O texto a seguir foi apresentado como um discurso no Primeiro Simpósio Anual de Primavera sobre Budismo e Psicologia, patrocinado pelo Departamento de Cultura da Sede de Pittsburgh da SGI-USA, realizado na Universidade de Pittsburgh em 11 de abril de 1992, e publicado na revista Seikyo Times (SGI-USA) em sua edição de outubro de 1992 e na revista Terceira Civilização (BSGI) de julho de 1994( págs. 28 a 33):
Tenho atuado no campo da geriatria nos últimos quinze anos. Em 1983, após seis anos de trabalho na comunidade, vim ao Instituto e Clínica de Psiquiatria Ocidental (ICPO). Fui designado para uma equipe de trabalho na Unidade de Pacientes Internados de Psiquiatria Geriátrica. Durante sete anos, tratamos de mais de mil pacientes idosos com uma variedade de distúrbios, mas a maioria deles sofria ou da Doença de Alzheimer ou de grande depressão. Foi nessa época que me tornei mais e mais interessado no fenômeno da depressão.
Via a depressão atacar pacientes com uma malignidade e totalidade que parecia privá-los da essência de sua humanidade. Vi famílias, que por gerações foram acossadas pelo suicídio e depressão. Vi pacientes que sofriam prolongadamente a perda de pessoas queridas, ou que não conseguiam se adaptar à aposentadoria, ou cujos problemas não solucionados de uma existência de insatisfação haviam finalmente se transformado em reflexão sombria e arrependimento constante. E vi pacientes que ficavam deprimidos sem nenhuma razão, mas sofriam a moléstia tão profundamente quanto aqueles que possuíam bons motivos para tanto.
Em 1989, iniciei treinamento na psicoterapia interpessoal, e em maio de 1990, juntei-me ao Dr. Charles Reynolds e à equipe do Programa de Prevenção da Depressão na Velhice como um psicoterapeuta. Esse programa é destinado ao estudo da manutenção de terapias para a depressão na população geriátrica.
Enquanto trabalhava como terapeuta, fui atraído a explorar totalmente o significado filosófico da depressão conforme esta ocorre na vida humana moderna. Como um praticante budista, considerei importante examinar teorias referentes à doença emocional e de que maneira estas se relacionam com a filosofia budista.
Naturalmente, eu me perguntava se a crença de uma pessoa desempenhava algum papel para prevenir ou aumentar a vulnerabilidade para a depressão. Esta tarde, gostaria de dividir com os senhores algumas observações que fiz a respeito da visão de mundo que está contida nos ensinos de Nitiren Daishonin e que relação esta tem com a depressão. Antes de fazê-lo, penso que seja importante explicar a que me refiro por depressão.
A vida pode oferecer uma infindável série de dificuldades. Algumas vezes, somos capazes de enfrentar de frente esses desafios e superá-los, Outras, eles parecem oprimir-nos. A vida é cheia de altos e baixos. E nós de fato ficamos deprimidos, desanimados e estressados. Contudo, para a maioria das pessoas, isto é uma condição temporária. Ás vezes, basta uma palavra de encorajamento, uma pausa para descanso. algumas vezes, o problema se resolve.
Quando falamos sobre doença emocional, depressão profunda, começamos a verificar que a depressão assume uma vida própria. Um aglomerado de sintomas surge na vida da pessoa, desânimo, distúrbio no sono, perda de apetite, nenhuma energia, pouca concentração, perda de interesse e incapacidade para desfrutar a vida.
Quando isto acontece, nem mesmo uma palavra amável, uma caminhada sob o sol, uma mudança nas circunstâncias são suficientes. O bom senso deixa de prover um remédio e a pessoa parece cair num abismo escuro de desespero e falta de esperança. Porém, também podemos pensar na depressão como um continuum, estendendo-se desde a tristeza transitória de ver os Piratas (1) fracassarem novamente, não conseguindo vencer o Campeonato Mundial, ao tipo de depressão que pode levar a pessoa a concluir que o suicídio é a única solução lógica, sensata e atraente. Independentemente de onde a pessoa possa se encontrar nesse continuum, o ponto importante é que esse sentimento resiste ao tempo, e é caracterizado pela disfunção e infelicidade.
Há muitas teorias da depressão, e aqui estão algumas delas : Existe a teoria tradicional psicanalítica, que se concentra na "perda do objeto" e na "perda da auto-estima". Temos também a explanação mais comum, exposta primeiramente por Karl Abraham, de que a depressão é uma raiva voltada para dentro. Mais recentemente, há uma forte evidência de que a depressão seja uma doença biológica envolvendo desequilíbrios metabólicos no cérebro. O conceito budista de "unicidade da mente e do corpo" (shiki shin funi) foi interpretado principalmente como a "mente" influenciando o "corpo".
O reconhecimento de que os processos biológicos do corpo influenciam a mente também é compatível com a teoria budista. Tive muitas oportunidades para discutir os conceitos budistas com o meu colega Dr. Mark Miller, professor assistente de psiquiatria e diretor médico do Programa de Prevenção da Depressão na Velhice.
Com respeito a shiki shin funi, o Dr. Miller disse :
"Não há mais dúvida de que existe uma relação íntima, recíproca, entre a mente e o corpo. Durante muitos anos, os médicos tiveram muitas experiências curiosas que demonstravam claramente essa ligação. entretanto, não havia nenhuma prova científica. Aqui, no ICPO efetuamos estudos sobre o sono que mostraram nitidamente diferenças na atividade cerebral ente os pacientes deprimidos e os não-deprimidos."
"Sabemos também que viúvas que perderam os maridos recentemente sofrem supressão nos sistemas imunológicos. Só agora estamos começando a entender a sutil interação entre ciclos de sono e insônia, ritmos circadianos, sensibilidade à luz e como estes podem afetar a emoção humana. Nunca houve uma época mais excitante ou esperançosa para estar envolvido neste campo. À medida que a pesquisa nessas áreas progride, torna-se mais aparente que o conceito budista de shiki shin funi continuará a ser validado. "
Os estudos também têm mostrado claramente que fortes fatores genéticos estão envolvidos na depressão. Alguém com um membro da família de parentesco de primeiro grau com depressão é muito mais vulnerável a ela. E embora haja fatores múltiplos em operação, a genética parece desempenhar o papel de maior amplitude. Essa noção condiz com a conceituação budista de que os males da mente são "doenças cármicas". Certamente, nascer numa família em particular, onde a vulnerabilidade é transmitida por meio de genes é um expressivo indicativo do carma.
O que considerei mais intrigante é a teoria cognitiva da depressão, desenvolvida pelo Dr. Aaron Beck, um pesquisador e clínico psiquiátrico da Filadélfia altamente respeitado. A teoria do Dr. Beck sobre a desordem emocional representou uma mudança paradigmática no campo da psicologia. Até os anos 60, a psicologia comportamental utilizava um simples modelo estímulo-resposta. Não havia o reconhecimento de que as variáveis cognitivas como a expectativa, auto-verbalizações, estilo explanatório e predições poderiam desempenhar algum papel no aprendizado e no comportamento humano. Com o advento da escola cognitiva da psicologia, prestou-se mais atenção aos processos do raciocínio do indivíduo, o "diálogo interno" que a maioria de nós chamamos de pensamento.
Esse modelo para a interação da cognição, emoção e comportamento é surpreendentemente similar ao princípio budista dos cinco componentes da vida. Nesse modelo, a vida do indivíduo é considerada uma união temporária dos cinco componentes e segue o seguinte caminho : (1º) Forma; (2º) Percepção; (3º) Concepção; (4º) Volição; e (5º) Consciência.
Em outras palavras, a consciência é vista como um "ambiente" habitado por nossa força vital. Essa consciência, então, habita nossa forma, ou entidade física que possui cinco órgãos sensoriais. Por intermédio dessa forma percebemos o mundo e integramos essa informação com a nossa mente (percepção). Então, criamos noções mentais a respeito daquilo que percebemos (conceito) e, aí, agimos com base naquilo que foi percebido (volição).
De uma perspectiva budista, os problemas surgem quando a vida do indivíduo é afetada pelos três venenos da avareza, ira e estupidez (2). Quando a vida das pessoas é dominada pela avareza, ira ou estupidez, as percepções delas são distorcidas e as ações que efetuam só servem para levá-las a sofrer mais ainda. Essa idéia é, na realidade, parte de uma teoria bastante profunda e esclarecedora do budismo, denominada itinen sanzen (3) . Em síntese, o budismo sempre reconheceu o importante papel da cognição no comportamento humano.
Nesse trabalho com pacientes que sofriam de depressão profunda, o Dr. Beck observou que a depressão primariamente não era um distúrbio de ânimo, mas um resultado de visões negativamente preconceituosas do eu, do mundo e do futuro. Constatou-se que essas "visões distorcidas" ou distúrbios cognitivos, conduzem a manifestações afetivas, de motivação e comportamentais. Uma pessoa propensa à depressão tenderá a ter pouca auto-estima, a enxergar o ambiente como hostil e obstrutivo, e será bastante pessimista com relação ao futuro.
Além disso, segundo o Dr. Beck, todos nós desenvolvemos "esquemas" ou modos de ver o mundo, que são padrões cognitivos duradouros que formaram por meio de nossa interação com o ambiente. Embora muitos sejam resultado de nossa interação na infância com adultos de relevância, também somos influenciados por nossas crenças (religião) e pela nossa "experiência acumulada" (carma). Ademais, esses esquemas operam abaixo da superfície da consciência normal e funcionam mais ou menos como respostas automáticas.
Uma vez ativado, o esquema influencia o processamento de novas experiências por meio da atenção seletiva e da reconstituição de memórias passadas por intermédio da lembrança seletiva. Em outras palavras, enxergamos e escutamos aquilo que queremos enxergar e escutar, e lembramo-nos somente daquilo que queremos lembrar. Deste modo, nossos padrões cognitivos tornam-se auto-confirmantes.
Apesar de não acreditar que a teoria cognitiva seja a explicação para a depressão, ela certamente esclarece um dos caminhos da depressão. Se aceitarmos a idéia de que essas cognições ou pensamentos distorcidos e negativos causem ou perpetuem a depressão, então, pelos propósitos da discussão de hoje, considero importante examinar os conceitos de eu, mundo e indivíduo conforme expressos nos ensinamentos budistas.
Felizmente, existe um amplo volume de escrituras originais de Nitiren Daishonin e seis de suas principais obras foram traduzidas para o inglês (4) . Elas são denominadas de Gosho e consistem em cartas a seus discípulos bem como teses.
Uma das principais razões de essa teoria da depressão ter chamado a minha atenção foi o fato de eu, por acaso, estar estudando "A Essência Real de Todos os Fenômenos" , e ter me deparado com a seguinte afirmação :
"Por eu ver as coisas desse modo, sinto imensurável alegria apesar de ser agora um exilado" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág. 94)
Nitiren Daishonin escreveu essa carta na Ilha de Sado, sob a pior provação possível e, contudo, exprimia imensurável alegria por causa da maneira como via as coisas. Isto me inspirou a examinar as escrituras de Nitiren Daishonin de uma nova perspectiva. Como ele via o mundo, o eu e o futuro ? Como ele explicava o mundo aos seus seguidores ?
Com respeito ao mundo, seria bom observar que as seitas do budismo predominantes naquela época mantinham uma visão essencialmente negativa do mundo. Em primeiro lugar, era universalmente aceito por todos os budistas que os Últimos Dias da Lei (6) já haviam se iniciado. Muitos eruditos budistas interpretavam isto como uma era de grandes sofrimentos, na qual a prática e os ensinos budistas tradicionais perderiam todo poder.
Em segundo lugar, o ,mundo estava realmente tumultuado. Na introdução do "Rissho Ankoku Ron" ("A Pacificação da Terra Por Meio da Propagação do Verdadeiro Budismo") , Nitiren Daishonin declara :
"Nos anos recentes, há distúrbios incomuns no céu, estranhas ocorrências na terra, fome e peste, todos afetando cada canto do império e se espalhando pelo país inteiro ... Mais da metade da população já foi lavada pela morte, e em todas as famílias alguém se aflige." (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. II, pág. 3)
Atravancada por uma visão negativa do mundo, reforçada pelos acontecimentos, a pessoa naturalmente julgaria o ambiente obstrutivo e hostil. determinadas seitas do budismo de fato ensinavam as pessoas que, enquanto estivessem neste mundo, deveriam aprender a aceitar o seu carma e orar ao Buda Amida par que, depois da morte, pudessem encontrar paz e segurança num paraíso. Essa visão de mundo inerentemente negativa no final levaria as pessoas a uma resignação passiva com relação aos males e sofrimentos da vida e à extenuação ainda maior da energia vital.
A visão de mundo de Nitiren Daishonin e muito diferente. Ele não era cego para os incríveis sofrimentos das pessoas comuns, e ele também era consciente das predições lúgubres concernentes aos Últimos Dias da Lei. Contudo, ele optou por uma interpretação totalmente diferente desses fatos e descobriu grande júbilo e esperança neste mundo. Ele disse a um de seus discípulos :
"Para aqueles que se preocupam com a próxima existência, é preferível ser um mortal comum nesses Últimos Dias da Lei do que reis poderosos nos Primeiros e Médios Dias da Lei. Por que as pessoas não acreditam nisso ? Do que ser um sacerdote chefe da seita Tendai, é melhor ser um leproso que recita Nam-myoho-rengue-kyo !" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. III, pág. 93)
Isto porque ele esta convicto de que havia chegado o tempo para a revelação da prática budista que poderia conduzir todas as pessoas à iluminação. No Gosho "A Transformação do Carma Determinado", ele afirma :
"A vida é o tesouro mais precioso de todos. Um dia a mais de vida vale mais do que dez milhões de ryo de ouro ... Um dia de vida vale mais do que todos os tesouros do universo." (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. III, pág. 93) (9)
Nitiren Daishonin oferece-nos uma visão de mundo esperançosa, porém equilibrada. No Gosho "A Felicidade Neste Mundo", ele diz :
"Jamais permita que os impasses da vida o perturbem. Afinal, ninguém pode escapar dos problemas, nem mesmo santos ou sábios ... Sofra o que tiver que sofrer. Desfrute o que existe para ser desfrutado. Considere tanto o sofrimento como a alegria como fator da vida, e continue orando o Nam-myoho-rengue-kyo, não obstante o que aconteça. Então, experimentará a infinita alegria da Lei. " (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. III, pág. 199)
Quando discuti esses pontos com o Dr. Miller, ele observou :
"O budismo ensina o indivíduo a abraçar toda a vida, tanto a boa como a má, o que considero ser uma filosofia bastante correta. Estimula o desenvolvimento de uma resistência para os sofrimentos e provações que todos nós temos de enfrentar algumas vezes. Essa atitude concorda totalmente com as metas da psicoterapia. O terapeuta está sempre buscando meios de abrir os olhos do paciente para novas possibilidades e interpretações para os acontecimentos recentes e também para os do passado. O budismo parece incorporar um tipo cordial de esperança que não se abstrai das dificuldades da vida."
Com base na visão de mundo de Nitiren Daishonin, os membros da SGI recebem uma mensagem bastante poderosa quando encontram uma crise pessoal. Nunca lhes é dito para simplesmente aceitar o carma e esperar uma existência melhor no próximo mundo. Eles sempre são incentivados a agüentar a luta e jamais desistir. A grande recompensa ou benefício da prática budista está em aprender a interpretar os problemas como oportunidades para o crescimento individual e não como uma evidência de quanto o mundo é conturbado, ou de quanto somos inadequados como seres humanos.
Quanto à visão do "eu" de Nitiren Daishonin, verificamos uma perspectiva que habilita o indivíduo a enfrentar todas as dificuldades com grande fé em sua própria capacidade inerente. Nitiren Daishonin encorajava constantemente seus discípulos a superar todos os sofrimentos por intermédio do desenvolvimento de suas próprias naturezas de Buda. Ele sempre identificou o eu como o lócus da força do Buda. No Gosho "Sobre Atingir o Estado de Buda" , ele afirma :
"Nunca deve procurar os ensinos de Sakyamuni ou dos Budas e bodhisattvas do universo fora de si mesmo. O domínio dos ensinos do Buda não o livrará dos sofrimentos mortais a menos que perceba a natureza de sua própria vida." (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág.4)
Na "Carta de Ano Novo" , ele declara :
"Quanto à questão de onde exatamente existem o inferno e o Buda, um sutra diz que o inferno se encontra debaixo da terra e um outro sutra diz que o Buda está no oeste. Entretanto, uma análise mais cuidadosa revela que ambos existem em nossos próprios corpos" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág. 271)
A Dra. Gay Herrington é uma outra colega com quem tive muitas conversas sobre a interação do budismo e a psicologia. Ela é psicoterapeuta na Clínica de Prevenção da Depressão, um projeto-irmão do Programa de Prevenção da Depressão na Velhice.Com referência ao"domínio dos ensinos budistas", ela disse :
"A nossa sociedade pressiona fortemente o indivíduo a ganhar domínio sobre todas as áreas da vida. Espera-se que a pessoa esteja no comando sempre. Todavia, a sociedade não ensina às pessoas como fazer isso de uma maneira sustentável, nem respeita o valor inerente delas. O budismo parece adotar uma abordagem holística que capacita o indivíduo a ser focalizado interiormente apesar de ainda encontrar os desafios diários de viver numa sociedade dirigida materialmente."
O domínio da teoria e técnica psicológica não protege o terapeuta de cometer erros em sua própria vida, nem o torna um bom profissional. Em última análise, o terapeuta deve vir a entender a sua própria vida para ser eficiente. Considero isto essencial também para ser feliz".
A mensagem subjacente da visão budista do "eu" é que o indivíduo nasce com a capacidade inerente para superar todas as dificuldades e alcançar um estado extraordinário de auto-realização. Além disso, não há distinção entre o eu e a realidade última. Mais propriamente, essa distinção é uma simples questão de percepção, apesar de profunda. Como Nitiren Daishonin expressa no Gosho "Sobre Atingir o Estado de Buda" :
"Enquanto iludida, a pessoa é chamada de mortal comum, mas uma vez iluminada, é chamada de Buda" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág. 4)
Em seguida, examinei a visão de futuro. No Gosho "Carta a Myoiti-ama" Nitiren Daishonin declara :
"Aqueles que crêem no Sutra de Lótus são como o inverno; o inverno nunca falha em se tornar primavera. Desde os tempos antigos, nunca ouvi ou vi o inverno tornar-se outono. Nem tenho sequer ouvido de algum crente no Sutra de Lótus que se tornou um mortal comum. " (Escrituras de Nitiren Daishonin, vol. I, pág. 336)
Essa passagem do Gosho tem inspirado seus discípulos há mais de 700 anos e é uma afirmação de franco otimismo.
Na época mais difícil de sua vida, enquanto exilado na Ilha de Sado, Nitiren Daishonin escreveu "O Verdadeiro Aspecto de Todas as Leis" e disse :
"A princípio somente Nitiren recitou o Nam-myoho-rengue-kyo , mas então duas, três e cem seguiram, recitando e ensinando as outras pessoas. Isto acontecerá também no futuro ... Sem dúvida, no tempo do Kossen-rufu toda a nação japonesa recitará o Nam-myoho-rengue-kyo. Isto é tão certo quanto uma flecha mirar a terra e nunca errar o seu alvo. " (Escrituras de Nitiren Daishonin, vol. I, pág. 367)
De uma cabana fria e rude no meio de um cemitério na Ilha de Sado, Nitiren Daishonin conseguia exprimir audaciosamente a sua esperança e convicção de que as gerações futuras abraçariam o seu budismo. A visão de futuro de Nitiren Daishonin não significava aspirar a algum outro paraíso mundano em busca de paz e segurança. Ensina que a vida neste mundo contém potencial ilimitado para a felicidade e realização.
Tenho examinado essa visão do "eu", mundo e do futuro, o que poderíamos concluir da pessoa que abraça tal filosofia de vida ? A Dra. Herrington observou :
"A felicidade tornou-se muito fugidia para muitas pessoas de nossa sociedade. Parece que as atitudes e perspectivas expressas pelo budismo provêem não apenas proteção contra a depressão, mas também podem levar a uma satisfação imensa. O budismo diz ao indivíduo que existe uma forma de experimentar a vida como algo valioso e que vale a pena, incondicionalmente. Também diz que você pode fazer a diferença."
Finalmente, analisemos a questão "Por que estamos presenciando um aumento tão alarmante na incidência da depressão em nossa sociedade ? ". Um outro líder no campo da teoria cognitiva é Martin Seligman, Ph.D., o primeiro da teoria "desamparo assimilado". Recentemente ele publicou o livro Learned Optimism (Otimismo Assimilado), que esclarece o papel do "estilo explanatório" otimista e pessimista nas áreas da depressão, realização e saúde. O Dr. Seligman apresentou algumas opiniões sobre o recente aumento da depressão na sociedade americana, que alguns têm denominado de "Era da Melancolia".
Ele atribui esse acontecimento a dois fatores. Primeiro, há, em nossa sociedade, uma crescente exaltação do "eu" . Na sociedade americana, enfatiza-se cada vez mais que o "eu" seja a fonte de significado, valor, estima e satisfação existencial. O Dr. Selingman refere-se a isto como o "eu máximo". Juntamente com isso, surgiu um senso diminuído de comunidade e um compromisso diminuído para com um propósito elevado. Ele diz :
"A vida dedicada a nada maior do que si é realmente um vida pobre."
Solicitei os comentários do Dr. Miller :
"A nossa sociedade exerce um alto grau de pressão externa sobre o indivíduo -- escola, trabalho, competição, etc. As pessoas se aplicam tanto à busca material que não possuem energia nenhuma para dar atenção aos assuntos interiores. Você pode ser muito bem sucedido em nossa sociedade sem prestar muita atenção ao seu eu interior, até que algo vá mal."
Tenho visto muitas pessoas idosas, quando se deparam com a aposentadoria, problemas de saúde ou a morte do cônjuge, não têm nenhuma perspectiva do verdadeiro valor da vida. Como nunca cultivaram sua vida interior, mesmo quando voltam-se para a religião, é simplesmente por obrigação. Elas fazem tudo o que se espera delas, mas nem assim encontram alguma felicidade. Muitas vezes, estão meramente tentando agradar a igreja. Em contraste, o budismo oferece uma abordagem sistemática do domínio sobre a vida interior e do crescimento construtivo. Isto capacita o indivíduo a suportar o sofrimento e o prepara para as perdas que inevitavelmente acompanharão os anos finais da vida."
Na filosofia budista, acredito que podemos encontrar uma verdadeira esperança e otimismo, com base em nossa busca interior da verdade e em nosso sonho comum de harmonia entre todas as pessoas. Em seu discurso na ocasião da Palestra Anual em Memória de Gandhi em 11 de fevereiro de 1992, o Presidente Ikeda comentou o seguinte a respeito de Gandhi :
"Como ele próprio (Gandhi) disse : 'Continuo um otimista, não que haja qualquer evidência de que a possibilidade de eu conceder esse direito prospere, mas por causa de minha fé inabalável em que esse direito prospere no final.' ... Por ser incondicional, o otimismo dele não conhece beco sem saída ou impasse. Contanto que a pessoa abrace essa convicção, o seu otimismo fornecerá uma promessa de infinita esperança, visão e vitória ... Na tranqüilidade de suas palavras, sentimos uma autoconfiança invencível, o grito triunfante reservado somente às almas que alcançaram o verdadeiro autodomínio."
Tenho a sincera esperança de que, de algum modo, tenhamos revelado a força psicológica inerente no budismo. Gostaria de concluir com um pequeno trecho da poesia de Emily Dickinson que sinto ser apropriada :
Esperança é o seremplumado ---que pousa n'álmaE canta a cantigasem palavrasE nunca pára jamais
Notas:
(1) Piratas : PIRATES, time de beisebol dos Estados Unidos;
(2) Correspondem às nossas ações quando manifestamos os estados inferiores da vida de fome, maldade e animalidade. O budismo nos ensina que da a vida, todos os fenômenos e todas as coisas do Universo possuem 10 estados (ou caminhos, ou mundos, ou condições) de vida, que são : inferno, fome, animalidade, maldade (ou ira), tranqüilidade, êxtase (ou alegria), erudição, absorção, bodhisattva e buda;
(3) Itinen Sanzen : Teoria dos "Três Mil Mundos em Um Único Instante de Vida", desenvolvida por Tientai, em seu livro "Maka Shikan" (Grande Concentração e Discernimento);
(4) No Brasil os Goshos foram publicados, em seis volumes, com o nome de ESCRITURAS DE NITIREN DAISHONIN, pela Editora Brasil Seikyo.
O texto acima foi apresentado como um discurso no Primeiro Simpósio Anual de Primavera sobre Budismo e Psicologia, patrocinado pelo Departamento de Cultura da Sede de Pittsburgh da SGI-USA, realizado na Universidade de Pittsburgh em 11 de abril de 1992, e publicado na revista Seikyo Times (SGI-USA) em sua edição de outubro de 1992 e na revista Terceira Civilização (BSGI) de julho de 1994( págs. 28 a 33).
Ele é de autoria de LEE WOLFSON Psicoterapeuta do Instituto e Clínica de Psiquiatria Ocidental (ICPO) do Centro Médico da Universidade de Pittsburgh. Membro da SGI-USA desde 1972, ele também ocupa cargo de vice-responsável de área Filadélfia (USA) e responsável de regional.
Ele é de autoria de LEE WOLFSON Psicoterapeuta do Instituto e Clínica de Psiquiatria Ocidental (ICPO) do Centro Médico da Universidade de Pittsburgh. Membro da SGI-USA desde 1972, ele também ocupa cargo de vice-responsável de área Filadélfia (USA) e responsável de regional.
Traduzido e Revisado
POR
-Professor Adjunto do Departamento de Estudos Budistas da BSGI (Associação Brasil Soka Gakkai Internacional)
Rianchocosta@gmail.com
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Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.
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