Autor: Alexandre Melatti(*)
1. Introdução
Os partidos políticos podem ser entendidos, em síntese, como
associações de cidadãos, de carácter duradouro, que procuram, por meio de
eleições, conquistar legitimamente o poder, a fim de materializarem seus ideais
e programas visando a solução dos problemas encontrados pela comunidade.
A busca legítima pelo poder é uma característica essencial da
política representativa. O político deseja a conquista do governo, a fim. de
colocar em prática seus ideais, ideias e com vistas a atender ao interesse
público. Esse modelo não é novo, vez que há registros que datam de 1828, nos
Estados Unidos, e de 1832, na Inglaterra.
A figura dos partidos políticos não é novidade na vida
política dos países. Nas palavras de Bonavides (1996, p. 57) "o reconhecimento
da relevância, pois, do sistema de partidos representou um dos fenômenos
políticos de maior importância na segunda metade deste século e se manifesta
como tal logo após a Segunda Grande Guerra Mundial".
O autor se referia ao Século XX, e ao fenômeno de
constitucionalização dos partidos políticos, e até mesmo de positivação das
agremiações partidárias, uma vez que a existência destas se desenvolveu fora da
Constituição e até mesmo das leis. Entretanto, ao se analisar a denominada Teoria
Geral dos Partidos Políticos, percebe-se que essas associações estavam
presentes muito antes do reconhecimento constitucional e legal.
Para compreender a importância dos partidos político, se faz
necessário conhecer a história e o surgimento das agremiações nos países.
Atualmente, muito se critica em relação às entidades partidárias, contudo,
conforme se notará, com breves apontamentos históricos, da posição fundamental
que os partidos desempenham nas democracias.
2. Apontamentos sobre o surgimento
dos partidos
Segundo Frederico Alvim (2013, p. 11) o "surgimento dos
partidos políticos é um fenômeno social paulatino cuja concepção pode ser
identificada a partir dos séculos XVII e XVIII, contemporânea, portanto, ao
surgimento do regime democrático representativo". Contudo, não da forma que se
conhece as agremiações partidárias atualmente.
Assim, destaca Alvim (2013, p. 11):
"Adota-se aqui a noção de
partido em sentido amplo, tal como a assumida por Georges Burdeau, para
quem as agremiações
partidárias existem desde
que os homens,
pela primeira vez,
concordaram a respeito
de alguma finalidade
com projeção social
e dos meios
necessários para alcançá-la. Por
esse critério, seria possível vislumbrar
o princípio do
fenômeno partidário nas
atividades de tories
(conservadores) e whigs
(liberais), por ocasião
da Revolução Gloriosa,
na Inglaterra, 1688;
de federalistas e
republicanos, nos Estados
Unidos pós-independência; ou,
ainda, de jacobinos e girondinos, no levante
revolucionário francês."
Ainda segundo o autor (2013, p. 11) "o fortalecimento e a
expansão da atividade partidária somente ocorreram em meado do século XIX a
partir de quando os grupos políticos evoluíram para a adoção de formas e
estruturas mais estáveis definidas e profissionalizadas". Assim, nota-se a
estreita ligação da evolução dos partidos e a Revolução Industrial, pois esta
possibilitou o sentimento nos operários de se organizarem enquanto classe
buscando combater a burguesia.
Nesse mesmo sentido, aponta José Alfredo de Oliveira Baracho
(1980, p. 35) ao afirmar que "considerados hoje como essenciais à democracia
representativa, até há pouco tempo, a existência dos partidos desenvolveu-se
fora da Constituição e mesmo das leis, desde que os textos constitucionais
escritos e as leis os ignoravam. São considerados como produto dos costumes e
da tradição, fruto da experiência da nação e não resultado da ação formal de
qualquer autoridade legalmente constituída."
Ainda que não expressamente, os partidos estavam presentes na
vida política dos países e nações. Baracho (1980, p. 36) afirma que Harold J.
Lanski ao estudar o sistema de partidos no parlamentarismo inglês reconhece
que, na Grã-Bretanha "o objetivo principal do partido é conseguir chegar ao
poder, pelo que utiliza todos os meios para organizar eleitores nos distritos.
Nesse seu trabalho afirma que, substancialmente, a ausência o reconhecimento
legal da existência dos partidos não significa que eles não façam parte dos
mecanismos de governo".
Assim, nota-se que na evolução histórica dos partidos
políticos existe um grande traço ainda de informalidade e de costumes, mas
ainda assim essas associações estão presentes na vida política dos países, e
demonstram traços que atualmente fazem parte do próprio conceito de partido
político, como a busca legítima pelo poder.
Maurice Duvenger (apud BARACHO,1980, p. 24) afirma que:
"Durante a primeira metade do
século XIX, quando se falava em “partidos” tinha-se em mente, essencialmente,
as ideologias, e não os homens que as encarnavam. Com os trabalhos de MARX, e
ainda mais de LENINE, a ênfase transitou para a infra-estrutura social:
considerando-se os partidos como modos de expressão das classes na vida
política."
Conforme explica Alvim (2013, p. 11-12):
Deriva daí a conclusão de
que, até o século XIX, não existiam, propriamente, partidos, mas apenas grupos
políticos ou facções. O aparecimento dos partidos, em noção apurada,
identifica-se, portanto, com o momento em que a atuação partidária superou o
modelo de atuação ocasional e precária, parlamentar ou eletiva, para, fora das
assembleias, assumir uma forma de mobilização política institucionalizada,
burocraticamente estruturada e duradoura.
No mesmo sentido, Pedro Sabino de Farias Neto (2011, p. 179)
diz:
"A princípio, os partidos
foram organizações puramente eleitorais, cuja função essencial consistia em
assegurar o êxito de seus candidatos. Nesse contexto, a eleição era o fim e o
partido era o meio. Depois, o partido desenvolveu funções próprias como
organização capacitada para a ação direta e sistemática sobre a atividade
política, colocando a eleição a serviço da propaganda partidária."
Assim, Baracho (1980, p. 37) afirma que é possível "encontrar
as primeiras tendências para enquadrar os partidos políticos nas constituições
europeias a partir de 1914, na época em que MIRKINE-GUETZÉVITCH passa a falar
na tendência à racionalização do poder", destacando o autor sobre a criação do
Tribunal Eleitoral na Constituição da Tchecoslováquia.
Na Alemanha, com a Constituição de Weimar, de 1919, foi
reconhecido o direito da formação de associações, dispondo ainda que não se
poderia negar a personalidade destas por ter como finalidade a política. Antes
disso, porém, era possível perceber figuras bastantes semelhantes aos partidos
políticos, como destaca Arnaldo Manuel Abrantes Gonçalves (2005) ao afirmar que "Os partidos britânicos nascem das reformas eleitorais de 1832 (Reform Act) e
1867 que conduzem ao alargamento do sufrágio e à criação das registration
societies donde saem as organizações locais dos partidos que se criam após a
lei eleitoral de 1832".
A Alemanha, em 1949, colocou os partidos políticos em sua Lei
Fundamental, a Constituição Alemã, trazendo alguns aspectos relevantes a eles
como a função de formar a vontade política do povo, além de garantir a
autonomia de criação e de organização, bem como de determinar a prestação de
contas e de possibilitar ao povo o conhecimento da origem de seus recursos.
Portanto, na Alemanha as agremiações partidárias ganharam
status constitucional, e institutos tão importantes sobre o direito partidário
ganharam relevo, e assim como no país alemão, outros países no século XX
passaram a incluir os partidos em suas constituições.
Nota-se, assim, que sempre existiram grupos de pressão que
buscavam defender seus interesses perante o Estado, mas não havia partidos
políticos em sua concepção moderna, tal qual se conhece atualmente. Desta
forma, pode-se afirmar que as organizações políticas surgiram no mundo no final
do século XIX e início do século XX.
Sobre isso, afirma Benjamin Alves Rabello Filho (2001, p.
20-21):
"a ideia de partido político
remonta à Idade Média. É mais antigo o vocábulo partido na terminologia
política que classe nas denominações sociais. Denominavam-se partido às facções
que outrora dividiam as Repúblicas, os clãs italianos no período renascentista,
os clubes onde se realizavam as reuniões dos deputados das Assembleias
Revolucionárias, bem como os comitês que lhes preparavam as eleições
censitárias e as organizações populares de democracia moderna. A justificativa
para esta diversidade de interpretações num mesmo vocábulo está em que todas
estas instituições tinham por objetivo a conquista e o exercício do poder. Na
verdade, os verdadeiros partidos surgiram há pouco mais de um século. No seu
perfil moderno, os partidos ganharam consistência, embora lenta, a partir da
adoção do princípio da representatividade popular, com o surgimento em 1215, na
Inglaterra, do incipiente poder legislativo decorrente da Carta Magna
(LGL\1988\3) Baronorum, vindo a se consolidar, porém, efetivamente, em meados
do século XIX. Até aquela época, embora já encontrássemos tendências de
opiniões, clubes populares, associações de pensamento e até mesmo grupos
parlamentares, não se conhecia partido político no sentido moderno do termo. É
verdade que, gramaticalmente, a palavra partido designa parte de conjunto social
e, por isso, já servia antes para designar grupos que, por qualquer razão,
defendiam ideias sem aceitação universal."
Assim, ainda que durante muito tempo existiram grupos,
semelhantes a partidos, o fato é que somente no final do século XIX e início do
século XX que pessoas se organizaram de maneira estável e passaram a lançar
candidatos em eleições, além de compartilharem um mesmo ideal.
3. Conclusão
Conforme
se notou, os partidos estão presentes no mundo há muitos anos, entretanto, o
seu reconhecimento constitucional teve maior destaque a partir do final do
século XIX. Conhecer a história e o surgimento das agremiações partidária é
importante para se repensar a função social e democrática dos partidos.
É
fato, ao não cumprir sua função social e democrática, permanecendo apenas na
busca legítima do poder, e por não permitir uma liberdade aos filiados,
transparência e verdadeira democracia dentro de seu funcionamento, os partidos
se encontram criminalizados, e não somente no Brasil.
Por
isso a relevância de se compreender o papel histórico das agremiações, de modo
a se encontrar meios para fortalecer os partidos, tendo em vista que com isso a
própria democracia se fortalecerá.
REFERÊNCIAS
ALVIM, Frederico. A evolução
histórica dos partidos políticos. Revista Eletrônica EJE nº 6, ano 3.
Disponível em:
http://www.tse.jus.br/o-tse/escola-judiciaria-eleitoral/publicacoes/revistas-da-eje/artigos/revista-eletronica-eje-n.-6-ano-3/a-evolucao-historica-dos-partidos-politicos.
Acesso em 25 fev. 2020;
BARACHO, José Alfredo de Oliveira.
Teoria Geral dos Partidos Políticos. Revista Brasileira de Estudos Políticos,
nº 50, Jan. 1980, p. 19-76;
BONAVIDES, Paulo. Revista da OAB.
Conselho Federal. Nº 62. Jan-jun - 1996;
FARIAS NETO, Pedro Sabino. Ciência
política: enfoque integral avançado. São Paulo: Atlas, 2011, p. 178;
GONÇALVES, Arnaldo Manuel Abrantes.
Os partidos políticos e a crise da democracia representativa. Revista Jus
Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 707, 12 jun. 2005. Disponível
em: <https://jus.com.br/artigos/6818>. Acesso em: 17 dez. 2018; e
RABELLO FILHO, Benjamin Alves.
Partidos políticos no Brasil: doutrina e legislação. Belo Horizonte: Del Rey,
2001.
(*)ALEXANDRE GUIMARÃES MELATTI
-Advogado, graduado em Direito pela Universidade Norte do Paraná/PR;
-Pós-graduado em Direito do Estado pela Universidade Estadual de Londrina/PR; e
-Professor de Direito Administrativo autor convidado de Direito Político e Eleitoral e Direito Administrativo e direito eleitoral na Faculdade Dom Bosco/PR.
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