quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

A Responsabilidade Objetiva das Revendedoras de Carros Usados


 Autora: Cibele Aguiar Kadomoto (*)



Desde sempre, a melhor marca de carro é aquela: zero quilômetros. Mas, se você quer adquirir um veículo usado, eis algumas dicas que podem ser úteis. Antes de adquirir um carro usado, a crença popular é que basta verificar no site do Detran se está tudo em ordem com o veículo, certo? Errado. No site do Detran não constam informações importantíssimas e que deveriam (isso mesmo, pois nem sempre essas informações são passadas pelos que vendem os carros usados) ser repassadas ao comprador.

Neste tipo de negociação entre revendedora de carros usados e comprador, está presente a relação de consumo entre as partes.

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
Você já sabe a diferença entre sinistro e leilão?

Carro com sinistro é aquele em que o antigo proprietário recebeu indenização pelo veículo. Já leilão tem várias hipóteses:

Leilão de pequena monta significa que o veículo sofreu danos leves e poderá voltar a circular após os reparos, sem registro de sinistro no documento do veículo (Certificado de Registro de Veículo).

Temos o Leilão tipo A, que quer dizer que o veículo não têm grandes avarias (danos) ou por conta de um financiamento que não foi pago, por penhora ou por fazer parte da renovação de frota de uma empresa. A passagem por qualquer destes leilões deve ser informada ao cliente de uma revendedora de carros usados na data da compra.

No caso de o cliente comprar um veículo e no ato não lhe for informado que o veículo tinha passagem por leilão, é direito do cliente requerer a devolução dos valores pagos conjuntamente com as despesas que se originaram do negócio jurídico entre as partes, como encargos de transferência etc.

Também pode o consumidor acionar o judiciário por meio de seu advogado, e requer não somente os valores já gastos que chamamos de dano material, mas também, direitos morais, em decorrência da frustração que a empresa gerou ao consumidor, podendo ser concedido ou não a critério do juiz.

Vejamos o que os artigos 31 e 37 do código de defesa do consumidor fala do dever da empresa quanto as informações no ato da compra:

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

Dessa forma, é uma prática abusiva vender um carro como se novo fosse, ocultando sua origem de leilão, induzindo o consumidor a erro e obtendo vantagem manifestamente abusiva em relação ao real valor do bem em questão.

A passagem pelo leilão não fica registrada em nenhum documento do veículo, por isso os proprietários não têm como saber, e, portanto, para descobrir é necessário pagar para fazer uma perícia veicular ou consultar o histórico do veículo.

No Código de Defesa do Consumidor (CDC), a empresa revendedora de veículos tem responsabilidade objetiva e solidária pelos danos causados ao adquirente do bem que continha impedimento à época do negócio.

A responsabilidade civil objetiva no CDC, prevista nos artigos 12 e 14, é a imposição que obriga a revendedora a reparar os danos causados aos consumidores decorrentes de vício do produto, informações insuficientes ou inadequadas ou, ainda, de falhas na prestação de serviços, independentemente da existência de culpa.

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Agora, se você é comprador e está comprando um carro usado de uma pessoa física, faça pesquisas nas seguradoras e em aplicativos de checagem de sinistros e leilões.

Vejamos uma jurisprudência para ilustrar:

O 1º Juizado Cível do Gama condenou a Smaff Automóveis a indenizar consumidor que, sem saber, adquiriu veículo salvado. A concessionária recorreu, mas a 2ª Turma Recursal do TJDFT confirmou a sentença, de forma unânime.

O autor conta que adquiriu veículo da parte ré, pelo valor de R$ 75.000,00. No intuito de reduzir os gastos com o veículo, resolveu trocar o seguro, quando teve o pleito negado pela seguradora Yasuda Marítima, diante de um sinistro anterior no aludido carro. Surpreso, obteve a informação de que o veículo foi envolvido em sinistro com indenização integral e de que após salvamento, o mesmo fora leiloado. Sustenta a ilegalidade da ocultação dessa informação, visto que ofende o direito do consumidor. Requereu o abatimento de 30% do valor pago pelo veículo e indenização por danos morais.

Processo (PJe): 0700591-78.2016.8.07.0004
Concluindo, se você vai adquirir um carro usado, as buscas pelo histórico do veículo vão além da pesquisa no Detran. Se o vendedor for uma pessoa jurídica, peça as pesquisas que eles fizeram (isso mesmo, eles TÊM que fazer); se for de pessoa física, solicite a pesquisa.

*CIBELE AGUIAR KADOMOTO














- Advogada graduada em Direito pela Faculdade Pitágoras (Abril/2012);
- Pós graduada em Direito Público pela PUC Minas (2017);
-Conciliadora do TJMG desde 2010
-A partir de 2021 está atuando na  Advocacia preventiva;
Contatos:
  -Instagram: @cibelekadomoto
  -WhatsApp: 31 9 9869-1982



Nota do Editor:

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Um comentário:

  1. Informações muito bacanas e úteis. Parabéns a autora. Gratidao

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