“... O que deve caracterizar a juventude é a modéstia, o pudor,
o amor, a moderação, a dedicação, a diligência, a justiça, a educação.
São estas as virtudes que devem formar o seu carácter...!”
Sócrates
O ingresso do Brasil ao Primeiro Mundo não pode se cingir a um exercício de retórica. Deve ser algo muito mais consistente, que passa pelos cuidados com a educação, a ciência e a tecnologia.
Se investirmos apenas 0,5% do Produto Interno Bruto em Ciência aí está o sintoma claro de que nos distanciamos de nações mais desenvolvidas, como é o caso da Coreia do Sul, que hoje coloca 2% do seu PIB em pesquisa científica e tecnológica. Com um pormenor notável: 70% desses recursos são oriundos da iniciativa privada, que acredita nesse investimento, o que infelizmente não ocorre entre nós.
A quase totalidade dos nossos fracos investimentos na área é devida a recursos federais, colocados à disposição das universidades. Não se deve desconsiderar o valor dos recursos hoje aplicados no Brasil aos setores de desenvolvimento científico e tecnológico. São 2,4 bilhões de dólares, resultado das muitas campanhas realizadas e da aquisição de uma consciência generalizada a respeito da sua importância. Mas é também claro que estamos muito longe dos recursos ideais.
Veja o caso dos EUA: as universidades americanas disporão este ano um orçamento de 158 bilhões de dólares, mais da metade para projetos de pesquisa básica.
Quando se coloca a questão da inserção do Brasil no clube do Primeiro Mundo, gostaria de deixar claro o meu ponto de vista: entrar no Primeiro Mundo não significa vencer a corrida tecnológica, mas acompanhá-la. Um país pertence ao Primeiro Mundo quando contribui para o desenvolvimento da humanidade como um todo.
O Brasil poderia estar dedicando maior atenção ao desenvolvimento de vacinas contra a meningite do tipo B e o dengue. No primeiro caso, temos importado vacinas de Cuba, gastando milhões de dólares, quando isso poderia estar sendo feito em nossos próprios laboratórios, com economia e eficiência. O mesmo pode ser dito em relação à genética. O nosso país tinha resultados apreciáveis, em nível mundial, nas décadas de 50 e 60, mas por falta de apoio a nossa presença foi definhando, tornando-se hoje secundária.
A origem da falha encontra-se no sistema escolar ("a escola está preocupada em ensinar - e não fazer o aluno aprender"). A escola quer formar os cidadãos médios, mas é preciso valorizar os bons alunos, aqueles que irão compor as elites científica e intelectual, de onde são extraídos os elementos capazes de sustentar a liderança em setores determinados do conhecimento ou do pensamento. Há exemplos internacionais do que deve ser feito, como é o caso da Bronx School of Science (NY), que trabalha com alunos superdotados para o ensino de Ciências. Eles são estimulados, por mestres competentes, em laboratórios devidamente apetrechados, para que se ampliem as suas possibilidades de acesso a outros patamares da ciência moderna.
Estamos diante da irreversibilidade da lei da educação brasileira (LDBEN nº 9394/96). Não custa, pois, acentuar alguns aspectos que poderiam ter merecido melhores definições, como é o caso da educação especial, tratada de modo superficial. É muito grande, no Brasil, o número de deficientes visuais, auditivos, motores e psicológicos, todos merecendo na escola os cuidados que são dispensados, com tanto carinho, nas nações mais desenvolvidas.
Por outro lado, no caso da educação infantil (de 0 a 6 anos de idade) não basta a simples referência que se faz no instrumento legal. Não temos tradição no trato dessa faixa etária, de resto entregue à iniciativa privada, portanto inacessível, dado os seus custos, às camadas mais pobres da população.
Quando na LDBEN/9394/96 - se fala em superdotados há apenas uma referência no artigo 58.
Sabe-se que o Brasil tem cerca de 4 milhões deles, o que configura uma imensa potencialidade entregue à própria sorte. Se Israel pôde criar um Instituto para Superdotados, em que se faz uma apropriada educação complementar, por que não se pode pensar o mesmo entre nós?
Outro fato a merecer destaque: o grande número de alunos da rede pública que se encontram prejudicados pela distorção idade-série (mais de 80% do efetivo existente). Isso causa enormes prejuízos ao aprendizado e precisa ser considerado quando se vai partir para inovações pedagógicas.
Somos partidários igualmente de uma grande valorização da educação ambiental, prevista na Constituição Federal de 1988, de forma inédita no mundo. Não se tem notícia de nenhum outro país que determine, em sua Carta Magna, a adoção dessa disciplina. E finalmente cabe ainda um registro sobre o ensino médio, que é responsabilidade dos Estados. A valorização tecnológica não deve ser descartada das nossas preocupações. A profissionalização nesse nível pode ser um poderoso antídoto à onda de desemprego, São aspectos que, na implementação da LDBEN/96, talvez devam ser corrigidos por intermédio da legislação complementar e das ações a serem desenvolvidas pelos sistemas estaduais e municipais de educação.
A Suécia é o país que mais investe em educação. Só em 2014, gastou 7,6% do seu Produto Interno Bruto nessa área, superando os Estados Unidos, a França, o Japão e a Itália, que aplicaram índices inferiores do seu PIB no mesmo setor. Com uma população de 8,4 milhões de habitantes, o país passou por uma intensa reforma educacional, a partir dos anos 50.
Hoje, dedica nove anos à escolarização obrigatória, que abrange alunos dos sete aos dezesseis anos de idade; dispõe de classes integradas para o ensino médio, objetivando acomodar indivíduos a partir dos 16 anos; possui um sistema municipal de educação de adultos oferecendo a mesma qualidade-padrão dada aos mais jovens; e conta com um nível superior aberto a qualquer um, com qualificações bastante diversificadas.
Todas as crianças entram no pré-escolar pelo menos um ano antes de iniciar a escolarização obrigatória. As instituições que realizam esse trabalho não pertencem ao sistema regular de ensino, mas a programas governamentais de auxílio à criança.
A parcela do orçamento voltada para o ensino é distribuída de tal forma que aumenta os incentivos, estimulando os estudantes. A pré-escola, a educação obrigatória e o ensino médio são controlados pelas autoridades municipais, mas os gastos com a manutenção são divididos com o Estado.
As escolas são gratuitas e seus alunos recebem ainda o material escolar, a refeição e o transporte. Existem poucas escolas particulares. Os pais dos estudantes recebem o salário-família, que é idêntico para todos, até que os dependentes completem 16 anos. A partir daí, os jovens que desejam continuar os estudos recebem bolsas. Chegando ao nível superior, essas bolsas passam a ser empréstimos reembolsáveis.
As administrações municipais proporcionam a um número cada vez maior de crianças atendimento durante todo o dia e atividade fora do horário escolar, por preços módicos. A educação em nível universitário é totalmente controlada pelo governo, existindo mais de 30 instituições que proporcionam ensino gratuito.
Na Suécia, as pessoas com retardamento mental cursam uma escola especial, que não é apenas um direito, mas faz parte da escolarização obrigatória, na faixa dos 7 aos 21 anos. A integração entre o ensino regular e o especial cria condições para uma cooperação mútua, oferecendo aos deficientes mentais as mesmas facilidades de que dispõem os outros estudantes.
Observando o sistema educacional sueco, nota-se uma forte preocupação em manter um currículo homogêneo, igual para todas as escolas do país. Ele contém exigências expressas quanto às tarefas escolares, de maneira que elas se adaptem às necessidades intelectuais e sociais dos alunos.
O objetivo principal do governo é beneficiar o desenvolvimento da personalidade da criança, aumentar suas possibilidades de uma boa colocação no mercado de trabalho e garantir uma intensa participação na vida da comunidade. Para um país das suas dimensões, o sistema funciona de modo bastante adequado, o que resulta na posição invejável da Suécia no conceito internacional.
No Japão, o ensino é obrigatório durante os primeiros nove anos de escolarização ( seis no primário e três no secundário inferior). A partir daí, tudo é opcional. Em consequência, praticamente todos os japoneses dos seis aos 15 anos de idade encontram-se nas escolas, num fenômeno elogiável de universalização do ensino.
Alcançando esse ideal, os educadores agora se voltam para a discussão em torno da qualidade do ensino, procurando-se valorizar a criatividade, de que eles andam bastante divorciados.
Condena-se hoje o excesso de memorização nas escolas, quando o desejável é a compreensão maior e melhor das lições transmitidas por seus mestres.
Outro aspecto a ser ressaltado é o excesso de competitividade, responsável pela enorme frequência de suicídios entre os jovens. Não serve estudar em qualquer escola, mas nas que têm renome, sobretudo universidades.
As melhores oportunidades são oferecidas aos que têm históricos escolares exemplares, o que é compulsado pelos caçadores de talentos das empresas japonesas. Para oferecer essas oportunidades aos seus estudantes, o Japão investe 12% do orçamento em educação.
Os Estados Unidos investem nada menos de 13,6 %. Numa comparação sem maior análise, do que faz o Brasil. O problema é que temos uma dívida social imensa, que precisa ser resgatada com investimentos maciços na educação. Enquanto isso não se fizer, continuaremos a conviver com números e carências verdadeiramente absurdos.
As nações desenvolvidas agem dessa forma. Não temos outra saída senão seguir os seus passos.
Postado originariamente no dia 16.09.2015 na Sala de Protheus em
http://epensarnaodoi.blogspot.com.br/
Por NELSON VALENTE
-Professor Universitário;
-Jornalista e
-Escritor