Autora: Gabrielle Gomes Andrade Suarez
Com a possibilidade de os nubentes adotarem o nome do cônjuge por ocasião do casamento e com a ocorrência de divórcios e convolação de novas núpcias, tem sido notada uma demanda crescente no judiciário por uma questão bastante peculiar: a modificação do sobrenome materno na certidão de nascimento dos filhos.
As situações costumam ser semelhantes. Por ocasião do primeiro casamento, a mãe adere ao sobrenome do marido. O casal decide por ter filhos e registra-os com os nomes atuais do pai e da mãe – que conta com o sobrenome do marido.
Por circunstâncias talvez alheias à vontade do casal, acabam se divorciando e a mãe retorna ao nome anterior ao casamento, sem o patronímico familiar do cônjuge.
Se a mãe vem a convolar novas núpcias e a aderir ao sobrenome do novo marido, podem ocorrer situações bastante constrangedoras com relação ao Registro Civil dos filhos do primeiro relacionamento.
Existem diversos relatos de profissionais que são procurados por mulheres nesta situação, que dizem enfrentar uma verdadeira “via crucis” a cada vez que precisam comprovar o parentesco com os filhos, pois, a depender da modificação ocorrida no sobrenome, certos estabelecimentos públicos ou particulares requerem explicações para demonstrar que se trata da mesma pessoa, ou seja, que o documento da mãe corresponde ao nome constante no registro da criança.
Sobrenomes comuns em nosso país, como os de origem portuguesa, acabam sendo mais suscetíveis a despertar este tipo de situação, justamente pela ocorrência de diversos homônimos.
E a cultura arraigada nos órgãos públicos é de que a prevenção da homonímia é justamente baseada no conjunto de informações constantes do nome da pessoa somado ao nome da genitora.
Daí é só imaginar quantos dissabores a pessoa pode vir a enfrentar, passando desde o constrangimento de não lhe acreditarem a filiação de seus próprios filhos, até a geração de mais de um número de CPF para o filho, em razão da alteração do sobrenome da mãe em seus documentos.
A função dos sobrenomes é identificar o núcleo familiar da pessoa e retratar a verdade real, que tem por objetivo espelhar da melhor forma a linhagem individual.
Sobre o tema "nome", asseverou José Serpa de Santa Maria:
“A finalidade do nome civil, como já deflui de sua própria significação, é servir para distinguir as pessoas humanas de uma mesma sociedade, durante a sua vida e até após a morte, pela memória que se fixa através de seus sucessores e da estima e mérito pessoal. Muitas vezes o nome adquire tal respeitabilidade pela tradição que cria, que serve também para dignificar o seu portador, com um escopo secundário e variável". (In, Direitos de Personalidade e a Sistemática Civil Geral, Julex Livros, p. 132).
O artigo 57 da lei de Registros Públicos admite a alteração de nome civil, desde que se faça por meio de exceção e de forma motivada, com a devida apreciação judicial:
Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei.
Bem, as modificações da sociedade, muitas vezes, não são acompanhadas por modificações na legislação.
No caso do Direito de Família, esse fato se torna muito mais evidente, demonstrando que a dinâmica familiar e as demandas da população dependem mais de questões subjetivas e interpretativas dos julgadores do que necessariamente do que está descrito na lei.
Relativamente à questão apresentada, os Tribunais Superiores têm opinado pela possibilidade da modificação do patronímico materno no registro civil dos filhos, como forma de se atender ao princípio basilar da Lei dos Registros Públicos, que é atender à verdade real.
Em recente decisão, asseverou o Ministro do STJ, Villas Bôas Cueva:
“É justificável e plausível a modificação do patronímico materno na certidão de nascimento de suas filhas, situação que prima pela contemporaneidade da vida, dinâmica por natureza” (Recurso Especial 1.279.952).
Com o fim do casamento e a modificação do nome da mãe, por meio de contração de novo matrimônio, sem nenhum prejuízo a terceiros, não há motivo para impedir a atualização do registro de nascimento dos filhos.
A alteração facilita, inclusive, as relações sociais e jurídicas, pois não seria razoável impor a alguém a necessidade de outro documento público — no caso, a certidão de casamento dos pais — para provar a filiação constante de sua certidão de nascimento.
O parágrafo único do artigo 3º da Lei nº 8.560/92 preleciona:
Art. 3º (...) Parágrafo único. É ressalvado o direito de averbar alteração do patronímico materno, em decorrência do casamento, no termo de nascimento do filho.
Referida disposição, observada à luz do princípio da simetria, não importa óbice para a sua aplicação inversa, sendo possível a retificação do patronímico materno ou mesmo paterno no registro civil da prole, em caso de divórcio, ou adoção ou de novo patronímico em decorrência de novas núpcias.
Para o ingresso com Ação Judicial, deve ser realizado o pedido, através de advogado, de Retificação do Registro Civil do Patronímico Materno. Quem ingressa com a ação são os filhos e, caso menores, são representados por um dos genitores.
Há que se comprovar a ocorrência de dissabores e situações de constrangimento, juntando-se provas documentais ou testemunhais.
É necessário, também, levar aos autos certidões de distribuições judiciais dos Tribunais de Justiça dos estados da federação nos quais a família já residiu, além de certidão de distribuição de feitos na Justiça Federal; a fim de se demonstrar ao julgador que a modificação não será feita de má-fé, para o fim da família ocultar-se ou ocultar patrimônio, mas, apenas, para salvaguardar o direito dos filhos e da genitora à verdade real.
Assim, havendo situação de modificação do nome da mãe após se divorciar e/ou contrair novas núpcias, é possível alterar seu nome na certidão de nascimento dos filhos, para que não ocorram constrangimentos e que se proporcione maior facilidade na comprovação do vínculo parental.
* GABRIELLE GOMES ANDRADE SUAREZ - OAB/SP 315.903
-Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Varginha/MG;
-Atua como Advogada na seara do Direito de Família em São Caetano do Sul/SP; e
Membra associada do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família) e comentarista e articulista jurídica.
E-mail: gabrielleasuarez@adv.oabsp. org.br
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Nota do Editor:
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Muito bom!
ResponderExcluirMuito bom!
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