O Brasil entrou na rota da inovação e consolida-se cada vez mais
como um país com grande potencial de desenvolvimento de empresas inovadoras. A
cada dia surgem mais empresas voltadas para a inovação e tecnologia. Em quatro
anos, de 2015 até 2019, o número de Startups passou de 4.151 para 12.727
segundo censo realizado pela Associação Brasileira de Startups (ABStartups).
Desse total, nove são "unicórnios" (empresas avaliadas em mais de US$
1 bilhão)[1].
O
que diferencia uma Startup de uma empresa Tradicional? A primeira definição de Startup na legislação brasileira advém da
Lei complementar 167, de 24 de abril de 2019, a qual dispõe sobre a Empresa Simples
de Crédito (ESC) e entre outras alterações, também incluiu artigos na lei do
Simples Nacional e institui o Inova Simples em seu artigo 65-A, Lei complementar 167[2]:
“Art. 65-A. É criado o Inova Simples, regime especial simplificado
que concede às iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo
que se autodeclarem como startups ou empresas de inovação tratamento
diferenciado com vistas a estimular sua criação, formalização, desenvolvimento
e consolidação como agentes indutores de avanços tecnológicos e da geração de
emprego e renda.
§ 1º Para os fins desta Lei Complementar, considera-se startup a empresa de caráter inovador que visa a
aperfeiçoar sistemas, métodos ou modelos de negócio, de produção, de serviços
ou de produtos, os quais, quando já existentes, caracterizam startups de
natureza incremental, ou, quando relacionados à criação de algo totalmente
novo, caracterizam startups de natureza disruptiva.
§ 2º As startups
caracterizam-se por desenvolver suas inovações em condições de incerteza que
requerem experimentos e validações constantes, inclusive mediante
comercialização experimental provisória, antes de procederem à comercialização
plena e à obtenção de receita.
RIES (2011, p. 26)[3],
autor do Best-Seller A Startup Enxuta, por sua vez, conceitua Startups como:
"Uma instituição humana designada a entregar um novo produto ou serviço sobre condições de extrema incerteza."
Assim, voltando à resposta da pergunta anterior, o que diferencia
uma Startup de uma Empresa Tradicional é a capacidade
de crescer de forma escalável em um ambiente de grandes incertezas.
Enquanto em uma empresa tradicional, há uma aproximação entre o crescimento das
receitas e das despesas, em uma Startup, o crescimento da receita pode aumentar
em ritmo exponencial em poucos anos, sem que as despesas cresçam no mesmo
ritmo.
Dessa forma, o grande diferencial dessas novas empresas/projetos também
é apresentar algumas características comuns, tais como, inovação, empreendedorismo, validação de um modelo de negócios,
potencial de crescimento, ambiente de incertezas e risco.
Quais
são os principais cuidados que os fundadores de uma Startup devem ter no início
do negócio?
De forma didática, os estágios de crescimento de uma Startup são
separados em 4 (quatro) fases:
Se considera Startups as duas primeiras fases e quando a Startup entra na fase de Negócios/Tração ela é chamada de Scale Up (conhecida como as duas últimas fases na qual a Startup possui rápido e grande crescimento)
Se considera Startups as duas primeiras fases e quando a Startup entra na fase de Negócios/Tração ela é chamada de Scale Up (conhecida como as duas últimas fases na qual a Startup possui rápido e grande crescimento)
a)
FASE de IDEAÇÃO:
Na primeira fase, quando os fundadores ainda estão analisando hipóteses,
buscando soluções e dando os primeiros passos para desenvolver o modelo de
negócios da futura empresa, os cuidados jurídicos são menores. Nessa fase, a
principal preocupação é com os fundadores/futuros sócios.
Nessa fase é comum que algum dos fundadores saia do projeto tendo
em vista que o negócio ainda é uma ideia a ser desenvolvida e provavelmente não
há recursos a serem distribuídos entres futuros sócios.
Nessa fase, a saída de um fundador pode
gerar um conflito irremediável e acabar com o negócio antes mesmo dele se
tornar realidade.
Quais sãos os principais cuidados nessa fase? O principal cuidado nessa fase é com os
próprios fundadores. Uma forma de evitar ou ao menos reduzir conflitos é
através da assinatura de um contrato de intenções entre os fundadores antes
mesmo de constituírem a empresa. Esse documento chama-se Memorando de
Entendimentos.
O que é isso? É um contrato assinado entre os empreendedores com
as características do futuro negócio, direitos e obrigações e um esboço dos
objetivos da empresa. Ou seja, o Memorando de Entendimentos é uma primeira
fase, pré-formação da Startup,
na qual as partes decidem como serão tomadas as decisões até a formalização do
negócio. Nesse documento também é importante estabelecer os percentuais que
cada fundador terá quando a Startup for formalizada e será utilizado como base
para no futuro ser assinado o Acordo de Cotistas.
O que deve constar no Memorando de Entendimentos?
- Definição do percentual de cada fundador
- Papel de cada fundador/tarefas
- Remuneração
- Propriedade Intelectual
- Confidencialidade
- Eventual saída de um fundador
- Resolução de conflitos
Assim, é fundamental estabelecer regras claras desde o início para
evitar conflitos e dúvidas no futuro.
b)
FASE de VALIDAÇÃO
Na segunda fase da Startup surgem novos desafios, tais como tirar
o negócio do papel e ir para o mercado.
Essa fase é uma das mais importantes, pois a validação significa
desenvolver um Produto Mínimo Viável (MVP) e ir para o mercado obter respostas
tais como: O meu produto faz sentido? O mercado quer o meu produto? Dessa
forma, o desafio é testar o produto e conquistar os primeiros clientes.
Quais
são os principais cuidados jurídicos nessa fase? Pode-se dividir em dois:
Normalmente a Startup inicia suas atividades no CPF de um dos
fundadores até que surge o momento de formalizar a atividade. Em geral, nas fases iniciais, as startups
iniciam suas atividades na informalidade até efetivamente serem constituídas
formalmente como empresas. É comum que na segunda fase que os fundadores precisem
criar um CNPJ. Dessa forma, à medida que ocorre a validação do negócio e surgem
os primeiros clientes, chegará o momento de emitir as primeiras notas fiscais e
com isso, a necessidade de análise do momento adequado para a formalização.
Aí
surge a dúvida: Qual é o tipo societário
mais adequado para formalizar a Startup? Em geral, a Sociedade Limitada é o tipo empresarial mais indicado. A lei da
liberdade econômica (Lei número 13.874, de 20 de setembro de 2019) trouxe a possibilidade da criação da Limitada
Unipessoal. Assim, mesmo que a Startup seja constituída por apenas um
fundador, também poderá ser uma limitada. Após a Startup receber investimentos
e os investidores ingressarem no quadro social, ela será transformada em uma
Sociedade Anônima.
Nesse
momento também surgem os primeiros cuidados com a propriedade intelectual,
através do registro da marca no INPI. Além disso, é importante que os arranjos
contratuais prevejam a cessão dos direitos autorais para a empresa, seja dos
sócios ou da equipe.
II.
EQUIPE
a)
Formação da Equipe:
Com
relação à equipe surgem diversos cuidados que devem ser analisados.
Principalmente no que se refere à formação da equipe.
É comum que no início a Startup não tenha recursos para a
contratação de funcionários, como por exemplo, um desenvolvedor. Surge aí a
utilização do Contrato de Vesting
que nada mais do que oferecer um percentual da empresa para atrair um sócio que
é fundamental para o desenvolvimento do negócio. O Vesting está sendo
amplamente utilizado no ecossistema, mas inspira muitos cuidados,
principalmente nas esferas trabalhista e tributária.
b)
Cuidados trabalhistas:
Caso
a Startup opte por contratar um prestador de serviços PJ é fundamental cuidar
para não haver uma relação de emprego disfarçada. Ou seja, o prestador de
serviços não pode ser tratado como um verdadeiro funcionário nos termos do
artigo 3º, da CLT, tendo Subordinação, Pessoalidade e Habitualidade.
c)
Acordo de cotistas
Com relação aos sócios, é nesse momento que surge a necessidade de
aproveitarem o Memorando de Entendimentos e transformá-lo no Acordo de
Cotistas.
CONCLUSÃO
Por fim, é importante salientar que ao longo de sua trajetória, a
Startup irá enfrentar diversos desafios. Nas fases seguintes será necessário
criar contratos para atender os clientes, além de termos de uso e políticas de privacidade.
Além disso, nas fases seguintes (Negócio e Escala) surgem rodadas de
investimentos profissionais, tais como Fundos e Equity Crowdfunding,
necessitando assim, de maior atenção das questões jurídicas pelos sócios.
Ocorre que muitas vezes os sócios focam apenas no crescimento da
empresa, na captação de clientes, no aumento das vendas e relegam as questões
jurídicas para segundo plano. Alguns cuidados básicos podem fazer toda a
diferença, principalmente com relação aos sócios, aos aspectos trabalhistas e
tributários.
[1]
https://economia.uol.com.br/empreendedorismo/noticias/redacao/2019/10/08/crescimento-numero-startups-pais-unicornios.htm
[2]
BRASIL. Lei complementar 167 de 24
de abril de 2019.
*ALEXANDRE CAPUTO
Advogado, sócio
do escritório Caputo Assessoria Jurídica com sede em Porto Alegre-RS,
pós-graduado em Contratos, Direito Imobiliário e Responsabilidade Civil pela
PUCRS, pós-graduado em Direito Público pelo IDC; pós-graduando em Direito
Societário pelo EBRADI. Head de Projetos na Associação Gaúcha de Startups;
Membro da Comissão de Direito da Tecnologia e Inovação da OABRS. Atua na área
empresarial com ênfase em Startups, Contratos e Societário. Palestrante em
direito, tecnologia e inovação, também participa de programas de mentoria para
Startups (ajuda empreendedores a aperfeiçoar seus modelos de negócios e
desenvolver suas habilidades). www.caputoadvogados.com.br
Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.
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