Autora: Gabriela Aisen(*)
O pedido de casamento glamuroso, a emoção de ter o solitário no dedo anular direito e a perspectiva de ser criada uma nova família são as imagens que vem à mente quando um casal anuncia o seu noivado. Em tempos de prevalência de redes sociais e de superexposição, muitos se preocupam em garantir a foto perfeita para registrar este momento envolto em romantismo e magia. No entanto, geralmente se esquecem que o casamento possui implicações patrimoniais substanciais, as quais não devem ser ignoradas.
Isto porque um dos elementos que compõem a Certidão de Casamento é, justamente, o regime de bens, cuja principal finalidade é delimitar as regras que regerão o patrimônio das partes durante o casamento e na hipótese de seu término, seja pelo divórcio, seja pela morte de um dos cônjuges. Inclusive, a publicidade do regime de bens adotado pelas partes é medida necessária para a proteção de credores ou de terceiros que tenham relações patrimoniais com um dos cônjuges, no intuito de que sejam evitadas fraudes e lesões.
Neste sentido, é facultada aos noivos a escolha do regime de bens aplicável ao matrimônio, elegendo, assim, as disposições que regerão os seus respectivos bens depois de casados, contanto que o façam mediante a lavratura de Escritura Pública de Pacto Antenupcial, antes da habilitação para o casamento. Em linhas gerais há 4 (quatro) modalidades clássicas de regime de bens que são elencados pelo Código Civil, a saber: comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, separação total de bens e participação final nos aquestos.
O primeiro deles, o regime da comunhão parcial de bens, é o regime imposto pela legislação. Equivale dizer que esta é a regra geral utilizada para o casal que não estipula nenhuma disposição patrimonial específica para o seu casamento. Sendo assim, como a maioria dos casais não lavra Escritura Pública de Pacto Antenupcial antes de se habilitarem para o casamento perante Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, acabam se casando pelo regime legal sem saber ao certo o que ele disciplina e muito menos as suas consequências na prática.
Via de regra, o regime da comunhão parcial de bens preleciona que aqueles bens que cada um dos noivos detinha antes da celebração do matrimônio permanecem respectivamente como sua propriedade exclusiva, os chamados bens particulares, enquanto que os bens adquiridos onerosamente (tal como a compra e venda) na constância do casamento, independentemente de seu titular, são bens comuns do casal e que, portanto, serão igualmente partilhados se as partes vierem a se divorciar.
Entretanto, há exceções para a comunicabilidade do patrimônio dos cônjuges, as quais estão elencadas no artigo 1.659, do Código Civil. As ocorrências mais comuns de incomunicabilidade patrimonial vislumbradas nos casos concretos são o recebimento de doação ou de herança por uma das partes, os bens de uso pessoal de cada um deles e os instrumentos de trabalho que possuírem. Logo, verifica-se que a comunhão parcial de bens privilegia a solidariedade na vigência do casamento, porquanto não importa no nome de qual dos cônjuges estiverem os bens, eles serão igualmente partilhados entre o casal quando do fim do matrimônio.
O regime da comunhão universal de bens, ao seu turno, era o regime de bens mais frequente nos casamentos celebrados entre as décadas de 1.960 e 1.970, por ser sido o regime legal estabelecido pelo antigo Código Civil de 1.916. Nele, todos os bens de um dos cônjuges passam automaticamente a se tornar do outro, e vice versa, independentemente do tempo da sua aquisição, se antes ou após o casamento. Desta maneira, é formado um condomínio entre os cônjuges, assim como as dívidas de um ou de outro alcançam todo o patrimônio do casal.
Em contrapartida, o regime da separação total de bens blinda toda e qualquer comunicação do patrimônio particular de cada um dos cônjuges, sejam eles adquiridos antes ou durante o casamento. Neste diapasão, somente será proprietário dos bens aquele que detiver a sua titularidade, não podendo o outro se beneficiar deste patrimônio se o seu nome não constar no título aquisitivo, por ocasião do término do matrimônio. Por isso, uma das vantagens deste regime de bens é a liberdade de administração do patrimônio de cada qual, uma vez que não há a necessidade de o outro cônjuge assinar quaisquer documentos dando a sua anuência para estes atos, a chamada outorga uxória do artigo 1.647, do Código Civil.
Consequentemente, em caso de divórcio, não haverá a necessidade de ser realizada a partilha de bens, posto que não há comunicabilidade entre os patrimônios dos cônjuges. Todavia, na hipótese do falecimento de uma das partes, o que encerra o casamento e o regime de bens, o cônjuge sobrevivente (supérstite) será herdeiro do falecido, concorrendo com os seus descendentes ou os seus ascendentes na herança, se houverem, segundo dispõem os artigos 1.829 e 1.845, do Código Civil. Percebe-se, então, que na hipótese de falecimento existirá a comunicabilidade do patrimônio de um dos cônjuges ao sobrevivente, o que não se daria em vida com o divórcio.
Por fim, no regime da participação final nos aquestos há uma clara divisão de regramentos na constância do casamento e após o seu término. Ao longo do casamento, as partes podem livremente administrar os bens de sua titularidade, tal como se estivessem casadas pelo regime da separação total de bens. Contudo, por ocasião da dissolução do matrimônio, serão partilhados os bens aquestos, ou seja, aqueles que foram adquiridos durante o casamento, a partir de uma análise contábil, repartindo-se o referido valor igualmente entre os cônjuges. Muito embora este regime de bens seja interessante, principalmente para casais que exerçam atividade empresária, ele não é muito conhecido e pouco visto na prática, considerando o seu caráter burocrático se houver o divórcio do casal.
Portanto, escolher adequadamente o regime de bens do casamento, por estar alinhado à realidade dos noivos, sopesando as necessidades e as consequências para cada um, é fundamental para a construção de um relacionamento sólido e saudável. Para tanto, o franco diálogo entre as partes acerca de seus respectivos patrimônios, bem como as suas expectativas financeiras é essencial. Por mais que se possa buscar a orientação de um advogado especialista em Direito de Família, é preciso ressaltar que a decisão final do regime de bens a ser adotado no casamento sempre será do casal. Desta feita, superada esta questão, os noivos poderão sonhar com a festa de casamento, o "eu aceito" de cada um e o "eu vos declaro casados"!
*GABRIELA AISEN
-Graduada em Direito pela Universidade de São
Paulo (2018);
-Especialização em Direito de Família pela Universidade de Coimbra (2019) e
-Pós - graduada em Direito de Família e Sucessões pela Escola Paulista de Direito (2021)
Trabalha no Escritório Mellone Etlin Advocacia.
Nota do Editor:
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