quarta-feira, 11 de julho de 2018

Queda de Passageiro que Fratura a Coluna em Transporte Público. Responsabilidade de quem?


Maria, nome fictício, saiu de casa às 05hs da manhã como fazia todos os dias, subiu a ladeira da comunidade de onde morava e deu sinal ao ônibus que a levaria até o metrô. Passados 5 minutos do trajeto, o motorista freiou bruscamente em uma lombada e Maria veio a cair no solo do ônibus.

Os passageiros que seguiam pediram para o motorista parar e este seguiu seu itinerário. Maria teve fraturas na coluna e perda da capacidade de trabalho. Como trabalhava há 20 anos como Empregada Doméstica, foi afastada pela Autarquia Federal durante 90 dias e, apesar de ainda ter sequelas advindas do acidente, amarga dores horríveis em sua coluna, perdeu a capacidade total laborativa e ainda foi despejada porque sem trabalho não pode pagar o aluguel.



E, agora José? 

Bom, seria caso fictício se isto não ocorresse diuturnamente. Dentre milhares de pessoas que trafegam pela cidade todos os dias, seja a pé, seja de trem, seja em ônibus intermunicipal... ou de casa até o trabalho, em simples condução - não importa. 

Muitos sofrem com a falta de destreza e responsabilidade no trânsito, entre vias, marginais, avenidas, rodovias e linhas metroviárias. Mas, o que o Código Brasileiro do Consumidor tem a ver com isto? E a Constituição Federal ? E o Código Civil? 

Tudo.

A prestação de serviço de Transporte Público, é delegada ao permissionário que executa o transporte e que cobra a prestação do serviço do usuário através de tarifa, sendo esta a sua principal fonte de arrecadação.

A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal.

O que significa dizer que as empresas de veículos de transportes públicos colocados a disposição dos usuários, são objetivamente responsáveis pelos danos que causarem a terceiros usuários ou não do transporte.

Por exemplo, se houver ciclista ou um pedestre atravessando a rua e este for abaulado por um destes ônibus, a responsabilidade pelos danos é destas empresas, e só há a necessidade de se provar o dano, não havendo de se provar a culpa. 

De igual forma o passageiro que se encontra no interior do coletivo, no caso de nossa personagem, e é arremessado ao chão devido a uma freada brusca, pode procurar na justiça o ressarcimento pelos danos causados pela queda, inclusive pleiteando além dos prejuízos relativos ao tempo em que ficou em tratamento, e outras despesas inerentes ao tratamento médico, inclusive o dano moral. 

O Código Brasileiro do Consumidor em seu Artigo 14 insere: "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, responde pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - o modo de seu fornecimento;
II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi fornecido."

Já o Artigo 734 do Código Civil traduz a responsabilidade objetiva, pois “O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade”.

E como salvaguardar seus direito a indenização?

- Uma vez ocorrido o acidente, a empresa de transporte deve ser avisada formalmente, seja por email, seja por carta dirigida pessoalmente (com protocolo) ou outro meio existente que permita que a empresa de transporte de passageiros seja comunicada e que a vítima obtenha provas de que houve a comunicação, como o protocolo por exemplo e 
- Outra providência não menos importante, é comunicar a autoridade policial, e neste caso, pouco importa se o acidente trouxe vitima fatal ou não, desde quedas pequenas, que podem trazer sequelas futuras, até aquelas graves, devem ser comunicadas a autoridade policial, imediatamente. 

Isto porque as empresas de transporte são obrigadas a comunicar a municipalidade ou os órgãos fiscalizadores a ocorrência de acidentes de percurso , para que seja possível a realização de levantamento estatísticos, e investigação acerca do itinerário, se este fato é comum, etc., além de prever responsabilidade, é uma maneira do cidadão contribuir com os meios de fiscalização.

Além do mais, a maioria das permissionárias de serviço público são obrigadas a manter seguro de responsabilidade civil, e o sinistro deve ser comunicado a seguradora para que a vítima seja atendida. O que ocorre é que muitas vezes as permissionárias fogem as suas responsabilidades e deixam os consumidores/passageiros jogados a própria sorte. 

É obrigação do transportador, entregar o passageiro no seu destino, com sua bagagem, incólume, ou seja, sem um arranhão sequer. Este é o contrato de transporte. 

Mas atenção, apesar de se tratar de responsabilidade objetiva, ou seja independente de culpa, o passageiro deve respeitar os avisos de segurança, como por exemplo, não ficar nas escadas dos coletivos, ou não colocar as mãos ou a cabeça para fora da janela. Ou brincar de "surfe"em cima dos vagões de trem.

Se a empresa transportadora provar que não houve o respeito às normas de segurança, não haverá possibilidade de indenização. E no caso de assalto no interior do transporte público ? Quem é o responsável? Uma parte dos legisladores e julgadores entende que trata-se de caso fortuito externo e que não haveria responsabilidade do Estado, por outro lado, tem-se que se o Estado também é o responsável pela segurança pública.

Desta forma, cabe ao ente público a segurança dos passageiros. Havendo entendimento que no caso de furtos e roubos sucessivos, na mesma linha de transporte, haveria a previsão desta ocorrência, e neste caso, a vítima transportada teria direito a indenização. Mas, casos assim devem ser pontualmente analisados. 

Para que seja possível ingressar com uma ação de danos materiais e morais no caso de algum prejuízo, seja ele em relação ao acidente dentro do transporte ou em relação a um furto ou roubo, é preciso que a vítima tome todas as precauções, e mantenha o equilíbrio , em uma situação difícil.

Por exemplo:

- Cuide para trocar telefone com alguém que viu o que ocorreu, seja o acidente, o furto ou o roubo. Se ficou inconsciente, volte ao local do acidente e procure saber entre o comércio local algo a respeito, para que haja provas da ocorrência do acidente. Os condutores dos veículos são obrigados a comunicar aos seus superiores, mas há casos em que não há esta comunicação, o que dificulta a prova quanto a sua ocorrência;

- Vá até a delegacia mais próxima, ou peça para um parente próximo, em seu nome ir, e relate a autoridade policial o que ocorreu, com detalhes, inclusive o itinerário do transporte, e algo que possa identificá-lo, como horário da ocorrência, placa, número do veículo, etc;

-Insista na lavratura da ocorrência. Você também pode telefonar a policia 190 e comunicar o acidente. Uma viatura será levada até o local e um termo circunstanciado será lavrado. Uma cópia pode ser requerida no batalhão próximo ao local do acidente. Mas, não deixe de comunicar a ocorrência; 

- Se possível tire fotografias do interior do veículo, ou peça para alguém tirar fotografias também de alguma escoriação ao marca que ficou em você, além do local do acidente, do coletivo, enfim, colha provas ao seu favor. Caso haja alguma sequela advinda do acidente, peça a Autoridade Policial que providencie a guia para o exame junto ao Instituto Medico Legal e, no dia marcado, vá acompanhado levando todo o seu prontuário médico e exames anteriores. Certifique-se de que o relatado pelo médico que o examinar seja realmente aquilo que aconteceu. Dias depois você poderá retirar o laudo do IML na Delegacia ou no próprio IML; e 

- Se houve alguma sequela relacionada ao acidente, se você se machucou, e teve que ser levado ao hospital, guarde todos os comprovantes de despesas médicas, quais sejam, remédios; exames de imagem; relatórios médicos, etc.. 

Você pode pleitear na justiça a devolução destes valores. Traga o prontuário médico de seu atendimento – este é um direito seu e não pode ser negado. Se o hospital para o qual você foi encaminhado é público, mesmo assim o hospital é obrigado a fornecer seu prontuário médico. 

De posse de todos estes documentos procure um Advogado (a) que poderá lhe orientar acerca das possibilidades de ingressar com uma ação de responsabilidade civil. Esta ação deve ser proposta o quanto antes, a fim de ter esclarecido o acidente e o culpado, no caso o permissionário do transporte público, pode ser condenado a ressarcir todos os danos, inclusive os danos pelo padecimento moral, como decorrência lógica do acidente. 

É uma batalha jurídica, inclusive com a realização de perícia médica para detectar quais as sequelas advindas do acidente. Mas o importante é fazer valer os seus Direitos.

Uma vez confirmadas todas as consequencias do acidente, o judiciário analisará qual será a condenação. 

Da mesma forma, esta ação de responsabilidade civil em nada implica na indenização do seguro obrigatório DPVAT. Pouca gente sabe mas o seguro obrigatório DPVAT pode e deve ser utilizado pelos passageiros do transporte, inclusive por pedestres que foram vítimas de acidentes de trânsito. Você precisará destes documentos para requerer a indenização. O DPVAT vai pagar a vítima, de acordo com as sequelas advindas do acidente, mas exige que a documentação relativa ao acidente e a documentação médica esteja em ordem. 

Há leis para a proteção dos passageiros consumidores do serviço de transporte público – faça valer seus direitos de Consumidor!

POR SILVANA CRISTINA CAVALCANTI













Advogada especializada em Direito do Consumidor;
-Administradora de Empresas e
-Proprietária do Escritório de Advocacia Cavalcanti Advocacia & Consultoria e partner do Escritório de Advocacia Neris Mota Assessoria e Consultoria – Contatos (11) 96136-1216 ou (11) 2574-5522.








Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

Um comentário:

  1. Excelente.Quantas e quantas pessoas passam por situação parecida e não tem conhecimento do procedimento para valer os seus direitos!

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