Autora: Renata Pereira(*)
Desde 2014, por iniciativa do Conselho Federal de Medicina e da Associação Brasileira de Psiquiatria ocorre o Setembro Amarelo, uma campanha com o objetivo de prevenir o suicídio. O Blog do Werneck, por entender a relevância do tema, se une a essa campanha, e durante esse mês, na sessão Psicologia, serão postados alguns artigos sobre o tema. O primeiro deles foi publicado no dia primeiro de setembro e o segundo é o que se segue:
Se receber a notícia da morte de alguém é sempre triste, independente da proximidade que tenhamos com a pessoa, imagine receber a notícia de que alguém morreu porque tirou a própria vida. Se o assunto morte é um tabu, imaginem o que não é o suicídio. Não tem como não pensar sobre qual é o sentido da vida, por que estamos aqui, o que leva uma pessoa a agir assim ou será que eu mesmo não teria coragem também. O que nos difere das pessoas que se matam, eles são tão humanos quanto nós. Essas questões nos angustiam, então, preferimos viver sem pensar nelas, como se o problema não existisse.
Até acontecer com alguém que está perto de nós e então, os questionamentos são piores e mais angustiantes ainda: como eu não percebi, o que eu poderia ter feito para evitar... se você quer diminuir sua chance de passar por isso, o primeiro passo é aceitar que essa é uma triste realidade, que já se tornou problema de saúde pública no mundo todo. Os casos de suicídio aumentaram em 2,3 por cento em um ano, no Brasil ocorre um caso a cada 46 minutos e o suicídio é responsável por 800 mil mortes por ano no mundo todo (1).
E mais triste ainda é pensar que muitas dessas mortes poderiam ser evitadas, pois mais da metade das pessoas que tiram suas vidas tinham transtornos mentais, como depressão, por exemplo, para os quais existem tratamentos muito eficazes (2). Identificar as pessoas que estão em risco, qual o tamanho desse risco e o que fazer para ajudar é uma arte que envolve informação confiável, sensibilidade e disposição para olhar para o outro. Esse texto vai entrar com a informação, o resto, fica por sua conta.
Adolescentes, adultos jovens e idosos do sexo masculino (homens tiram mais suas vidas do que as mulheres, embora elas tentem mais vezes) que pertencem a grupos minoritários, são de classe média ou alta, são solteiros/viúvos, moram sozinhos, têm poucos amigos, não têm religião e estão passando por doenças graves, estresse intenso ou por perdas, seja de emprego, de relacionamento ou de um ente querido, correm mais risco (3). Mudanças no humor habitual (ficar mais triste ou mais alegre), na rotina, nos interesses, falta de planos ou perspectivas futuras, isolamento social, interesse por assuntos relacionados a morte e a suicídio são alguns indicadores importantes (4). Quanto maior for a soma desses aspectos em uma pessoa, maior será seu risco de ela tirar a Vida. E se esses fatores se somarem a uso de drogas ou álcool, impulsividade, histórico de suicídio na família, busca de novidades de modo perigoso e episódios de auto agressão, com ou sem intenção letal, o riso é alto. Mas se a pessoa tiver um plano de suicídio, mesmo que desestruturado, o risco é altíssimo e providências precisam ser tomadas urgente (5).
Por exemplo, se uma pessoa busca pouco por novidades ou faz isso com risco, fala pouco ou nada sobre o futuro, disfarça o sofrimento, procura pessoas quando estressado e está passando por problemas, ela possui risco de suicídio médio e a recomendação é buscar tratamento psicológico e psiquiátrico. Em um caso onde a pessoa passa a ter a tendência de se isolar, a falar do futuro sem esperança, mostra sofrimento eventualmente, procura pessoas de confiança, mas também pessoas problemáticas e pertence a grupos minoritários, o risco de suicídio é considerável e deve-se procurar tratamento intensivo com psicólogo e psiquiatra, evitar deixar a pessoa sozinha e monitorar o risco diariamente. O risco de a pessoa tirar a própria vida é alto quando ela fala sobre morte eventualmente, seu sofrimento é visível, não procura pais ou responsáveis e está de luto ou tem depressão não tratada, e então, deve-se procurar um psiquiatra urgente, vigiar a pessoa em casa 24 horas e verificar o risco diariamente. Mas se a pessoa tem um episódio de auto agressão, evita falar, sofre visivelmente, tem um plano suicidas estruturado, não procura ajuda, usa drogas e tem depressão grave o risco é extremo, é preciso procurar um psiquiatra urgente, fazer vigilância domiciliar 24 horas e, em alguns casos, discute-se até a possibilidade de internação hospitalar (6).
Não subestime esses comportamentos. Eles foram encontrados na grande maioria das autópsias psicológicas de pessoas que tiraram suas vidas. É muito raro uma pessoa cometer suicídio sem apresentar nenhum desses sinais ou sintomas. A pessoa não quer chamar atenção com eles, ela está comunicando um sofrimento intenso, pedindo socorro, literalmente. Também não é verdade que “quem quer se matar, se mata, não fica só falando”, pois uma pessoa que está bem, não fala nisso (6).
Mais do que falar sobre isso, precisamos nos importar com isso, pois só agimos em relação ao que é importante para nós. Então, se você conhece alguém que apresente essas características, se importe: fale com ela a respeito, mas faça mais, acompanhe-a a uma consulta com um profissional de saúde mental, por exemplo, ajude-a a sentir de fato que não está só e que existe saída e esperança para seu sofrimento.
REFERÊNCIAS:
1 - Bertolote, J. M., & Fleischmann, A. A global perspective in the epidemiology of suicide.Suicidologi. (2002), 7(2), 6-8;
2 - Organização Mundial da Saúde [OMS]. Departamento de Saúde Mental. Transtornos Mentais e Comportamentais. Prevenção do suicídio: manual para professores e educadores. (2000). Disponível: http://apps.who.int/iris/ bitstream/10665/66801/5/WHO_MNH_MBD_00.3_por.pdf;
3 - Marín-León L, Barros MBA. Mortes por suicídio: diferenças de gênero e nível socioeconômico. Rev Saude Publica 2003; 37(3):357-363;
4 - Gonçalves LRC, Gonçalves LRC, Gonçalves E, Oliveira Junior LB. Determinantes espaciais e socioeconômicos do suicídio no Brasil: uma abordagem regional. Nova Economia 2011; 21(2):281-316;
5 - Salvo Garrido, L., & Castro Salvo, A.Soledad, impulsividad, consumo de alcohol y su relación con suicidalidad en adolescentes. (2013). Revista Médica de Chile, 141(4), 428-434;
6 - Botega, N. J., Marín-León, L., Oliveira, H. B., Barros, M. B. A., Silva, V. F., & Dalgalarrondo, P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, (2009). São Paulo, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, 25(12), 2632-2638.
*RENATA PEREIRA
-Psicóloga formada pela Universidade Prebsteriana Mackenzie;
-Especialista em Terapia Comportamental Cognitiva pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP;e
Atende adolescentes e adultos em psicoterapia individual e em grupo.
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