Conhecer transformações e mudanças nas quais a sociedade passou pelo menos nos últimos cem anos pode ser um bom referencial para se compreender um pouco da realidade nos tempos do século XXI, onde a produção de necessidades para as pessoas é baseada em uma prática ideológica, que produz formas de conforto e facilidades para as atividades cotidianas tentando promover um viver com mais qualidade.
Não é muito bom saber e ver de perto como os seres humanos são vulneráveis a quaisquer novidades que aparecem por aí e, em consequência, como desfruta, sem pensar nos recursos naturais, sem maiores critérios de cuidados. Os prognósticos sobre a escassez da água, por exemplo, deveriam amedrontar, pois mostram que é mais do que hora de acreditar que os recursos naturais não são eternos. Outros exemplos indigestos podem ser citados: os aterros sanitários que se esgotam rapidamente e continuam poluindo com o chorume e a produção de gás venenoso; os incineradores poluindo o ar; o desmatamento contínuo através do corte e extração das árvores; o extermínio de inúmeras espécies de animais; a guerra contínua por demarcação de terras derivando daí o aumento da violência sobre populações indígenas e rurais; a fome de populações inteiras; o ar poluído pelas indústrias e meios de transportes; a queima do petróleo; o efeito estufa; campos inteiros devastados pela extração de minérios; os acidentes nas usinas nucleares; a ingestão de grande quantidade de alimentos com agrotóxicos que é necessário usar cada vez mais; produtos químicos para purificar a água; produtos tóxicos que contaminam o solo, os alimentos e a água, afetando cada vez mais a saúde de todos; as epidemias que grassam vidas mesmo com a medicina altamente avançada (pois serve para poucos); a escravidão do Homem ao, e no trabalho, diminuindo o tempo para pensar, o lazer e união entre a família; a desigualdade social que cada vez aumenta mais e, enfim a utilização da vida de inúmeros seres vivos como cobaias para testar o que é produzido. Tudo para sustentar um determinado modo de viver, ou como se diz hoje, um determinado estilo para ser feliz.
Há tanto a fazer para mudar, porém são poucas as medidas governamentais ou das corporações/instituições, que pensam no coletivo e, efetivamente realizam algo que melhore a qualidade do ambiente e, em consequência proporcione o equilíbrio entre todos os fatores ambientais necessários à manutenção da vida. Quando há medidas para isso, algumas pessoas aplaudem, outras se surpreendem e, poucas acreditam que não há interesses econômicos perversos por trás.
As pessoas estão expostas a uma rede invisível e subliminar de sugestões comportamentais, que na maioria das vezes as fazem correr pra lá e pra cá, comprando/consumindo, acumulando, destruindo, estressando-se! Algumas têm como ideal, fechar-se em condomínio ou carro blindado, o que pode produzir uma falsa sensação de segurança. Não há um pensar sobre os porquês e as consequências deste sistema que a princípio é tido como necessário para a vida pós- moderna e contemporânea. Passou a ser difícil para alguns pais dizerem aos filhos e filhas, que eles não vão ter “aquele carro” para ir à balada, nem a centésima bolsa da moda ou o IPhone de última geração. Também os que possuem menor poder econômico, têm dificuldades de dizer “não” e acabam cedendo aos apelos das novas gerações. É fato que, para o usufruto de uma vida mais aprazível e adaptável ao desejo de cada um, também aparecem as insatisfações, infelicidades, os vazios, a baixa autoestima, as depressões...
Todas as ações, atitudes e comportamentos têm várias consequências no meio em que se vive. Observa-se que a conscientização sobre os cuidados ao meio ambiente para a manutenção da vida, é um tema bastante abrangente, polêmico e complexo e ainda excluído de uma identidade conceitual e prática, derivado de entendimentos e vivências segundo interesses de segmentos sociais, políticos e econômicos.
Mas, afinal, como pode ser desenvolvido um processo educacional para conscientização sobre a questão ambiental?
Um processo educacional pode trabalhar esta questão a partir de diversos direcionamentos. Alguns processos se mostram de linha conservadora, caracterizados, sinteticamente, por uma visão fragmentada e reducionista, por uma leitura individualista e comportamentalista, além de uma despolitização do debate ambiental, em consonância com a banalização da noção de cidadania e participação social. Já outros se mostram emancipadores e podem ser caracterizados por uma visão que abarca a complexidade e a multidimensionalidade da questão ambiental, por meio de uma atitude crítica que tenha a democracia e a participação cidadã como pré-requisito da sustentabilidade.
Em outro direcionamento, observa-se que há uma educação que produz mudanças aparentes e parciais nas relações entre sociedade e o meio ambiente. Ela apoia-se, em frágeis e efêmeras mudanças, com ampla visibilidade na mídia e uso da linguagem científica, a fim de garantir uma transformação socioambiental, que, no entanto, não subsiste durante muito tempo.
Hoje, todo sistema educacional incorporou a Educação Ambiental aos seus projetos pedagógicos por meio de uma prática gestada com base em um destes direcionamentos. E como não poderia deixar de ser, as atividades dos projetos também seguem linhas específicas e pontuais, com nuances de diferenças entre elas, mas extremamente preocupantes em relação aos processos de ensino e aprendizagem dentro da escola.
O “Dia da água” ou “Semana do Meio Ambiente” são exemplos de atividades desenvolvidas através de ações pontuais que depois de um tempo parecem já terem sido assimiladas, mas vão paulatinamente assumindo um caráter efêmero e descontínuo, facilmente relegadas ao segundo plano. Outra atividade que usualmente acontece no interior de quase todas as escolas é a coleta e separação de produtos recicláveis que muitas vezes estão relacionadas a alguns eventos maiores como gincanas, festas juninas ou olimpíadas e onde são oferecidos prêmios aos que se sobressaem nas tarefas.
Algumas escolas vão além, buscando incorporar a questão ambiental ao seu currículo, acrescentando uma nova disciplina ou inserindo a temática como um tema gerador. Mas, por trás de muitas práticas tidas como inovadoras, uma observação mais profunda pode perceber processos adestradores, conservadores e despolitizados.
Um exemplo bem marcante de educação ambiental desprovida de comprometimento com a questão social e política pode ser vista sobre a temática do lixo. Os professores da escola, notadamente os de ciências, tendem a tomar a responsabilidade para si, ou são automaticamente encarregados do desenvolvimento desta temática, como se só a eles coubesse o seu conhecimento. São trabalhadas questões e levantados dados sobre a produção de lixo e os porquês da necessidade de sua separação, o que é reciclagem e assim por diante. Atividades extracurriculares são organizadas. Visita aos lixões e às usinas de reciclagem.
Todo o problema da degradação ambiental através do lixo é posta como de responsabilidade individual do ser humano, e que ele pode fazer a diferença, mudando seu comportamento quanto ao fim que dará ao seu lixo. Porém, o consumo, por exemplo, não é questionado, dando a impressão de que se pode continuar consumindo desde que cada um separe o lixo e o leve para reciclagem. A questão social, os interesses econômicos e as mensagens ideológicas na mídia, não são postas na mesa de debate, não são questionadas nem usadas para reflexão.
Em uma última perspectiva, as atividades, também podem estar centradas em grupos que se relacionam politicamente com a preocupação da preservação de recursos naturais (corrente conservacionista) e com a crítica sobre o modo de utilização dos recursos naturais (gestão ambiental).
O sistema educacional encontra-se subordinado a uma sociedade pasteurizada que age através de uma visão utilitarista e antropocêntrica de modo que os processos da educação em geral estão dissociados de uma educação ambiental construída segundo valores éticos e tenha cada vez mais dificuldades de desenvolver a emancipação social.
No entanto, contraditoriamente a toda esta situação, alguns grupos de pessoas se constituem para pensar e agir, propondo e fazendo algo que provoque mudanças. Estas pessoas, quase sempre transitam entre ser um sujeito ecológico e não ser, mesmo sob diversas influências.
Agir para mudar, pelo menos um pouco em uma situação tão complexa como é a temática do meio ambiente é levantar questionamentos sobre o sistema de destruição vivenciado e que já está posto. É saber como ele funciona, para, a partir disso se integrar, organizar e participar individualmente ou coletivamente de ações, que serão sempre intervenções políticas e sociais. Isso pode ser, sem sombra de dúvida, fazer parte dos principais objetivos do sistema educacional. Essas intervenções, participativas e comunitárias podem atingir alguns pontos chaves, como o comércio justo, a preservação e manutenção ambiental, produção limpa, consumo consciente, direitos ao trabalho, erradicação de algumas doenças, recuperação dos governos (que sejam para as pessoas e pelas pessoas), etc...
É difícil sim ser ecológico o tempo todo, aliás, este sujeito é tido como um sujeito chato e maluco, quando por exemplo, enche o carro de papéis de bala até achar uma lixeira, mas, algumas propostas de sustentabilidade e equidade, como, a química verde, a energia renovável, a produção em círculo fechado, o Zero resíduos e as economias locais vivas, como muitas outras ideias e práticas que estão por aí, mas que quase nunca são discutidas nas escolas, surgiram de muitos destes eco chatos, sujeitos conscientizados.
Mesmo que ações e as práticas apresentem pontos negativos e alguns sejam polêmicos, elas são possíveis agentes de transformação, talvez acontecendo lentamente, mas passíveis de serem aperfeiçoadas. Pensar e agir envolve então, em ser guiado para chegar à luz no final do túnel. Por que então a escola não o auxiliar para ir em direção à ela?
Referências para apoio:
www.agrolink.com.br/noticias/NoticiasDetalhe.aspx?CodNoticia=111643 – acessado em 15/03/2017
www.ecoblogs.com.br/ecoblog/reciclagem-nao-e-a-saida-residuo-zero-sim/ - acessado em 21/02/2017
www.economiaviva.com.br- acessado em 10/01/2017
www.escolakids.com/energia-renovavel.htm - acessado em 20/01/2017
http://www.youtube.com/watch?v=7qFiGMSnNjw- acessado em 20/02/2017
www.mundopt.com/dir/detail/12976/zero-residuos.htm acessado em 19/02/2017
FRACALANZA, H. A Educação Ambiental nas Escolas: problemas e perspectivas. Revista Virtual Contestado e Educação. Nº 6, Out./ Dez. 2003. 14 p.
POR SHEYLA P. DA SILVA
- Prof.ª de Ciências e orientadora pedagógica, aposentada- Secretaria Municipal de Educação de Campinas;
-Coordenadora do Programa de Orientação Sexual – Secretaria Municipal de Educação de Campinas;
-Mestre em Educação pela Faculdade de Educação - UNICAMP;
- Licenciatura e Bacharelado em Ciências Biológicas pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Fundação Souza Marques – Rio de Janeiro;
- Pedagogia Plena pela Faculdade de Educação - UNICAMP; e
- Especialista em Educação e Sexualidade Humana- Faculdade de Educação- UNICAMP
Nota do Editor:
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