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sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Os Cinco Merecimentos



Verdadeiro valor não dão à gente;
Essas honras vãs, esse ouro puro
melhor é merecê-los sem os ter 
que possuí-los sem os merecer.
Luís de Camões

A água corre para o mar, esse ditado vem de uma certeza, e assim se aplica analogicamente a tudo. Pensando cá, em meus momentos reflexivos, me veio a ideia de que tudo que fazemos carrega um sentido, aliás, melhor seriam, sentidos. 

Todo o dinheiro ou bem material que aqui se acumula e pensa-se ter, na verdade será de outro, não será seu. Todo bem que se pensa usufruir é ilusão. 

E o é necessariamente uma vez que não se pode possuir o tempo. Sim! Não possuímos o tempo, se assim o fosse não envelheceríamos. 

O homem está fadado ou a merecer as coisas sem tê-las ou ter as coisas sem merecê-las. Explico: Quando merecemos algo somos verdadeiramente ricos, pois temos direito a ter a substância, a essência, a vida se torna injusta enquanto nos tornamos justos. A própria natureza das coisas e do tempo nos recompensa nos guiando ao mar da satisfação. E como Aristóteles falava “O bem é aquilo a que todas as coisas tendem”. [1]

- Vamos lá! 

Há no mundo àqueles homens que vivem no merecimento da eficiência, comem, vivem e defecam, ou seja, àqueles que trabalham e acumulam o fruto do seu trabalho, não aglutinam muita riqueza porque a própria natureza é eficiente e dá somente àquilo que se merece. Essas pessoas não enriquecem. Veja as formigas, os pássaros, os três reinos naturais, tudo em sincronia perfeita, nem mais nem menos, os animais assim vivem na perfeição da ética e entregam sua alma à evolução das espécies. Quanto aos homens desse merecimento, estes consumiram seus merecimentos entregam o que sobrou ao progresso de sua sociedade. É o cidadão comum que faz a sua parte, levam algo consigo em sua bagagem - suas vestimentas para o futuro. 

Há tipos de homens que carregam em si um merecimento póstumo. Que levam para o além ou o que se defina como outra vida, um merecimento que não se esvai por completo na curta vida em que somos sentenciados. Tome por exemplo um cientista que descobre uma cura para uma doença que aflige a humanidade, ou um inventor que inventa algo que não vai usar, não viverão para usufruir da grandiosidade de sua genialidade. E onde está Alexander Graham Bell agora? Com certeza não está usando um celular nem tão pouco Jobs estará usando e usufruindo da riqueza de sua invenção, deixam suas heranças aos filhos, à sociedade e ao mundo, contudo levam consigo o merecimento de sua monstruosa participação. 

Existem ainda os que são merecedores de berço, os que trazem dentro de si uma vocação artística, um sacerdócio que ultrapassa o valor médio dos demais. Assim é o artista que transforma a fama em riqueza material, que consome seu merecimento, mas também deixa o patrimônio imaterial de sua cultura. O seu mistério jaz escondido em algum lugar. 

Os ilusórios, àqueles que aglutinam riquezas somente para outros, utilizam do pouco merecimento que possuem para deixar sua herança à sua comunidade, e ainda consomem sua fatia do que lhes seria recompensa, no orgulho. Fazem sua parte na grande engrenagem, que faz o tempo atual funcionar, para que a pirâmide social seja sustentada. É assim com um pastor corrupto que vive da exploração dos fieis que precisam de respaldo psicológico ou da muleta de um consolo religioso. Ele pode comprar um avião, um iate ou até mesmo um apartamento em Miami. Não adianta! Seu dinheiro vai para a grande Babilônia! Seu prazer será consumido na ilusão do ter. Pouco levará consigo, posto já ter consumido todo o merecimento de sua ajuda em proveito próprio. Este é mais zero a zero do que um a um. 

E por fim, nessa singela classificação, há aqueles que muito ambicionam, não importando qual bagagem tragam, zombam do Direito, são aqueles que confiam tão somente na força e na riqueza, que passam por cima de todos, das leis e do respeito. Sua riqueza e seu orgulho profanam o santuário da justiça, a estes um destino cruel os espreita - voltar ao tempo para se redimir. Suas contas são mais que negativas e seus débitos hão de ser pagos com juros.

REFERÊNCIAS

[1] ARISTÓTELES. Tópicos. Dos argumentos sofísticos. Metafísica: livro I e livro II. Ética a Nicômaco. Poética. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Os pensadores, 4).

POR CHRISTIAN BEZERRA COSTA











-Advogado graduado pelo UNIEURO- Brasília;e 
-Atuante nas áreas  de Direito Internacional Privado e Civil
 Twitter: @advchristiancos

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

De cima para baixo




Naquele dia o ministro chegou de mau humor ao seu gabinete, e imediatamente mandou chamar o diretor-geral da Secretaria.

Este, como se movido fosse por uma pilha elétrica, estava, poucos instantes depois, em presença de Sua Excelência, que o recebeu com duas pedras na mão.

— Estou furioso! — exclamou o conselheiro; — por sua causa passei por uma vergonha diante de Sua Majestade o Imperador

— Por minha causa? — perguntou o diretor—geral, abrindo muito os olhos e batendo nos peitos.

— 0 senhor mandou-me na pasta um decreto de nomeação sem o nome do funcionário nomeado!

— Que me está dizendo, Excelentíssimo?…


E o diretor-geral, que era tão passivo e humilde com os superiores, quão arrogante e autoritário com os subalternos, apanhou rapidamente no ar o decreto que o ministro lhe atirou, em risco de lhe bater na cara, e, depois de escanchar a luneta no nariz, confessou em voz sumida:

— É verdade! Passou-me! Não sei como isto foi…

— É imperdoável esta falta de cuidado! Deveriam merecer-lhe um pouco mais de atenção os atos que têm de ser submetidos à assinatura de Sua Majestade, principalmente agora que, como sabe, está doente o seu oficial-de-gabinete!

E, dando um murro sobre a mesa, o ministro prosseguiu:

— Por sua causa esteve iminente uma crise ministerial: ouvi palavras tão desagradáveis proferidas pelos augustos lábios de Sua Majestade, que dei a minha demissão!…

— 0h!…

— Sua Majestade não o aceitou…

— Naturalmente; fez Sua Majestade muito bem.

— Não a aceitou porque me considera muito, e sabe que a um ministro ocupado como eu é fácil escapar um decreto mal copiado.

— Peço mil perdões a Vossa Excelência — protestou o diretor-geral, terrivelmente impressionado pela palavra demissão. — 0 acúmulo de serviço fez com que me escapasse tão grave lacuna; mas afirmo a Vossa Excelência que de agora em diante hei de ter o maior cuidado em que se não reproduzam fatos desta natureza.

0 ministro deu-lhe as costas e encolheu os ombros, dizendo:

— Bom! Mande reformar essa porcaria!

0 diretor-geral saiu, fazendo muitas mesuras, e chegando no seu gabinete, mandou chamar o chefe da 3ª seção, que o encontrou fulo de cólera.

— Estou furioso! Por sua causa passei por uma vergonha diante do Sr. Ministro! — Por minha causa?

— 0 senhor mandou-me na pasta um decreto sem o nome do funcionário nomeado!

E atirou-lhe o papel, que caiu no chão.

0 chefe da 3ª seção apanhou-o, atônito, e, depois de se certificar do erro, balbuciou:

— Queira Vossa Senhoria desculpar-me, Sr. Diretor… são coisas que acontecem… havia tanto serviço… e todo tão urgente!…

— 0 Sr. Ministro ficou, e com razão, exasperado! Tratou-me com toda a consideração, com toda a afabilidade, mas notei que estava fora de si!

— Não era caso para tanto.

— Não era caso para tanto? Pois olhe, Sua Excelência disse-me que eu devia suspender o chefe de seção que me mandou isto na pasta!


— Eu… Vossa Senhoria…

— Não o suspendo; limito-me a fazer-lhe uma simples advertência, de acordo com o regulamento.

— Eu… Vossa Senhoria.

— Não me responda! Não faça a menor observação! Retire-se, e mande reformar essa porcaria!

***

0 chefe da 3ª seção retirou-se confundido, e foi ter à mesa do amanuense que tão mal copiara o decreto:


— Estou furioso, Sr. Godinho! Por sua causa passei por uma vergonha diante do sr. diretor-geral!

— Por minha causa?

— 0 senhor é um empregado inepto, desidioso, desmazelado, incorrigível! Este decreto não tem o nome do funcionário nomeado!

E atirou o papel, que bateu no peito do amanuense.

— Eu devia propor a sua suspensão por 15 dias ou um mês: limito-me a repreendê-lo, na forma do regulamento! 0 que eu teria ouvido, se o sr. diretor-geral me não tratasse com tanto respeito e consideração!

— 0 expediente foi tanto, que não tive tempo de reler o que escrevi…

— Ainda o confessa!

— Fiei-me em que o sr. chefe passasse os olhos…

— Cale-se!… Quem sabe se o senhor pretende ensinar-me quais sejam as minhas atribuições?!…

— Não, senhor, e peço-lhe que me perdoe esta falta…

— Cale-se, já lhe disse, e trate de reformar essa porcaria!…

***
0 amanuense obedeceu.


Acabado o serviço, tocou a campainha. Apareceu um contínuo.

— Por sua causa passei por uma vergonha diante do chefe da seção!

— Por minha causa?

— Sim, por sua causa! Se você ontem não tivesse levado tanto tempo a trazer-me o caderno de papel imperial que lhe pedi, não teria eu passado a limpo este decreto com tanta pressa que comi o nome do nomeado!

— Foi porque…

— Não se desculpe: você é um contínuo muito relaxado! Se o chefe não me considerasse tanto, eu estava suspenso, e a culpa seria sua! Retire-se!

— Mas…


— Retire-se, já lhe disse! E deve dar-se por muito feliz: eu poderia queixar-me de você!…

***
0 contínuo saiu dali, e foi vingar-se num servente preto, que cochilava num corredor da Secretaria.

— Estou furioso! Por sua causa passei pela vergonha de ser repreendido por um bigorrilhas!

— Por minha causa?

— Sim. Quando te mandei ontem buscar na portaria aquele caderno de papel imperial, por que te demoraste tanto?

— Porque…

— Cala a boca! Isto aqui é andar muito direitinho, entendes? — Porque, no dia em que eu me queixar de ti ao porteiro estás no olho da rua. Serventes não faltam!…

0 preto não redarguiu.

***
0 pobre diabo não tinha ninguém abaixo de si, em quem pudesse desforrar-se da agressão do contínuo; entretanto, quando depois do jantar, sem vontade, no frege-moscas, entrou no pardieiro em que morava, deu um tremendo pontapé no seu cão.

0 mísero animal, que vinha, alegre, dar-lhe as boas-vindas, grunhiu, grunhiu, grunhiu, e voltou a lamber-lhe humildemente os pés.

0 cão pagou pelo servente, pelo contínuo, pelo amanuense, pelo chefe da seção, pelo diretor-geral e pelo ministro!… 

Postado originariamente em http://contobrasileiro.com.br/de-cima-para-baixo-conto-de-artur-azevedo/ em 22.03.2013


Por ARTHUR AZEVEDO (07.07.1855 - 22.10.1908)





- Dramaturgo, poeta, contista e jornalista brasileiro

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

As Turbinadas





A maioria das mulheres se acham feias, acima do peso ideal, encalhadas... E por aí vai. Até que um dia são descobertas por alguém que lhes dizem: você é linda! E de repente se olha no espelho como se fosse pela primeira vez, e se diz: Não é que ele tem razão...!

Tudo na vida é uma questão de convenção. Se convenciona tudo: a moda, os costumes,até as condutas.Mas voltando ao início,quando eu falava de beleza...essa foi a mais convencionada. E,o padrão de beleza da mulher atual, hoje em dia, na visão de um bom esteta,deixa a muito à desejar...A mulher magra,esquálida,sem peito e sem bumbum é o tipo ideal para as passarelas da moda,enquanto as demais, tentam ser magras com protuberâncias apenas em dois pontos estratégicos;e como é difícil conciliar o paradigma estético ideal,apela-se para a lipo, o silicone, etc.Daí é que surgem as “turbinadas”são as adeptas da musculação, que não contentes com os resultados dos exercícios se utilizam de anabolizantes, com isso,chegam a descaracterizar completamente sua anatomia feminina,aumentam tanto a musculatura que parecem seres andrógenos. E olhem, que o termo “turbinado” era designado a motores de automóveis, aeronaves...

Muitas mulheres com ajuda de alguns artifícios, tais como: metacrilato, botox, fios de ouro, e lentes coloridas, perdem completamente a originalidade de suas feições faciais. Ao ponto de não se poder mais definir seus traços familiares. Algumas chegam mesmo a parecer com seres alienígenas desses saídos das páginas de algum livro ou filme de ficção científica. Antigamente se reconhecia uma pessoa por certas características hereditárias; falava-se assim: os olhos são do pai, o nariz é da mãe, e a boca da avó... Hoje em dia já se fala dessa maneira: O nariz é metacrilato, a boca é botox, e os olhos são bausch & lomb (lentes de contato). Quão bom seria se essas mulheres lembrassem de priorizar em primeiro lugar o cérebro em vez de preocupar-se tanto com o visual externo,mas tudo isso é decorrente dessa inversão dos valores, de nossa sociedade individualista e consumista que nos induz a fazer escolhas que nem sempre é o que realmente queremos ou precisamos;quando o ideal seria que cada pessoa seguisse seu próprio estilo, sem rótulo, e viver sua vida desapegado daquilo que é convencionado pelas massas, como: moda,música, vestuário,etc.

 Por ZINAH ALEXANDRINO



-Pedagoga e Escritora e 
-Mora em Fortaleza - Ceará