Autora: Silvana Cristina Cavalcanti(*)
A viagem havia sido programada há mais de 6 meses por alguns amigos que residiam em Curitiba . O grupo, no total de 10 pessoas, incluindo duas crianças e um bebê de colo havia planejado detalhadamente a primeira viagem internacional rumo a DISNEY – destino turístico de milhares de brasileiros.
Compareceram todos, como é exigido em vôos internacionais, 3 horas antes do embarque em São Paulo, no Aeroporto Internacional de Guarulhos.
Em meio a malas, selfies, correria das crianças e todo aquele alvoroço despediram-se de seus amigos virtuais e... caminharam até o balcão da Companhia Aérea para realizar o check in.
Porém, a frustração veio a tona ao serem informados que a viagem planejada há mais de 6 meses DEVIDO A UM FURACÃO, havia sido CANCELADA .
Imaginemos a triste situação ...
A Atendente da Companhia Aérea informou que devido a este fenômeno, os Aeroportos nos Estados Unidos estavam fechados, a malha aérea havia sido colocada em terra e todos os vôos para aquele destino haviam sido cancelados.
Não seria possível a realocação imediata em novo voo, enquanto perdurassem as consequências advindas deste incauto acontecimento, explicou ainda a atendente.
Desta forma, o voo foi remarcado para dali há 8 dias...!!!
E, agora? Como o grupo deveria proceder? Quem é o responsável pela hospedagem, alimentação, e transporte dos passageiros de volta a Curitiba, ou se decidirem aguardar pela nova data de embarque em São Paulo?
Quem será o responsável por todas estas providências? Pode haver pedido de indenização por danos materiais e morais ? O furacão é caso de excludente de responsabilidade? Posso pedir o ressarcimento dos valores pagos?
Nossa experiência insere que a Companhia Aérea pode até se negar a prestar assistência aos passageiros, sob o argumento de que trata-se de caso de “força maior” tendo em vista o “fenômeno da natureza”. No entanto, a negativa na prestação da assistência não se justifica.
De rigor que deve haver o reembolso imediato dos valores pagos, no caso do passageiro não poder viajar nas datas propostas pela Companhia Aérea.
E, se o passageiro decidir aguardar pelo novo cronograma da Companhia Aérea?
Em casos análogos, o Tribunal de Justiça de São Paulo, tem reconhecido a responsabilidade solidária entre a Companhia Aérea e a Agência de Turismo que intermediou a viagem. Do mesmo modo, os julgadores formatam que a excludente de responsabilidade, por motivo de "força maior" em que haja fenômeno meteorológico capaz de produzir o fechamento de aeroportos, e estancamento da malha aérea, não justifica a FALTA DE ASSISTÊNCIA aos passageiros, tendo em vista o risco do negócio em que a Companhia Aérea se insere.
No exemplo do Furacão, antes mesmo que os cidadãos comuns saibam pela imprensa, este fenômeno já estaria nos radares dos controladores de vôos dos Aeroportos e das Companhias Aéreas.
Portanto, os viajantes não podem e não devem ser colocados em risco ou abandonados “a própria sorte” e em caso do cancelamento ou remarcação do voo a Cia. Aérea deve prestar toda a assistência aos viajantes.
Os passageiros, no entanto, devem provar que não obtiveram a informação sobre o cancelamento ou atraso em tempo e, ainda não foram corretamente assistidos pelas Companhias Aéreas .
Fato é, que antevendo a ocorrência destes fenômenos, as Companhias devem avisar os passageiros com antecedência mínima para que a viagem seja reprogramada, respeitando as autorizações pertinentes no espaço aéreo, a normalização da malha aérea, aeroportos e demais envolvidos no embarque e desembarque.
Ao comunicarem os passageiros apenas no check in, a Companhia Aérea deve fornecer toda a assistência aos seus viajantes, incluindo aí hospedagem adequada, alimentação e transporte.
Para que haja a exclusão da responsabilidade objetiva, terá que demonstrar que adotou todas as medidas que eram razoavelmente necessárias para evitar o dano ou que lhes foi impossível a adoção destas medidas. (Art. 19 da Convenção de Montreal).
Do mesmo modo, todos os esforços devem ser empreendidos tanto pela Agência de Turismo como pela Cia. Aérea, para evitar danos maiores do que o cancelamento da viagem.
A ausência de assistência durante o período que os passageiros ficaram aguardando o embarque, desde que prescindida de cancelamento ou atrasos, seja por motivo de força maior ou não, é passiva de questionamento no judiciário havendo configuração de danos materiais e danos morais passíveis de indenização, pelo instituto da Responsabilidade Civil.
Neste sentido, a manutenção da aeronave, assim como defeitos na prestação de serviço, falta de combustível, excesso de trafego aéreo, interrupção da malha aérea por motivos alheios, não configuram casos de força maior e são traduzidos tecnicamente como "fortuito interno" .
Pelo risco do próprio negócio a que se insere a Companhia aérea, este tipo de ocorrência é tecnicamente previsível e, portanto, não é do consumidor (parte hipossuficiente) o peso da responsabilidade.
Os passageiros são consumidores, e como tal são assim protegidos . O Artigo 14 do Código Brasileiro do Consumidor traz conta de responsabilizar o fornecedor de serviços, independente de culpa.
O Fortuito externo ou força maior que resultaria na exclusão da responsabilidade da Companhia Aérea, conforme Artigos 393 e 734 do Código Civil, não ilide a comprovação da devida assistência durante o período de espera até a ocorrência do voo remarcado.
Igualmente, devem estar presentes as regras de conduta capazes de inserir a boa fé objetiva em todo ordenamento jurídico:
Deveres de cuidado, respeito, lealdade, probidade, informação, transparência, honestidade e razoabilidade – todos devem estar presentes nos negócios. Caso contrário, a parte que der causa pode ser responsabilizada e a parte que se sentir lesada, pode e deve resguardar os seus Direitos.
Quanto às limitações das indenizações, importante salientar que as convenções internacionais em que o Brasil é signatário, a exemplo da Convenção de Varsóvia, recentemente utilizada como tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento RE nº 636.331 devem ser respeitadas. Porém, as limitações indenizatórios previstas neste julgamento, não abrangem reparação de danos morais, mas apenas os danos materiais advindos do extravio de bagagem.
A conduta das partes deve ser analisada. Em caso de violação injusta da dignidade do consumidor, malferindo os mais básicos direitos deste, haverá a configuração dos danos morais in re ipsa (dano moral presumido) conforme orientação do Colendo Superior Tribunal de Justiça :
" Sempre que ocorrer ofensa injusta à dignidade da pessoa humana restará configurado o dano moral, não sendo necessária a comprovação de dor e sofrimento. Trata-se de dano moral in re ipsa (dano moral presumido)." (REsp nº 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma. J. 04/012/2012).
Dessa forma, levando em conta o caso concreto, é preciso que um Advogado de confiança seja consultado e em análise técnico-jurídica se chegue as reais possibilidades de Ação Indenizatória.
*SILVANA CRISTINA CAVALCANTI
-Advogada especializada em Direito do Consumidor;
-Administradora de Empresas, Proprietária do Escritório de Advocacia Cavalcanti Advocacia & Consultoria Internacional, no bairro da Aclimação em São Paulo.
- Formada pela Universidade Nove de Julho, Especialista em Direito do Consumidor pela Escola Paulista de Direito.
-Whats app : 11 96136 – 1216
-Escritório : 55 11 5574 – 6497
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