Disponível em 
https://covid19.ibge.gov.br/pulso-empresa/; Acesso em: 28 de agosto de 2020;
[7] SILVA, Pedro Paulo Rodriguez Guisande; COVID-19 - Breves esclarecimentos acerca da ação revisional de alimentos durante a pandemia; publicado em 8 de junho de 2020.
Disponível em

*ERICK GONÇALVES CARRASCO













-Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Sete Lagoas – UNIFEMM (2018); 
-Advogado inscrito nos quadros da OAB/MG. 
-Atualmente atua nas áreas do Direito Civil (Família, Sucessões, Contratos) e Direitos do Consumidor.


NOTA DO EDITOR :

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quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Cartão de Crédito Consignado : Vantagens e Desvantagens


Autor: Alex Hashimura(*)


Atualmente, todo mundo sabe que o cartão de crédito é um meio de pagamento mais fácil e simples de se realizar uma compra, seja em loja física, seja em loja virtual. No mercado há um leque enorme de instituições financeiras que fornecem aos seus clientes vários tipos de cartões de inúmeras categorias, das mais simples até os mais "tops".

Porém, nem todos conseguem obter um cartão de crédito, pois as instituições financeiras realizam uma análise de crédito do interessado para verificar se o futuro usufruidor do cartão terá condições de arcar com os gastos para liberar um limite de crédito para que possa utilizar, sem que a instituição corra o risco de não receber o valor gasto. Diante dessa burocracia, muitos nem tentam ou não conseguem obter um cartão de crédito.

Com isso, surgiu o cartão de crédito consignado, que tem a mesma ideia do cartão de crédito comum, porém sendo destinado para aposentados, pensionistas, servidores públicos e trabalhadores com carteira assinada. Apesar de haver várias vantagens, se comparado com o cartão de crédito comum, o cartão consignado tem suas diferenças e cuidados que devem ser observados.

Uma das primeiras diferenças com o cartão de crédito comum é que o limite disponível será, na maioria dos casos, maior, podendo ser maior que a própria renda do cliente, pois no cartão consignado não é realizado nenhuma consulta ao SPC/Serasa. Para se definir o limite de crédito que será liberado, a instituição financeira faz um cálculo direto sobre a renda do cliente.

Outra diferença, segundo as próprias instituições e o site do Serasa[1], são as taxas, pois elas são bem menores que a do cartão de crédito comum, principalmente as taxas do rotativo, o que é bem atrativo para quem precisa de crédito e não quer pegar um empréstimo ou financiamento.

Talvez uma das maiores vantagens do cartão de crédito consignado seja a anuidade ou taxa de manutenção. Nesse tipo de cartão, não existe aquela taxa mensal que deve ser paga na fatura, ou seja, é isento.

A diferença, e talvez a única diferença, se comparando com o cartão de crédito comum, é a forma de pagamento da fatura. O cartão consignado tem a mesma ideia que o empréstimo consignado. Portanto, a forma de pagamento também é igual, porém com um único diferencial: o valor que é descontado direto na folha ou benefício previdenciário é o valor mínimo da fatura, havendo que se pagar o complemento via boleto ou débito em conta. Por isso que, se olharmos somente para esses pontos que destaquei, podemos estar, na verdade, caindo em uma verdadeira bola de neve.

Como as taxas do cartão consignado são bem atrativos, muitos que o possuem pensam em sacar o crédito que a instituição financeira, como se fosse um empréstimo, mas se esquecem ou não são informados que devem parcelar o valor sacado ou realizar o parcelamento da fatura, já que, por ser um cartão de crédito, o valor sacado aparecerá na fatura em sua íntegra, e como é descontado na folha somente o valor mínimo da fatura, o que poderia ser uma vantagem pode se tornar uma bola de neve, já que é necessário o complemento do valor.

Muitas das vezes o consumidor é atraído somente pelas vantagens, mas não são alertados corretamente ou não são repassadas as informações de forma clara, pois nesse tipo de contratação a modalidade é por adesão, ou seja, o consumidor só assina, sem poder questionar ou alterar nenhuma cláusula do contrato.

Também vale destacar que o próprio costume das pessoas faz com que não leia o que está sendo assinado. Quando se dá conta, o que era para ser um simples crédito se torna uma bola de neve ou uma dor de cabeça sem fim, havendo a necessidade de se recorrer aos órgãos competentes ou até mesmo ao judiciário para poder reverter a situação. 

Portanto, fique ciente que é necessária a orientação detalhada do que está sendo oferecido, e não fique com vergonha se estiver com dúvida, tente sanar todas as dúvidas com o ofertante.

REFERÊNCIAS

<acesso em 04/08/2020>


ALEX SHINJI HASHIMURA/ OAB/DF nº 52.833


-Graduado pela Universidade Projeção – UniProjeção (2016);
-Pós-graduando em Direito Previdenciário e Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Legale;e
Sócio Administrador do Escritório Alex Hashimura – Sociedade Individual de Advocacia

Nota do Editor:

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terça-feira, 1 de setembro de 2020

Prescrição Intercorrente em Processo Administrativo Fiscal: Mutação Jurisprudencial?


Autora: Tátia Leal(*)


Como é de grande conhecimento dos advogados que atuam na área tributária, tanto o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) como os nossos tribunais pátrios vem pacificando  o entendimento de que não é possível a aplicação da prescrição intercorrente em processo administrativo fiscal em nenhuma hipótese. Porém, recentemente, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região julgou favoravelmente em um caso concreto, o que será estudado no presente artigo.

O caso concreto se trata do mandado de segurança nº 5013446-32.2019.4.03.6100, impetrado para obter provimento jurisdicional para suspender os atos impugnados na cobrança de crédito tributário do imposto de renda, sob a alegação de estar extinto diante da prescrição intercorrente ocorrido no processo administrativo.

No referido mandamus o Impetrante alega que apresentou impugnação administrativa em 08/03/2010 e recurso voluntário julgado pelo CARF em 18/03/2014, bem como entre a data final da decisão do CARF e a data em que teria sido expedida a intimação, em 10/04/2019, já teriam se passado mais de 5 anos, havendo a ocorrência da prescrição intercorrente no procedimento administrativo, por não ter cumprido o prazo legal do art. 24 da Lei nº 11.457/2007, ultrapassado o prazo do art. 1º da Lei nº 9.873/99, bem como o prazo dos arts. 173 e 174 do CTN.

Em suma, no mandado de segurança foram ressaltados três pontos de argumentação para embasar a extinção do crédito tributário:

1.  Não cumprimento do prazo de 360 dias para julgamento – art. 24 da Lei nº 11.457/2007 (art. 24.  É obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte);

2.  Decurso de prazo de mais de 3 anos do art. 1º, §1º, da Lei nº 9.873/99 (§ 1º  Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso)

3.    Decurso de prazo de 5 anos dos arts. 173 e 174 do CTN:

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
Parágrafo único. A prescrição se interrompe:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118/2005)
II - pelo protesto judicial;
III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.

Ao analisar o mérito do mandado de segurança, a MM. Juíza da 2ª Vara Federal de São Paulo entendeu que o Impetrante logrou êxito em demonstrar que o processo ficou parado por período superior ao previsto em lei entre a data do julgamento pelo CARF e a intimação para o pagamento e ciência do acórdão, conforme trechos que destaca-se:

"(...) Verifico que o impetrante logrou êxito em demonstrar a paralização do processo administrativo nº 19515.000204/2010-59 com a documentação juntada aos autos, na medida em que se denota que a decisão do CARF sobre o recurso voluntário teria sido publicada em 16.04.2014 (doc. id. 19857221) e que a intimação para pagamento dando ciência do mencionado acordão somente veio a ocorrer em 2019, por intermédio da intimação nº 519/2019 (doc. id. 19857219), período em que já não  mais pendia de recurso.

Com efeito, tem o presente remédio a função de coibir atos de desvio ou abuso de poder por parte de autoridade, que viole direito líquido e certo de alguém. No presente caso, a autoridade agiu fora dos ditames legais, restando caracterizada a violação do direito líquido e certo da parte impetrante, devendo ser concedida sua pretensão.

“Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da sua impetração.” (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, editora Revista dos Tribunais, 15ª edição, São Paulo, 1990, p.610).

No caso, está comprovada a existência do direito alegado pela parte impetrante.

Ante o exposto, confirmo a liminar deferida e CONCEDO A SEGURANÇA, o que faço com fundamento no artigo 487, inciso II, do CPC, para, nos termos da fundamentação supra, reconhecer a prescrição intercorrente dos créditos cobrados no processo administrativo nº 19515-000.204/2010-59, devendo a autoridade impetrada se abster de adotar os procedimentos para a cobrança (inscrição em dívida ativa, CADIN e demais atos). (...)
(Processo nº 5013446-32.2019.4.03.6100, Juíza Federal Rosana Ferri, 2ª Vara Federal/SP, proferida em 12/05/2020, PJe 19/05/2020)

Ademais, o colegiado do TRF/3ª Região também julgou favoravelmente em situação análoga do citado mandado de segurança, in verbis: 

"TRIBUTÁRIO - ANULATÓRIA - IMPOSTO DE RENDA - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO: OCORRÊNCIA - APELAÇÃO PROVIDA.
1. A Lei Federal nº 9.873/99: Art. 1º. § 1º. Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso".
2. A impugnação administrativa, protocolada pelo contribuinte em 4 de abril de 2002, foi levada a julgamento, apenas, na sessão de 9 de dezembro de 2008, pela Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento São Paulo II, com intimação expedida em 13 de janeiro de 2009.
3. O extrato do respectivo processo indica a ausência de movimentação entre 29 de abril de 2003 e 12 de dezembro de 2008.
4. O processo administrativo fiscal ficou paralisado por período superior a três anos. Não há informação de qualquer ato de instrução capaz de obstar o curso do prazo prescricional.
5. Verificada a prescrição intercorrente.
6. Apelação provida.
(TRF3, ApCiv 2276988 - 0014629-65.2015.4.03.6100, Rel. Juiz Convocado Leonel Ferreira, Sexta Turma, julgado em 06/06/2019, e-DJF3 Judicial 1 14/06/2019)"

Portanto, diante dos dois casos acima narrados, surge-se a seguinte dúvida: será que poderá haver uma mutação jurisprudencial quanto a aplicabilidade da prescrição intercorrente em processo administrativo fiscal?

Temos que aguardar como o Superior Tribunal de Justiça irá se comportar diante da nova e atual situação, tendo em vista que, em 2010, o Colendo Tribunal firmou entendimento acerca da temática. Porém, ocorrida uma década, e diante de inúmeras ações que se questionam a legalidade ou não da aplicação da prescrição intercorrente, o Tribunal Superior poderá rever seu antigo posicionamento.

TÁTIA M.O.LEAL OAB/DF nº 















-Advogada graduada pela Universidade da Amazônia (2008);
-Pós-graduada em “Direito e Legislação” pela Escola da Magistratura do Distrito Federal (2010); 
-Áreas de atuação:Cível,Família e Consumidor;
-Atualmente, encantada pelo Direito Tributário.

Nota do Editor:

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