quarta-feira, 18 de setembro de 2019

O Preço de Voar na Janela


Autor: Ellcio Santos(*)

A tutela do Estado é imprescindível nas relações de consumo, ainda que tenham o caráter eminentemente particular. O Estado quando nos primórdios das relações de consumo avocou para si a responsabilidade de garantir aos consumidores o efetivo cumprimento dos ditames legais por parte do empresariado, para que no final dessa relação o consumidor possa auferir produtos e serviços de qualidade, sem abusos ou exploração, em face das vicissitudes apresentadas no marcado consumerista.

Ainda que presente o controle estatal, pelo menos em parte, os consumidores são surpreendidos com práticas comerciais que se não ilegais, pelo menos dúbias ou imorais, já que a hipossuficiência de uma parte, nesse caso o consumidor, instiga a criatividade de outra parte, o empresariado.

Flagrante o viés "autoritário" que às vezes é corroborado pelo próprio Estado que, in tese, deveria ser o contrapeso da balança face à desproporcionalidade patente entre o consumidor brasileiro e o empresariado. Constatam-se hodiernamente abusos de toda feita e de forma diversificada.

Nesta senda, a título exemplificativo, trazemos à luz, a prática comercial utilizada pelas Empresas Aéreas ou na melhor síntese, aéreas.

Diferentemente de outros tipos de transportes, ainda que injustificável, não há, ou pelo menos no modelo de transporte Aéreo atual, repiso que não há! A mínima possibilidade de viajarmos em pé, se já existe pedimos vênia. Contudo, em assim sendo, particularmente não arriscaria, pois sabe-se que existe a espécie classe econômica, economia assim, nem tanto.

A falta de concorrência desperta a ambição do empresariado, o que não poderia ser diferente, já que o objetivo central é o lucro. Nessa linha, as Aéreas passaram a cobrar dos consumidores um preço para voar na janela ou mesmo sem ela.

Abstraindo-se o lado cômico do ponto de vista, na realidade as Aéreas cobram pela marcação de assento antecipadamente que entendemos ser, na prática, uma forma de auferir lucro em cima do consumidor brasileiro que já desembolsa uma absurda quantia para aquisição de uma passagem, justiça seja feita com direito a água, mas sem pão! Como se não bastasse, ainda cobram valores adicionais aos consumidores/passageiros quando do despacho de bagagens.

O ardil das Aéreas está em mascarar a cobrança abusiva com o oferecimento de assentos ou poltronas mais confortáveis (assento conforto), aquela inclinação e o velho espaço paras pernas. Por outro lado, estão diminuindo os espaços nos demais assentos o que obriga, praticamente, o consumidor a pagar pela reserva considerando sua necessidade ou do contrário terá seu assento escolhido aleatoriamente no momento do check-in (embarque).

Vigilantes, o PROCON e OAB, em alguns Estados Brasileiros, como São Paulo, buscando coibir esta prática comercial, vêm multando as aéreas por cobrança antecipada de assento em voo. Os órgãos vigilantes alegam que a cobrança está em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor. No caso em tela, vislumbra-se uma prática abusiva que poderá dar ensejo a demandas judiciais.

Nessa senda, elucida o Código de Defesa do Consumidor no seu Art. 39, que é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços.

Buscando justificar o injustificável, as empresas aéreas se defendem alegando a observância às normas da Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC, sobretudo a Resolução n.º 400/2016, que Dispõe sobre as Condições Gerais de Transporte Aéreo.

Todavia, entende-se que o Código de Defesa do Consumidor deve prevalecer para que a justiça nas relações de consumo seja efetiva.

Diante do exposto conclui-se que, qualquer consumidor/passageiro possui com o fulcro na Constituição Federal de 1988 e na Lei n.º 8.078/1990, Código de Defesa do Consumidor, o direito de utilizar esses assentos ou marcar sua passagem sem desembolsar nada a mais por isso, desde que observadas e respeitadas as prioridades estabelecidas em Lei.

Assim, vale o ensinamento Gandhi: "Odeio o privilégio e o monopólio. Para mim, tudo o que não pode ser dividido com as multidões é tabu." (Mahatma Gandhi, pág. 13). 

REFERENCIAL 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 

BRASIL. Lei nº 8.078/1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm. Acesso em: 11/07/2019; 

ARTIGO. A companhia aérea cobrou você pela reserva de assento? Conheça seus direitos. Disponível em: https://www.proteste.org.br/seus-direitos/direito-do-consumidor/noticia/a-companhia-aerea-cobrou-voce-pela-reserva-de-assento-conheca-seus-direitos. Acesso em: 20/08/2019; 

A única revolução possível é dentro de nós", Mahatma Gandhi, 2004. 
Acesso em: 19/08/2019; e

Dicionário Etimológico: etimologia e origem das palavras. Disponível em: https://www.dicionarioetimologico.com.br/higiene/.aCESSO. Acesso em: 10/07/2019.

* ELLCIO DIAS DOS SANTOS




-Advogado graduado pelo Centro Universitário de Desenvolvimento do Centro Oeste - UNIDESC, Luziânia/GO; 
 -Especialista em Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil pela AVM/Universidade Cândido Mendes; Graduado em Ciîencias com habilitação em Matemática, São Luis/MA pela Universidade Estadual do Maranhão - UEMA; e
- Servidor Público Federal.
-Mora em Brasília/DF.





Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário