De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, no ano de 2022 houve o crescimento de 0,9% da população carcerária, ou seja, cerca de 830 mil pessoas se encontram em cárcere. Do numerário expressivo que compõe a população em cárcere, 43,1% são pessoas com até 29 anos de idade e 68,2% desta massa são pessoas pretas. Com base no que vem sendo discutido juridicamente falando, não se mostra assombroso os números apontarem que 70% da comunidade carcerária é preta, tendo em vista que sob o escopo do perfilamento racial, o fenótipo está condicionado a interpretação policial para designar uma pessoa como suspeita. Dessa forma, o artigo versará sobre o conceito do perfilamento racial, bem como tal premissa destoa dos direitos fundamentais previstos à Constituição da República de 1988.
Não raro é presenciado no cotidiano a polícia exercendo o papel preventivo e repressivo através de abordagens. Possivelmente passa desapercebido pelo olhar social, o motivo pelo qual o(a) policial efetuou a abordagem em determinada pessoa.
Nesta linha, ao se questionar porque tal indivíduo foi revistado pela guarda policial, a primeira resposta que vem em mente é que a esta pessoa estava em atitude suspeita no entendimento da polícia. Todavia, é importante questionar o seguinte: O que faz uma pessoa ser vista como suspeita pela corporação policial? Há quem diga que durante a formação, o(a) policial é treinado para identificar "um padrão de indivíduo suspeito".
Assim sendo, tal padrão seria baseado em que? Vestimentas? Formas de andar? Cor de pele? O critério de definição de pessoa suspeita está na mente de cada policial? Tais apontamentos passaram a surgir a partir do momento que nos autos de prisão em flagrante passaram a conter a cor da pele da pessoa que foi abordada, sendo o fenótipo inserido como um possível padrão de pessoa suspeita.
A partir de tal análise, chega-se no termo "perfilamento racial" utilizado para denominar condutas policiais que versam em julgar como suspeitas pessoas pretas. Entretanto, com base nos direitos fundamentais e humanos que tutelam os cidadãos, constata-se que a prática do perfilamento racial lesa tais preceitos, de modo que a discussão sobre esta temática se tornou crescente, estando em julgamento o Habeas Corpus 204280 em voga, visto nascer deste um possível precedente para anular provas fundadas a partir de filtragem racial.
Neste espeque, o presente artigo tem como escopo elucidar o que se trata o perfilamento racial e sua aplicação no meio policial e o que entende o ordenamento jurídico acerca desta prática corriqueira.
Mas afinal, o que é Perfilamento Racial?
O “Perfilamento Racial” é a expressão utilizada para caracterizar a abordagem policial fundada em questões de etnia, descendência e cor.
Nesta senda, também podemos definir o "perfilamento racial" como a associação sistemática de um conjunto de características físicas, comportamentais ou psicológicas com delitos específicos e seu uso com base para tomar decisões de aplicação da lei.
No ano de 2015, a relatoria especial da Nações Unidas versou acerca das formas atuais de discriminação racial, apontando assim, o perfilamento racial como um ato frequente exercido por pessoas da segurança pública.
Imperioso destacar que embora essa temática esteja em voga atualmente em virtude o julgamento do Habeas Corpus 208240, esta vem chamando a atenção das instituições, como Judiciário e Nações Unidas há algum tempo.
O Conselho Nacional de Justiça, recentemente lançou o resultado da pesquisa nomeada como "Reconhecimento de Pessoas", contendo uma análise de informações prestadas por guarnições policiais de todo o país.
Dessa pesquisa, 684 unidades policiais do Brasil informaram que possuem "álbum de suspeitos", de modo que 216 guarnições responderam que frequentemente exibem o mencionado álbum para vítimas e testemunhas, como forma de identificar a pessoa que praticou possível ato ilícito.
Ao questionar de que forma tal álbum de suspeitos é criado, as informações são as seguintes:
Das 1657 instituições policiais que responderam:
a) 299 informaram que o álbum é composto por fotos de condenados da justiça;b) 375 responderam que o álbum advém de fotos extraídas das abordagens policiais;c) 361 informaram o álbum possui fotos retiradas de bancos de dados públicos;d) 348 responderam que o álbum é criado através de fotos das redes sociais e outras mídias;e) 27 não souberam informar;f) 247 informaram que o álbum é criado através de outros meios.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
1. A busca pessoal independente de mandado judicial deve estar fundada em elementos concretos e objetivos de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, não sendo lícita a realização da medida com base na raça, cor da pele ou aparência física;2. A busca pessoal sem mandado judicial reclama urgência para qual não se pode aguardar uma ordem judicial;3. Os requisitos para a busca pessoal devem estar presentes anteriormente à realização do ato e devem ser devidamente justificados pelo executor da medida para ulterior controle do Poder Judiciário.
Bacharel em Direito pela Doctum – Campus, João Monlebade/MG.
Pós-Graduada em Advocacia Criminal pela Escola Superior de Advocacia (ESA/MG).
Pós-Graduanda em Mercado Financeiro e de Capitais pela PUC Minas.
Advogada atuante desde 2019.
Membra da Comissão de Promoção de Igualdade Racial e Diretos Humanos da OAB/MG Subseção João Monlevade/MG.
Membra da Comissão de Promoção de Igualdade Racial da OAB/MG Seccional de Minas Gerais.
Membra da Associação Mulheres em Ação de João Monlevade/MG
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