terça-feira, 14 de abril de 2020

Ilícitos Penais em Tempos de Coronavírus


Autora: Greice Serra(*)


No dia 11 (onze) de março, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou a pandemia do coronavírus (COVID-19).

Iniciada na China como uma doença respiratória, levando diversas pessoas, precipuamente idosos a estado grave.

Ocorre que o vírus se proliferou, algumas nações, principalmente turísticas foram as mais afetadas. Acabaram por não tomar as medidas preventivas devidas e atualmente registram altos índices de pessoas infectadas e casos fatais (óbitos).

Por enquanto, o Brasil encontra-se no início do isolamento social para parcela da população. Atualmente o país registra mais de 22.000 infectados e mais de 1.300 óbitos, principalmente localizados na região sudeste.

Assim como em qualquer nova situação, surgem os novos fatos sociais, destarte fatos que possuem incidência no plano jurídico e que podem ser classificados como atos ilícitos quando são caracterizados por infrações legais ou lesionem direito de outrem.

De acordo com jornais televisivos e sites informativos, agentes, em virtude da situação supracitada e da demanda, estão comercializando produtos diversos ou adulterados do álcool em gel, enganando a população. Resta evidente neste caso o delito do art. 273,§1º, do Código Penal, sendo a principal vítima neste caso a saúde pública.

Ressalta-se que se trata de crime hediondo. Em primeiro momento não vislumbra-se manifesta violação ao princípio da proporcionalidade no tocante virtude da nocividade da conduta e dos males que podem acontecer em virtude da falsificação ou substituição de produto medicinal/terapêutico. Mas há o que se considerar quanto à possível violação e inconstitucionalidade em face ao tempo da pena que é considerada por muitos juristas como extensa demais, que é reclusão de 10  a 15  anos, e multa. Uma verdadeira discrepância.


Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:
§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.
§ 1º-A - Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico.
§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:
I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente;
II - em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior;
III - sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização;
IV - com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade;
V - de procedência ignorada;
VI - adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.


Quanto ao princípio da proporcionalidade faz-se a ênfase segundo Alberto Silva Franco[1]

O princípio da proporcionalidade, em sentido estrito, obriga a ponderar a gravidade da conduta, o objeto da tutela e a conseqüência jurídica. Trata-se, para empregar expressões próprias da análise econômica do Direito, de não aplicar um preço excessivo para obter um benefício inferior: se se trata de obter o máximo de liberdade, não poderão ser cominadas penas que resultem desproporcionadas com a gravidade da conduta

Prosseguindo no âmbito do direito penal, mas focando em sentindo não fraudulento, ou seja, nos limites atinentes ao cidadão médio, salienta-se a Portaria nº 5 de 2020 editada por Sergio Moro e Mandetta no dia 17/03/2020 (em consonância à lei nº 13.979/2020) e publicada no Diário Oficial da União e seus reflexos para os brasileiros.

Algumas medidas descritas na Portaria devem ser obedecidas sem depender de ordem judicial, tais como a detenção e contenção pelo uso das forças policiais, sem verificação de ilegalidade a priori.

A pessoa que descumprir ordens médicas de quarentena, isolamento ou internação pode responder às penas do art. 268 do Código Penal que trata sobre a infração de medida sanitária preventiva cuja pena é detenção de 1  mês a 1 ano e multa. 

Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.


Segundo classificação doutrinária de Cezar Roberto Bitencourt[2]: "Trata-se de crime comum, formal, de perigo abstrato e coletivo, comissivo ou omissivo, unissubjetivo, doloso." 

Ademais, o sujeito também ainda pode incorrer no crime de desobediência do art. 330 do Código Penal cuja detenção é de 15 dias a 6  meses e multa. 

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.

Importante frisar obviamente que "o crime de desobediência é subsidiário e somente se caracteriza nos casos em que o descumprimento da ordem emitida pela autoridade não é objeto de sanção administrativa, civil ou processual" (STJ, AgRg no AREsp 699.637/SP). 

O art. 5º da Portaria nº 5/2020 dispõe literalmente sobre inocorrência nos dois delitos acima caso não seja verificado crime mais grave:

Art. 5º O descumprimento da medida de quarentena, prevista no inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 13.97, de 2020, poderá sujeitar aos infratores às sanções penais previstas nos artigos 268 e 330 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, se o fato não constituir crime mais grave.
Parágrafo único. A compulsoriedade da medida de quarentena depende de ato específico das autoridades competentes, nos termos do §1º do art. 4º da Portaria 356/GM/MS, de 2020.


Um caso verídico ocorreu no dia 01/04/2020: a prisão de duas pessoas que lideravam carreata a favor do Presidente em Belém do Pará, possibilitando aglomerações, em contrapartida às medidas de combate ao COVID 19, contrariando os dispositivos do art. 268 e 330 do CP, apesar de terem se comprometido a não cometer o delito em Termo Circunstanciado de Ocorrência.



REFERÊNCIAS


[1] FRANCO, Alberto Silva. Crimes Hediondos. 2ª edição. Revista dos Tribunais. São Paulo: 2005, p 668 e

[2] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte especial 4 – 5ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2011, p. 298.

GREICE PAULA MIRANDA SERRA - OAB/PA nº 24.294 














-Graduação em Direito pela Universidade da Amazônia (UNAMA) (2015);
-Pós-Graduação em Direito Público pelo Complexo Educacional Renato Saraiva(2019);
-Áreas de atuação: Civil, Penal, e Administrativo;
-2016 – até a presente data: Advogada e Assessora Jurídica da Empresa CS Engenharia Ltda.
 -Endereço profissional: Trav. 14 de abril, nº 2031 - Guamá - Belém/PA;



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