sábado, 25 de agosto de 2018

A Influência da LDB e do Regimento Municipal de São Paulo no Ensino da População Indígena



Desde o período colonial até final da década de 1980, a educação escolar indígena no Brasil, como em outros países da América Latina, esteve marcada por um viés notadamente etnocêntrico e integracionista o qual desconsiderava as diferenças étnicas, linguísticas e culturais, entre outras, dos indígenas enquanto grupos humanos ou povos específicos.

No período colonial, a educação escolar dos índios esteve a cargo de missionários católicos da Companhia de Jesus até sua expulsão em 1792 e o ensino seguiu uma orientação para a catequese religiosa e para a civilização dos índios considerados povos primitivos e selvagens.

O etnocentrismo europeu, diante do outro, buscou demonstrar superioridade cultural, religiosa e ―racial. Sob este enfoque, houve uma restrição da humanidade, da virtude e da racionalidade aos cristãos europeus (FERREIRA NETO, 1997).

Ferreira da Silva e Azevedo em sua obra “Pensando as escolas dos povos indígenas no Brasil: o movimento dos professores indígenas do Amazonas, Roraima e Acre “(1995), no período do império, a educação indígena permaneceu a cargo de missionários católicos de diversas ordens, por delegação tácita ou explícita da Coroa Portuguesa”. A política integracionista foi orientada para a mestiçagem (branqueamento da raça) e para a preparação de mão de obra indígena para substituir a mão de obra dos escravos negros.

Desta forma, a proposta de ―catequese e educação para ―civilizar os indígenas permaneceu a mesma. A criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) em 1910, no período republicano, não trouxe muitas mudanças nas orientações oficiais para a educação escolar dos índios no Brasil, pois foi dada ―maior ênfase no trabalho agrícola e doméstico, com vista à integração. Com a saída dos jesuítas, outras missões católicas assumiram a educação dos índios. 

Os estudos revelaram a complexidade extraordinária dos povos considerados ―selvagens e seus elaborados processos de abstração, ―nem sempre abarcáveis pela razão ocidental‖ (FERREIRA NETO, 1997, p. 321).

Sob o enfoque integracionista, voltado à homogeneização cultural, o objetivo era transformar os indígenas em trabalhadores nacionais através da imposição da cultura dominante/ocidental visando sua total integração à sociedade ―civilizada. Este período também foi marcado pela inclusão das missões evangélicas protestantes no processo de educação nas áreas indígenas (e fora delas também).

O Estatuto do Índio (Lei 6.001 de 1973), o ensino das línguas nativas nas escolas tornou-se obrigatório e a alfabetização indígena deveria ser feita ―na língua do grupo (Artigo 49). Para a execução do ensino bilíngue, a FUNAI recorreu ao Summer Institute of Linguistcs (SIL) - em português, Instituto Linguístico de Verão. 

De acordo com Brito (1995: 109), ―partindo do pressuposto básico de que o Brasil é um país pluriétnico e plurilíngue o movimento indigenista destacava os direitos dos povos indígenas ―consignados em tratados e acordos internacionais assinados pelo governo brasileiro.

Este período na história da educação escolar indígena no Brasil foi caracterizado pela mobilização e participação de organizações não governamentais ―pró-índio na articulação de ―encontros nacionais de educação para índios e na criação de projetos. 

Desta forma, foi se constituindo, no cruzamento do campo indigenista com o campo acadêmico, um discurso de diferenciação educacional de enfoque basicamente comunitário (voltado aos interesses de cada etnia e/ou 3 povo indígena), centrado na ideia da especificidade (histórica, cultural, linguística) dos grupos ou povos envolvidos. 

Tal diferenciação deveria abarcar tanto a construção de escolas específicas em áreas indígenas com inclusão de professores índios no processo escolar quanto à construção de currículos e materiais didáticos específicos. 

Tal mobilização culminou com as prerrogativas legais da Constituição Federal de 1988 que, especificamente, no Artigo 231 reconheceu ―aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. E, no Artigo 210, § 2º, assegurou às comunidades indígenas ―a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem no ensino fundamental. 

Estas prerrogativas inauguraram uma nova orientação no trato com as questões indígenas no país, especialmente no que diz respeito aos processos de escolarização. Passando a escolarização diferenciada a se configurar como um direito dos índios no país. 

A partir da Constituição Federal de 1988, outros documentos oficiais foram criados no sentido de instituição e normatização de uma educação escolar diferenciada para os indígenas.

Os principais documentos são: Diretrizes para a política nacional de Educação Escolar Indígena/1993b; Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº. 9.394/1996 (Artigos 32; 78 e 79); Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas/19987; Parecer nº. 14/1999; Resolução Nº. 03/1999; Plano Nacional de Educação. Lei Nº 10.172/2001 (capítulo 9. Educação Indígena). 

No plano prático, foi criada a categoria diferenciada de escola indígena no sistema de ensino brasileiro, a modalidade de educação escolar indígena na educação básica, a categoria de professor indígena e a instituição de cursos específicos de formação de professores índios em diversas universidades e instituições formadoras, entre outras ações.

Dessa forma, as mobilizações no campo indigenista brasileiro contribuíram para as garantias legais em torno de processos de escolarização diferenciados para os indígenas, entretanto, mostraremos mais à frente que este processo fez parte de um movimento maior, circundado por ações, 4 agentes e por documentos de agências internacionais. Neste sentido, apresentamos a emergência do direito à educação diferenciada para indígenas no contexto mundial a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 aos anos mais recentes (2007). 

Embora haja consenso entre estudiosos de que as garantias legais em favor de uma escolarização diferenciada para indígenas no Brasil tenham a sua origem relacionada às reivindicações do movimento indígena e indigenista interno, a proposição de escolas diferenciadas se insere no contexto educacional mais amplo e ―global orientado pela tônica da ―educação para todos. 

Para além das fronteiras do indigenismo, a construção da escola diferenciada para indígenas surgiu no bojo de um processo mais amplo de mudanças no mundo, que trouxe novas demandas para a educação, as quais possibilitaram a construção de um discurso de inclusão aliado ao discurso da ―escola para todos, especialmente no que diz respeito ao atendimento de grupos considerados diferenciados. 

As Leis de Diretrizes e Bases da Educação e o Regimento Municipal de e a forma como ela discute a questão do ensino básico nas aldeias indígenas e quais são os direitos da população indígena em relação à educação.

Aqui quero me restringir ao segundo termo e discutir novas possibilidades que têm surgido no panorama da educação voltada aos povos indígenas no Brasil nos últimos anos, onde se pode registrar avanços e consensos na estruturação de uma política pública, de âmbito nacional, voltada a atender às necessidades educacionais desses povos. Esses avanços podem ser verificados tanto no plano legal quanto no plano administrativo.

Investigar o fenômeno da educação infantil no período colonial, portanto, significa desvelar aspectos importantes da própria formação socioeconômica brasileira. Esta afirmação ganha a sua verdadeira dimensão quando nos deparamos com o papel econômico, cultural e político que a Companhia de Jesus desempenhou no processo de consolidação do sistema colonial português, pois, em 500 anos de nossa história, os jesuítas detiveram o monopólio educacional por 210 anos (1549-1759).

Além disso, importa acrescentar que este trabalho é resultante de uma pesquisa que estamos realizando com objetivo de suprir lacunas ainda existentes nos estudos sobre a história da educação brasileira no período colonial.

Nos anos 90 se instaurou uma nova concepção de educação escolar indígena no país, decorrente da nova postura do estado frente aos povos habitantes deste território. Movimentou-se no sentido de deixar de ser uma educação para o índio, funcionando como um estado para se voltar à possibilidade de ser a expressão dos interesses de cada povo: cada povo tem direito à formulação própria do seu currículo escolar, o que pode fazer da escola expressão dos projetos de futuro destas sociedades, em sua especificidade, dentro da sociedade brasileira.

Desta forma a escola se transforma ou pode (logicamente) se transformar em instrumento dos povos indígenas na formulação de suas estratégias de sobrevivência e de luta política (por seus direitos como povos minoritários e historicamente espoliados). 

Emerge daí a possibilidade de uma política linguística formulada por cada povo indígena (ou fração deste povo, já que povos indígenas não agem necessariamente como uma unidade) em vista do seu projeto de futuro: manter sua língua indígena transformá-la ou não em uma língua escrita, desenvolver novos campos de uso (no campo lexical ou terminológico, por exemplo), ensinar o português na perspectiva de desenvolver um bilinguismo aditivo, ensinar uma língua estrangeira, etc.

As decisões tomadas neste momento, e a competência em formular e executar as políticas linguísticas e educacionais decorrentes destas decisões pode significar a diferença entre o desaparecimento e a manutenção das línguas indígenas no futuro.

Os estados federados, responsáveis legais pela educação escolar indígena, devem então reconhecer as propostas curriculares formuladas e apoiar sua implantação com recursos do orçamento. Esta política educacional, com sua contraparte em uma política linguística e em uma política cultural, está sendo gerada em várias experiências de escolas indígenas diferenciadas, 6 bilíngues, interculturais, com professores indígenas, hoje em processo de expansão entre vários povos em diversas regiões do país. 

São agora, segundo o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas (1998), documento do Ministério da Educação do Brasil, 1.591 escolas indígenas com 76.293 alunos. 94% destes alunos estão em uma das quatro séries iniciais de escolaridade (primeira parte do ensino fundamental), e daí se podem deduzir o enorme potencial de expansão do sistema nos próximos anos.

Conforme o artigo 20 da LDB na redação da lei 12.020/2009, que define instituições de ensino comunitárias : 

"Art. 20-Constituirão elementos básicos para a organização, a estrutura e funcionamento da escola indígena: 
I - sua localização em terras habitadas por comunidades indígenas, ainda que se entenda por territórios de diversos Estados ou Municípios contíguos; II - exclusividade de atendimento a comunidades indígenas; III – o ensino ministrado nas línguas indígenas;IV – a organização escolar própria;
 Parágrafo Único. A escola indígena será criada em atendimento à reivindicação ou por iniciativa de comunidade interessada, ou com a ausência da mesma, respeitadas suas formas de representação."

Mais explícita ainda foi a Resolução número 011 do Conselho Estadual de Educação do Amazonas, aprovada em 07 de fevereiro de 2001. 

Conforme o artigo 18 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira diz o seguinte: "..em caráter especial, o Sistema Estadual de Educação ou Sistema Municipal de Educação, quando solicitado, assegurarão Educação Básica à população indígena desafiada, garantindo os mesmos direito constitucional vigente às localizadas em terras indígenas."

A atenção diz respeito à transferência de responsabilidade e de coordenação das iniciativas educacionais em terras indígenas do órgão indigenista (Fundação Nacional do Índio – FUNAI) para o Ministério da Educação (MEC), em articulação com as Secretarias Estaduais de Educação, por meio do Decreto nº 26/91, da Presidência da República. 

Desta forma, é possível conectar vários aspectos positivos dessa transferência de responsabilidades que ensejou o envolvimento de outras esferas do poder público, sejam agentes governamentais, sejam órgãos de governo, abrindo novos canais de interlocução para os índios. E também há a possibilidade de demonstrar as inúmeras resistências dessas mesmas esferas de poder em absorver as escolas indígenas, respeitando o direito dos índios R. bras. Est. pedag. Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 277 a uma educação diferenciada, que requer novos aportes teóricos, metodológicos e administrativos.

Desta forma é importante ressaltar que outras iniciativas importantes vieram somar-se a este novo contexto. Consolidou-se uma coordenação geral de educação escolar indígena no âmbito do Ministério da Educação, ao mesmo tempo em que se incentivou a criação de instâncias gestoras nas Secretarias de Educação Estaduais para cuidar das escolas e da formação dos professores indígenas. 

Em um campo que se caracteriza por uma plêiade de concepções e práticas diferentes, o documento conhecido pela sigla RCNEI conseguiu reunir e sistematizar um mínimo de consenso, capaz de subsidiar diversas interpretações e propostas de construções pedagógicas e curriculares autônomas.

O desafio do momento está posto na necessidade de se consolidar uma política pública eficiente de atendimento das necessidades educacionais dos povos indígenas, envolvendo o MEC, Secretarias Estaduais de Educação, organizações da sociedade civil de apoio aos índios e organizações indígenas. Isto se faz necessário uma vez que se percebe um quadro ainda desigual, fragmentado e pouco estruturado de oferta e atendimento educacional aos índios.

E este é um dos principais "nós" a ser enfrentado, uma vez que a execução da política de educação indígena ficou sob a responsabilidade dessas Secretarias. Poucas são as que estruturaram um corpo técnico  administrativo para formular e implementar uma política estadual de educação indígena e que mantêm cursos regulares de formação e titulação de professores indígenas.

Em sua maioria, as Secretarias Estaduais não contam com orçamento próprio para ações nessa área, limitando-se a realizar pequenos cursos, encontros e oficinas com recursos obtidos junto ao FNDE. 

Desde que o MEC recebeu a incumbência pela coordenação das ações educacionais em áreas indígenas, cabendo às Secretarias de Educação sua execução assistimos um processo de indefinição administrativa, onde poucas Secretarias assumiram seu papel executor.




POR VERINE STOCHI VEIGA





















-Formada em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo -PUC-SP(2012);
Mestra em História da Ciência pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo -PUC-SP(2016);
-Conhecimento em pacote Office, digitação de textos, digitalização de imagens e pesquisa na internet. 
-Idiomas: conhecimento de Inglês e espanhol em nível intermediário.

Nota do Editor:

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sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Conjuntura Eleitoral

A existência do sistema dominante tem na ideologia a base de sua força, pois possibilita a concentração de poderes políticos e econômicos nas mãos dos que controlam o Estado, isso inclui o ativismo judicial, a partir do STF. Prova disso é o recente aumento de vencimentos que seus ministros se presentearam, humilhando os mais de 12 milhões de desempregados e os quase 50 milhões de dependentes do programa Bolsa Família. 

Todo esse aparato que protege a casta elitista só existe porque há um viés esquerdista explícito que o sustenta: a defesa de um estado grande, onipresente, intervencionista, autorregulador, que em tudo intervém, privilegiando os que comungam das mesmas ideias. Por outro lado, atuam abertamente na censura feroz aos conservadores e liberais, onde estiverem. 

Há de um lado, um governo grande que se locupleta com um farto orçamento público, do outro lado, grupos poderosos e bem organizados, que se beneficiam dele, e que têm o interesse em sua manutenção, pois a riqueza, gerada a partir do setor produtivo, é confiscada por meio dos pagadores de impostos. Isso explica a elevação avassaladora da carga tributária nos últimos 20 anos. 

Somente a elite encastelada no poder tem acesso ao grande confisco de patrimônio promovido pelo Estado. O volume trilionário de tributos arrecadados estimula a cobiça dos que saqueiam o erário, que passam a criar variadas formas de necessidades e situações que resultam na firmatura de contratos de fornecimento de bens e serviços, visando manter o fluxo de caixa de seus negócios com o principal e maior cliente. 

Não obstante o financiamento público de campanha ter destinado uma soma bilionária para que os atuais congressistas e chefes do Executivo se reelejam na disputa que se inicia em outubro próximo, há uma grande chance de mudança de curso nesse cenário desolador. Oremos a Deus, para que ilumine os brasileiros nesse momento crucial da nossa história.

POR UBIRATAN MACHADO DE OLIVEIRA











- Advogado, engenheiro civil e professor de inglês

Nota do Editor:
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quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Breves Anotações sobre a Doutrina Espírita



Uma das coisas que sempre me intrigou diz respeito à nossa finalidade na Terra. E nunca poupei questionamentos a esse respeito. Nascido, criado e educado na fé católica apostólica romana, estudei em colégio mantido e dirigido por padres jesuítas, na cidade de São Paulo. Tive, inclusive, ainda no curso primário, como catequista, um padre dessa mesma ordem religiosa, boníssimo, mas que ao meu perguntar sobre alguns mistérios daquela fé, me respondia: "Meu filho, esses são dogmas da fé católica e deveis acreditar neles sem nenhum questionamento."

Para uma criança de sete/oito anos, isso nada esclareceu. Muito mais tarde, ao estudar as mais diversas religiões, vim a saber o que é um dogma, definido como um ponto indiscutível sobre qualquer fé religiosa. Ou seja, deveríamos ter sobre o tema a fé cega, indiscutível. E sempre a fé não esclarecida. É como dizer que a religião é um conjunto de regras dogmáticas, enquanto a espiritualidade te convida a raciocinar, a questionar sobre aquilo que não te convence. Enquanto as religiões falam de pecado e culpa, a espiritualidade, em especial a doutrina espírita, diz-nos para aprender com os erros.

Pois bem, correu o tempo, anos se passaram e a questão sempre a me preocupar. Como já mencionei, iniciei o estudo das religiões (quase todas ainda que de forma perfunctória) e me deparei com a Doutrina Espírita com a sua visão reencarnacionista ocidental, a me mostrar algumas das respostas que sempre estive a procura. E me aprofundei nos estudos sobre essa doutrina, na leitura de livros de inúmeros autores, sempre esclarecedores com suas redações rebuscadas, mas incisivas, o que me proporcionou a solução de questões até então insolúveis, as quais sempre olhei sob a ótica dos dogmas da fé católica.

É bom que se diga, nada tenho contra nenhuma religião, seja ela tradicional ou esotérica, respeitando-as e a quem com elas comunga. Me considero um universalista e espiritualista, aberto a todas as interpretações, sem nenhum sectarismo, preconceito ou proselitismo, mas, naturalmente, tenho as minhas convicções, decorrentes da minha vivência, razão mor pela qual reverencio quem pense diversamente de mim.

Convidado por este blog a externar comentários sobre a doutrina que abracei, me vi compelido a trazer ao conhecimento daqueles que tenham a mente aberta, alguns conhecimentos sobre a doutrina espírita, seus fundamentos, técnicas espirituais e outros que tais. Claro que sem a pretensão de esgotar a matéria, muito longe disso. Até porque, neste opúsculo, não cabem longas dissertações sobre o assunto.


Sem medo de equívoco, podemos dizer que a Doutrina Espírita repousa sobre um tripé:



Ela é Filosofia, quando, inserida no contexto filosófico tradicional, embora de cunho evolucionista e metafísico, pontua a necessidade de o homem ir em busca de seu autoburilamento, estimulando-o à averiguação de respostas às questões magnas da Humanidade: sua natureza, sua origem e destinação, seu papel perante a Vida e o Universo. Diz Kardec, "nascer, viver, morrer e renascer de novo, progredindo sempre, tal é a lei."

Ela é Ciência, porque se trata de um conjunto organizado de conhecimentos relativos a certas categorias de fatos ou fenômenos analisados empiricamente, catalogados e relatados por seus pesquisadores, representado pelo O Livro dos Médiuns. Diz Kardec, "a fé sólida é aquela que pode encarar a razão, face a face."

Ela é Religião, porque tem o dom de unir os povos em um ideal de fraternidade, preconizado por Jesus de Nazaré, permitindo, dessa forma, que o homem se encontre com o próprio Criador. Diz Kardec, “fora da caridade não há salvação.”

Talvez para muitos, o que quer que eu diga em nada mudará suas convicções, principalmente porque não é essa a intenção. Mesmo porque só o tempo e a vivência são os fatores que podem nos levam às mudanças. Este breve ensaio não deseja fazer prosélitos, adeptos ou arautos para a doutrina espírita. O que me anima e impulsiona é exatamente evitar que se continue a pronunciar aquele jargão: “Não conheço e não gosto”. Os leitores podem até não gostar, mas isso não se dará por uma absoluta ignorância.

Prosseguindo, duas são as formas existentes para abraçarmos essa doutrina: pelo amor ou pela dor. A grande maioria, na qual inclusive me incluo, nela adentra pela dor. Mas que Pai impiedoso é esse que obriga seus filhos ao sofrimento?
A Codificação de Allan Kardec, através das inúmeras obras por ele produzidas (o “Evangelho Segundo o Espiritismo”  e outras obras como o “Livro dos Espíritos”, o “Livro dos Médiuns” e tantas mais), nos traz a compreensão de nossa destinação na Terra, mostrando-nos uma imperiosa necessidade de reforma de conduta, nos fazendo repensar a máxima que notabilizou um famoso jogador de futebol que, fazendo propaganda de uma marca de cigarros, dizia o bordão “eu gosto de levar vantagem em tudo”. Pois bem, essa reforma íntima que a doutrina espírita espera de nós, seus adeptos, é notável e levará, se encampada por todas as religiões, a uma paz interior agradabilíssima, tirando de nossas costas um peso imenso que carregamos aleatoriamente.

Para saber a razão de tanto sofrimento dos espíritos encarnados aqui na Terra, temos de levar em conta qual a destinação que lhe é dada na escala evolutiva dos mundos. Ela está situada apenas no segundo degrau evolutivo, tendo abaixo dela apenas os mundos primitivos. A Terra está classificada como um mundo de Provas e Expiações, ou seja, a felicidade (felicidade é muito mais do que alegria) não é deste mundo. Nós, os seus habitantes encarnados, estamos em sintonia vibracional com esse mesmo estágio evolutivo. Eis aí a razão de tantas dores, culpas e sentimentos negativos que nos cercam, uma vez que viemos, sponte própria, resgatar os nossos erros pretéritos acumulados ao longo de nossas múltiplas encarnações, considerando a eternidade do espírito que nos anima sempre. Vivemos milhares de reencarnações e já passamos em mundos semelhantes à Terra, e anteriormente a isso, nos denominados primitivos. Muitas vezes, nossa reencarnação, em razão de nosso livre-arbítrio, não avança, mas também não regride. Parte-se do princípio de que tudo evolui, sempre.

Se fizermos aos outros aquilo que gostaríamos que nos fosse feito, não teremos justificativa alguma para eventual erro de conduta ou procedimento. Isso é o Evangelho de Jesus, na sua autêntica prática e vivência diária. Algumas passagens desse relicário de ensinamentos, nos mostra, de forma bem perceptível, as assertivas acima expostas. “A CASA DE MEU PAI TEM MUITAS MORADAS” significa dizer que existem muitos mundos na imensidão infindável do Universo, iguais à Terra, também piores e melhores. “A FELICIDADE NÃO É DESTE MUNDO” significa que podemos ter alegrias na Terra, mas não dispomos de felicidade como concebida em mundos mais elevados.

Segundo o meu pensar, a Terra está em fase de transição e passará de um mundo de provas e expiações para um mundo de regeneração. O tempo, ah, o tempo! Ele não se mede como nas mentes humanas terrenas. A ideia de Céu e Inferno revela-se, na doutrina espírita, como um estado de alma (espírito). Aquele que segue os preceitos de amor ao próximo, enaltece a fraternidade e age como um bom ser humano, seja ele fiel a religião que for, não sofre com as aguilhoadas da consciência, o verdadeiro inferno que vive em nós. E como se identifica o bom ser humano? Perceba naquele que vivencia a Lei do Amor, que substituiu, com a vinda de Jesus, a lei Mosaica, onde sempre predominou a máxima “olho por olho, dente por dente”. Portanto, encontramos espíritos encarnados com o rótulo de cristãos entre os que comungam de outros credos, desde que norteados pela lei de amor ao próximo.

E, se somos estimulados a viver a Lei do Amor, temos necessariamente que albergar em nossos corações o PERDÃO. Como disse Jesus ao ser questionado por Pedro, o apóstolo, se ele deveria perdoar seu irmão sete vezes. Disse Jesus, em resposta: “Não, Pedro, não deveis perdoar seu irmão sete vezes, mas sim setenta vezes sete vezes”.  Sublime resposta que nos deve servir sempre de lição.

Mas perguntarão alguns: como executar isso? Nosso alcance espiritual ainda está muito longe de seguir à risca as recomendações de Jesus. Mas é exatamente isso que pretendemos dizer com a reforma íntima: abdicarmos, o quanto possível, dos sentimentos como o orgulho, o egoísmo, a avareza, a maledicência, a cupidez, a intolerância, respeitarmos aos que pensam diversamente de nós, dos que odeiam; abraçarmos, o quanto possível a tolerância, a indulgência, a benevolência, a humildade, a paciência e o perdão, dentre tantos outros predicados que nos foi por Ele exemplificados.

A mim parece evidente que a grande maioria de nós ainda está no estágio inicial dessa procura, outros nem mesmo a veem. Ainda predomina, entre os terrícolas, o pendor à maldade. Nos chegam diariamente informação sobre atos de corrupção, assassinatos e massacres selvagens, enfrentamentos, ódios fraticidas e tantas outras mazelas tão próprias dos seres humanos ainda no início de suas caminhadas. Passados mais de dois mil anos de sua vinda, o império do Amor preconizado por Jesus está anos-luz distantes de nossas aspirações, imantados por pensamentos escusáveis residentes em nossas mentes poluídas pelas sensações carnais, pelo prazer mórbido, pelos sentimentos menores. Sim, verdadeiramente, convivemos com espíritos encarnados de variados níveis de evolução.

E é de nossa ação, sem nos arvorarmos como alguém superior, olhar para esses espíritos com misericórdia, porque ainda envoltos nas sombras da ignorância espiritual. E a doutrina espírita vem como um farol luminoso no mar encapelado da vida humana, trazendo esses espíritos para um porto seguro, no constante rodar da evolução.

Em suma e na minha opinião, a doutrina espírita veio como a Revelação prometida por Jesus para a melhoria e evolução da Terra e de seus habitantes.

POR SERGIO LUIZ PEREIRA LEITE
















-Advogado militante;
-Eterno aprendiz da Doutrina Espírita e
-Trabalhador na seara da Apometria.

Nota do Editor:

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quarta-feira, 22 de agosto de 2018

A Empresa como Consumidora e os Danos Morais



Uma empresa pode figurar como consumidora em uma relação jurídica? Segundo o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor a resposta é positiva:

"Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final."

O referido código possui a finalidade de proteger o ente onde exista relação de desigualdade, independente de se tratar de uma pessoa física ou jurídica. Para tanto, Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva ao escrever sobre a condição de consumidor tece as seguintes considerações:
"Consumidor é quem adquire no mercado de consumo o produto ou serviço; aquele em razão de quem é interrompida a cadeia de produção e circulação de certos bens e serviços, para usufruir ele mesmo, ou terceiro a quem os ceda, das respectivas funções – ainda que esses bens e serviços possam ser empregados, indiretamente, no exercício de sua empresa ou profissão, isto é, ainda que venham a ser interligados, acessoriamente, à sua atividade produtiva ou profissional, coletiva ou individual, voltada ou não para o lucro (destinatário final fático) (SILVA, 2008, p. 8)." 
Exemplificando: uma clínica médica possui a necessidade de fornecimento de energia adequado e contínuo para prover aos seus pacientes tratamentos com máquinas especializadas, sendo certo que qualquer equipamento fora de utilização por falha na prestação do serviço de distribuição implica em prejuízo para a atividade exercida pela clínica.

Na doutrina sobre o Direito Consumerista existem duas correntes para delimitação da figura do consumidor: a finalista e a maximalista. Para não tornar o artigo longo procuro resumir ambas. A primeira destaca que o destinatário final é todo aquele que utiliza o bem ou o serviço como consumidor final fático e econômico, ou seja, utiliza para o seu uso pessoal e que não haverá utilização para qualquer finalidade produtiva, encerrando assim o ciclo econômico. A segunda teoria destoa da primeira no momento em que determina que o destinatário final é todo aquele consumidor que adquire o produto ou serviço para o seu próprio uso, sem importar a questão econômica, isto é, interpreta-se o artigo 2º do CDC de forma abrangente, enquanto que na primeira corrente o referido dispositivo legal é interpretado de forma mais restrita.

É interessante destacar que o Superior Tribunal de Justiça vem utilizando em suas decisões uma terceira teoria: a finalista mitigada ou finalista aprofundada. Trata-se de um entendimento intermediário e que busca observar o porte econômico do consumidor e não apenas a destinação dada ao produto ou serviço adquirido.

Voltando ao exemplo dado alguns parágrafos acima, é evidente que na relação da clínica com a fornecedora de energia existe vulnerabilidade de uma empresa em face da outra, principalmente no quesito técnico e por vezes no econômico. Para isso o art. 4º do CDC traz em seu texto que a Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores e a proteção dos interesses econômicos, determinando em seu inciso I que um dos princípios que devem ser atendidos é o do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor.

Ora, se a pessoa jurídica pode ser reconhecida como consumidora ela também possui o benefício de ter sua vulnerabilidade pronunciada em face de outras empresas que possuem competências técnicas e econômicas superiores as suas em determinadas áreas. 

Posto isto, passamos agora a discussão no tocante aos danos morais, que de imediato se delimita: depende diretamente da ofensa à honra objetiva das empresas. Em linhas curtas: honra objetiva vincula-se ao prestígio de uma empresa no cenário local e o dano moral deve ser analisado em caso de atos que geram prejuízos aos seus interesses, como a imagem e boa fama da pessoa jurídica. 

Em tempos nos quais o uso indiscriminado dos meios de comunicação gera efeitos em larga escala, a opinião travestida de ofensa muitas vezes pode ser o marco inicial da análise de uma conduta insultuosa ao prestígio de uma marca, independente da sua solidez no mercado.

Para tanto, a pessoa jurídica possui ao seu alcance o artigo 52 do Código Civil de 2002 e a Súmula nº 227 do Superior Tribunal de Justiça, vejamos:

Código Civil de 2002 
Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade. 
 Súmula nº 227 do STJ 
A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.
Voltando ao exemplo da clínica, realizemos um exercício de ficção no tocante à hipótese da fornecedora de energia elétrica falhar na prestação do seu serviço, acarretando na queima de equipamentos por variação de tensão, o que consequentemente gera um acréscimo no tempo de espera para atendimento e com o passar do tempo a perda da confiança no estabelecimento, bem como o aparecimento de comentários da clientela acerca dos recentes ocorridos. 

A imagem e a boa fama da pessoa jurídica certamente estarão maculadas nessa hipótese e significará prejuízos financeiros, podendo vir a causar endividamento, desemprego e até mesmo o encerramento das atividades da clínica.

Em outras palavras, com uma falha de outro ente o conceito público de uma empresa pode aos poucos ser deteriorado por serviços prestados de forma ineficiente por motivos alheios à sua gestão, gerando prejuízos e abalo à reputação da pessoa jurídica, o que acarreta descrédito frente aos membros de determinada comunidade. 

Posto isto, entendo que o preenchimento concomitante dos requisitos autorizadores para reparação (ato ilícito x danos x nexo de causalidade x dolo ou culpa x ofensa ao bem jurídico) em conjunto com a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em favor das pessoas jurídicas, ao teor das teorias maximalista e finalista mitigada/finalista aprofundada, confere uma maior segurança jurídica a esses empreendimentos na busca por indenizações de cunho extrapatrimonial, principalmente quando os argumentos são reforçados pelo Código Civil e pela Súmula nº 227 do Superior Tribunal de Justiça.

POR EDUARDO BAUER














-Advogado graduado pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP (2015);
-Sócio fundador do escritório Bauer & Maia Advocacia; e 
-Atuação na região Nordeste. Direito Civil e do Consumidor; Direito Médico; Direito Empresarial. 
Redes sociais: 


Nota do Editor:

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terça-feira, 21 de agosto de 2018

Nos Conformes


Foi publicada em Abril/2018, a Lei Complementar nº 1320/2018, que instituiu o Programa de Estimulo à Conformidade Tributária, denominado "Nos Conformes". 

Esta Lei Complementar, disciplina condições para construção continua e crescente de um ambiente de confiança reciproca entre os contribuintes e a Administração Tributária, por meio de implementação de medidas concretas inspiradas nos Princípios: a) Simplificação do Sistema Tributário Nacional; Boa-Fé e Previsibilidade de Condutas; Segurança Jurídica pela Objetividade e coerência na aplicação da legislação tributária; Publicidade e Transparência na divulgação de dados e informações; Concorrência Leal entre os agentes econômicos. 

As diretrizes deste programa são: 

a) Facilitar e incentivar a autorregularização e a conformidade fiscal; 

b) Reduzir os custos de conformidade para os contribuintes; 

c) Aperfeiçoar a comunicação entre os contribuintes e a Administração Tributária; 

d) Simplificar a legislação tributária e melhorar a qualidade da tributação; e

e) Aperfeiçoar continuamente a Administração Tributária para atender os princípios tributários da LC nº 1320/2018. 

A implementação do Programa "Nos Conformes" está trazendo para os contribuintes um novo cenário, como por exemplo, de receber avisos por fiscais de que o valor devido será inscrito na dívida ativa. 

Em muitos casos, os contribuintes não tem como saldar o que deve, pois para não fechar a empresa estão utilizando este dinheiro destinado ao Fisco para saldar dividas juntos a fornecedores, pagamento de empregados, dentre outros. 

Diante deste cenário e em conformidade com as normas publicadas do programa os contribuintes do ICMS serão enquadrados em categorias: "A+", "A", "B", "C", "D", "E" e "NC" (Não Classificado), sendo esta classificação competência privativa e indelegável dos Agentes Fiscais de Rendas, com base nos seguintes critérios: 

a) obrigações pecuniárias tributárias vencidas e não pagas relativas ao ICMS; 

b) aderência entre escrituração ou declaração e os documentos fiscais emitidos ou recebidos pelo contribuinte; e

c) perfil dos fornecedores do contribuinte, conforme enquadramento nas mesmas categorias e pelos mesmos critérios de classificação previstos nesta lei complementar. 

São regras objetivas para um cenário financeiro de um estado e país que se encontra em crise e claro os contribuintes não querem ser enquadrados em categorias que possam o prejudicar. 

Todavia, a realidade para muitas empresas é de se manter funcionando e manter os empregos, para assim contribuir com a crise que assola o Brasil. 

É um programa importante, mas esbarra infelizmente na crise que assola o país e para isso não há solução instantânea, somente medidas que possam incentivar o aumento de empregos e vendas e compras e assim acabar com todo este desiquilíbrio financeiro e arrecadatório. 

POR EDNA DIAS













-Advogada na Duarte e Tonetti Advogados;
-Especialista em Direito Tributário pelo IPEC - Instituto Paulista de Educação Continuada;
-Extensão em Direito Tributário pelo IPEC;
-Planejamento Tributário pelo IBET;
-Cursando Ciências Contábeis pela Universidade Anhanguera;
-Palestrante; e
-Co-autora do Livro Coaching para Advogados.


Nota do Editor:

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