segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Carlos


 Autor: Benedito Godoy Moroni (*)

Esta é uma história com fatos reais. Alteramos as identidades a fim de evitar eventuais constrangimentos.  

Os negócios corriam magnificamente bem para Afonso, próspero fazendeiro proprietário de vasta plantação de café no Paraná. Ele era viúvo e cuidava dos dois filhos, Carlos dois anos mais velho que Antônio. Carlos, com 11 anos, completou o então curso primário, atual ensino fundamental, e em seguida fez o ginasial da época que hoje também faz parte do ensino fundamental. Antônio, da mesma forma, dois anos depois de Carlos, cursou o primário e o ginasial. Entretanto, quanto aos estudos, a semelhança entre os dois parou aí. Enquanto Antônio continuou seus estudos, cursando o então científico, hoje ensino médio, prosseguindo e entrando no curso de engenharia, Carlos não quis mais estudar, preferia ficar em casa lendo livrinhos de Bang Bang.

Nessa época aconteceu no Paraná uma das mais fortes geadas ocorridas na região, levando devastação à plantação de café de Afonso.

A solução encontrada por Afonso, na época, foi vender as terras, mudar-se e iniciar outra atividade que não mais o sujeitasse às imprevisíveis alterações climáticas. Desta forma tornou-se empresário no segmento de transporte de cargas fluviais em um rio que comportava tal empreendimento.

Carlos, todavia, não se preocupava com o futuro, pois sabia que seu pai, para a época e local, ainda tinha muito dinheiro e um negócio próspero. Assim, o rapaz raciocinou que não precisaria continuar os estudos nem, muito menos, trabalhar. Sua “atividade” seria ler revistas e livretos com histórias de faroeste e desfrutar da boa vida. 

Com vida dotada de todo conforto, Carlos logo estava com seu carro próprio.

Seu "namorico" com Clara fica sério. Vem o noivado e pouco tempo depois o casamento. Carlos continua a não ter atividade econômica alguma, vivendo em tudo de ajuda financeira do pai. Logo no primeiro ano de casados, Clara engravida. Poucos dias próximos ao previsto para o parto, Carlos arranja uma viagem para fazer. Quando os primeiros sinais de que o bebê está para nascer se fazem sentir, Clara vai ao hospital e, sem Carlos a seu lado em momento tão especial, dá à luz o primeiro filho do casal. Mesmo informado do nascimento, Carlos só retorna dias depois, sem justificativa alguma para o fato de não ter voltado antes.

Nessa época os negócios do pai dele sofrem severa fiscalização, levando inclusive ao fechamento da empresa e perda de praticamente todo o patrimônio de Afonso. Já Carlos tem que contentar-se com a renda do trabalho de Clara como professora, a qual desdobrava-se aumentando fazendo mais atividades resolver o problema do sustento da família.

Carlos, por sua vez, vive de negócios eventuais, ocasionais e esparsos. Com isto, seu verdadeiro gênio aflora: se alguém lhe é agradável, desdobra-se em trata-la bem. Mas, por outro lado, se algo ou alguém o desagrada, descarrega toda sua irritação e brutalidade.

Clara, vendo que esta situação estava levando o casamento a um impasse, achou que um segundo filho melhoraria o comportamento de Carlos. Assim, ela procura ficar grávida imaginando que, em consequência, ele mudaria para melhor.

Nasce o segundo filho, também com Carlos longe do local de nascimento no dia do evento e sem demonstrar qualquer sentimento por não estar com Clara nessa ocasião tão importante para um casal.

Nem o nascimento do segundo filho mudou as atitudes e ou as maneiras de Carlos.

A situação entre o casal foi deteriorando a passos largos. Para complicar, Carlos vendeu, sem Clara saber, todas a joias que ela possuía. Quando ela notou, ele simplesmente alegou haver vendido para poder manter os negócios, os quais não nunca contava quais eram.

Certa feita, enquanto Clara dormia, ela acorda com Carlos tentando tirar-lhe o anel solitário, última joia que ela ainda possuía.

O casamento vai desmoronando, a passos rápidos, e não muito tempo depois chega ao desfecho previsível: separam-se oficialmente.

Carlos muda-se para outro estado distante de Clara e dos filhos. Suas atividades levam-no, com o passar dos anos, a conhecer no Mato Grosso, Rondônia, Amazonas Pará e Acre, certos "serviços" que existiam por lá. Ele aprende e aprimora-se em um deles: "limpar fazenda"b de terceiros.

Esse "serviço" consistia em eliminar eventuais invasores de propriedade particular. A "atividade" exigia que todos os ocupantes, sem exceção, fossem eliminados com a execução dos mesmos. Todos: marido, mulher, filhos e agregados tinham que, isto a fim de não deixar ninguém que pudesse tornar-se depois um "vingador".

Após a realização de um desses serviços, recebe como pagamento uma fazenda com uma centena de alqueires, coberta de madeira de lei.

O tempo passa. Mesmo sabendo que operações extrativas ilegais em áreas florestais remotas, como o corte de qualquer árvore comercialmente valiosa e independentemente de quais árvores sejam protegidas por lei, isto não preocupou a Carlos. Algum tempo depois, a fazenda recebida por ele, teve praticamente toda sua madeira de lei cortada e pronta para comercialização ilegal, tudo a revelia e arrepio da lei.

Nesse ínterim, em um dos contatos telefônicos com o filho mais velho, então já menino, soube deste em uma briguinha com um coleguinha, este batera nele. Incontinenti pegou seu aviãozinho particular e com dois capangas foi de Cuiabá até a cidade em que o filho morava. Chegando na casa de Clara pediu ao menino para levá-lo até onde morava o garoto com quem brigara. Lá chegando, entrou na casa com seus capagangas e o filho. Imperativamente, de arma em punho, mandou o pai do garoto trazer à sala o garotinho. Isto foi feito e, quando o garoto estava na frente deles, Carlos ordenou a seu filho que batesse no garoto e virando-se ao pai do mesmo disse para ele não dar um pio, ficar  sentado e calado. O filho de Carlos, assustado, tentou argumentar que não precisava isso, que tudo já estava no passado e que agora estava tudo bem. Entretato Carlos ordenou, de forma inquestionável, que o filho batesse no garoto e que o garoto não reagisse. Não adiantou o filho de Carlos chorar e pedir para não fazer isso: no fim teve que bater no garoto, sob os ohos aterrorizados do pai do mesmo.

Feito isso, Carlos levou o filho para a casa de Clara. Ato contínuo, voltou para ao campo de aviação onde deixara seu aviãozinho, partindo em seguida de volta.

Dias depois, quando precisava retornar à fazenda para ultimar  os preparativos para a venda da madeira cortada, foi acometido de forte problema renal. Entretanto, como era imperioso ir à fazenda, contratou um motorista para levá-lo. E isto foi feito.

Dois dias depois, Clara recebe chamado da polícia informando-a que uma tragédia ocorrera e Carlos estava morto.

Ela, com os dois filhos, viajam até Cuiabá.

Mesmo não sendo mais a esposa de Carlos, Clara, em consideração aos filhos que tivera com o mesmo, providencia o sepultamento.

A polícia conta-lhe que a tragédia acontecera perto da fazenda de Carlos. Ao investigar uma denúncia anônima, os policiais haviam encontrado o motorista contratado morto com um tiro na cabeça, a cerca de 50 metros da camioneta de Carlos, a qual estava em frente a uma árvore tombada na estrada, fato que obrigou que o veículo a parar. Carlos, por sua vez, recostado no tronco da árvore jazia morto com um tiro na testa, vários disparos pelo corpo e todo retalhado por golpes de facão nas pernas.

O criminoso não foi descoberto e nem o motivo de tamanha barbárie, mesmo depois de investigações.

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Voltando no tempo...

Zé Antonio e Ciça viviam da agricultura, trabalhavam na lavoura como trabalhadores para proprietários rurais. Tinham quatro filhos: Clorindo, Pedro Carlos, João Pedro e Quinca.

Clorindo, o filho mais velho, curiosamente, nascera diferente dos irmãos. Era magricelo, todo sardenton e cabelos avermelhados, fato que o tornava, entre os colegas, motivo de brincadeiras e tentativas de apelido como Foguinho, Vermelho ou até Pimentinha.

Com o tempo, sabendo que haviam terras em Mato Grosso que os donos não cuidavam, deixando-as praticamente abandonadas, Zé Antonio e Ciça resolveram, com os filhos, partir em busca de um lugar assim, no qual roçaria o mato para depois plantá-lo e viver desse trabalho para o sustento da família. Em conversa com outros lavradores ficou sabendo que perto da divisa com a Bolívia haviam terras assim. Informou-se direito como chegar a esse local. Obtendo tais informações reuniu seus poucos pertences e, com a família, mudou-se para lá. O lugar era ermo, mas não o impediu de construir um barraco para eles. Em seguida Zé Antonio iniciou sua lida. Muito trabalho, esforço e fadiga, mas promissor. Tratava a terra com todo carinho, como se dele fosse.

Clorindo, entretanto, vendo que na região havia muito garimpo, raciocinou que com a lavoura sobreviveria, mas ele queria mais e esse mais poderia acontecer se partisse para o garimpo. De nada adiantou Zé Antonio aconselhá-lo a ficar. Pediu a benção dos pais e despediu-se deles, bem como dos irmãos, prometendo que voltaria a visitá-los quando tivesse um dinheirinho.

Clorindo vagou até achar um garimpo onde aprendeu a trabalhar. Era uma tarefa extenuante, mas ele aprendeu bem e permitiu-lhe iniciar a amealhar economias, mais do que ganharia sendo lavrador como seus familiares.

Passado certo tempo, resolveu que já era a hora de visitar  os pais e irmãos. Alegre e feliz, comprou umas lembrancinhas para presentea-los. Voltou ao local no qual deixara seus familiares. Lá chegando, todavia, teve a amarga notícia: um matador e seus capangas haviam executado todos, seus pais (Zé Antonio e Ciça) e seus irmãos (Pedro Carlos, João Pedro e Quinca) a sangue frio. Não bastasse, o matador colocou os cadáveres no barraco e em seguida ateou fogo no mesmo, praticamente reduzindo as vítimas a pó.

Clorindo ficou chocado. Não se conformava, pois seus pais e seus irmãos eram pessoas bondosas e sem maldade alguma. Só queriam sobreviver e suas vidas foram ceifadas cruel e impiedosamente.

Primeiro precisava descobrir quem fora o matador e onde encontrá-lo. Procurou informar-se na região se alguém sabia de algo  que pudesse levá-lo até o assassino. A procura mostrava-se frustrante, pois alguns nada sabiam e outros que sabiam de algo, contudo, não ousavam falar. Isto foi assim até quando voltou para o garimpo.

O destino dá muitas voltas. E numa dessas, Dito Preto, colega de garimpo, em uma conversa com Clorindo, conta que ouviu dizer que um tal de "Carlos", costumava fazer esse tipo de "serviço" por aquelas bandas do ocorrido.

Clorindo procura de todas as maneiras e, após muita pesquisa, consegue finalmente chegar até Carlos, o chefe da gangue que cometeu a chacina de sua família.

Descobre que Carlos está preparando uma carga de madeira ilegal para ser vendida. No domigo fica sabendo onde Carlos morava. Agora precisava ver como era Carlos. Nas imediações do endereço Clorindo, escondido, fica espreitando. Em dado momento vê Carlos saindo e tomando um taxi. Isto foi o bastante para guardar a imagem do malfeitor. O passo seguinte era saber quando ele poderia por em prática sua vingaça. Com toda frieza Clorindo sai de seu esconderijo e toca a campainha da casa de Carlos. Quem o atende é a empregada. Dizendo que estava a procura de Carlos, a empregada informa-o que ele acabara de sair para comprar uns remédios, mas não sabia quando ele voltaria. Clorindo, gentilmente, pergunta-lhe se ela saberia se ele estaria em casa na próxima semana. Ela, inocentemente, informa-o que ele iria viajar naquela quinta feira para sua fazenda e não sabia direito quando ele voltaria. Clorindo agradece e despede-se.

Clorindo,após descobrir o local das terras de Carlos, na quarta feira já está de tocaia na estrada perto da entrada da fazenda de Carlos. O primeiro passo foi a preparar o local, pelo qual praticamente só dava acesso a Carlos, derrubando uma árvore à machadadas para obstruir a estrada. A árvore caída obstrui completamente esse ponto que fica depois de uma curva. Clorindo depois disso, de tocaia, passa a noite acordado. Não consegue nem descansar e o tempo parece não passar. Como o caminho era praticamente deserto, ele estava preparado, armado com uma pistola, um rifle e um facão, além do machado.

Ainda não amanhecera quando Clorindo percebe o clarão de faróis aproximando-se. Ele permanece escondido à beira da estrada. O carro faz a curva e, vendo a árvore caída, freia bruscamente o veículo. Clorindo atira nos dois pneus laterais furando-os. O carro permanece imóvel, o motorista abre a porta e assustado começa a correr. Mas não vai muito longe. Clorindo mira cuidadosamente e atira, acertando a cabeça do motorista que desaba morto na estrada. Completamente escondido o atirador grita para Carlos que não reaja e saia do carro com as mãos para cima. Carlos, ainda assustado com a surpresa, até se esquecendo das dores nos rins, antes de sair enfia sua arma na cinta, detrás da cintura, pronto para sacá-la na primeira oportunidade.

A porta do outro lado do carro se abre e Carlos sai com as mãos para o alto. Dá alguns passos e ouve a voz dizendo-lhe para parar em frente da árvore caída. Carlos obedecendo, caminha lentamente para o local indicado. Após isto, fica inteiramente iluminado pelos faróis que permaneceram ligados. Clorindo percebe que Carlos tentava esconder uma arma. Diante disto, e ainda escondido, ordena que Carlos pegue, com dois dedos da mão esquerda, a arma que está detrás da cintura e a jogue longe.

Não resta nenhuma outra coisa que Carlos possa fazer, a não ser obedecer às ordens dessa pessoa que está em lugar que ele não pode identificar, ainda mais com as dores nos rins aumentando. Faz como da maneira como ordenado: pega a arma e atira-a longe.

Após isso Clorindo finalmente sai, lentamente de seu esconderijo, empunhando sua pistola. Pega a arma jogada por Carlos e, chegando a uma distância segura para ele, mira a coxa direita de Carlos e dispara. Este sente dor lancinante quando a bala atravessa os músculos e atinge seu fêmur. Cambaleia gemendo e cai recostando-se no tronco da árvore caída na estrada.

Clorindo aproxima-se e impassivelmente dispara novamente, agora contra a outra coxa de Carlos. Este grita de dor. O atirador, impassível, fica em frente ao ferido fitando-o. Após uns poucos instantes, pergunta:

- Por acaso você imagina quem sou eu?

- Maldito, você é um maldito! Desgraçado! Não sei – grita Carlos em desespero.

- Lembra de uma família que você matou o casal e eles estavam com três filhos? Lembra de que depois disso botou fogo no barraco com os cinco dentro para acabar com todo vestígio de seu crime?

- O que você está querendo saber seu desgraçado? Isto significa o quê? - grita Carlos entre gemidos, consequência da dor provocada pelos ferimentos.

- Eles eram a minha família – reponde Clorindo.

Após dizer isto dispara um tiro em cada braço de Carlos, que uiva de dor., maldizendo e esbravejando contra o agressor. Clorindo não para. Olhando nos olhos de Carlos diz friamente:

- Isto, agora, é pelo meu irmão Pedro Carlos. - Saca do facão e dá um golpe na perna direita de Carlos. Novo grito de Carlos sentindo a carne cortada até os ossos.

- Isto é pelo meu irmão Quinca. – Novo golpe de facão é desferido, agora na outra perna. A dor que Carlos sente é inimaginável. O sangue, como que em golfadas, desce pelo corpo já formando várias poças no solo. 

- Acabe logo com isso. Chega de sofrimento. Não aguento mais. Mate-me logo. – Suplica Carlos soluçando de dor.

- Um traste como você merece sofrer muito e isto agora é pelo meu irmão João Pedro. - Em seguida desfecha um golpe de facão no braço direito de Carlos. Novo uivo de dor que até a parte mais remota da floresta parece ter ouvido.

- Você agora está sabendo um pouco como é sofrer, mas não chega ao tanto de dor que me fez passar com a perda de minha família, pessoas que nada fizeram de mal a você. - Em seguida outro golpe de facão é desfechado, desta vez contra o braço esquerdo de Carlos. Clorindo fala:

-Agora foi pelo homem bom que era meu pai Zé Antonio e sua ruindade infinita matou maldosa e friamente. - Carlos está quase desfalecendo, o sangue sai em borbotões por toda parte. Clorindo chega perto dele e murmura.

- Agora será pela minha mãe Ciça, uma mulher santa que você assassinou maldosa cruel e friamente. Que sua ruindade infinita matou. – Aponta a arma para o peito de Carlos e lentamente principia a acionar o gatilho até que, finalmente, dispara, o cão atinge a cápsula, o projétil é disparado e, naquilo que parece câmera lenta, sai da câmera, atravessa o cano, voa pelo espaço, encontra a testa de Carlos, penetra-a, atinge o cérebro esfacelando-o e sai pela nuca perdendo-se entre os galhos da árvore.

Afasta-se lentamente do local, sem olhar para trás e nunca mais alguém, na região, ouviu falar ou saber sobre Clorindo...

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No Acre, o administrador, que está há pouco tempo naquela fazenda, faz a entrevista final admissional de um candidato a trabalhar na segurança da mesma. Após uma breve conversa, pergunta:

- Qual o seu nome?

- Zé Bento - responde o candidato.

- Qual sua atividade anterior?

- Eu era lavrador.

-Por que está vindo para cá?

- Ouvi que aqui a gente tem chance de melhorar de vida.

- Tudo bem. O senhor pode passar-me seus documentos?

- Estou sem nenhum documento, meu senhor.

- Mas como? Está sem sua Identidade, CPF, Título de eleitor?

- Não senhor, não tenho mais nada aqui comigo.

- Como assim?

- É que a balsa na qual eu vinha para cá afundou e por pouco não morri afogado. Consegui me salvar, mas perdi todos meus documentos.

O administrador acha estranho e pede ao entrevistado para esperar um instante. Levanta-se e vai até o chefe dos seguranças, conta-lhe que o candidato demostrou ser uma pessoa calma, comedida e, indicado para a vaga, mas não tem documento algum e alegou que perdeu tudo no naufrágio da balsa em que estava viajando.

- Ele já passou pela sua avaliação e foi aprovado. Por mim, também. Ele tem tudo para ser admitido e agora como faço?  Ele não tem documento algum com ele e alega que os perdeu no naufrágio da balsa em que estava.

O chefe dos seguranças, com um sorriso maroto, explica:

- Se o senhor verificar, muitas fichas de admissão aqui, contam que o contratado não tem documentos por havê-los "perdido" em naufrágio de balsa. Cá entre nós: quem se sujeita a trabalhar neste fim de mundo, muitas vezes, está fugindo da polícia ou de vingadores. Se fosse em outro lugar, não serviriam, mas aqui, para vigiar cercas que durante a noite "andam", para correr o risco de morrer em tiroteio com seringueiros ou por outros capangas, vale a pena contratá-los e não fazer muitas perguntas...

O administrador para, pensa e conclui que, como o chefe da segurança achara o candidato adequado e outros candidatos em igual situação já foram contratados, decide:

- Então, pode contratar este candidato magricelo, sardento e com cabelos avermelhados.

 * BENEDITO GODOY MORONI

-Advogado, jornalista e escritor;

-Graduado em Direito  pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, Universidade de São Paulo(1972); e

-Membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e da Academia Venceslauense de Letras. 



Nota do Editor:

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