Autor: Rômulo Ovando (*)
Inicialmente, no tocante à prevenção de eventos adversos, destaca-se a atuação do advogado no exercício do gerencialmente legal dos aspectos voltados à saúde. O profissional especializado possui conhecimento técnico acerca do ordenamento jurídico e fica responsável por elaborar os regimentos a serem seguidos pelos que exercem seus ofícios em estabelecimentos de saúde. O setor jurídico é responsável por acompanhar as novas legislações específicas, visando minimizar os possíveis eventos adversos e outras questões relacionadas às queixas e processos dos usuários. O objetivo é o de garantir a excelência dos préstimos médico-hospitalares e de oferecer aos pacientes a segurança de um atendimento zeloso e de alto padrão de qualidade.
Apesar disso, o conjunto de processos dos usuários tende a sobrecarregar o setor jurídico das unidades hospitalares. De acordo com Carneiro et al (2011), estudos feitos em unidades de saúde internacionais e no Brasil têm demonstrado que grande parte dos incidentes adversos poderiam ser evitados ou ao menos mitigados, se fosse adotado o gerenciamento legal de riscos. Portanto, além da gestão hospitalar com base na política de humanização e do cuidado integral, cada vez mais se torna necessária a existência da gestão legal do risco no ambiente hospitalar.
Para um autêntico modelo de gestão de risco, segundo esses autores, torna-se imprescindível o emprego de métodos, procedimentos, protocolos e obrigações que sejam rigorosamente cumpridos. Eles devem permitir o monitoramento dos atendimentos realizados no hospital, do mais comum ao mais complexo. Entre as principais normas e condições a serem estabelecidas, destacam-se, como a mais relevante, as que contribuem para elevar os padrões de qualidade no atendimento ao paciente (CARNEIRO et al, 2011).
Esse é o compromisso lógico e primordial de qualquer entidade hospitalar. Nesse processo de gestão, são os administradores hospitalares (presidente, funcionários, médicos, dentistas, assistentes sociais, psicólogos, advogados, administradores, etc.) que ficam responsáveis pela elaboração de normas e por estabelecerem condições, visando minimizar ao máximo possíveis intercorrências.
A gestão legal diz respeito a uma forma de gestão do departamento jurídico dentro do estabelecimento baseada em estratégias e táticas, assim como na operacionalização desse processo de forma planejada, mediante rotinas internas bem estruturadas. De acordo com Tozzi & Selem (2013) esses três níveis de atividades (estratégico, tático e operacional) são pensados em função de duas modalidades de público: o interno e o externo.
No ambiente hospitalar, em princípio, seria para os profissionais da saúde (interno) e para os usuários dos serviços do hospital (externo). Nesse caso, várias ferramentas e modelos de gestão são emprestados da administração e mesmo de outras áreas, na condução do processo de gestão legal. Magalhães (2014) refere-se ao departamento jurídico como um setor que apresenta interface com praticamente todos os departamentos da organização hospitalar, o que lhe atribui maior possibilidade de visão integral da estrutura e da dinâmica organizacional.
Essa peculiaridade lhe atribui a possibilidade de atuar com pensamento e ação estratégica dentro do hospital. Isso pode incluir uma ação rápida frente às diversas questões que afetam a unidade e que podem envolver o acesso a uma nova legislação ou mudanças na estrutura administrativa. Portanto, esse departamento constitui peça fundamental para auxiliar os demais departamentos, desde que os mesmos sejam previamente mapeados por esse setor. Ele apresenta as melhores condições para desenvolver uma visão estratégica e operacional dos serviços prestados pela organização hospitalar.
A adoção da gestão legal pode contribuir para diminuir certas condutas dos profissionais que prestam atendimento, seguindo a orientação descrita na legislação, para, por fim, gerenciarem riscos supervenientes e determinarem uma política de apreciação dos quesitos e situações que sejam prováveis de insucesso. Certo é que uma boa gestão, bem organizada e implantada de forma sistêmica, consegue prever e dirimir problemas que poderiam gerar consequências negativas à organização e, sobretudo, aos usuários de seus serviços.
Como é possível depreender, a gestão legal envolve, entre outros, a gestão do risco, definida pela Norma Brasileira NBR ISO 31:000, como sendo as atividades coordenadas para dirigir e controlar os riscos da organização. No caso da saúde, tal gerenciamento seria utilizado como uma política interna, não só para oferecer maior estabilidade da segurança dentro do hospital em relação aos vários tipos de incidentes, mas, sobretudo, para garantir a segurança do usuário.
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa (2017, p. 9), "a gestão do risco está intimamente relacionada ao estabelecimento de uma cultura de segurança, que pressupõe o aprendizado com as falhas e a prevenção de novos incidentes relacionados à assistência à saúde". Nesse caso, a meta da gestão de risco, em ambiente hospitalar, consiste na prevenção de agravos e incidentes que naturalmente são imensuráveis.
Para que se alcance a prevenção, é preciso que os profissionais da saúde e administradores se conscientizem do papel das regras estrategicamente planejadas, de modo a evitar que eventos danosos e adversos possam ocorrer. Nos dizeres de Brandão, Brito & Barros (2018), a identificação dos riscos é importante para se fazer a prevenção de eventos adversos e impedir que o usuário sofra algum dano.
Trata-se, portanto, de um modo para se garantir um atendimento mais humanizado e seguro. Pode-se acrescentar a isso outras finalidades, tais como: a prevenção de incidentes em vários tipos de ambientes hospitalares, a maior segurança ao profissional da saúde (médicos, enfermeiros, técnicos, farmacêuticos, dentistas) no exercício de suas funções, a utilização constante do TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido), a redução da judicialização da saúde e a imprescindibilidade da atuação do profissional advogado, devidamente qualificado.
A gestão de riscos, além de evitar erros e prejuízos (morais, físicos, financeiros), serve para oferecer serviços de saúde de alto nível. Balestrin (2003) lembra a importância em consolidar o uso de protocolos a serem rigorosamente seguidos, no sentido de favorecerem o rastreamento das diversas formas de atendimento realizado, desde as mais simples até as mais complexas.
A Segurança do Paciente implica a redução do risco de danos causados pelos serviços da assistência à saúde no ambiente hospitalar. Em função da grande ocorrência de incidentes relacionados com a assistência, foi criado em 2013, o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), com o objetivo de "promover e apoiar a implementação de iniciativas voltadas à segurança do paciente em diferentes áreas da atenção, organização e gestão de serviços de saúde, por meio da implantação da gestão de risco e de Núcleos de Segurança do Paciente nos estabelecimentos de saúde".
Por fim, além do setor jurídico, que possui importância ímpar para a diminuição das chances de eventos prejudiciais, todos os profissionais que exercem seus ofícios nos estabelecimentos de saúde devem cumprir a política imposta, levando-se em consideração que todos possuem responsabilidades, respondendo consoante o atendimento prestado ao usuário.
Referências Bibliográficas
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* RÔMULO GUSTAVO DE MORAES OVANDO
-Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica Dom Bosco;
-Mestre em Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco;
- Especialista em Direito Médico e Hospitalar pela Escola Paulista de Direito/SP;
- Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito/SP;
- Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus;
-Doutorando em Direito pelo Centro Universitário de Brasília;
-Advogado no Escritório Jurídico Moraes Ovando Advogados; e
-Professor na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e FaPrime.
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Contatos: 67 99238 5742/ 67 3382 0663
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